Avaliação do impacto da polimedicação nas verbas de internamento nas unidades
de longa duração e manutenção
Introdução
O setor de saúde está a sofrer fortes mudanças em Portugal. O Estado recua,
enquanto a iniciativa privada tende a avançar. Os operadores privados apostam
cada vez mais no mercado da saúde, em alternativa ao polémico encerramento de
unidades de saúde públicas ou em consequência do aumento dos utentes com
seguro. A possível insustentabilidade financeira do Serviço Nacional de Saúde,
motivada pelo envelhecimento da população e inovação tecnológica poderá ter
como consequência (a ser verificada) a crescente privatização do setor da saúde
(Sakellarides, 2007).
O aumento da procura de cuidados de saúde privados tem tido taxas de
crescimento graduais, que conduzem a uma evolução do setor privado. Esta
evolução irá traduzir-se na abertura de novos hospitais, clínicas e,
consequentemente uma maior inovação. Num mercado ainda pequeno como o
português, é relativamente fácil identificar os principais operadores privados
no setor da saúde. A evolução destas empresas no mercado e a relevância que têm
assumido nos últimos anos são consequências de um desenvolvimento marcante e
progressivo na prestação de cuidados na área da saúde (Moura, 2006). A
concorrência entre os principais operadores torna-se visível devido ao aumento
de oportunidades de negócio, e a uma constante procura de uma maior inovação de
tecnologias, infraestruturas e equipamentos (Dinis, 2008).
O efeito cumulativo da diminuição da mortalidade e da natalidade tem-se
traduzido, em Portugal, no progressivo envelhecimento da população. O aumento
da esperança média de vida, que se tem verificado em paralelo, espelha a
melhoria do nível de saúde dos Portugueses nos últimos 40 anos. Apesar de tal
sucesso, verificam-se carências ao nível dos cuidados de longa duração e
paliativos, decorrentes do aumento da prevalência de pessoas com doenças
crónicas incapacitantes. Estão, assim, a surgir novas necessidades de saúde e
sociais que requerem respostas novas e diversificadas que venham a satisfazer o
incremento esperado da procura por parte de pessoas idosas com dependência
funcional, de doentes com patologia crónica múltipla e de pessoas com doença
incurável em estado avançado e em fase final de vida (Sakellarides, 2006). As
definições de cuidados continuados integrados; doença crónica; unidades de
longa duração e manutenção estão descritas em Decreto-Lei nº 101/2006 de 6 de
junho.
De acordo com o exposto, este estudo teve como objetivo avaliar o impacto da
polimedicação nas verbas diárias de internamento imputadas a uma unidade de
longa duração e manutenção, de forma a responder a duas grandes questões:
Como é que estão as unidades de cuidados continuados de longa duração e
manutenção a lidar com as verbas imputadas pelo Estado, para a prestação de
cuidados de saúde?
Qual o impacto da polimedicação nas verbas diárias imputadas a uma unidade de
longa duração e manutenção?
Revisão teórica
Com a entrada em funcionamento da Rede Nacional de Cuidados Continuados
Integrados (RNCCI) foram criadas as condições para a separação clara entre o
prestador de cuidados de saúde e o seu financiamento, passando o relacionamento
financeiro com as unidades de saúde do Serviço Nacional de Saúde (SNS) a
estabelecer-se mediante contratos de gestão, com a contratualização de
orçamentos devidamente planeados de acordo com objetivos, e que variam de
acordo com as áreas assistenciais e com uma fundamentada programação de
atividades, sem descurar a garantia da qualidade da prestação direta de
cuidados de saúde (Costa, 2010; UMCCI, 2011).
Passou a haver, assim, um aumento do controlo de gestão, tanto ao nível das
unidades de saúde como da própria tutela (OPSS, 2010).
Os Cuidados Continuados Integrados (CCI) são uma oferta diferente do que até
aqui existia, dirigindo-se a reais dificuldades de saúde das pessoas, apoiando
as suas famílias em situações de grande dificuldade na colocação adequada dos
seus familiares dependentes, são uma revolução na continuidade do apoio
hospitalar. O doente deixa de ter a estadia artificialmente prolongada no
hospital, pois passou a ter à sua disposição apoios que já existiam na vertente
social, mas que agora passaram a existir na vertente saúde. Cuidados adequados
ao nível de dependência são cuidados de melhor qualidade e também conduzem a um
melhor uso de recursos (Campos, 2008).
