INVAGINAÇÃO JEJUNO-GÁSTRICA: RELATO DE RARA COMPLICAÇÃO EM
PÓS-OPERATÓRIO DE RESSECÇÃO GÁSTRICA
INTRODUÇÃO
Os primeiros relatos de uma intussuscepção jejunogástrica como complicação de uma gastroenteroanastomose foram feitos por Bozzi em 1974 e Steber em 1971,
três décadas após a primeira antrectomia realizada em
1881 por Wolfer (1). Hovelius atribui a Von Brunn a
descrição dos achados radiológicos que caracterizam
esta patologia. Embora sejam inexatos, a literatura
mundial tem cerca de 200 casos referidos (2).
As principais manifestações clínicas características da
invaginação jejuno-gástrica são: dor epigástrica, vômitos incoercíveis e a hemorragia digestiva alta, encontradas em paciente portador de cirurgia de derivação
gástrica recente ou de longa data (3). O diagnóstico de
certeza é firmado por endoscopia digestiva alta, exames
contrastados ou por achado no momento da laparotomia.
Objetivou-se com este relato de intussuscepção jejunogástrica, aduzir novos dados sobre o assunto para que o
médico esteja atento ao eventual aparecimento desta
patologia, sobretudo no diagnóstico diferencial do
abdome agudo.
CASO CLÍNICO
A.L.S., 60 anos, masculino, admitido em 10/07/2006
com epigastralgia e vômitos sanguinolentos havia um
dia. Referia dor súbita, intensa e contínua no abdome
superior. Relatava gastrectomia subtotal com reconstrução a Billroth II (BII) havia 26 anos, por úlcera duodenal. Apresentava abdome doloroso à palpação de
epigástrio, sem irritação peritoneal.
As radiografias de tórax e abdome foram inespecíficas.
A ultrassonografia abdominal evidenciou estômago distendido, com resíduos, alças intestinais com grande
quantidade de líquido (formando uma massa em flanco
esquerdo) e mínima quantidade de líquido livre. A endoscopia sugeriu alça intestinal localizada em cavidade
gástrica, mucosa hiperemiada e friável com pontos de
sangramento e grande volume de sangue no estômago
(Figura 1).
Realizada laparotomia exploradora, cujo inventário acusou cirurgia prévia (antrectomia com reconstrução a BII,
pré-cólica) e intussuscepção de alça de jejuno para o
interior gástrico (Figura 2). Desfeita invaginação de
aproximadamente 25 cm com dificuldade (Figura 3).
Realizada enterectomia do segmento necrótico (Figura
4) e enteroanastomose primária (Figura 5).
O pós-operatório foi sem intercorrências. O anátomopatológico da peça cirúrgica mostrou infarto isquêmico
transmural de segmento jejunal com infecção bacteriana
secundária. Paciente manteve-se assintomático no 60º
pós-operatório, em seguimento ambulatorial.
DISCUSSÃO
A invaginação jejuno-gástrica é complicação rara em
ressecções gástricas, descrita em qualquer período pósoperatório (relatos de 5 dias a 35 anos)(3,4,5). A posição
do segmento de alça jejunal (pré ou retro-cólico) parece
não ter influência na gênese da invaginação.
As principais causas relacionadas são: espasmo jejunal e
antiperistalse pela acidez gástrica, largo calibre da boca
anastomótica e pressão intra-abdominal aumentada.
Anatomicamente, pode ser de alça aferente (16%), de
alça eferente (74%) e de ambas as alças (10%) (7,8,9).
A forma crônica manifesta-se como dor abdominal pósprandial, aliviada por vômitos e com resolução espontânea. A forma aguda corresponde à epigastralgia súbita,
em cólica, progressiva e vômitos sanguinolentos.
A presença de massa abdominal à esquerda ocorre em
50% dos casos.
O diagnóstico é firmado pelo exame contrastado do
estômago, que demonstra falha de enchimento gástrico
(aspecto em "casca de cebola")(11) ou com endoscopia
(6), que mostra o coto gástrico ocupado por alça jejunal
com ou sem necrose.
Na forma aguda, o tratamento cirúrgico é mandatório,
definido por remoção da intussuscepção, quando viável,
ressecção do segmento comprometido ou degastrectomia com reconstrução em Y de Roux (7).
O prognóstico favorável depende do diagnóstico precoce. O índice de mortalidade chega a 50% após 48
horas de evolução (1,3). Daí a importância desta enti-
dade e de seu diagnóstico precoce, uma vez que, embora rara, pode ser fatal.