Anemia ferripriva refractária à terapêutica com ferro oral: que etiologias?
INTRODUÇÃO
O défice de ferro representa um problema de saúde pública, sendo a causa mais
frequente de anemia na criança(1,4,9,18). Nas últimas décadas vários estudos
desenvolvidos mostram o efeito nocivo desta deficiência sobre o desenvolvimento
psicomotor da criança que, em algumas circunstâncias, pode ser irreversível(1).
Tendo este facto em consideração, a correcção célere das anemias ferriprivas é
de importância primordial.
Embora o diagnóstico etiológico e a resolução terapêutica da anemia ferripriva
habitualmente não se mostrem complexos, existem situações clínicas que colocam
difi culdades diagnósticas e terapêuticas tal como a resistência à terapêutica
com ferro oral. O não cumprimento da terapêutica ou a deficiente correcção de
eventuais erros alimentares são as causas mais frequentes. No entanto, é
importante ponderar outras etiologias relacionadas com o défice de absorção, a
hemorragia oculta assim como com erros de metabolismo do ferro.
Para serem formuladas as diversas hipóteses diagnósticas, é indispensável
conhecer o processo de metabolismo de ferro (2-4,18). O ferro é um elemento
essencial para processos vitais mas, paradoxalmente, altamente tóxico quando
presente em concentrações elevadas no organismo. Isto obriga a que haja um
equilíbrio perfeito no seu metabolismo: desde a absorção até à sua
incorporação na molécula de hemoglobina. Esta função é levada a cabo por
diversas proteínas cujo conhecimento emergiu na última década. De uma forma
geral, o ferro proveniente da dieta é absorvido no duodeno e para tal necessita
da integridade das vilosidades assim como dos diversos transportadores
envolvidos na absorção, que é favorecida por um ambiente ácido. O ferro é
incorporado no enterócito através de uma proteína transportadora comum a
outros metais divalentes (DMT-1) e exportado para a corrente sanguínea através
de uma outra proteína designada de ferroportina, também essencial na exportação
do ferro por parte da célula do sistema reticulo-endotelial (SER) no processo
de reciclagem do eritrócito senescente. Assim, o ferro utilizado na
eritropoiese provém essencialmente de duas fontes: da sua absorção da dieta e
da degradação das hemácias. Quando em circulação, liga-se à transferrina que o
torna insolúvel e impede a sua toxicidade. Não apresentando nenhum mecanismo de
excreção eficiente, a regulação do metabolismo de ferro fi ca essencialmente
dependente da hepcidina, uma molécula que constitui a mais recente descoberta
do processo do metabolismo do ferro e que impede que a ferroportina exerça a
sua acção (exportação de ferro dos enterócitos e do SRE) (2-4). Assim sendo,
numa situação em que ocorre défice de ferro, a síntese de hepcidina é frenada,
de forma a permitir a passagem do elemento do enterócito e do SRE para a
circulação sanguínea. Por seu lado, numa situação de excesso, a síntese de
hepcidina aumenta e o ferro fica sequestrado no enterócito e no SRE. O
comprometimento de qualquer um destes factores pode contribuir para uma anemia
ferripriva refractária (AFR) ao tratamento oral.
OBJECTIVOS
Os autores pretendem, através da descrição de seis casos clínicos de anemia
ferripriva refractária em idade pediátrica, discutir os diagnósticos
diferenciais de AFR bem como a pertinência dos exames auxiliares de diagnóstico
e demonstrar a necessidade de protocolar a sua investigação à luz dos
conhecimentos actuais.
MATERIAL E MÉTODOS
Foi efectuado um estudo retrospectivo dos processos clínicos de seis doentes
com anemia ferripriva refractária e avaliados diversos parâmetros como: índices
hematológicos, padrão dos parâmetros bioquímicos de ferro, prova terapêutica de
absorção, rastreio de patologia de absorção, resposta terapêutica ao ferro
endovenoso e/ou ferro de absorção não dependente da secreção gástrica e
investigação endoscópica e histológica do tracto digestivo.
