Colonografia por Tomografia Computorizada
Colonografia por Tomografia Computorizada
Posição da Sociedade Portuguesa de Gastrenterologia
INTRODUÇÃO
A colonografia por tomografia computorizada (CTC) - também conhecida por
colonoscopia virtual - é uma técnica de visualização do cólon que envolve a
obtenção de imagens bidimensionais de alta resolução através de aparelhos de
tomografia computorizada helicoidal multi-corte. Posteriormente é efectuado o
pós processamento por software específico que possibilita uma reconstrução
tridimensional e a obtenção de uma imagem endoluminal do cólon semelhante à que
se obtém com a colonoscopia óptica convencional.
Durante a última década, a CTC tem sido avaliada como método de estudo do cólon
para a detecção de neoplasia colorectal. Múltiplos avanços tecnológicos e
clínicos têm permitido a sua evolução gradual desde uma técnica de investigação
até se tornar uma opção viável para o rastreio do cancro colo-rectal.
Uma das vantagens apontadas para a CTC é a de permitir uma avaliação
diagnóstica minimamente invasiva, com provável aumento das taxas de adesão aos
programas de rastreio populacional. Além disso, a CTC poderia igualmente
permitir desenvolver uma estratégia de vigilância por subgrupos de pólipos com
a consequente alocação dos recursos da colonoscopia óptica à vertente
terapêutica, nomeadamente à remoção de adenomas de maiores dimensões.
Contudo, persiste alguma polémica entre radiologistas, gastrenterologistas e
outros clínicos quanto ao papel que a CTC deverá ocupar na prática clínica. Na
realidade, se por um lado existe uma enorme expectativa em relação a uma
técnica de imagem não invasiva que poderá detectar lesões colo-rectais
clinicamente significativas, vários estudos têm demonstrado uma acuidade
diagnóstica diminuída quando a CTC é realizada por especialistas sem treino e
experiência ou quando a tecnologia e metodologias utilizadas não são as mais
adequadas. Além disso, os potenciais efeitos a longo prazo da radiação
ionizante emitida durante a CTC, nomeadamente se esta for utilizada como exame
de rastreio, são também motivo de preocupação.
De acordo com estes pressupostos, a Sociedade Portuguesa de Gastrenterologia
decidiu tomar uma posição sobre o papel da CTC na prática clínica actual,
nomeadamente no rastreio do cancro colo-rectal.
INDICAÇÕES ACTUAIS
Actualmente existem várias situações clínicas em que a CTC pode desempenhar um
papel importante. A colonoscopia óptica incompleta por falta de colaboração ou
intolerância do doente, tortuosidade do cólon, aderências pós-cirúrgicas e
hérnias ocorrem em aproximadamente 2 a 5% dos casos. Também a avaliação do
cólon proximal a um carcinoma colo-rectal obstrutivo é recomendada devido ao
facto de 5 a 8% dos doentes apresentarem uma lesão neoplásica síncrona. Nestas
situações, bem como noutros casos de estenose, nomeadamente devido a
radioterapia ou colite isquémica, a CTC tem demonstrado permitir uma
visualização adequada e ser superior ao clister opaco com duplo contraste na
detecção de pólipos e carcinomas no cólon restante.
Uma área em que a CTC poderá ser útil é no rastreio do cancro colo-rectal em
pessoas com contra-indicação relativa para a colonoscopia convencional (diátese
hemorrágica, alto risco anestésico) ou que recusam outros métodos de rastreio.
Na realidade, por várias razões (medo, ansiedade, embaraço) muitas pessoas
apresentam alguma relutância em efectuar o rastreio por colonoscopia. O
conceito de um exame relativamente indolor que permita visualizar o cólon e
detectar lesões significativas é apelativo para uma parte significativa da
população. No entanto, nem sempre os doentes são informados sobre a vertente
terapêutica da colonoscopia. Um doente pode preferir a CTC em relação à
colonoscopia, mas se souber que se algum pólipo for detectado este pode ser
removido durante o procedimento, isso pode aumentar a sua aceitação em relação
ao exame.
