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EuPTCVHe0872-81782007000200004

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National varietyEu
Year2007
SourceScielo

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INVAGINAÇÃO RETRÓGRADA JEJUNOGÁSTRICA - CASO CLÍNICO

CASO CLÍNICO

Doente do sexo feminino, de 81 anos de idade, admitida no Serviço de Urgência por hematemeses. Apresentava dor epigástrica intensa, tipo cólica, com 24 horas de evolução, associada a hematemeses.

Como patologia associada apresentava hipertensão arterial medicamente controlada, doença de Alzheimer e diabetes mellitus tipo 2 tratada com antidiabéticos orais.

A doente tinha como antecedentes cirúrgicos uma gastrectomia tipo Billroth II por úlcera gástrica efectuada 20 anos.

O exame objectivo mostrava palidez cutânea, abdómen ligeiramente distendido, doloroso à palpação profunda dos quadrantes superiores, com massa epigástrica palpável. A tensão arterial era de 124/64 mm Hg e a frequência cardíaca de 78 bat./min Analiticamente tinha uma hemoglobina de 11 g/dl, hematócrito de 34.1% e leucocitose de 15 0003/µL, estando os restantes parâmetros dentro dos valores normais de referência.

Realizou-se endoscopia digestiva alta, que mostrou volumosa invaginação de ansa intestinal, com aspecto congestivo e com lesões petequiais na mucosa. A invaginação era procidente através da gastrojejunostomia, ocupando toda a cavidade gástrica, tendo a mucosa gástrica aspecto normal (Figuras 1, 2).

TRATAMENTO Realizou-se uma laparotomia exploradora de urgência que confirmou a existência de uma invaginação da ansa intestinal eferente que preenchia toda a cavidade gástrica (Figura 3). Com tracção suave da ansa jejunal, foi possível efectuar a redução da invaginação de 50 cm de ansa intestinal, edematosa, congestiva e com aspecto viável (Figura 4), pelo que não foi necessário realizar uma ressecção intestinal. A cerca de 30 cm de distância da gastrojejunostomia, efectuou-se uma pexia da ansa eferente, à parede abdominal, com pontos separados de fio absorvível 3/0 (Vicryl®).

O pós-operatório decorreu sem incidentes, tendo a doente tido alta ao dia de internamento.

Após um mês a doente encontra-se assintomática e o trânsito gastro-intestinal não mostrou alterações (Figura 5), tendo evidenciado boa permeabilidade da anastomose, com presença de movimentos peristálticos normais na ansa eferente.

DISCUSSÃO

O primeiro caso de invaginação retrógrada jejunogástrica foi descrito por Bozzi em 1914 (1-6). É uma situação muito rara registando-se menos de 200 casos na literatura anglo-saxófona (1-3) e, apenas, uma publicação na literatura nacional (4).

Admite-se que as invaginações jejuno-gástricas possam ocorrer em 0,1% de todas as gastrectomias (2,5) variando o hiato temporal entre a cirurgia e o seu aparecimento entre 6 dias e 20 anos (1,3).

As invaginações jejuno-gástricas podem classificar-se em três tipos: I - invaginação da ansa aferente; II invaginação da ansa eferente; III - combinação do tipo I e II (1-3,5,8,9-11).

A invaginação do tipo II que traduz uma invaginação retrógrada jejuno-gástrica, isto é, uma invaginação da ansa intestinal eferente através da gastro-jejunostomia é a mais frequente representando 80% dos casos (2,3).

Na literatura encontram-se descritos casos, após gastrectomia com gastrojejunostomia tipo Polya, Hoffmeister ou Y de Roux, após gastro-jejunostomia sem ressecção gástrica e, inclusivamente, em doentes com PEG (gastrostomia endoscópica percutânea) (1,3,5,6-10).

A etiologia desta entidade é obscura admitindo-se que possa envolver causas funcionais e mecânicas, nomeadamente, hiperacidez gástrica, atonia do estômago, alterações da motilidade, peristalse retrógrada, pressão intra-abdominal elevada, ansa aferente muito longa, aderências após laparotomia, tubos de gastrostomia e erros técnicos (1,2,5-7).

As manifestações clínicas são variáveis dependendo de ser uma invaginação aguda ou crónica (1-3,6,10,11).

As situações agudas caracterizam-se por dor epigástrica tipo cólica, massa epigástrica palpável (50%), vómitos biliares seguidos de hematemeses. Alguns autores referem uma tríade diagnóstica - vómitos, dor epigástrica e massa epigástrica - em doentes com cirurgia gástrica prévia (1-3,5,9,11). São situações graves com mortalidade elevada e que impõem um diagnóstico rápido e tratamento urgente (1,2).

As situações crónicas têm clínica mais fruste, intermitente, de alívio rápido, sendo o diagnóstico difícil.

O meio complementar de diagnóstico de eleição é a endoscopia digestiva alta, realizada por um gastroenterologista experiente, que habitualmente, permite identificar a invaginação. Nalguns casos pode justificar-se o recurso à tomografia computorizada do abdómen (13,12).

Em situações agudas, a invaginação de uma ansa intestinal por um pequeno estoma provoca isquémia e rápida necrose da ansa invaginada, pelo que o tratamento cirúrgico deve ser urgente, não existindo consenso quanto à melhor opção técnica, ficando esta ao critério do cirurgião e à melhor adequação ao doente em questão (1,5).

São várias as técnicas propostas, desde a simples redução da ansa invaginada, plicatura jejuno-jejunal da ansa eferente, fixação da ansa jejunal ou do mesentério aos tecidos envolventes, ressecção intestinal e revisão da anastomose gastrojejunal (1-3,5,6,11).

Da literatura não é possível retirar qualquer ilação quanto ao modo de evitar esta complicação. Na realidade não existe evidência que uma anastomose tipo Polya predisponha mais que uma tipo Hoffmeister ou que o isoperistaltismo seja melhor que o anti-peristaltismo (6).

No caso clínico apresentado a opção de tratamento foi a redução da invaginação e plicatura da ansa eferente à parede abdominal. Não tendo sido necessário uma ressecção intestinal que a ansa invaginada apresenta- va um aspecto viável. Muito embora este tipo de opção cirúrgica não esteja descrito a doente teve uma evolução favorável.

CONCLUSÃO A suspeição clínica deve conduzir ao diagnóstico precoce destas situações o que permite uma atitude terapêutica em tempo útil, que evitará a gangrena da ansa invaginada e consequentemente a redução da morbi-mortalidade.


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