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EuPTCVHe0871-34132006000100006

EuPTCVHe0871-34132006000100006

National varietyEu
Year2006
SourceScielo

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Adesão à Terapêutica Anti-Retrovírica na Infecção VIH/SIDA

INTRODUÇÃO

A importância da adesão à terapêutica na infecção VIH/sida foi reconhecida na 12ª Conferência Mundial em Genebra (1). Assim, ao desafio de tratar esta infecção acresceram duas questões: Qual o nível de adesão à terapêutica necessário para o sucesso terapêutico? Qual o nível de adesão estimado para os doentes em terapêutica? Em doenças crónicas, como a hipertensão, uma adesão de 80% é considerada boa. No caso da infecção VIH/sida, estudos recentes demonstraram que é necessário cumprir entre 90% a 95% da terapêutica para atingir o objectivo terapêutico (2).

Os objectivos desta revisão foram analisar estudos feitos na área da adesão à terapêutica anti-retrovírica e descrever as diferenças e as semelhanças quanto à natureza da variável adesão, os métodos utilizados e o tipo de estudo realizado, bem como as características da amostra, os resultados encontrados e as barreiras à adesão apresentadas.

MÉTODOS Foi efectuada uma pesquisa na MEDLINE desde 1996 até 2004 e utilizando os seguintes termos: adherence and HIV e adherence and AIDS. Desta pesquisa resultaram 30 artigos. Foi realizada uma outra pesquisa com base nas referências desses artigos (20 artigos). O termo adherence é o utilizado pelas recomendações internacionais para a utilização de anti-retrovíricos, anualmente emitidas pelo o Departamento de Saúde e Serviços Humanos do governo dos Estados Unidos (3).

Nesta revisão foram incluídos 32 artigos, decorrentes da investigação em adultos (acima de 18 anos) e cujo objectivo principal foi quantificar a adesão à terapêutica de doentes com infecção VIH/sida (apêndice).

A revisão dos artigos registou a informação relativa à definição de adesão, ao local de realização e desenho do estudo, à amostra, aos métodos de avaliação e aos níveis de adesão à terapêutica obtidos.

As variáveis preditoras de adesão foram agrupadas de acordo com o conceito que pretendiam representar.

Estes grupos foram organizados em três grandes categorias: a) factores sociais, b) factores relacionados com a doença e c) factores relacionados com o tratamento.

As variáveis estudadas por análise univariada e multivariada foram agrupadas em função do seu significado estatístico.

RESULTADOS

Caracterização dos artigos analisados

Definição de adesão Em 20 dos 32 artigos analisados a adesão à terapêutica foi considerada uma variável categorias: dicotómica (adere ou não adere) ou com várias categórias.

O conceito dicotómico (cumprimento absoluto ou no missing doses), que traduz uma adesão de 100%, isto é, sem falha, foi utilizado por quatro autores (apêndice 5, 6, 19, 32).

Na adesão à terapêutica utilizando várias categorias é, habitualmente, definido um valor abaixo do qual o doente é considerado não aderente, sendo esse ponto designado por limiar. O limiar mais baixo encontrado foi 75% (apêndice 31) e os mais utilizados foram os 80% (seis artigos) e de 90% (seis artigos).

Em relação à apresentação da adesão por classes foram identificados quatro artigos (apêndice 1, 8, 11, 27).

Nos restantes trabalhos, dez consideraram a adesão uma variável contínua; dessa forma a adesão pode assumir qualquer valor entre zero e 100% (apêndice 4, 10, 12, 13, 15, 18, 20, 21, 22, 29).

Foi identificado um artigo que, apesar de definir a adesão à terapêutica como uma variável contínua apresentou o resultado como categórica (apêndice 14).

Em outro trabalho foram consideradas simultaneamente as duas classificações (apêndice 25).

Outro critério usado foi o instrumento empregue para medir a adesão.

Nos estudos que utilizaram os níveis plasmáticos dos inibidores da protease, a adesão à terapêutica foi definida como a presença de uma concentração mínima destes fármacos no sangue (apêndice 16, 25, 26, 28).

Para os trabalhos que utilizaram marcadores biológicos, um doente foi considerado aderente à terapêutica quando foram detectadas variações do volume globular médio, do ácido úrico e de bilirrubina (apêndice 1, 2, 16).

Para a contagem de comprimidos e para os sistemas electrónicos, a razão entre medicamentos tomados e medicamentos prescritos foi a definição mais utilizada. O período de tempo dessa avaliação variou de um dia (apêndice 15, 20), a uma semana (apêndice 15) até seis meses (apêndice 13). Os dados foram obtidos com base em registos de profissionais de saúde ou por sistema electrónico.

A utilização dos sistemas electrónicos também recorreu a outra definição: a diferença entre o número total de dias considerado para análise e o total de dias em que todos os medicamentos prescritos foram correctamente tomados (apêndice 12, 15).

Quando foi empregue o registo de dispensa de medicamentos na farmácia, a adesão à terapêutica foi definida pela razão entre medicamentos prescritos e medicamentos dispensados, relativamente a um determinado período de tempo. Apesar do período de tempo ter variado entre seis meses e um ano, a adesão foi estimada em avaliações mensais (apêndice 2, 7, 14, 23, 25, 26,31).

