Avaliação muscular isocinética do quadríceps em indivíduos com doença pulmonar
obstrutiva crónica
Introdução
A doença pulmonar obstrutiva crónica (DPOC) é uma enfermidade respiratória
prevenível e tratável, com efeitos extrapulmonares significativos que podem
contribuir para a gravidade dos doentes1,2. A intolerância ao exercicio é
manifestação comum na DPOC, em função do distúrbio respiratório e da disfunção
muscular esquelética periférica3-5. Embora o problema essencial na obstrução
crónica ao fluxo aéreo seja a doença pulmonar, a debilidade muscular tem
impacto significativo na qualidade de vida desses indivíduos6-8, relacionando-
se com o número de exacerbações da doença9, o aumento dos gastos com
internamentos10 e a maior mortalidade11.
Um factor importante envolvido na limitação física é a disfunção da musculatura
periférica, caracterizada por anormalidades estruturais (diminuição da massa
muscular e relação capilaridade/mitocôndria, mudanças no tipo e tamanho das
fibras musculares e redução das enzimas oxidativas)12, funcionais (redução da
força e da resistência musculares)13 e da bioenergética muscular (redução do
consumo de oxigénio, aumento do nível de lactato e diminuição do pH)5. Os
músculos esqueléticos periféricos sofrem alterações por uma combinação de
factores, incluindo: hipercapnia, stressoxidativo, uso prolongado de
corticosteróides, hipoxemia, depleção nutricional, inflamação sistémica e
atrofia muscular por desuso14-16. Além disso, a DPOC é mais prevalente em
idosos1,2, fazendo com que as alterações associadas ao envelhecimento, como
atrofia do tecido muscular - sarcopenia ' e perda de fibras musculares17, se
somem à disfunção muscular esquelética causada pela doença.
A análise da força muscular é de extrema importância para compreender a
capacidade funcional18,19. Portanto, para determinar as habilidades e
potenciais limitações de um indivíduo, é essencial uma avaliação precisa do
desempenho muscular. Neste sentido, o dinamómetro isocinético tem sido muito
utilizado em pesquisas e na prática clínica para avaliar indivíduos com DPOC20-
29. A sua principal vantagem em relação às outras mensurações está na
manutenção de uma velocidade angular constante ao longo da amplitude de
movimento, o que possibilita maior precisão e reprodutibilidade da medida30-32.
No entanto, inúmeros fatores precisam ser controlados durante um protocolo de
teste isocinético para evitar resultados inválidos, entre eles a forma de
execução do teste, a escolha das variáveis medidas, o adequado posicionamento e
estabilização, além do número de séries e do intervalo de repouso entre elas31.
As principais variáveis analisadas num teste isocinético são o pico de torque e
o trabalho total; o primeiro é um excelente indicador da máxima força produzida
por um indivíduo, enquanto o segundo revela a capacidade de um indivíduo
produzir força ao longo da amplitude de movimento total31. O índice de fadiga,
quando positivo, traduz a incapacidade em manter o trabalho ao longo de duas ou
mais séries, e reflete queda no desempenho muscular por surgimento de fadiga32.
Para avaliação da força muscular, não há necessidade de mais de cinco
repetições31. Se for realizada mais de uma série de medidas, a manutenção da
força depende da duração do intervalo de recuperação entre as séries33.
A Associação Americana de Fisiologistas do Exercício (ASEF) recomenda um
intervalo de 30 segundos num teste de força muscular com diferentes
velocidades31. Willardson33, em artigo de revisão, sugere que para grandes
músculos, como o quadríceps, haja um repouso de 60 segundos entre séries.
Parcell e colaboradores34 relataram que, nos estudos que utilizaram testes
isocinéticos em indivíduos saúdaveis, esse intervalo variou de 15 segundos a 5
minutos, sendo 60 segundos o tempo ideal. Bottaro e colaboradores18 verificaram
que, em idosos saudáveis, 30 segundos de repouso foi suficiente para permitir a
recuperação entre duas séries.
Na DPOC, não há consenso quanto à forma de realizar a avaliação isocinética do
quadríceps: Dal Corso e colaboradores20 mediram a força por meio de teste com
duas séries de cinco repetições, separadas por dois minutos de repouso; já
Malaguti e colaboradores21 realizaram o mesmo protocolo de duas séries de cinco
repetições, mas não descreveram o intervalo de recuperação entre elas.