RASTREIO DO CANCRO COLO-RECTAL
Múltiplos estudos têm avaliado a acuidade da CTC na identificação de pólipos e
cancro colo-rectal. As descrições iniciais envolviam sobretudo pequenos grupos
de doentes sintomáticos e com risco aumentado de cancro colo-rectal e a
utilização de aparelhos com único detector. Nos últimos anos, vários estudos
multicêntricos prospectivos, com um elevado número de doentes e utilizando
tecnologia mais avançada, têm sido publicados. Um dos problemas apontados à CTC
como método alternativo de rastreio do cancro colo-rectal tem sido a ampla
variação de sensibilidades que têm sido descritas nestes estudos
multicêntricos. Algumas das diferenças podem ser explicadas pela selecção do
perfil de corte, estação de trabalho e técnica de interpretação. O treino e a
experiência do especialista é outro dos factores que pode influenciar a
acuidade diagnóstica.
O diâmetro dos pólipos é um factor crítico para a CTC poder ser considerada um
procedimento custo-eficaz e ser usada como exame de rastreio do cancro colo-
rectal. O facto de não identificar por rotina pólipos diminutos (de diâmetro
igual ou inferior a 5 mm) é minimizado pela reduzida probabilidade destes
conterem lesões neoplásicas avançadas. A CTC poderia então funcionar como um
filtro selectivo e evitar a realização de colonoscopias que seriam
desnecessárias. Na realidade, para a CTC poder ser considerada como um método
de rastreio custo-eficaz, as lesões diminutas teriam que ser ignoradas ou, se
detectadas, seguidas com um intervalo de vigilância apropriado. Contudo, não
existem estudos controlados adequados a longo prazo que confirmem ser seguro
não remover pequenos pólipos do cólon e as recomendações actuais são de
referenciar para colonoscopia óptica todos os doentes em que são diagnosticados
pólipos, independentemente do seu tamanho. De igual modo, não existem ainda
estudos que avaliem a eficácia dessa estratégia na redução da morbilidade e da
mortalidade por cancro colo-rectal. Apesar disso, em Março de 2008, a American
Câncer Society, juntamente com a US Multi-Society Task Force on Colorectal
Cancer e o American College of Radiology, considerou haver evidência suficiente
para incluir a CTC como teste de rastreio em indivíduos de risco médio a partir
dos 50 anos de idade, com uma periodicidade de 5 anos, e a indicação para
referenciar para colonoscopia todos os doentes com um ou mais pólipos com ≥ 6
mm de diâmetro.
RECOMENDAÇÕES
A CTC constitui actualmente o melhor método de imagem alternativo à
colonoscopia óptica para a detecção de pólipos colo-rectais.
A impossibilidade de realização de colonoscopia óptica completa devido a
contra-indicação médica ou anestésica, dificuldade técnica ou lesão obstrutiva,
constituem actualmente as principais indicações para a realização de CTC.
A CTC pode também constituir um método alternativo de rastreio de cancro
colo-rectal em doentes com contra-indicação relativa para a colonoscopia óptica
ou que recusam outros métodos de rastreio. Nestes casos, deve ser ministrada ao
doente informação adequada sobre as vantagens e desvantagens de cada técnica,
nomeadamente a possibilidade de efectuar polipectomia durante a colonoscopia.
Não existem estudos que avaliem a eficácia da CTC como método de rastreio do
cancro colo-rectal, devendo por isso a sua utilização com essa indicação ser
considerada investigacional.
Devido aos potenciais efeitos a longo prazo da radiação ionizante emitida
durante a CTC, nomeadamente se esta for utilizada como exame de rastreio, deve
ser preconizado o uso de protocolos mais eficientes com parâmetros de baixa
dose.
A eficácia do procedimento está dependente da utilização do estado da arte em
termos de equipamento técnico de aquisição e pós processamento de imagem.
A leitura e interpretação dos dados deve ser feita por radiologistas e
gastrenterologistas treinados e com experiência. A Sociedade Portuguesa da
Gastrenterologia compromete-se a trabalhar juntamente com as outras Sociedades
e Colégio da Especialidade de modo a se definirem os parâmetros de treino e o
curriculum mínimos necessários, bem como a patrocinar e desenvolver acções de
formação específicas para que os especialistas actuais e os que ainda se
encontram em formação possam vir a interpretar CTC. ≤
Dr. Rui A. Silva
Gastrenterologista do Serviço de Gastrenterologia do Instituto Português de
Oncologia do Porto Francisco Gentil, EPE.
Email: rsgastro@sapo.pt
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