Alcoba (apêndice 26) considerou o acumulado de dias para os quais o doente não teria medicamentos e não a quantidade total de medicamentos cedidos na farmácia.

Nos estudos que aplicaram a entrevista, a definição empregue baseou-se no número de tomas/comprimidos que o doente recorda ter feito dos medicamentos prescritos, durante o período considerado. O período de tempo sobre o qual incidiu esta avaliação foi variável, um dia (apêndice 15) a sete dias (apêndice 3). Para além da definição referida, houve trabalhos que utilizaram o número de dias com cumprimento absoluto da terapêutica para definir adesão (apêndice 3).

Da mesma forma que na entrevista, no questionário foram observados vários intervalos de tempo, nos quais o doente deveria identificar a forma como cumpria cada um dos medicamentos prescritos.

Para ambos os métodos, a informação acerca dos medicamentos tomados foi obtida com base na memória dos doentes.

Métodos de avaliação da adesão Os métodos empregues dividiram-se em métodos directos (determinação das concentrações plasmáticas de fármacos e marcadores biológicos) e métodos indirectos (contagem de comprimidos, registos da dispensa de medicamentos na farmácia, juízo clínico, comunicação da adesão pelo doente, através de questionários e entrevistas e sistemas de controlo electrónico). Na tabela 1 estão descritos os métodos utilizados para estimar a adesão à terapêutica, nos artigos analisados.

Dos trabalhos analisados, 15 (46,9%) utilizaram um método para avaliar a adesão; 10 (31,3%) utilizaram dois e 6 (18,7%) utilizaram três métodos, em simultâneo.

Hugen e colaboradores (apêndice 25) aplicaram sete métodos diferentes num estudo descritivo realizado em 2002.

Nos 32 artigos analisados, o intervalo de tempo considerado na avaliação da adesão e o número de avaliações da adesão à terapêutica efectuadas foram bastante diversificados. Na entrevista, questionário e juízo clínico, o intervalo de tempo de avaliação variou entre um dia a uma semana. Nos restantes métodos indirectos esse período foi mais longo, havendo trabalhos que fazem essa avaliação durante meses.

Local de realização Dos 32 trabalhos, 17 (53,1%) foram realizados nos Estados Unidos, 2 (6,3%) no Canadá, 4 (12,5%) em Espanha, 2 (6,3%) em Itália, 1 (3,1%) na Bélgica, 1 (3,1%) na França, 1 (3,1%) na Holanda, 1 (3,1%) no Reino Unido, 1 (3,1%) na Suiça, 1 (3,1%) em Hong-Kong e 1 (3,1%) no Senegal. A zona urbana foi o local eleito para a realização da maioria dos estudos.

Em dez artigos não foi identificado o número de centros de investigação envolvidos e em 14 o estudo decorreu num único centro de investigação.

A proveniência dos participantes foi: em três (9,4%) artigos comunitária, em 18 (56,3%) hospitalar e em 11 (34,4%) seleccionados de coortes.

Desenho do estudo Trinta e um estudos foram observacionais analíticos e um foi descritivo (apêndice 25). Quinze foram estudos prospectivos, 13 transversais e dois retrospectivos.

O intervalo de tempo de avaliação da adesão do doente foi outro aspecto analisado. Os estudos retrospectivos (apêndice 1, 27) decorreram durante intervalos de tempo variáveis. Esse intervalo foi limitado por um ponto i, definido como o início do estudo e por um ponto t, onde o doente iniciou a terapêutica.

Nos estudos transversais não foi definido o intervalo de tempo em que decorreu o estudo.

Os estudos prospectivos decorreram em intervalos de tempo que variaram entre as 12 e as 104 semanas (2 anos).

Nos estudos transversais, o número de avaliações da adesão à terapêutica foi pequeno, habitualmente, uma avaliação. Nos estudos prospectivos, foram, habitualmente, efectuadas mais do que uma avaliação.

Amostra O número de doentes incluídos nas amostras variou entre poucas dezenas e centenas. Cinco artigos utilizaram amostras com menos de 50 doentes (apêndice 2, 10, 12,17, 25) e seis com mais de 500 (apêndice 14, 19, 21, 23, 31, 32). A amostra mais pequena foi de 28 doentes (apêndice 25) e a maior de 1522 doentes (apêndice 31).

Na selecção de doentes houve autores que optaram por recrutar doentes naives (apêndice 1, 14, 22, 31), mas a maior parte optou por doentes em terapêutica mais de 6 meses ou 1 ano.

As características demográficas analisadas foram a idade, o sexo, a etnia e/ou raça.

A maioria das amostras incluiu homens e mulheres (27 artigos), mas o número de homens foi sempre superior. Nos restantes cinco artigos, dois não mencionaram a distribuição por sexos (apêndice 5, 25), um apenas incluiu mulheres (apêndice 20) e dois apenas homens (apêndice 2, 32).

Nos estudos realizados nos EUA (17 estudos) foram descritas as etnias dos participantes, sendo a caucasiana inferior a 50% em 11 estudos (64,7%) e superior a 50% em cinco (29,3%).