O objetivo primordial desta reforma foi consolidar ganhos em saúde, fomentando
uma atuação centralizada no cidadão, assim como reorganizar e otimizar a Rede
de Cuidados de Saúde, tendo em vista a eficácia e eficiência do sistema e sua
sustentabilidade financeira, promovendo uma gestão eficiente dos recursos
físicos e financeiros, e a produtividade dos prestadores de cuidados (Rodrigues
et al., 2007).
Depreende-se então que se torna necessário promover um modelo de gestão
integrador, introduzindo mecanismos de competição e de mercado no sistema
prestador, e se dê um maior incremento do setor privado na prestação de
cuidados de saúde, pois considera-se que uma das principais causas da
ineficiência dos sistemas de saúde reside no excessivo peso que o Estado possui
na prestação de cuidados de saúde, sendo que se advoga, igualmente, uma clara
separação entre o "financiador" e o "prestador" tal
como é referido por Rego e Nunes (2009).
No que diz respeito às unidades de longa duração e manutenção, o seu objetivo é
manter capacidades existentes, e não de ganho em autonomia. Por outro lado, o
número de incapazes e dependentes na admissão representava 98% da amostra em
2008, 99% em 2009 e 98% no 1º semestre de 2010, mostrando uma estabilização
elevada de incapacidade na admissão. Podemos concluir que as instituições que
mais referenciam para a RNCCI são os hospitais, utentes cada vez com mais
idade, com grande incapaciadade, perda de autonomia e comorbilidades. Sendo a
RNCCI um novo modelo de cuidados, integrado no SNS e em corresponsabilidade com
a Segurança Social, com o objetivo de promoção de autonomia, impõe-se, para o
seu sucesso e credibilidade junto dos cidadãos, uma correta referenciação dos
potenciais utentes que viabilize resultados adequados dos cuidados prestados.
Contudo, considerando que o atual quadro macroeconómico resultante da crise
internacional aponta para uma variação média negativa do índice de preços no
consumidor, e tendo em conta que daqui resultaria uma diminuição dos preços dos
cuidados de saúde e de apoio social nas unidades da RNCCI a praticar no ano de
2010, o que poderia ter implicações na sustentabilidade das entidades
promotoras e gestoras daquelas unidades, torna-se imperioso tomar medidas que
evitem tais consequências. Os preços dos cuidados de saúde e de apoio social,
prestados nas unidades de internamento e ambulatório da Rede Nacional de
Cuidados Continuados Integrados (RNCCI), a praticar no ano de 2010 (Portaria nº
326/10), constam da tabela 1.
Tabela 1 ' Preços da Rede Nacional de Cuidados Continuados Integrados, 2010
Parafraseando Barros, ... aliás, este é mesmo o exemplo mais típico, de uma
das principais variáveis económicas de interesse, o preço. Nos modelos
tradicionais, o preço é o elemento que permite equilibrar o mercado (2009, p.
30).
Relativamente à sustentabilidade financeira, poucas conclusões se podem tirar.
Em relação ao modelo de financiamento, a modalidade de pagamento definida para
remunerar este tipo de prestação de cuidados é assente no pagamento por doente/
diária (na média duração/reabilitação e na longa duração e manutenção são
partilhadas entre os dois ministérios e os utentes), acrescida das despesas com
terapêuticas e meios complementares de diagnóstico e tratamento, embora possam
constituir uma vantagem para a consolidação do modelo, dificultam a sua
integração com o financiamento dos níveis de cuidados primários e hospitalares
e tornam difícil a sua sustentabilidade a médio e longo prazo. Para, além
disso, este sistema não prevê pagamentos diferenciados em função, por exemplo,
de diferentes níveis de funcionalidade dos utentes. Por último, não existem
dados disponíveis que permitam perceber quais os ganhos que os outros dois
níveis de cuidados do SNS (primários e diferenciados/hospitalares) tiveram com
a implementação deste nível intermédio. Em suma, a sustentabilidade financeira
merece especial atenção, tendo em consideração não só os argumentos atrás
apresentados, mas também a situação económico-financeira que atravessamos. Tal
atenção especial deverá ter como objetivo não só demonstrar os ganhos em saúde
deste nível de cuidados, mas também a sua influência positiva nos restantes
níveis, nomeadamente na qualidade, através da diminuição da demora média de
internamento, dos reinternamentos, etc.
