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EuPTCVHe1646-69182012000400003

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National varietyEu
Year2012
SourceScielo

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Necessidade e Criatividade PÁGINA DA SPC Necessidade e Criatividade J. C. Mendes de Almeida

A necessidade é a mãe da invenção. Face às correntes dificuldades em que Portugal se encontra, que recorrer a toda a capacidade criadora. É obrigação dos cirurgiões tentar oferecer, a quem os procura, o melhor que sabem e podem fazer. Em tempo de restrição, deve recorrer-se a todo o engenho para atingir aquele objectivo.

Nesta época adversa, o principal desafio que se coloca aos Cirurgiões é talvez dos mais difíceis de alcançar. É aquele de fazer o mesmo com menos, com muito menos. Esta circunstância não vai ser uma opção, vai ser um constrangimento.

Parte importante dos gastos inerentes à Cirurgia são controláveis pelos Cirurgiões. Assim haja vontade. É possível realizar, com eficiência e segurança, um grande número de actos utilizando menos recursos. Os materiais descartáveis, os dissectores e coaguladores, as colas e as suturas mecânicas são em muitas, verdadeiramente muitas, situações dispensáveis. Representam uma parte importante dos custos inerentes à nossa actividade. A limitação do seu uso não irá ser facultativa, vai ser imposta. que fazer as mesmas cirurgias sem dispôr, em muitos casos, destes recursos. pela restrição à sua utilização será possível dispôr deste equipamentos para as situações em que estes se tornam verdadeiramente imprescindíveis.

Outra das fontes de consumo, em que os Cirurgiões podem melhorar os orçamentos cirúrgicos, é a gestão do internamento. Para além da desejável ambulatorização de um conjunto importante de procedimentos, que optimizar o tempo de internamento. Se, na realidade, uma parte substancial deste não é controlável pelos clínicos, existe todo um conjunto de medidas que o podem melhorar de forma extremamente significativa. A primeira é a excelência dos cuidados. Boa cirurgia implica menos complicações e, consequentemente, menor tempo de internamento. Segundo, a utilização generalizada de protocolos ERAS (Enhanced Recovery After Surgery), vulgarmente conhecidos como "fast-track", pode ter um impacto enorme na duração da estadia hospitalar. Esta abordagem é actualmente empregue por vários centros nalgumas áreas cirúrgicas, nomeadamente na cirurgia colo-rectal. Pode também ser aplicada, com grande vantagem, a quase todo o universo cirúrgico, incluindo a cirurgia da mama, gastro-esofágica e hepato-bilio-pancreática. Terceiro, a preocupação genuína na redução dos tempos de internamento leva a um conjunto de medidas junto do doente e da sua família que podem ter um resultado muito significativo.

Incluem-se neste grupo actuações como a alta hospitalar durante o fim-de- semana, a comunicação da data previsível de alta aquando do internamento, a alta com drenos, a identificação e referenciação ao Serviço Social dos casos problema logo na admissão, e ainda muitas outras medidas de natureza semelhante.

Seguramente que uma das grandes dificuldades, que os serviços cirúrgicos vão enfrentar num futuro próximo, reside na limitação e regulamentação dos períodos de trabalho extraordinário. Os serviços com maior actividade em regime de urgência serão os mais afectados. Com grande probabilidade irão ocorrer situações aparentemente irresolúveis ou que, no mínimo, colocacarão problemas de muito difícil solução. A resposta possível para estas dificuldades, poderá nem sempre ser a ideal, mas deve ser procurada com o maior engenho.

Provavelmente reside numa modificação de paradigma, numa forma organizativa diferente. Uma das soluções possíveis reside na autonomização, mais ou menos acentuada, das equipas cirúrgicas de urgência. Pode esta organização assumir várias formas, da criação efectiva de uma unidade dedicada, à, mais simples, constituição de equipas fixas que asseguram uma parte substancial do serviço de urgência. A modificação organizativa permitirá, entre outras consequências, derivar um conjunto importante de intervenções, normalmente realizadas durante os períodos da tarde ou da noite, para o período da manhã e, assim, enquadra-la num regime sem trabalho extraordinário. Estes esquemas permitirão reduzir o número de cirurgiões de serviço durante os períodos em que aquele regime de trabalho se torna mandatório.

Outra área em que é possível melhorar, e que tem um importante consumo de horas cirúrgicas, é a dita "Pequena Cirurgia". Uma vasta proporção destes actos não necessitam de um cirurgião para serem realizados. Médicos adequadamente ensinados, preparados por um curso ou outro tipo de formação, podem assegurar cerca de 90% dos actos deste tipo. O impacto desta organização na disponibilidade dos cirurgiões para outras tarefas é seguramente importante.

Ainda se pode identificar uma outra componente importante de consumo da disponibilidade de tempo cirúrgico, a dita triagem cirúrgica. Se, de forma protocolada, os cirurgiões forem chamados a observar apenas doentes urgentes observados pelo médico de primeira linha, o dispêndio de tempo cirúrgico será muito menor. claramente um importante conjunto de medidas que podem melhorar de forma muito significativa os gastos de tempo e, consequentemente, reduzir a dimensão das equipas de urgência. Seguramente que estas formas organizativas, se não forem implementadas pelos serviços cirúrgicos, serão impostas, seguramente de forma menos eficaz e aceitável, pelas administrações hospitalares. por isso que tomar a iniciativa e ser activos na procura de soluções para este difícil problema.

As dificuldades presentes são incomparavelmente menores do que aquelas que teremos de enfrentar num futuro próximo. O horizonte que se aproxima é mesmo muito negro. É através da concentração de recursos nas actividades e centros operacionais essenciais que será possível manter a prática assistencial. O tempo que se avizinha é o do possível, não o do desejável. É através da eliminação do supérfluo que se pode conservar o fundamental.

Face ao descalabro de um país e, também, do seu sistema de saúde que fazer uma mudança de paradigma.


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