Níveis de adesão obtidos Os níveis de adesão à terapêutica dos estudos analisados, considerando a adesão como variável categórica, são apresentados na tabela 2. Estes resultados consideraram os vários métodos utilizados para avaliar a adesão numa única avaliação.

Os resultados dos artigos que consideraram a adesão à terapêutica como variável contínua estão expressos nas tabelas 3 e 4.

Variáveis associadas à adesão à terapêutica Em oito dos 32 trabalhos analisados, os autores questionaram os doentes acerca das razões que os levaram a não cumprir a terapêutica. As principais razões mencionadas foram o esquecimento e o estar muito ocupado ou fora de casa.

Os efeitos secundários dos medicamentos, a depressão e as dificuldades em compreender a posologia prescrita foram outras das razões apontadas.

As alterações na vida diária, o querer desintoxicar o corpo, o adormecer e o consumo de álcool ou outra substância ilícita aparecem descritas no final da lista.

Dos 32 artigos, 17 (53,1%) fizeram uma análise univariada dos factores preditores da adesão à terapêutica no doente com infecção VIH/sida e 13 (40,6%) alargaram essa análise a um estudo multivariado. O resultado das associações encontradas é apresentado considerando factores sociais, factores relacionados com a doença e factores relacionados com a terapêutica (Tabela 5).

Factores sociais Do conjunto de variáveis demográficas, a idade foi a que apresentou associação mais evidente com a adesão à terapêutica. Os artigos mostraram que os participantes mais velhos tinham maior adesão à terapêutica.

A etnia foi estudada em 13 artigos, todos provenientes dos Estados Unidos. Os afro-americanos apresentam mais baixa adesão à terapêutica.

Em nenhum estudo foi encontrada associação estatisticamente significativa entre sexo, estado civil e viver com dependentes (componente familiar), e adesão à terapêutica.

As características socio-económicas incluíram o nível de escolaridade e o estatuto socio-económico. O nível de escolaridade considerou indicadores relativos ao grau académico e ao grau de iliteracia. Do estatuto socioeconómico fizeram parte indicadores tão diversos como o vencimento anual dos doentes, a situação laboral, o número de refeições diárias ou o ter casa própria. Os artigos que evidenciaram associação mostraram que os participantes com baixo nível de escolaridade e socioeconómico tinham menor adesão à terapêutica.

Nem todos os autores definiram o tempo de consumo de tabaco, álcool ou drogas ilícitas, alguns dividiram esse consumo entre activo ou histórico. A associação entre o consumo de tabaco e a adesão à terapêutica foi analisada em dois artigos, mas não foi encontrada associação entre as variáveis.

As características institucionais incluíram o apoio social e o grau de satisfação com a instituição médica e/ ou com os profissionais de saúde. Os resultados mostraram que os participantes com maior apoio social tinham maior adesão à terapêutica. As situações enquadradas no apoio social foram: o apoio de familiares e amigos, o apoio religioso e o apoio dado por instituições de solidariedade social. A satisfação do doente em relação à instituição onde é tratado e aos profissionais de saúde que o acompanham, nomeadamente médicos, não mostrou evidência de associação significativa com a adesão à terapêutica.

As variáveis ligadas à saúde mental foram o stress e a depressão. No stress foram considerados sentimentos como: a ansiedade, as limitações emocionais, o cansaço, o isolamento. Como depressão incluíram-se as situações clínicas ligadas à saúde mental. Foram utilizadas várias escalas para avaliar a depressão. Os artigos que incluíram participantes mais deprimidos ou com stress tinham menor adesão à terapêutica.

Factores relacionados com a doença O estado clínico do doente reflectiu uma variedade de situações, desde um bom estado geral de saúde, ao aparecimento de sinais ou sintomas incómodos ou de infecções ou eventos oportunistas, avanço na história natural da doença, aumento da carga vírica ou deterioração do estado imunológico. Foi observada associação significativa entre o estado imunológico (número de linfócitos T CD4+) e a adesão à terapêutica, esta foi no sentido de doentes com menor número de linfócitos T CD4+ demonstravam uma menor adesão à terapêutica.

As variáveis que estudaram a associação entre a atitude perante a doença e a adesão à terapêutica abordaram situações relacionadas com a crença na saúde e com a motivação. A primeira incluiu situações relacionadas com o conhecimento da doença e/ou da forma de actuação dos medicamentos, a percepção de que os medicamentos podem melhorar e prolongar a vida, que os medicamentos vão combater o vírus ou a percepção de que a infecção VIH causa doenças que podem ser combatidas pelos medicamentos. A segunda considerou situações que demonstram empenhamento face ao cumprimento da terapêutica, tais como coping, uso de auxiliares de memória para não esquecer de tomar os medicamentos. Os artigos mostraram que os participantes mais motivados têm maior adesão à terapêutica.

Factores relacionados com o tratamento Dada a sua complexidade o regime terapêutico foi avaliado em termos gerais. Com efeito, é complicado tomar os medicamentos sobretudo fora de casa, durante o horário do trabalho, de estômago vazio ou quando não se encaixam no quotidiano.