A UMCCI (2007) refere que têm sido identificados alguns constrangimentos no
desenvolvimento da atividade de prestação de cuidados pelas entidades
prestadoras. Tais constrangimentos prendem-se, nomeadamente, com a dispensa de
medicamentos pelas entidades prestadoras, implicando consumos mais elevados dos
que inicialmente expectáveis (Novaes, Gonçalves e Simonetti, 2006). Este facto
é realmente reportado por todos os prestadores da área, embora não existam
dados que lhe confiram suporte e validade. As despesas efetuadas pelas unidades
de internamento no âmbito da RNCCI em medicamentos, realização de exames
auxiliares de diagnóstico e apósitos e material de penso para tratamento de
úlceras de pressão são pagas de acordo com tabela própria (Portaria nº 189/08),
havendo lugar à compensação com os valores pagos no âmbito do sistema
experimental (tabela 2).
Tabela 2 ' Valores pagos no âmbito do sistema experimental
A avaliação do consumo de medicamentos associado ao tratamento de doenças
crónicas (Santos e Almeida, 2010) poderá vir a permitir obter orientações para
a reestruturação dos formulários das unidades, e transmitir uma análise do
impacto das doenças crónicas na verba diária disponibilizada para os encargos
com as mesmas. Outra questão que se poderá levantar com a conclusão do estudo,
nomeadamente, o impacto das doenças crónicas nas verbas disponibilizadas às
unidades, é saber até que ponto é da responsabilidade da unidade a continuação
do tratamento de doenças crónicas que o doente já possuía aquando da sua
admissão, e que não constituem muitas vezes o motivo da sua referenciação. Se
por um lado, existe a preocupação na racionalização dos custos na unidade,
existe, também, por outro, o dever do cumprimento da política de saúde, que
determina a responsabilidade pela saúde da população por parte do Estado,
assegurando o acesso geral, universal e tendencialmente gratuito de todos aos
cuidados de saúde e consagrando o Direito à Saúde como direito de cidadania
previsto na Constituição da República Portuguesa (Artigo 64.º).
Perante este quadro, justifica-se avaliar o impacto da polimedicação nas verbas
diárias de internamento imputadas a uma unidade de longa duração e manutenção.
Tal poderá evidenciar o impacto das doenças crónicas nos custos com
medicamentos de modo a poder evitar a colocação em causa da sustentabilidade
destas unidades e consequentemente de uma grande reforma de cuidados de saúde
que se apresenta em curso.
Metodologia
Este é um estudo de caso, de natureza exploratória. A população foi constituída
por todos os doentes admitidos na Unidade de Longa Duração e Manutenção Dona
Elvira da Câmara Lopes da Santa Casa da Misericórdia da Póvoa de Lanhoso entre
junho e novembro de 2010, num total de 65.
Como instrumentos de recolha de dados foram utilizados: I) um formulário com
perguntas de caracterização sóciodemográfica; e II) uma grelha de registo, onde
se recolhia a causa de solicitação pela unidade, quem tinha referenciado o
doente, o diagnóstico principal e secundário da situação do doente, as
necessidades de cuidados e a terapêutica prescrita.
Relativamente aos procedimentos éticos, foi realizado um contacto prévio e
pedido de autorização à Mesa Administrativa da Santa Casa da Misericórdia da
Póvoa de Lanhoso, para apresentar os objetivos do estudo e consequente
autorização. É de salientar que a participação no estudo foi de caráter
voluntário, tendo cada doente fornecido um consentimento autorizado sobre a sua
participação. A recolha de dados foi efetuada entre 22 de junho 2010 e 15 de
novembro de 2010.
texto">A análise dos dados foi efetuada utilizando o programa de análise
estatística SPSS 16,0 (Statistical Package for the Social Sciences), que nos
permitiu elaborar uma matriz dos dados recolhidos, previamente codificados. A
análise estatística compreendeu, numa primeira fase, uma análise descritiva com
valores das frequências absolutas e relativas, medidas de tendência central
(média) e medidas de dispersão (desvio padrão). Uma segunda fase compreendeu a
análise inferencial baseadaem testes paramétricos e não-paramétricos (t-
Student, ANOVA, e o teste de Mann-Whitney), utilizando um nível de
significância de 0,05.