Bourjeily-Habr e colaboradores22 e van Wetering e colaboradores23 avaliaram
cinco movimentos de extensão da coxa, sem determinar com exactidão o intervalo
entre as repetições, descrito apenas como um período adequado de repouso entre
os esforços.
Neder e colaboradores24 utilizaram no seu estudo três repetições, com tempo de
recuperação de um a três minutos entre elas, a mesma metodologia descrita por
Borghi-Silva e colaboradores25. O protocolo utilizado por Gosker e
colaboradores26 e Franssen e colaboradores27,28 para medir força muscular
consistiu em 15 contracções máximas sequenciais, considerando o máximo pico de
torque atingido. E ainda Janaudis-Ferreira e colaboradores29 realizaram um
teste com quatro repetições, sem descanso entre elas.
O quadríceps de indivíduos com DPOC é caracterizado, além da fraqueza
muscular5,12,35, por fatigabilidade prematura35,36, devido à redução da
proporção de fibras do tipo I e de enzimas oxidativas37-39, o que pode levar à
necessidade de mais de uma série de medidas e de maior intervalo de recuperação
entre as séries para detectar o máximo pico de torque e trabalho total.
Diferentes métodos de medir a força muscular podem levar a resultados díspares,
dificultando a compreensão e a comparação entre os estudos. Diante do exposto,
o objectivo deste trabalho foi analisar o efeito de duas séries e três
diferentes intervalos de repouso na mensuração do pico de torque e trabalho
total do quadríceps, a fim de identificar o protocolo adequado para realização
do teste isocinético de força muscular em doentes com doença respiratória
crónica.
Material e métodos
Amostra
Foi utilizada amostra de conveniência, composta por indivíduos com DPOC
atendidos no serviço de Pneumologia do Hospital Universitário de Brasília. Este
estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Faculdade de Ciências
Médicas da Universidade de Brasília (registro 083/2008). Antes de iniciar o
teste, os indivíduos assinaram um termo de consentimento livre e esclarecido,
que explicava objectivos, procedimentos, possíveis riscos e benefícios do
estudo.
Os critérios de inclusão foram: (i) indivíduos com diagnóstico clínico de DPOC
com limitação ao fluxo aéreo expiratório grave ou muito grave, de acordo com a
classificação estabelecida pela American Thoracic Society 2; (ii) cognitivo
preservado para compreensão das instruções. Foram excluídos os indivíduos: (i)
com alterações musculoesqueléticas ou outras enfermidades que impossibilitassem
a realização do teste; (ii) que fizeram uso de corticosteróide oral ou tiveram
exacerbação da doença nas últimas três semanas; (iii) com doenças cardíacas ou
cerebrovasculares associadas; e (iv) submetidos a transplante pulmonar ou
portadores de doença renal dialítica.
Procedimentos
Antes de realizar os testes, os indivíduos foram submetidos a avaliação médica
e realizaram medidas antropométricas, espirometria e gasometria arterial,
conforme rotina do Serviço de Pneumologia do Hospital Universitário de
Brasília.
Para avaliar o efeito de duas séries e três diferentes intervalos de
recuperação na medida do pico de torque de extensão de joelho, os indivíduos
realizaram três testes isocinéticos à velocidade angular de 60°.s-1, no
Laboratório de Fisiologia do Exercício da Faculdade de Educação Física da
Universidade de Brasília. Cada teste consistiu em duas séries de cinco
repetições de contracção isocinética máxima do quadríceps femoral, com
intervalos de 30, 60 ou 120 segundos entre as séries. Entre os testes, houve
descanso mínimo de 30 minutos. A ordem dos testes foi definida aleatoriamente.
Os indivíduos foram instruídos a não realizar exercícios físicos extenuantes
nem fazer uso de bebidas alcoólicas nas 48 horas anteriores à realização do
teste, de acordo com as recomendações para realização de avaliação
isocinética18,31.
Aquecimento e familiarização
Como aquecimento, os indivíduos fizeram uma caminhada leve de cinco minutos em
corredor plano40. Com o intuito de se familiarizarem com o aparelho e minimizar
o efeito de aprendizagem31,41, realizaram uma série de dez repetições à
velocidade angular de 300°.s-1, seguida por uma série de duas repetições à
velocidade angular de 60°.s-1 (velocidade real do teste).
