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EuPTCVHe1646-107X2012000300006

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National varietyEu
Year2012
SourceScielo

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Insatisfação com a imagem corporal e relação com o nível de atividade física e estado nutricional em universitários

Ao longo das últimas décadas, o crescente processo de modernização conduziu a população a um estilo de vida inadequado, caracterizado pelo aumento do consumo de alimentos com alto teor calórico e declínio no nível de atividade física (NAF) (Frutuoso, Bismarck-Nasr, & Gambardella, 2003). Este padrão de comportamento resulta em um aumento nas prevalências de sobrepeso e obesidade em todos os estratos da população (Ribeiro et al., 2006).

O estilo de vida inadequado não implica somente em efeitos negativos sobre a saúde física, mas também sobre a saúde mental, estimulando a ocorrência de sintomas de estresse, ansiedade e depressão (Ferreira, Tufik, & Mello, 2001), podendo interferir, também na percepção corporal do indivíduo, tornando- o insatisfeito com a imagem corporal (IC).

Estudos prévios relatam que a prática da atividade física está associada à melhoras na IC (Vieira, 2004; Williams & Cash, 2001). Vieira (2004), ao analisar o efeito da atividade física em academias na imagem corporal de indivíduos obesos, identificou que após a intervenção, a prevalência de insatisfação com a IC foi menor em comparação ao pré-teste. O mesmo foi observado por Williams e Cash (2001), ao avaliar a eficiência de um programa de treinamento com pesos em estudantes universitários. Contrariamente, em um estudo com homens e mulheres fisicamente ativos, não foi encontrada associação entre atividade física e IC (Davis & Cowles, 1991). O autor comenta que esse resultado se deve à obsessão pelas formas corporais magras, o que leva os indivíduos a permanecerem insatisfeitos com a IC. Assim, além da escassez de estudos sobre a relação entre NAF e insatisfação com a IC, sobretudo, em universitários, percebe-se uma falta de consenso na literatura a respeito dessa questão.

Outro fator que pode influenciar a IC é o estado nutricional, devido à imposição cultural de corpos extremamente magros para o sexo feminino (Schwartz & Brownell, 2004) e musculosos para o masculino (Damasceno, Lima, Vianna, Vianna, & Novaes, 2005), como forma subliminar de sucesso, felicidade, dinamismo e bem-estar pessoal (Andrade & Bosi, 2003). Diante disso, aqueles indivíduos que não conseguem atingir este padrão corporal estão propensos a desenvolver uma percepção negativa da IC (Stipp & Marques de Oliveira, 2003).

Em uma pesquisa realizada com universitários (Kakeshita & Almeida, 2006), os autores verificaram que aqueles com excesso de peso apresentaram maior insatisfação com a IC. Entretanto, outro estudo realizado com essa população evidenciou que mesmo os estudantes com o peso corporal adequado manifestavam um nível elevado de insatisfação com a IC (Bosi, Uchimura, & Luiz, 2008).

Desta forma, evidencia-se a necessidade de verificar a relação entre insatisfação com a IC e estado nutricional, para que este conhecimento possa apontar a direção a ser seguida no sentido de promover melhoras na IC e na aceitação do próprio corpo em indivíduos que estão em processo de formação universitária.

O final da adolescência e o início da fase adulta caracterizam períodos em que as modificações no estado nutricional, o NAF e a percepção da IC são muito evidenciadas (França & Colares, 2008), assim como as relações entre estes três fatores. Dentre os aspectos determinantes destas mudanças, destaca-se o ingresso na universidade, período no qual o indivíduo adquire novas relações sociais, que, somado às obrigações acadêmicas, pode levar a condutas de saúde menos saudáveis. Assim, torna-se relevante a investigação dessas variáveis e suas associações neste segmento da população, a fim de orientar o desenvolvimento de programas de promoção da saúde, visando a aquisição e manutenção de comportamentos saudáveis.

Desta forma, o objetivo do presente estudo foi verificar a associação da insatisfação com a IC com o NAF e o estado nutricional em universitários recém- ingressos em uma universidade pública brasileira.

MÉTODO Amostra Este estudo foi realizado com base no banco de dados do projeto de pesquisa Avaliação da aptidão física relacionada à saúde de universitários da UFSC. O protocolo do estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade Federal de Santa Catarina (Processo 096/2007).

A população de estudo foi composta por 2290 universitários ingressantes no primeiro semestre do ano letivo de 2008 na Universidade Federal de Santa Catarina. Para o cálculo do tamanho da amostra, foi utilizada a metodologia recomendada por Thomas, Nelson, e Silverman (2007), considerando um nível de confiança igual a 95% e um erro máximo permitido de três pontos percentuais. A amostragem estratificada proporcional foi utilizada por centro de ensino e por turno de estudo (diurno e noturno). Foi utilizado um procedimento randomizado para o sorteio das turmas dentro de cada centro de ensino. Com base no cálculo amostral, estimou-se que seria necessário avaliar 728 universitários, no entanto, devido à coleta de dados ser realizada por conglomerado de turmas, sendo convidados a participarem do estudo todos os estudantes presentes em sala de aula, no dia da coleta, desta forma, responderam o questionário 921 indivíduos.