Resultados e discussão
Uma nota prévia para referir que a inexistência de estudos na área das unidades
de longa duração e manutenção condiciona a comparação dos dados desta
investigação com resultados de outros estudos.
Começamos por referir que a maior incidência percentual é composta por
elementos do sexo feminino, mais propriamente 53,8% (n=35), e a demais
percentagem pertence ao género masculino (46,2%; n=30).
Os elementos estudados apresentam idades compreendidas entre os 35 e os 96
anos, sendo a média de idade de 72 anos (dp=14,90, o que demonstra um desvio
considerável em relação à média). Pelo menos 50% dos indivíduos possuem idade
igual ou inferior a 75 anos (mediana=75), sendo esta a idade mais
frequentemente encontrada (moda=75). Ao agrupar a idade em duas categorias (até
64 anos e idosos com 65 ou mais anos) verifica-se que a maioria dos elementos
possui mais de 65 anos (73,8%; n=48), e somente a percentagem de 26,2% (n=17)
tem 64 ou menos anos.
Relativamente ao estado civil verifica-se que a maior parte dos doentes são
casados ou encontra-se em união de facto (42,9%; n=27), destacando-se de
seguida os elementos viúvos (38,1%; n=24). A maior parte dos inquiridos é
analfabeta ou não concluiu o 1º ciclo (56,7%; n=34) e 36,7% (n=22) tem
escolaridade ao nível do ensino básico. Apenas a percentagem de 3,3% (n=2)
apresenta habilitações mais elevadas, ao nível do 3º ciclo ou 12º ano.
Verifica-se ainda que a percentagem mais expressiva de doentes reside com a
família natural (83,1%; n=54), o equivalente a 3,1% (n=2) encontra-se em
instituição e a mesma percentagem vive só. Existe também quem tenha mencionado
viver com outros elementos (10,8%; n=7), mais concretamente com amigos ou
cuidadores extrafamília.
Na questão de quem os doentes recebem apoio nas atividades da vida diária
constata-se que a família surge como cuidador preferencial, pois o valor de
96,9% (n=63) referiu que são familiares quem lhes presta apoio. Destaca-se
também quem tenha referido os técnicos de saúde (9,2%; n=6), a empregada
doméstica (7,7%; n=5) e a ajuda domiciliária (6,2%; n=4). Os centros de dia/
técnicos de serviço social somente foram referenciados por um elemento (1,5%;
n=1) e os vizinhos foram mencionados por 3,1% (n=2).
No que concerne ao tipo de apoios que o doente recebe constata-se que a higiene
da roupa e a higiene pessoal são os apoios mais necessários, já que, surgem com
72,3% (n=47) e 70,8% (n=46) respetivamente, seguindo-se os medicamentos e a
higiene da habitação (ambos com 69,2%; n=45). As ajudas técnicas são prestadas
em 38,5% (n=25) e a ajuda pecuniária surge em somente um caso (1,5%; n=1).
A maioria dos doentes internados na unidade é proveniente de um hospital
(64,6%; n=42), e a percentagem de 32,3% (n=21) vieram diretamente do domicílio.
Existem ainda 3,1% (n=2) que vieram de um centro de saúde.
Quanto às causas de solicitação para o internamento na unidade de longa
duração, verifica-se que na totalidade de situações é considerada a situação de
utentes com fragilidade, em que 94,4% (n=62) dos doentes apresentam dependência
nas atividades da vida diária, em 3,1% (n=2) existe deterioração cognitiva e no
elemento restante foi apontado outro motivo não explanado. A maioria dos
utentes não apresenta doença crónica com episódios de agudização, pois a 60%
dos casos (n=39) não é aplicável a situação. Porém, em 27,7% (n=18) foram
apontadas outras doenças, em 7,7% (n=5) é descrito Doença Pulmonar Obstrutiva
Crónica, e em três casos são apontadas doenças cardiovasculares (4,6%; n=3).