Em relação ao número de fármacos incluídos no regime terapêutico, ao número de comprimidos diários ou à posologia, a associação pareceu menos evidente.

Nas duas situações, regimes terapêuticos complexos, com vários fármacos, muitos comprimidos e posologia com maior número de tomas estariam associados a uma adesão mais fraca.

Em relação à associação entre a experiência terapêutica e a adesão à terapêutica, houve mais referências de associação positiva em doentes em tratamento.

DISCUSSÃO A Organização Mundial de Saúde definiu adesão à terapêutica como a extensão em que o comportamento de um indivíduo, para a utilização de medicamentos, cuidados de saúde, alimentação e estilos de vida, está de acordo com as recomendações de um profissional de saúde com as quais concorda (4). Apesar das várias definições que foram sendo desenvolvidas ao longo dos anos, a adesão à terapêutica continua a ser difícil de medir, pelo que nos artigos analisados se centrou nos medicamentos tomados pelo doente. Apenas um autor (apêndice 25), apresentou como objectivo do estudo, a avaliação da adesão à terapêutica prescrita bem como a avaliação da adesão à posologia e às restrições alimentares.

Nos artigos analisados foi mais frequente a classificação categórica da adesão, contudo pelo seu carácter dinâmico, a classificação contínua seria melhor opção. Esta posição é defendida por Steiner, para este autor a utilização da adesão como variável categórica fará sentido quando for claro o limiar para a patologia em causa, fora essa situação a medida contínua deveria ser a utilizada (5). Os artigos que consideraram a adesão uma variável categórica utilizaram, geralmente métodos de avaliação subjectivos (auto-comunicação, juízo clínico), períodos de avaliação curtos e basearam a informação na memória do doente ou do profissional de saúde.

Quando utilizada a variável contínua, os períodos de avaliação foram mais longos e a informação, em regra, não se baseou na memória do doente ou do profissional de saúde. Esta opção permitiu igualmente fazer avaliações considerando múltiplos intervalos de tempo, o que possibilitou avaliar não a adesão à terapêutica no período de tempo definido no estudo, mas também a sua evolução ou retrocesso.

Em alguns artigos, o tempo de avaliação da adesão à terapêutica não foi quantificado. Houve autores que consideraram o tempo entre visitas”/consultas (apêndice 12, 22), o que implicou que a avaliação da adesão tivessem intervalos de tempo variados. Por exemplo, para alguns doentes o tempo entre consultas poderia ser diferente por razões ligadas à evolução da doença ou por motivo de fraca adesão à terapêutica. Esta variação pode originar um viés de selecção. Idealmente, os intervalos de tempo de avaliação devem ser iguais ou muito aproximados para os doentes de um mesmo estudo.

Para avaliar a adesão foram empregues diversos métodos. A utilização de marcadores biológicos na avaliação da adesão à terapêutica não constitui uma inovação na área da medicina. Na infecção VIH/sida, os marcadores biológicos utilizados foram a macrocitose, característico da zidovudina e da estavudina; o aumento dos valores séricos do ácido úrico, característico da didanosina, e o aumento dos níveis de bilirrubina que ocorre nos doentes a tomar indinavir. Os marcadores biológicos foram encarados como promissores por alguns investigadores (6). Doung (apêndice 16) mostrou existir evidência de associação entre a hiperbilirrubinemia e a adesão ao indinavir e entre o aumento do ácido úrico e a adesão à didanosina. Contudo, nem sempre foi demonstrada a associação entre essas alterações e a adesão. Broers e colaboradores (apêndice 1) não encontraram associação entre a macrocitose e a adesão à terapêutica com zidovudina ou com estavudina. A deficiência de vitamina B12 e de folatos, o alcoolismo ou a doença hepática são, igualmente, capazes de provocar alterações semelhantes, o que pode enviesar os resultados (10).

A determinação sérica dos fármacos é um método dispendioso e complexo (7). Os fármacos mais utilizados foram os inibidores da protease, particularmente o indinavir. Doung (apêndice 16) demonstrou que níveis plasmáticos acima dos valores de referência para os inibidores da protease e resposta virológica estavam associados e que os níveis de fármaco eram preditores nessa resposta. Outro artigo não confirmou, inteiramente, essa associação (apêndice 26). Outros estudos demonstraram que a baixa adesão estaria associada com níveis de fármaco indetectáveis, mas não com cargas víricas quantificáveis (8).

Uma desvantagem deste método prende-se com o facto dos inibidores da protease terem semi-vidas curtas, de facto, apenas se podem dosear concentrações plasmáticas relativas ao dia anterior à última toma, pelo que a extrapolação para períodos de tempo mais longos é controversa. Alguns autores concluíram que seria possível essa extrapolação (apêndice 26); outros alegaram o chamado efeito escova de dentes para se oporem (9). Outros viéses apontados na literatura foram as interacções medicamentosas e da dieta alimentar que podem estar ligadas a valores falsamente baixos de anti-retrovíricos (10).