Foram excluídos do estudo 89 indivíduos por não informarem dados referentes às variáveis analisadas (sexo, NAF, estatura, massa corporal e IC). Desta forma, a amostra final foi composta por 832 universitários (485 do sexo masculino e 347 do sexo feminino), com média de idade de 20.1 (desvio padrão = 4.6) anos.

Instrumentos e Procedimentos A massa corporal e a estatura foram obtidas através de medidas autorreferidas.

A validade destas medidas tem sido comprovada com a população adulta brasileira (Coqueiro, Borges, Araújo, Pelegrini, & Rodrigues, 2009). Para classificação do IMC utilizaram-se os seguintes pontos de corte: baixo peso ( 18.5), peso normal (> 18.5 e 24.9) e excesso de peso ( 25) (sobrepeso + obesidade) estabelecido pela Organização Mundial da Saúde (World Health Organization [WHO], 1998). Os indivíduos com sobrepeso e obesidade foram agrupados formando a categoria excesso de peso.

A insatisfação com a IC foi avaliada por meio do Body Shape Questionnaire (BSQ ' 34). Este instrumento foi traduzido e validado em universitários por Di Pietro e Silveira (2009), apresentando uma consistência interna de 0.97 e uma solução da escala fatorial de quatro dimensões, representando 66.4% da variabilidade total dos dados. O BSQ-34 é um questionário autoaplicável do tipo escala Likert, composto por 34 perguntas, com seis opções de resposta (nunca, raramente, às vezes, frequentemente, muito frequentemente e sempre) que pontuam de um a seis, sendo a maior pontuação conferida àquelas respostas que refletem maior preocupação com a IC e maior autodepreciação devido à aparência física, especialmente no sentido de sentir-se com excesso de peso. A partir da pontuação obtida, os indivíduos foram classificados em satisfeitos (escore < 111) ou insatisfeitos (escore 111) (Alves, Vasconcelos, Calvo, & Neves, 2008).

O NAF foi mensurado através do Questionário Internacional de Atividade Física (International Physical Activity Questionnaire ' IPAQ; versão 8, forma curta, última semana). Para avaliar o NAF dos universitários, foi utilizada a classificação desenvolvida pelo Comitê de Pesquisas sobre o IPAQ (IPAQ Research Committee, 2005). O IPAQ foi validado para a população adulta brasileira por Matsudo et al. (2001). Este método leva em consideração os critérios de frequência e duração, dividindo os indivíduos em três categorias: inativo, moderadamente ativo e muito ativo.

Análise Estatística A estatística descritiva foi utilizada por meio da distribuição de frequências.

Para verificar as associações entre as variáveis estudadas utilizou-se o teste exato de Fisher, com todas as análises controladas por sexo. Os dados foram analisados no programa estatístico SPSS 15.0, adotando-se um nível de significância de 5%.

RESULTADOS A prevalência de insatisfação com a IC foi de 10.1%. Dos universitários insatisfeitos, 90.1% foram do sexo feminino e 9.9% do sexo masculino.

Quanto à inatividade física, a prevalência foi de 14.5%, sendo que os homens apresentaram menor prevalência (11.9%) em relação às mulheres (18.2%).

Na Quadro 1 verifica-se que tanto no sexo masculino quanto no feminino não foi observada associação significativa entre IC e NAF (p > .05).

Quadro 1 Associação entre a IC e o NAF em universitários de acordo com o sexo.

Florianópolis, Santa Catarina, 2008.

Considerando a IC e o estado nutricional (Tabela 2), verificou-se uma associação significativa tanto para o sexo masculino quanto para o feminino (p < .05). Observa-se que, em ambos os sexos, houve uma maior proporção de insatisfação com a IC nos indivíduos com excesso de peso.

Quadro 2 Associação entre a IC e o estado nutricional em universitários de acordo com o sexo. Florianópolis, Santa Catarina, 2008.

DISCUSSÃO De acordo com revisão prévia da literatura, nenhuma pesquisa foi encontrada, considerando a associação da IC com o NAF e o estado nutricional em universitários. Dessa forma, o presente estudo contribui para o corpo de conhecimento neste domínio, demonstrando que universitários com excesso de peso estão mais insatisfeitos com a IC, em relação àqueles com peso normal e baixo peso. Além disso, percebe-se que a insatisfação com a IC não está relacionada ao NAF nos universitários pesquisados.