A unanimidade dos doentes apresenta necessidade de continuidade dos cuidados,
principalmente no que concerne à reabilitação (52,3%; n=34). O equivalente a
20% (n=13) necessita de manutenção de dispositivos e o correspondente a 18,5%
(n=12) apresenta a necessidade de tratamento de feridas/úlceras de pressão.
Existe ainda o valor de 6,2% (n=6) com intervenção ao nível da gestão do regime
terapêutico e dois utentes apresentam outro tipo de necessidades (3,1%; n=2).
Relativamente à necessidade de vigilância e tratamentos complexos verifica-se
que em 41,5% (n=27) a situação não é aplicável, mas para 44,6% (n=29) surge a
necessidade, uma vez que são portadores de sonda nasogástrica/gastrostomia
endoscópica percutânea. O valor de 9,2% (n=6) apresenta a necessidade de
vigilância e tratamento de úlceras de pressão múltiplas e três utentes
necessitam de acompanhamento pós-cirúrgico.
Em relação ao número de medicamentos que os doentes consomem na unidade,
verifica-se que o número está situado entre 1 e os 13 fármacos. Em média os
utentes consomem 6,1 medicamentos (dp=2,40), sendo que pelo menos metade dos
doentes ingere seis ou menos medicamentos diariamente (mediana=6) e o número
mais habitual é de 5 medicamentos diferentes por dia (moda=5). Ao considerar o
número de medicamenos utilizados nas terapêuticas dos doentes observa-se que
prevalece a polimedicação major em 75,4% dos utentes (n=49), sendo que a
polimedicação minor acontece em somente 24,6% dos casos (n=16). Traduzindo o
número de medicamentos tomados, tendo em consideração o valor unitário e a
posologia, num valor diário gasto com a medicação por utente observa-se que os
valores estão situados entre os 0,26 e os 14,51 EUR. Em média na Unidade gasta-
se em fármacos 3,27 EUR/dia (dp=2,71), a mediana está nos 2,18 EUR e o valor
mais frequente é de 1,01 EUR.
Como se pode verificar na tabela 3, os grupos farmacológicos são
tendencialmente mais consumidos por parte dos elementos do sexo masculino, com
exceção dos psicofármacos que são mais utilizados pelas mulheres (40%; n=12 e
48,6%; n=17 respetivamente) e dos antidislipidémicos (20%; n=6 e 31,4%; n=11).
Através dos valores obtidos com o teste estatístico, conclui-se que o tipo de
medicamentos consumidos é igual entre os elementos masculinos e femininos.
Tabela 3 ' Comparação dos grupos farmacológicos por sexo
Relativamente à comparação dos fármacos por grupos etários (até 64 anos e 65 e
mais anos), constata-se que os anti-hipertensores são claramente mais
consumidos por parte dos elementos mais idosos (47,1%; n=8 e 70,8%; n=34
respetivamente), podendo aceitar-se a hipótese da diferença estatística dos
resultados (z=-1,748; p=0,050) pelo que se conclui que este tipo de
medicamentos é tendencialmente mais consumido pelos elementos com mais idade. O
mesmo se verifica em relação aos anticoagulantes e antitrombóticos já que
também este tipo de medicamento é mais consumido pelas mulheres (41,2%; n=7 e
70,8%; n=32) e a diferença é significativa (z=-1,829; p=0,047).
Os elementos do sexo masculino apresentam uma média diária de 6,47 medicamentos
(dp=2,64) enquanto as doentes femininas tomam 5,71 medicamentos (dp=2,16),
verificando-se que a diferença das médias não é significativa (t=1,281;
p=0,205). O mesmo se verifica em relação aos grupos etários. De facto, a média
do número de medicamentos é igual para ambos os grupos (6,06 com dp=2,22 e
dp=2,48) e não se pode rejeitar a igualdade (t=0.004; p=0,997), o que demonstra
que a polimedicação não é um problema exclusivo da população idosa pois a média
de consumo é igual nos dois grupos (tabela 4).