As recomendações do Department of Health and Human Services, de Outubro de 2005, consideram a monitorização sérica de inibidores da protease e inibidores não nucleosídeos da transcriptase reversa como uma opção com interesse potencial e de inibidores nucleosídeos da transcriptase reversa como sendo, ainda, objecto de mais estudos. Em relação à sua utilização na prática clínica, as situações indicadas por esses peritos não incluem a avaliação da adesão à terapêutica. De facto, a falta de estudos prospectivos capazes de demonstrar que a monitorização sérica de anti-retrovíricos melhora a resposta à terapêutica é a principal limitação à utilização deste método (3).

Nenhum estudo empregou, exclusivamente métodos directos para estimar a adesão à terapêutica. Nos 32 artigos analisados, houve uma opção predominante pelos métodos indirectos e em seis artigos foram utilizados, em simultâneo, métodos directos e indirectos.

A entrevista e o questionário foram os métodos mais utilizados para avaliar a adesão à terapêutica, respectivamente em 23 trabalhos. De um modo geral, os questionários e as entrevistas sobrestimam a adesão, no entanto manifestar uma adesão absoluta é um fraco preditor, mas declarar uma adesão baixa deve ser tida em consideração (11).

Houve artigos que referiram ter optado por um entrevistador com formação específica e independente da equipa de saúde (apêndice 3, 28). A formação do entrevistador é importante, na medida em que lhe é ensinado a orientar uma entrevista, para que o doente compreenda o que lhe é perguntado, sem, no entanto, o influenciar ou condicionar. O facto do entrevistador não ser membro da equipa de saúde, pode dar mais garantias de que o doente não se sentirá pressionado a responder algo que agrade ao entrevistador e, por isso, sobrestime a sua adesão à terapêutica. Para além de se obterem respostas mais fidedignas, um reforço positivo da importância da adesão à terapêutica, uma oportunidade de conhecer os motivos das falhas e uma oportunidade de intervir (12). Estes dois métodos permitem auscultar o doente em relação às suas dificuldades em cumprir a terapêutica.

O registo da dispensa de medicamentos (sete artigos), o sistema electrónico (oito artigos) e a contagem de comprimidos (oito artigos) foram as segundas grandes opções, em termos de métodos de avaliação. Bangsberg (apêndice 12) defendeu as vantagens da contagem de comprimidos relativamente aos sistemas electrónicos.

Para este autor, os sistemas electrónicos subestimam a adesão, uma vez que é vulgar o doente retirar mais de uma dose de cada vez que abre o frasco, particularmente quando utiliza as chamadas caixas de medicação, o autor defende, ainda, a vantagem da contagem de comprimidos ser efectuada em casa dos doentes e sem visitas previamente anunciadas.

O registo de dispensa de medicamentos na farmácia pressupõe condicionalismos, nomeadamente, que a dispensa de medicamentos seja feita exclusivamente por uma farmácia e para períodos de tempo regulares e bem definidos. Em 1988, Steiner publicou um artigo onde descreveu e validou este instrumento para estimar a adesão à terapêutica (13). Este método permite obter uma informação: se os medicamentos foram dispensados ao doente, mas não controla se foram realmente tomados.

A interrupção da dispensa de medicamentos devido a efeitos adversos, episódios de internamento ou indicação médica não foram analisadas na maior parte dos trabalhos, apenas Olalla (apêndice 23) considerou estas variáveis nos seus resultados.

A capacidade dos médicos e outros profissionais de saúde avaliarem a adesão à terapêutica revelou-se, um instrumento incerto. No estudo de Paterson (apêndice 13), 51% dos doentes classificados pelo médico como tendo uma adesão inferior a 80% tinham, na realidade, adesão superior a esta percentagem (avaliada por sistema electrónico). De facto, 21% desses doentes tinham adesão superior a 95%. Aparentemente, um doente raramente admite ao seu médico não aderir à terapêutica, da mesma forma que um médico raramente admite que um seu doente não seja aderente à terapêutica (14).

Houve estudos em que os doentes receberam uma gratificação pela colaboração que tiveram, ou seja, pelo tempo dispensado a responder aos questionários ou às entrevistas (apêndice 3, 5, 17, 30). Este procedimento pode incentivar o doente a agradar; este pode tentar colaborar mais e, consequentemente aumentar a adesão à terapêutica.

Apesar das diferenças entre os vários métodos foi encontrada correlação moderada entre a autocomunicação (entrevista e/ou questionário) e os sistemas electrónicos num artigo (apêndice 15) e entre os sistemas electrónicos e a determinação das concentrações plasmáticas noutro (apêndice 25). Outros estudos que compararam sistemas electrónicos, contagem de comprimidos e auto-comunicação, encontraram níveis de adesão significativamente diferentes para esses métodos (apêndice 12, 18).

Parece, pois, ser consensual não existir um método ideal para avaliar a adesão à terapêutica, e que será a combinação de vários métodos a melhor abordagem; parece, também, lógico que estudos que utilizaram diferentes resultados analíticos e/ou clínicos como resultado final obtivessem diferentes resultados de adesão.

Mesmo entre os estudos que utilizaram o mesmo tipo de método houve diferenças, por exemplo, nas questões colocadas na entrevista ou do questionário, no tempo sob o qual incidiu a análise (um dia, dois dias, uma semana) e no próprio processo de recolha de informação.