Em relação à insatisfação com a IC, a prevalência encontrada no presente estudo foi inferior a apresentada por Luz (2003), o qual observou uma prevalência de insatisfação com a IC de 15.3% em universitários de Belo Horizonte, MG. A baixa prevalência encontrada na atual pesquisa pode estar relacionada à maior proporção de indivíduos do sexo masculino que compõem a amostra, uma vez que os homens tendem a apresentar maior insatisfação por magreza (Quadros et al., 2010) e o questionário utilizado, o BSQ, avalia somente a insatisfação por excesso de peso (Vieira, Sabadin, & Marques de Oliveira, 2008). Diante disso, justifica-se, também, a menor prevalência de insatisfação com IC verificada no sexo masculino, em relação ao feminino, no presente estudo.

A partir dos resultados obtidos, destaca-se que a prevalência de inatividade física (14.5%) está abaixo da identificada em outras investigações que utilizaram o IPAQ em universitários. Rodrigues, Cheik, e Mayer (2008) encontraram prevalência de inatividade física de 29.9% em universitários de Gurupi ' TO. Entre acadêmicos de uma universidade pública de João Pessoa - PB, Fontes e Vianna (2009) identificaram uma prevalência de 31.2%. Apesar da prevalência de inatividade física encontrada ser inferior a outras investigações, a elaboração de ações voltadas para a motivação à prática de atividade física torna-se necessária, a fim de que os universitários sejam estimulados a se inserirem ou permanecerem em programas de atividade física.

Ao comparar as prevalências de inatividade física entre os sexos, observou-se que a mesma foi superior no sexo feminino em relação ao masculino. Este resultado converge com o de Silva et al. (2007) que, ao avaliarem o NAF de estudantes universitários de Juiz de Fora ' MG, verificaram que 32% das mulheres eram inativas, enquanto somente 6% dos homens apresentaram esta condição. Uma possível explicação para essa constatação refere-se à distribuição de papéis na sociedade. Entre as moças, parece existir menor reforço social para a prática de exercícios físicos e maior dependência para atividades vinculadas às artes e tarefas domésticas (Taylor et al., 1999).

No que se refere à associação entre IC e NAF, a atual investigação demonstrou que, independente do sexo, a IC não está relacionada ao fato de o indivíduo ser ativo ou inativo. Adami e Vasconcelos (2008) encontraram resultados semelhantes em adolescentes de escolas públicas de Florianópolis ' SC. Desta forma, os autores apontam que o NAF não influencia a insatisfação com a IC, indicando que outros fatores, dentre eles, a internalização do ideal de beleza corporal, influências do meio social e familiar e o IMC apresentam maior influência sobre a IC do que o NAF.

Com relação à associação entre a IC e o estado nutricional verificou-se que os universitários com excesso de peso foram os que apresentaram as maiores prevalências de insatisfação com a IC. Estes achados corroboram estudos realizados com universitários (Kakeshita & Almeida, 2006), os quais aplicaram o mesmo instrumento para a avaliação da IC. Resultados semelhantes têm sido observados no ensino médio (Petroski & Glaner, 2009) e, de acordo com o observado na presente investigação, a tendência parece manter-se no ensino superior.

O resultado do presente estudo pode ser justificado devido a uma forte tendência cultural em considerar a magreza como uma situação ideal de aceitação social, sobretudo, no sexo feminino (Schwartz & Brownell, 2004). Desta forma, o excesso de peso pode conduzir a um afastamento do ideal de beleza, o que reflete percepção negativa da própria IC (Stipp & Marques de Oliveira, 2003).

Como principais limitações do estudo destacam-se: 1) o delineamento transversal, o que impede o estabelecimento de inferência causal; 2) o uso do BSQ-34 para verificar a insatisfação com a IC, pois este questionário permite avaliar a insatisfação pelo excesso de peso.

Os resultados observados no presente estudo permitem concluir que a insatisfação com a IC está associada ao estado nutricional, sendo que os universitários com excesso de peso foram os mais insatisfeitos, quando comparados àqueles com baixo peso e peso normal. Diante disso, verifica-se que a propagação de estereótipos magros, sobretudo, para o sexo feminino, tem influenciado cada vez mais a busca por estes padrões, principalmente, entre os indivíduos com excesso de peso. Desta forma, este fato deve ser utilizado como indicação para a promoção de mudanças no estilo de vida que visem a adequação a um estado nutricional mais saudável, provocando, também, mudanças positivas na IC.

Ademais, sugere-se a realização de estudos experimentais que analisem a influência da prática da atividade física na insatisfação com a IC em estudantes universitários, uma vez que este assunto deve ser mais explorado para o avanço do conhecimento relacionado a esta temática na área da saúde.


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