RESULTADOS
Caso 1 - A.M.C.P., dois anos, sexo feminino, caucasiana. Referenciada à
consulta de Hematologia Pediátrica por anemia ferripriva resistente ao
tratamento com ferro oral. No último mês apresentara vómitos esporádicos e
irritabilidade e tinha uma evolução ponderal deficitária desde os sete meses. Ao
exame físico era de realçar a palidez da pele e mucosas e o aspecto emagrecido.
Após quatro meses de tratamento com ferro oral, apresentava uma anemia moderada
microcítica e hipocrómica com RDW aumentado e ausência de reticulocitose. O
ferro sérico, percentagem de saturação de transferrina e ferritina estavam
baixos (Quadro 1) e a prova de absorção de ferro oral revelou défice de
absorção (Figura 1). Do estudo efectuado, destacaram-se anticorpos anti-
transglutaminase IgA positivos ' 4600 U/ml (Normal: <30 U/ml). Efectuou
endoscopia digestiva alta (EDA) com biópsias da 2ª porção do duodeno que vieram
confirmar atrofia vilositária e corroborar o diagnóstico de doença celíaca.
Iniciou evicção do glúten da dieta e reposição de ferro, primeiro por via
endovenosa com posterior recurso à via oral. Observou-se uma recuperação
gradual dos valores hematológicos com a normalização dos parâmetros
bioquímicos de ferro (Quadro 1). Desde então, manteve dieta específica com
valores dos índices hematológicos e dos parâmetros bioquímicos de ferro
adequados à idade, sem recidiva da anemia.
Quadro_1
Valores hematológicos e parâmetros bioquímicos de ferro dos casos um, dois e
três (Patologia gastrointestinal de absorção).
Figura 1Prova de absorção oral indicativa de défice de absorção
Caso 2 - F.P., 12 anos, sexo feminino, caucasiana, sem antecedentes pessoais
ou familiares dignos de relevo. Aos 11 anos de idade, em análises de rotina,
foi detectada uma anemia ferripriva. Efectuou terapêutica com ferro oral
durante um ano sem resposta adequada, motivo pelo qual foi orientada para a
consulta de Hematologia Pediátrica. Tratava-se de uma adolescente pré-púbere,
assintomática e que consumia uma dieta equilibrada. O estudo efectuado
evidenciou uma anemia ligeira, microcítica e hipocrómica com RDW aumentado e
ausência de reticulocitose. Os parâmetros bioquímicos de ferro confirmaram a
ferropenia (Quadro_1) e a prova de absorção de ferro oral sugeria défice de
absorção. Neste contexto procedeu-se ao estudo analítico no qual se destacavam
os níveis elevados de gastrina sérica - 580 pg/ml (Normal: 13-115 pg/ml).
Embora os anticorpos anti-Helicobacter pylori não sejam o método ideal de
pesquisa de infecção por Helicobacter pylori, face à suspeita e ao valor
negativo do teste respiratório com ureia C-13, foram determinados e revelaram-
se francamente positivos (IgG - 1149 RU/ml e IgA - 8,2 INDEX, respectivamente).
Decidiu-se então realizar EDA que mostrou uma mucosa hiperemiada no corpo e no
fundo gástricos. A histologia evidenciou lesões de gastrite crónica com
atrofia glandular focal e metaplasia intestinal ligeira A pesquisa de
Helicobacter pylori (H. pylori) foi positiva . Efectuou terapêutica tripla
durante duas semanas com omeprazol, amoxicilina e claritromicina e iniciou
tratamento com sulfato ferroso de glicina oral (preparação cuja absorção é
independente da secreção gástrica) que cumpriu durante quatro meses com
normalização dos parâmetros hematológicos e bioquímicos de ferro (Quadro_1).
Repetiu o estudo endoscópico sete meses depois do primeiro notando-se uma
regressão da metaplasia intestinal. Não eram evidentes sinais de atrofia e a
pesquisa de H. pylori foi negativa. Não ocorreram recidivas num período de um
ano de seguimento.