Finalmente, a avaliação foi feita, quase sempre, para um regime terapêutico e foram poucos os estudos que analisaram a adesão a fármacos em particular.

Não obstante o carácter universal desta infecção, são ainda poucos os trabalhos realizados na Europa, na Ásia ou em África. Salienta-se o facto de não terem sido identificados quaisquer artigos originários do leste da Europa, uma vez que esta região apresenta um aumento da incidência da infecção VIH/sida. Refere-se, também, o facto de 30 dos artigos analisados serem oriundos de países onde o acesso à terapêutica é universal a todos os doentes que dela necessitem.

A importância dos estudos sobre adesão à terapêutica no doente com infecção VIH/sida prende-se, principalmente, com o facto de ser imprescindível conhecermos os factores condicionantes da adesão para ser possível agir sobre eles. De facto, a diversidade de estudos realizados dificulta a comparação entre os vários trabalhos. Além disso, a ausência de um grupo controlo, aumenta a possibilidade de ocorrerem viéses por indicação, tais como a prescrição de regimes mais complexos a doentes considerados mais aderentes. A predominância de estudos transversais esquece a evolução ou retrocesso da adesão do doente à terapêutica ao longo do tempo.

A classificação do método epidemiológico utilizado e a duração do estudo foram parâmetros nem sempre definidos claramente pelos autores. Em 14 (44%) dos artigos analisados a classificação do método epidemiológico não foi definida pelo autor. Em relação à duração do estudo, se para os estudos transversais pode ser entendido que o estudo decorreu no tempo necessário à aplicação do instrumento de avaliação aos doentes, para os estudos prospectivos e retrospectivos a definição clara da duração temporal é um factor essencial.

Em grande parte dos artigos analisados, as amostras eram de pequena dimensão, o que pode ter dificultado a identificação dos factores preditores. A generalização dos resultados à população é igualmente controversa, pelo facto de existirem amostras de conveniência, dos participantes estarem incluídos em estudos de coorte ou receberem incentivos monetários. O reduzido número de mulheres, a variabilidade de distribuição de factores de risco para transmissão e as diferenças culturais foram outros limites à generalização.

Em relação aos estudos analisados, houve uma clara predominância por populações provenientes do continente americano (59,4%) relativamente à Europa (34,4%).

O optimismo surgido nos doentes e na comunidade médica e científica com o aparecimento de novos fármacos, particularmente os que permitiam uma terapêutica potente, foram frustrados pelo reconhecimento das exigências do próprio regime terapêutico. A terapêutica anti-retrovírica potente demonstrou ser capaz de baixar a carga vírica para valores indetectáveis, relacionando-se este facto com uma diminuição da morbilidade e da mortalidade. Contudo, a eficácia deste tratamento depende do cumprimento rigoroso de um regime terapêutico (15).

Os níveis da adesão à terapêutica encontrados nos artigos analisados foram diversos; contudo, foi unânime, para vários investigadores, que o nível de adesão à terapêutica deveria ser elevado para atingir os benefícios terapêuticos. Salienta-se o crescimento do valor limiar ao longo do tempo (ano de realização do estudo) e à medida que as evidências científicas e clínicas apontavam para a necessidade de um cumprimento cada vez mais escrupuloso do regime terapêutico.

Nos estudos que consideram a adesão uma variável categórica (apêndice 5, 6, 19, 32), o melhor resultado foi o obtido no trabalho de Kleeberger e colaboradores, onde 78 a 85% dos doentes apresentaram uma adesão de 100%. O pior resultado foi obtido por Maggiolo e colaboradores, com apenas 50,9% dos doentes a apresentarem uma adesão de 100%. Curiosamente, ambos os autores usaram um questionário estruturado como instrumento para estimar a adesão.

Nos artigos em que o valor limiar utilizado foi de 90%, o melhor resultado foi obtido por Fong e colaboradores, 98,1% de doentes aderentes (apêndice 27) e o pior resultado foi obtido por Gordillo e colaboradores 57,6% de doentes aderentes (apêndice 9).

Nos artigos que consideram a adesão uma variável contínua, os melhores resultados foram obtidos por Melbourne e colaboradores (apêndice 10) e por Laniéce e colaboradores (apêndice 29). Os piores resultados foram os obtidos por Andrea e colaboradores (apêndice 20) e por Arnsten e colaboradores (apêndice 15).

Do ponto de vista do doente, os factores que mais dificultaram a adesão à terapêutica foram o esquecimento, o estar muito ocupado ou fora de casa, os efeitos secundários e a depressão. Curiosamente, o número de fármacos, o número de comprimidos ou a posologia não apareceram entre as primeiras razões apontadas, apesar de na literatura, serem apontadas como importantes causas de adesão à terapêutica (3).

Nos artigos analisados, o desenho do estudo, a amostra, o método utilizado para estimar a adesão foram bastante diferentes; contudo, as variáveis analisadas foram muito semelhantes. De facto, não foi identificada uma variável estudada num único artigo; pelo contrário foram identificadas dezenas de variáveis repetidas. Essas variáveis foram reunidas em grupos e depois em três grandes categorias: factores sociais, factores relacionados com a doença e factores relacionados com o tratamento.