Avaliação muscular isocinética do quadricíceps
O pico de torque isocinético foi mensurado por meio do Biodex System 3
isokinetic dynamometer (Biodex Medical Systems Inc., Shirley, NY, 2002). Os
indivíduos sentaram-se numa cadeira, com o eixo de rotação do braço do
dinamómetro orientado com o eixo de rotação do joelho dominante. A coxa, a
pelve e o tronco foram fixados à cadeira por cintos de segurança, a fim de
prevenir movimento corporal adicional que pudesse influenciar a produção de
força. O peso do membro a ser testado foi calculado, para correcção da
gravidade. O posicionamento seguiu as recomendações de Stumbo e
colaboradores42. A mesma posição foi mantida nos três testes.
Os indivíduos foram instruídos a estender e flexionar completamente o joelho e
a trabalhar ao máximo durante cada série de exercícios. Encorajamento verbal
intenso e feedbackvisual ' por meio do monitor do computador do Biodex ' foram
fornecidos durante todo o teste43. Todos os procedimentos foram realizados pelo
mesmo investigador. A calibração do dinamómetro foi feita de acordo com as
especificações do fabricante, antes do início de cada sessão de testes.
Análise estatística
O teste de Shapiro-Wilk foi realizado para testar a normalidade da distribuição
dos dados. As variáveis antroprométricas, espirométricas e gasométricas
apresentaram distribuição paramétrica e foram descritas como média (± desvio-
padrão). Os valores de pico de torque, o trabalho total e o índice de fadiga,
por apresentarem distribuição não paramétrica, estão expressos na forma de
mediana (intervalo interquartil Q1 -Q3). De cada série de cinco repetições,
consideraram-se para análise os maiores valores de pico de torque e o trabalho
total atingidos. A variação no pico de torque e no trabalho total nas seis
medidas ' primeira e segunda séries com 30, 60 ou 120 segundos de intervalo '
foi verificada pelo teste de Kruskal-Wallis.
A fim de identificar a variação no pico de torque e no trabalho total entre
duas séries de medida, com diferentes intervalos de repouso, utilizou-se o
teste de Mann'Whitney para amostras emparelhadas. Já a comparação dos índices
de fadiga, nos três intervalos estudados, foi realizada pelo teste de Kruskal-
Wallis. O nível de significância estabelecido foi de 5%. O softwareutilizado
para análise estatística foi o SPSS versão 16.0 (Chicago, IL, EUA) para Mac
OSX.
Resultados
Para este estudo, foram avaliados 20 indivíduos ' 17 homens e 3 mulheres ' com
diagnóstico clínico de DPOC com obstrução ao fluxo aéreo expiratório grave ou
muito grave (66,1 ± 7,4 anos, 70 ± 10,8 kg, 167,4 ± 6,2 cm, VEMS1 36,5 ± 10,1%
do previsto), atendidos no serviço de Pneumologia do Hospital Universitário de
Brasília no período de Janeiro de 2008 a Fevereiro de 2009. Nenhum dos
indivíduos fazia uso de oxigenoterapia domiciliar contínua. As características
antropométricas, espirométricas e gasométricas estão detalhadas no Quadro I.
Quadro I – Características antropométricas, espirométricas e gasométricas dos
indivíduos estudados (n=20).
Os valores de pico de torque, trabalho total e índice de fadiga dos indivíduos
estudados estão apresentados no Quadro II. À velocidade angular de 60°.s-1, o
pico de torque identificado em todas as medidas ' análise intergrupo ' não
apresentou diferença significativa (p=0,957; Fig. 1). Ao comparar a primeira
com a segunda série ' análise intragrupo, o pico de torque não foi diferente em
nenhum dos intervalos de recuperação analisados (p=0,135, p=0,465 e p=0,304
para 30, 60 ou 120 segundos, respectivamente). Da mesma forma, o trabalho total
não foi diferente ao comparar todas as medidas (p=0,895; Fig. 2), nem entre as
séries (p=0,629, p=0,507 e p=0,144 para 30, 60 ou 120 segundos,
respectivamente).
Quadro II – Pico de torque (em newtons por metro), trabalho total (em joules) e
índice de fadiga (em percentagem) em duas séries com cinco repetições cada, à
velocidade angular de 60°·s -1, com intervalo de repouso de 30, 60 ou 120
segundos entre as séries (n=20) 30s
Fig. 1 – Gráfico do pico de torque (em newtons por metro) em duas séries com
cinco repetições cada, à velocidade angular de 60°·s -1, com intervalo de
repouso de 30, 60 ou 120 segundos entre as séries (n=20)
Fig. 2 – Gráfico do trabalho total (em joules) em duas séries com cinco
repetições cada, à velocidade angular de 60°·s -1, com intervalo de repouso de
30, 60 ou 120 segundos entre as séries (n=20)
O índice de fadiga para os diferentes intervalos de repouso foi calculado por
meio da fórmula utilizada por Ernesto e colaboradores41, a partir dos valores
de trabalho total nas duas séries:
Ao comparar os três tempos de recuperação, o índice de fadiga foi similar nos
diferentes intervalos de recuperação (p=0,125).