Caso 3 - P.S.P.S, sexo feminino, seis anos de idade. Referenciada à consulta
por anemia microcítica e hipocrómica detectada em análises efectuadas no pré-
operatório de amigdalectomia. Os parâmetros bioquímicos de ferro indicavam
clara deficiência (Quadro_1). A história não revelava evidência de erros
alimentares ou de perdas hemáticas. Após oito meses de tratamento com ferro
oral não foi observada resposta. Realizou prova de absorção de ferro oral que
revelou défice de absorção. Os anticorpos anti-transglutaminase e a pesquisa de
infecção por H.pylori com teste respiratório foram negativos. Efectuou
posteriormente o estudo para exclusão de gastrite atrófi ca auto-imune (GAAI):
a pesquisa de anticorpos anti-célula parietal foi fortemente positiva (212,5
U/ml; Normal < 25 U/ml) e o doseamento de gastrina sérica foi elevado (535 pg/
ml; Normal < 115 pg/ml).
Realizou EDA com biópsias gástricas que demonstraram mucosa atrófica no corpo e
fundo gástrico. Este conjunto de resultados veio confirmar o diagnóstico de
GAAI. Foi medicada com sulfato ferroso de glicina com boa resposta (Quadro_1).
Catorze meses após normalização do hemograma verificou-se uma recidiva da
anemia ferripriva. Reiniciou sulfato ferroso de glicina durante quatro meses
com normalização dos valores.
Caso 4 - J.E.M.S, sexo masculino, oito anos de idade. Detectada anemia
ferripriva em análises de rotina no pré-operatório de adenoidectomia. Na altura
do diagnóstico apresentava um consumo excessivo de produtos lácteos. Iniciou
ferro oral e correcção dos erros alimentares. Um ano depois, por resposta não
satisfatória, foi referenciado à nossa consulta. Apresentava uma anemia
microcítica hipocrómica, com RDW aumentado e reticulocitose. Os parâmetros
bioquímicos de ferro eram sugestivos de ferropenia (Quadro 2). A pesquisa de
doença celíaca, infecção por H. pylori e GAAI foi negativa, assim como o exame
parasitológico e a pesquisa de sangue oculto nas fezes. A resposta à
terapêutica com ferro oral revelava-se sempre parcial e fugaz (Quadro 2). A
resposta ao tratamento com ferro endovenoso era adequada numa primeira fase
(reticulocitose e hemoglobinização normal dos reticulócitos), mas recidivava
sistematicamente após suspensão do tratamento. Este padrão de resposta levou à
suspeita de hemorragia oculta. A realização de EDA evidenciou hérnia do hiato e
esofagite péptica (grau IV). Iniciou tratamento com omeprazol e foi submetido a
fundoplicatura de Nissen laparoscópica. Reiniciou ferro oral com normalização
sustentada do quadro hematológico ao fim de três meses (Quadro 2).
Quadro 2 ' Valores Hematológicos e parâmetros bioquímicos de ferro do caso 4
(Hemorragia Gastrointestinal oculta).
Caso 5 - M.C.O.N., sexo feminino. Aos 11 meses de idade efectuou estudo
analítico por quadro de perda ponderal, anorexia e palidez. Foi detectada
anemia severa, microcítica, hipocrómica, com necessidade de suporte
transfusional. Apresentava nessa altura parâmetros de ferro indicativos de
défice (Quadro 3). O tratamento prolongado com ferro oral não demonstrou nenhum
benefício em termos de índices hematológicos. Aos dois anos de idade foi
enviada à nossa consulta para estudo. A prova terapêutica de absorção de ferro
oral indicava défice de absorção. O estudo protocolado de patologia de má
absorção revelou-se negativo. Os parâmetros de ferro mostravam-se de alguma
maneira contraditórios na medida em que a saturação de transferrina e o ferro
sérico eram sistematicamente baixos em contraste com a ferritina sérica que se
revelava sempre normal/limiar. A terapêutica com ferro endovenoso acentuava
esta discrepância aumentando a ferritina sérica para valores preocupantes
enquanto os outros parâmetros sofriam apenas discreta melhoria (Quadro 3). De
referir que esta criança tinha uma prima em segundo grau seguida na nossa
consulta por ser portadora de anemia de características semelhantes. Este
contexto sugeria uma patologia de carácter hereditário por erro do metabolismo
do ferro que, para além de ser mal absorvido, não seguia o seu trajecto normal
quando administrado por via endovenosa. O seu esclarecimento definitivo teve que
esperar pelo ano de 2008, altura em que foi descrita e caracterizada
molecularmente uma doença denominada de IRIDA (Iron-Refractory Iron Deficiency
Anemia)(9). As duas primas vieram a revelar-se homozigóticas para uma mutação
no exão 15 do gene TMPRSS6 da protease transmembranar matriptase-2. Esta
proteína uma vez deficitária impede a contra-regulação da produção de hepcidina,
com consequente excesso da sua secreção(9). Actualmente com oito anos, a
criança apresenta desenvolvimento normal, tolera razoavelmente bem a anemia e é
medicada, de forma intermitente, com pequenas doses de ferro endovenoso.