Nenhum dos artigos analisados encontrou associação entre sexo, estado civil, viver com dependentes e a adesão à terapêutica. No entanto, ser jovem, pertencer a uma etnia minoritária, ter um baixo nível de escolaridade e económico e consumir drogas ilícitas apareceram associados com uma baixa adesão à terapêutica. As características socio-demográficas foram variáveis incluídas em praticamente todos os estudos; apesar de não serem necessariamente bons factores preditores, identificam franjas populacionais capazes de beneficiar de intervenções dirigidas.

Provavelmente, a associação entre a etnia e a adesão à terapêutica ocorreu como reflexo da diversidade de culturas, de crenças na saúde, de atitudes perante o tratamento, bem como do nível socio-económico dos doentes pertencentes a essas minorias. Os trabalhos que descreveram essa associação eram provenientes dos Estados Unidos e foi a população afro-americana a que apresentou uma menor adesão à terapêutica.

Em relação ao nível socio-económico, a diversidade de critérios de avaliação poderia justificar as associações encontradas. De facto, os critérios de pobreza ou de riqueza são muito variados e vão desde o comer menos de duas refeições por dia (apêndice 30), ao estar desempregado (apêndice 13, 20), até à quantificação do vencimento anual, isto é, grandes extremos de pobreza e de riqueza nos critérios escolhidos.

Em alguns estudos, o consumo de drogas endovenosas foi associado com baixos níveis de adesão à terapêutica, noutros essa associação não foi confirmada.

Um consumo histórico poderia estar implicado com o risco para a transmissão, particularmente nas drogas endovenosas. Um consumo activo estaria mais associado a um desinteresse pelo tratamento. Na literatura, autores, que defendem que mesmo o consumo activo de drogas não é condição para limitar o acesso à terapêutica, sob pena de aumentarem os casos de SIDA (16). Num trabalho de 2003, Wood concluiu que se não forem implementadas medidas para favorecer a adesão à terapêutica nos consumidores activos, estes progridem mais rapidamente para estadios mais avançados da doença com consequente utilização de outro tipo de recursos da saúde (17). O receio do incumprimento da terapêutica pode levar a atitudes discriminatórias, contudo, um estatuto socio-económico alto, um nível de escolaridade elevado e um passado sem consumo de drogas não foram descritos como preditores de óptima adesão à terapêutica nas mais recentes recomendações (3).

A limitação de acesso à terapêutica baseada no sexo, na idade, na etnia, no estatuto socio-económico ou na história de consumo de drogas ilícitas poderia colocar em risco um grupo populacional bastante vulnerável; no entanto, intervenções planeadas para esse grupo, exercendo uma discriminação positiva poderiam maximizar o tratamento (18).

A depressão foi associada com uma adesão à terapêutica subóptima, contudo o carácter transversal da maioria dos estudos analisados pode ter condicionado a relação causa-efeito. Por um lado, é possível que sintomas depressivos possam limitar a capacidade dos doentes de seguir as orientações do médico; por outro lado, a falta de adesão à terapêutica pode contribuir para o agravamento da depressão pela ausência de resultados clínicos favoráveis.

A depressão no doente com infecção VIH/sida pode ser mais do que uma situação transitória causada pelo impacto do diagnóstico, mas representar uma condição duradoura caracterizada por comportamentos auto-destrutivos (19). autores que apontam a depressão como a variável mais vezes associada a uma baixa adesão à terapêutica. Doentes com depressão ou doença mental deveriam receber tratamento e medicação adequada simultaneamente com o tratamento anti-retrovírico (20).

O stress foi igualmente relacionado com uma baixa adesão à terapêutica, de facto este pode reduzir a capacidade do doente em aderir à terapêutica, quer pela redução da motivação, quer pelo aumento da dificuldade de concentração e falha de memória (21).

O grau de satisfação do doente com o médico ou com a instituição de saúde não foram associados com a adesão à terapêutica, em nenhum dos artigos. Uma boa relação médico-doente tem sido dada como factor positivo na adesão à terapêutica (7). Para Chesney, esta relação poderá funcionar de forma inversa, ou seja, uma relação médico-doente, uma observação recriminatória ou com juízos de valor, com falta de compreensão sobre valores culturais pode afastar o doente do tratamento e da instituição (22).

Alguns dos estudos analisados referiram que doentes com níveis de linfócitos T CD4+ elevados apresentavam uma maior adesão à terapêutica. Stone tirou conclusões semelhantes (23). Contudo, o sentido desta associação não fica claro: doentes em fase menos avançada da infecção aderem melhor à terapêutica porque têm menos sintomas da doença? Ou doentes que aderem mal à terapêutica não conseguem atingir a supressão virológica e a reconstituição imunológica? (24) Curiosamente, o estadio da infecção não apareceu associado com a adesão à terapêutica, de facto, somente em três artigos se associou a fase de SIDA com uma maior adesão à terapêutica.