Discussão
Nos indivíduos estudados, não houve diferença significativa nos valores de pico
de torque, trabalho total e índice de fadiga, independente do número de séries
ou da duração do intervalo de recuperação entre elas.
A maneira com que a força muscular é mensurada em um teste isocinético deve ser
padronizada; esse procedimento assegura que o valor obtido seja preciso, além
de permitir a comparação entre resultados de diferentes estudos. A velocidade
angular de 60°.s-1, utilizada neste estudo, é ideal para avaliar força
muscular, pois é nela que se obtém o maior pico de torque18,31. Siqueira e
colaboradores44 avaliaram indivíduos às velocidades de 60°.s-1 e 240°.s-1,
identificando que o recrutamento das unidades motoras é maior em velocidades
angulares mais baixas; isto contribui para melhor performancemuscular, mas
também gera maior acúmulo de metabólitos.
Outro factor importante para realização do teste isocinético é o número de
repetições. Medidas realizadas com múltiplas repetições atingem maior pico de
torque, devido ao estado de pré-activação neural31. A activação neural prévia
prepara o membro para a geração de força, o que leva a maior produção de torque
muscular. A escolha do número de repetições é determinada pela informação que
se deseja obter; para testes de força, a recomendação da ASEP é que se realizem
até cinco repetições por série31, estando de acordo com o protocolo utilizado
no presente estudo e contrário à metodologia descrita por outros autores26-28.
A realização de mais de uma repetição permite a ocorrência de potencialização
pós-activação, a ampliação da força decorrente de uma actividade muscular
voluntária prévia45. O mecanismo considerado principal responsável pela
ocorrência deste fenómeno é a fosforilação da miosina reguladora de cadeia
leve, que faz com que a interacção actina-miosina se torne mais sensível ao
cálcio libertado pelo retículo sarcoplasmático; em decorrência dessa maior
sensibilidade ao cálcio, um número maior de pontes cruzadas passa a ser
activado, gerando um torque muscular superior ao observado no estado não
potencializado46. Também se sugere que a ampliação da força muscular produzida
nesse evento se deva a uma maior duração da interacção actina-miosina no
mecanismo das pontes cruzadas47.
Se forem realizadas mais de uma série, o intervalo de repouso entre elas pode
ser um factor decisivo para assegurar que o máximo valor de pico de torque seja
mensurado18. Ele deve ser suficiente para a adequada recuperação das fontes de
energia ' por exemplo, adenosina-trifosfato (ATP) e fosfocreatina, além de
permitir a eliminação dos bioprodutos da contracção muscular que levam à fadiga
' como os iões de hidrogénio, restabelecendo assim a produção de força
muscular33.
A fadiga muscular pode ser definida como declínio na produção de força muscular
máxima, sendo caracterizada por redução na capacidade de trabalho48. Inúmeros
factores contribuem para a fadiga, entre eles: (i) degradação de fosfocreatina;
(ii) redução do glicogénio muscular e hepático; (iii) acidose intramuscular
originada pelo exercício49. A demanda de ATP num exercício de alta intensidade
é inicialmente suprida pelos sistemas dos fosfagénios e glicolítico50.
A perda de massa muscular em doenças crónicas como a DPOC ocorre de forma
lenta1. A função e a estrutura muscular estão alteradas, devido principalmente
à conversão de fibras do tipo I em IIx e à atrofia das fibras do tipo IIx15,52.
Essas anormalidades implicam em redução da força e da resistência muscular e
estão relacionadas com a função respiratória, intolerância ao exercício,
utilização de recursos de saúde e capacidade funcional53. A perda muscular tem
profundos efeitos na morbidade, incluindo maior readmissão após exacerbações e
maior necessidade de suporte ventilatório1,6,12; é também um importante
determinante de mortalidade, independente da função pulmonar, tabagismo e
índice de massa corporal11,54.