Tabela 4 ' Comparação do número de medicamentos por sexo e idade
Relativamente ao valor diário gasto na medicação também não existe diferença
estatística por sexo ou idade. A média é ligeiramente mais elevada nos doentes
do sexo masculino (3,68 EUR; dp=3,00 e 2,92 EUR; dp=2,43 respetivamente) mas
não é significativa (t=1,131; p=0,262). Por grupo etário o valor é mais elevado
nos doentes com 65 ou mais anos (3,06 EUR; dp=2,06 e 3,35 EUR; dp=2,92) mas não
se pode assumir diferença significativa (t=-0,382; p=0,704).
Por outro lado, ao verificar se o valor diário dos medicamentos varia com o
tipo de polimedicação já é possível rejeitar a hipótese da igualdade e assumir
a diferença estatística das médias (t=-2,173; p=0,034). A média do grupo da
polimedicação minor é de 2,03 EUR (dp=1,85) enquanto a da polimedicação major é
de 3,68 EUR (dp=2,84) o que comprova que o número de medicamentos tomados está
associado ao valor diário encontrado. Por outro lado, o valor diário de custo
com a medicação por utente não está relacionado com a origem do encaminhamento
do doente para a unidade, uma vez que se verifica que a média é mais elevada
nos doentes provenientes do hospital (3,77 EUR; dp=3,03) e é mais baixa nos
utentes que se encontravam no domicílio (2,33 EUR; dp=1,80), mas o resultado do
teste Anova não permite assumir a diferença significativa das médias entre os
três grupos (F=2,610; p=0,082). Ao contrário do que seria previsível, os
utentes a quem lhes foi diagnosticado somente um problema de saúde carecido de
tratamento apresentam claramente uma média de custo mais elevada do que os
doentes que têm diagnósticos associados (4,43 EUR; dp=3,50 e 2,76 EUR;
dp=2,13), sendo a diferença significativa (t=2,369; p=0,021).
Conclusão
De uma forma geral podemos dizer que:
i) Traduzindo o número de medicamentos tomados, tendo em consideração o valor
unitário e a posologia, num valor diário gasto com a medicação por utente
observa-se que os valores estão situados entre os 0,26 EUR e os 14,51 EUR. Em
média, na unidade, gasta-se em fármacos 3,27 EUR/dia por doente. Dos fármacos
mais utilizados em tratamento na unidade ressalvam-se os antiepilépticos,
anticonvulsivantes (ambos com 15,4%), psicofármacos (44,6%) e insulinas (21,5%)
que estão presentes nos tratamentos. Sabendo-se que se trata de grupos
farmacológicos mais caros e que têm de ser adquiridos sem comparticipação, é
natural que os custos sejam maiores mas tal não permite afirmar que são mais
caros do que o preconizado;
ii) Atendendo a que o perfil de utente, corresponde a um indivíduo polimedicado
major, que o valor correspondente/dia é de 3,68 EUR de média, e fazendo o
cálculo, em função de 10 EUR de verba diária atribuída, obtém-se a percentagem
de 37% de impacto na verba imputada pelo Estado. Sabendo que o restante valor
diz respeito a tratamentos com material de penso e meios complementares de
diagnóstico, por norma situações mais dispendiosas, não parece ser uma situação
favorável ao desempenho de prestação de cuidados de saúde em qualidade, sem que
haja a intenção de reduzir ou conter custos.
iii) O perfil de utente típico polimedicado, nas unidades de longa duração,
tem a ver com: sexo feminino, de 72 anos, casado ou união de facto, sem
habilitações literárias, reside com a família natural, higiene da roupa e a
higiene pessoal são os apoios mais necessários, referenciado do hospital por
parte da Medicina Interna, tem fragilidade, e apresenta dependência nas
atividades da vida diária, precisa de reabilitação, vem com sonda nasogástrica,
tem como diagnóstico principal o acidente vascular cerebral e a hipertensão
essencial ou pneumonia como diagnóstico secundário, consome, em média, 6
fármacos por dia e gasta, em média, 3,68 EUR/dia com medicação correspondendo a
um caso de polimedicação major.
Uma das limitações deste estudo teve a ver com a recolha de dados ter sido
efetuada numa única unidade de longa duração e manutenção, o que,
eventualmente, pode condicionar a generalização dos resultados a outras
unidades, sugerindo-se que esta problemática continue a ser estudada e
investigada noutras unidades de longa duração e manutenção do país.