Nos artigos analisados foi encontrado um grande número de variáveis que reflectiam as atitudes do doente face à infecção, ao tratamento e ao medicamento. Por exemplo, o medo, o cepticismo, o pessimismo, mas também a confiança e o conhecimento técnico acerca dos fármacos. Para uma grande parte dos autores, a confiança do doente e a motivação estavam associadas com uma adesão à terapêutica mais elevada. A confiança do doente na terapêutica e a sua aceitação estão descritas como fundamentais no sucesso da terapêutica (25). A preparação psicológica do doente para iniciar um regime terapêutico engloba a compreensão, a motivação e o compromisso. Antes de iniciar tratamento é importante acordar com o doente as condições de aceitabilidade desse regime. Esta atitude envolve uma instrução/ educação do doente e uma compreensão perante as dificuldades expostas ou manifestadas por ele (3). Os instrumentos e as definições utilizadas para avaliar, por exemplo, sintomas depressivos, qualidade de vida, apoio social e crenças na saúde foram, igualmente muito diversos, nos artigos por nós analisados.

Nos artigos analisados os regimes terapêuticos descritos foram muito diferentes, fruto da quase ausência de opções terapêuticas que caracterizaram os primeiros anos da epidemia e do desenvolvimento de novos fármacos e regimes terapêuticos que surgiram após a viragem do milénio. Nos estudos que decorreram ou foram publicadas até 1998, houve a opção pela monoterapia e/ou terapêutica dupla, resultado dos fármacos disponíveis na época. Após esses anos, a terapêutica anti-retrovírica potente passou a ser a principal escolha.

O aparecimento de efeitos secundários dos medicamentos foi apontado como um factor de baixa adesão à terapêutica, em vários dos artigos analisados.

Esta variável fora citada pelos doentes quando descreveram as principais barreiras à adesão. De facto, para um doente assintomático que inicia terapêutica anti-retrovírica potente, os efeitos secundários dos fármacos representam uma diminuição na qualidade de vida.

Ammassari relatou a mesma situação (26). Altice concluiu que doentes que recebiam informações acerca dos efeitos adversos esperados e da forma como estes poderiam ser minoradas apresentavam uma adesão à terapêutica mais elevada (25).

Em relação ao número de comprimidos, apenas num artigo foi confirmada associação com a adesão à terapêutica e em relação à posologia foram identificados quatro artigos. Murphy avaliou de forma mais abrangente as barreiras à adesão à terapêutica. Neste estudo, foi considerado barreira à adesão à terapêutica qualquer factor que impedisse ou desincentivasse o doente de tomar os medicamentos. Estes factores incluíram: estado clínico do doente (ou seja a forma como o doente percepciona o papel da terapêutica na sua situação clínica); a natureza do regime terapêutico (número de comprimidos, posologia, necessidade de refrigeração); as emoções do doente (depressão; confusão); a vontade do doente (o doente não toma os medicamentos porque não se sente bem; porque isso o vai impedir de beber); o estilo de vida do doente (se o regime terapêutico não se encaixa no seu estilo de vida). Curiosamente, os factores mais apontados foram a coincidências dos horários dos fármacos com as horas de dormir e a dificuldade de tomar medicamentos com instruções especiais. O número de comprimidos aparece mencionado em 11º lugar e o número de administrações diárias não aparece mencionado (27).

Aparentemente, a forma como um regime terapêutico encaixa na rotina do doente é um factor mais importante que o número de comprimidos ou a posologia diária.

Planear um regime terapêutico que se adapte à rotina de cada doente será mais importante do que reduzir o número de comprimidos, fármacos ou administrações diárias. A redução no número de administrações diárias poderá ter como limitação a semi-vida do fármaco, particularmente dos análogos nucleosídeos e nos inibidores da protease. A simplificação de regimes terapêuticos a que se tem assistido nos últimos anos é um precioso contributo para aproximar os regimes terapêuticos da vida dos doentes e não uma panaceia em si mesma (28).

Em conclusão, considerar a adesão como uma variável categórica foi a opção mais escolhida nos artigos revistos.

A diversidade de métodos para avaliar a adesão foi grande, contudo a entrevista e o questionário foram os métodos mais utilizados. Os estudos realizados foram maioritariamente observacionais com um predomínio dos estudos prospectivos. A proveniência dos participantes foi sobretudo hospitalar com predomínio do sexo masculino.

Apesar da diversidade de instrumentos de avaliação da adesão, das várias definições da variável, dos diferentes valores de limiar considerados, os resultados da adesão à terapêutica encontrados, nos vários trabalhos, estão, na maior parte dos casos, abaixo do necessário para obter sucesso clínico.

As variáveis que em mais estudos se associaram com a baixa adesão à terapêutica foram: o baixo nível de escolaridade e estatuto sócio-económico, a depressão, a falta de motivação para o tratamento e a complexidade do regime terapêutico.

Futuros ensaios clínicos na infecção VIH/sida devem considerar a inclusão de pelo menos uma metodologia de avaliação da adesão; a utilização, em simultâneo, de dois métodos diferentes poderá ser a melhor abordagem.

É importante realizar estudos desenhados para encontrar estratégias para melhorar a adesão à terapêutica.


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