O défice na activação voluntária pode contribuir para a redução de força em
indivíduos com DPOC25. Vivodtzev e colaboradores55 observaram menor fracção de
recrutamento do quadríceps quando compararam doentes respiratórios crónicos e
controlos saudáveis, mostrando que o défice na activação voluntária pode
contribuir para a fraqueza muscular nos indivíduos com DPOC grave. Haccoun e
colaboradores56 encontraram menores níveis de trabalho muscular em indivíduos
com DPOC comparados com controlos durante um teste de 30 segundos em
cicloergómetro. As mudanças metabólicas que acontecem durante a fadiga afectam
a produção de força48. O processo inicial que leva à fadiga muscular resulta da
redução na produção anaeróbica de ATP, ou do aumento no acúmulo de adenosina-
difosfato (ADP) causado pela ausência de fosfocreatina e pela diminuição na
taxa de hidrólise do glicogénio49,51. O desempenho muscular e as respostas
metabólicas podem ser afectadas pelo tempo de recuperação entre duas séries de
medidas18. Assim, a manutenção da força num dado intervalo de repouso é uma
variável que pode ser utilizada para detectar a magnitude da ressíntese dos
suprimentos fosfagénicos de energia e da glicólise anaeróbica41.
Este é o primeiro estudo que avalia a influência do intervalo de repouso na
medida do pico de torque em indivíduos com DPOC. Nos indivíduos estudados, 30
segundos foi suficiente para garantir a recuperação muscular entre duas séries
de um teste isocinético. Ao comparar intervalos de 30, 60 ou 90 segundos na
avaliação de idosos saudáveis, Bottaro e colaboradores18 encontraram o mesmo
resultado. No estudo de Parcell e colaboradores34 em jovens saudáveis, foram
necessários 60 segundos de intervalo para manutenção do pico de torque entre
duas séries; entretanto, estes autores avaliaram intervalos de 15, 60 ou 180
segundos, não sendo possível portanto determinar se 30 segundos seria tempo
suficiente.
Para justificar a adequada recuperação da força muscular em idosos saudáveis
com 30 segundos de intervalo entre séries, Bottaro e colaboradores18 alegaram
que a realização de cada série não implica em actividade muscular sustentada
prolongada, ocasionando assim menor sobrecarga metabólica e possibilitando que
um menor intervalo seja suficiente para assegurar a restauração das vias
energéticas e a eliminação dos bioprodutos da contracção muscular. Além disso,
jovens saudáveis atingem maior pico de torque e, portanto, geram maior pressão
intramuscular, maior oclusão do fluxo sanguíneo e maior acúmulo de
metabólitos49, o que justifica a necessidade de maior intervalo de repouso
entre séries para permitir a recuperação muscular. O mesmo raciocínio pode ser
aplicado aos indivíduos com DPOC, a fim de justificar porque 30 segundos foram
suficientes para impedir o surgimento de fadiga, não comprometendo o desempenho
muscular na segunda série. A pequena variação no pico de torque entre as duas
séries de medidas, nos três intervalos de repouso estudados, sugere que não
houve fadiga muscular, apesar da maior fatigabilidade esperada em doentes
respiratórios crónicos36,52. Tal facto é ratificado pelos baixos índices de
fadiga encontrados: a similaridade nos valores de trabalho total entre as
séries comprova que mesmo um repouso de 30 segundos permitiu a recuperação
muscular nos indivíduos estudados. Neste estudo, não foi mensurada a área de
secção transversal da coxa nem a massa magra, o que não permite identificar a
ocorrência de caquexia. É possível que indivíduos com comprometimento muscular
mais intenso apresentem limiar de fadiga mais curto, necessitando de intervalos
de recuperação maiores entre séries de medida. Também não foi avaliado o nível
de actividade física dos indivíduos estudados. Watz e colaboradores57
identificaram que os estágios III e IV do GOLD (limitação ao fluxo aéreo
expiratório grave e muito grave) foram os melhores preditores para doentes
muito inactivos, portanto é provável que a presente amostra seja composta por
indivíduos com baixo nível de actividade física. Indivíduos inactivos podem
apresentar fadiga mais precocemente; entretanto, estes indivíduos também
atingem menor pico de torque, o que favoreceria a recuperação muscular num
tempo mais curto. Além disso, a piora na resistência da musculatura esquelética
também está presente em indivíduos com nível de actividade física relativamente
normal, não se correlacionando com variáveis de função pulmonar, dados
antropométricos nem mesmo força do quadríceps36.
Conclusão
Em síntese, os resultados deste estudo mostram que, na avaliação isocinética de
indivíduos com DPOC grave ou muito grave, pico de torque e trabalho total podem
ser identificados por meio de apenas uma série com cinco repetições; se forem
realizadas duas séries, 30 segundos de intervalo entre elas é suficiente para
garantir a recuperação muscular.