Quadro_3
Valores Hematológicos e parâmetros bioquímicos de ferro dos casos 5 e 6
(Excesso de produção de Hepcidina)
Caso 6 - M.I.M, sexo feminino, 17 anos de idade, com diagnóstico de
Glicogenose tipo 1A desde os quatro anos. Seguida em consulta de Nefrologia
por nefromegalia e proteinúria e de Hepatologia por aparecimento de adenomas
hepáticos aos sete anos. Foi referenciada à nossa consulta aos 14 anos por
anemia de agravamento progressivo. Apresentava uma anemia microcítica e
hipocrómica, com parâmetros bioquímicos de ferro indicativos de défice em
contradição com o valor da ferritina que era normal (Quadro_3). Iniciou
tratamento com ferro oral e face à ausência de resposta efectuou prova de
absorção oral de ferro que foi indicativa de défice de absorção. Com a
administração de ferro endovenoso verificava-se, tal como no caso 5, um aumento
desproporcional dos valores de ferritina em contradição com os restantes
parâmetros bioquímicos de ferro e parâmetros hematológicos (Quadro_3). Uma
consulta da literatura associava os adenomas hepáticos característicos da
Glicogenose tipo 1A a uma secreção inapropriada de hepcidina(17). Esta hipótese
justificava a refractoriedade da terapêutica com ferro oral assim como com
ferro endovenoso. O aumento do tamanho e do número dos adenomas ao longo dos
anos associado ao seu potencial de malignização e possível papel no
desenvolvimento de anemia conduziram à decisão de efectuar um transplante
hepático. Três meses após transplante verificou-se uma normalização sustentada
do hemograma bem como dos parâmetros bioquímicos de ferro (Quadro_3).
DISCUSSÃO E CONCLUSÕES
Os seis casos descritos documentam três mecanismos fisiopatológicos cuja
investigação é fundamental na presença de uma AFR.
Todos apresentam, à partida, uma anemia microcítica, hipocrómica com RDW
aumentado.
Relativamente aos parâmetros bioquímicos de ferro, os casos 5 e 6 podem
diferenciar-se logo à partida dos restantes. Efectivamente, nestes dois casos,
estes parâmetros revelam-se contraditórios, ou seja, a saturação da
transferrina é muito baixa (sobretudo à custa do ferro sérico baixo com
capacidade total de fixação ao ferro normal) em contraste com a ferritina sérica
que é normal. Nestes dois casos, um excesso de hepcidina com sequestro do ferro
no enterócito e SRE justifica estes valores. Os restantes casos (1 a 4)
apresentam parâmetros bioquímicos de ferro típicos de uma situação deficitária
(saturação baixa à custa de ferro sérico baixo e capacidade total de fixação ao
ferro alta e ferritina baixa). É neste sentido que uma avaliação crítica dos
parâmetros de ferro se pode revelar importante na orientação diagnóstica.
Relativamente ao padrão de resposta ao ferro oral, o caso 4 (hemorragia oculta)
difere dos restantes na medida em que se observa uma reticulocitose inicial com
incremento da hemoglobinização dos reticulócitos. Esta hemoglobinização nunca
é, contudo, satisfatória e o incremento no valor da hemoglobina é frustre com
recidiva da anemia ainda durante o tratamento, consequente à perda hemorrágica
coexistente. Nos restantes casos, a resposta ao ferro oral convencional é
mínima ou nula, seja qual for o parâmetro de avaliação.
A investigação da anemia ferripriva na criança é forçosamente distinta daquela
que está indicada em outros grupos etários. Num homem adulto ou numa mulher
pós-menopausa a avaliação endoscópica do tracto gastrointestinal é obrigatória
e de primeira linha. Na criança a prioridade deve ser dada à investigação de
aporte insuficiente. Face à não evidência desta etiologia, a atitude seguinte
será a de investigar patologia gastrointestinal de absorção(5-8,10-14,16). A
prova de absorção oral, embora com algumas limitações, pode ser útil face a
esta suspeita. Esta etiologia de AFR vem emergindo com importância crescente
na última década e é passível de ser estudada por métodos não invasivos:
pesquisa de doença celíaca, infecção por H. pylori e doseamento de anticorpos
anti-célula parietal e de gastrina sérica para exclusão de GAAI. A pesquisa de
Doença Celíaca faz já parte da rotina da investigação de AFR em pediatria. Em
termos fisiopatológicos, o comprometimento da absorção de ferro deve-se
essencialmente à atrofia da mucosa e desaparecimento das criptas, com
diminuição da área de absorção. São propostos como mecanismos coadjuvantes a
ocorrência de hemorragia oculta e, mais recentemente, postula-se que o aumento
da hepcidina associado à inflamação contribui para a deficiente absorção do metal
(6,10,12,13). Pelo contrário, a pesquisa de infecção por H.pylori e de GAAI não
integra ainda a rotina da investigação de AFR em idade pediátrica. Trata-se de
duas situações susceptíveis de provocar gastrite atrófica com consequente
hipocloridria que, por sua vez, pode comprometer a absorção de ferro(5-
10,11,14,16). O doseamento de gastrina sérica constitui um bom indicador
indirecto de hipocloridria e pode revelar-se importante na orientação
diagnóstica. De referir que a GAAI foi até há pouco tempo considerada uma
doença do idoso e associada apenas ao desenvolvimento de anemia perniciosa.
Estudos extremamente bem conduzidos vieram revelar que esta patologia pode
atingir a faixa etária pediátrica e que dezenas de anos antes do
desenvolvimento de anemia perniciosa se pode instalar uma AFR por lesão das
células parietais gástricas(6,10,11,14). A resposta à terapêutica com uma
apresentação de ferro de absorção não dependente de ambiente ácido (sulfato
ferroso de glicina) pode reforçar a evidência de uma patologia de absorção
associada a acloridria/hipocloridria e pode ser uma arma terapêutica de ouro
nos casos em que a cura da doença de base não é possível, como é o caso de
GAAI. Nesta situação, como ilustra o caso 3, a recidiva da anemia é quase
inevitável na ausência de tratamento adequado(15). Nos casos de infecção por
H.pylori, o teste respiratório com Ureia C-13 é considerado de eleição para o
diagnóstico embora possa ser de difícil realização em crianças mais jovens, nos
quais se pode optar pela pesquisa do antigéneo nas fezes. Nesta criança as
serologias foram orientadoras embora não devam ser a investigação de primeira
linha. No caso descrito, a erradicação da bactéria levou à resolução do quadro,
sem recidiva.
É importante referir que os casos 5 e 6 também revelaram compromisso na
absorção de ferro. Neste contexto, e tendo em conta que o mecanismo não envolve
a hipocloridria mas sim o impedimento da absorção por excesso de hepcidina, o
sulfato ferroso de glicina revela-se obviamente ineficaz. O que individualiza
de forma inequívoca os casos 5 e 6 é o padrão de resposta ao ferro endovenoso
que sugere fortemente um distúrbio do metabolismo que leva a que o ferro
administrado sob via endovenosa não siga um percurso expectável na medida em
que não é disponibilizado para eritropoiese, pelo facto de ficar sequestrado no
SRE. O aumento desproporcionado da ferritina é disso um claro indicador. O
incremento anómalo da produção de hepcidina, base fisiopatológica destas duas
situações, resulta de erro hereditário no caso 5 e de uma produção tumoral
autónoma no caso 6(17). Este aumento de hepcidina também contribui para a
denominada anemia da doença crónica na medida em que é também uma proteína cuja
secreção aumenta em resposta à IL-6 em condições inflamatórias.
Conclui-se assim ser fundamental no estudo destes doentes a elaboração de uma
metodologia de investigação que tenha em conta elementos de ordem
epidemiológica, semiológica e analítica assim como a utilização criteriosa de
exames auxiliares de diagnóstico invasivos.