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EuPTCVHe1647-21602012000100003

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National varietyEu
Year2012
SourceScielo

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Reconhecimento da Depressão e Crenças sobre Procura de Ajuda em Jovens Portugueses Reconhecimento da Depressão e Crenças sobre Procura de Ajuda em Jovens Portugueses Introdução Jorm et al. (1997a) introduziram o termo 'literacia em saúde mental' e definiram-no como "o conhecimento e as crenças acerca das perturbações mentais que ajudam no seu reconhecimento, gestão e prevenção", circunscrevendo-o ao campo das intervenções em adolescentes e jovens. A literacia em saúde mental é composta por vários componentes: a) a capacidade de reconhecer perturbações específicas ou diferentes tipos de sofrimento psicológico; b) conhecimentos e crenças sobre fatores de risco e causas; c) conhecimentos e crenças sobre intervenções de autoajuda; d) conhecimentos e crenças sobre ajuda profissional disponível; e) atitudes que facilitam o reconhecimento e a procura de ajuda apropriada; e f) conhecimentos sobre como procurar informação sobre saúde mental (Jorm, 2000). O mesmo autor (Jorm, 1997; 2000) tem estudado estas questões em adolescentes e jovens porque a adolescência e a juventude (15-24 anos) são etapas críticas, caracterizadas por alterações no contexto de vida dos indivíduos, em que os problemas relacionados com o bem-estar têm profundo impacto na vida adulta (Jorm, 2000; OMS, 2001).

Nesta faixa etária o reduzido nível de literacia em saúde mental é responsável pela perpetuação do estigma, agravamento dos sintomas, adiamento da procura de ajuda profissional, agravado nos adolescentes e jovens com reduzido nível de interação com o sistema de saúde.

Dos vários componentes da literacia apresentados depreende-se que uma literacia em saúde mental reduzida vai não impedir o reconhecimento precoce das perturbações mentais, influenciar o comportamento de procura de ajuda e o acesso aos tratamentos mais adequados, como também perpetuar o estigma face aos doentes mentais. A elevada prevalência das perturbações mentais (50%, segundo Kessler et al., 1994, citado em Jorm, 2000), juntamente com os fatores referidos, reveste de enorme importância o incremento da literacia em saúde mental.

No caso da literacia em saúde mental de adolescentes e jovens, este problema agudiza-se porque se sabe que esta idade representa o ponto auge de início de uma doença mental, com metade dos indivíduos que vão sofrer de uma doença mental a experienciar o seu primeiro episódio antes dos 18 anos (Kelly et al., 2011). Estima-se na atualidade que nos adolescentes e jovens a prevalência de perturbações do foro mental como são a depressão, o abuso de substâncias, os distúrbios de ansiedade, os distúrbios de comportamentos alimentares e inclusive as perturbações psicóticas, se situem entre os 15 e os 20%.

Contudo, os estudos têm demonstrado de forma consistente que a maioria dos adolescentes e jovens não procuram nem recebem a ajuda ou o tratamento adequados. A identificação e o tratamento precoces de dificuldades emocionais em adolescentes e jovens são uma prioridade tanto para os profissionais de saúde como para os educadores (Santor et al., 2007).

O reconhecimento precoce e a procura de ajuda apropriada vão ocorrer se os jovens e a sua família, professores e amigos souberem quais são as alterações precoces provocadas pelas perturbações mentais, os melhores tipos de ajuda disponíveis e como aceder a esta ajuda, conhecimentos e aptidões que foram definidos como 'literacia em saúde mental'.

Metodologia

Participantes A amostra deste estudo é constituída por jovens (n=860) com uma média de idades de 18,74 anos (dp=1,67 anos), sendo a mediana de 18 anos e a moda também de 18 anos. No que respeita ao género observa-se que 84% são do género feminino, representando o género masculino apenas 16% da amostra. Em relação ao distrito onde residem, observa-se que 27,4% residem no distrito de Coimbra, 16,5% em Leiria, 9,0% em Aveiro, 11,4% em Viseu, 5,9% em Castelo Branco e 25% noutros distritos limítrofes aos distritos considerados, como são exemplo, Santarém, Portalegre, Porto, entre outros (Quadro 1).

QUADRO 1 ' Distribuição percentual das variáveis género e distrito de residência dos participantes

Nas habilitações literárias dos pais podemos verificar que a distribuição, tanto no pai como na mãe, é relativamente semelhante (Quadro 2). As habilitações do pai concentram-se na sua maioria nos 4 primeiros "níveis" (Ensino básico ' Ciclo (antiga classe); Ensino básico ' Ciclo (Ensino preparatório ' antigo ano); Ensino básico ' Ciclo ' Curso geral dos liceus ( ano); Ensino secundário (Curso complementar dos liceus).

QUADRO 2 ' Habilitações literárias dos pais

Observa-se que apenas 11,3% dos pais têm formação superior. Ao nível das mães, os valores são ligeiramente diferentes dos pais que tanto no ensino básico ' Ciclo (16,7%), como Ensino básico ' Ciclo (17,3%), as percentagens são menores; 14,2 % das mães têm formação ao nível do ensino superior. Para o global da amostra, tanto os pais como as mães, têm na maioria os níveis do Ensino básico ' Ciclo ' Curso geral dos liceus ( ano) e do Ensino secundário (Curso complementar dos liceus).

Instrumento O Questionário de Avaliação da Literacia em Saúde Mental (QuALiSMental), versão validada para a população Portuguesa por Loureiro, Pedreiro e Correia (2012), é composto por três cenários (depressão, esquizofrenia e problemas associados ao consumo de álcool), com nove secções que incluem os seguintes domínios: a) Reconhecimento das perturbações; b) Ações de Procura de Ajuda e Barreiras percebidas; c) Crenças e intenções sobre prestar a primeira ajuda; d) Crenças sobre intervenções; e) Crenças sobre Prevenção; f) Atitudes Estigmatizantes e Distância Social; g) Exposição (familiaridade) com as perturbações mentais; h) Impacto das campanhas e da exposição nos meios de comunicação. Inclui ainda a versão breve do Inventário de Crenças acerca das Doenças e Doentes Mentais (ICDM) de Loureiro (2008).

Procedimentos O questionário foi realizado em contexto de sala de aula, na forma de autorrelato escrito, em sessões coletivas, sempre com a presença de um professor e um investigador. Ao aluno eram apresentadas três vinhetas que preenchiam os critérios para depressão, esquizofrenia e abuso de substâncias (álcool), respetivamente, seguidas de 18 questões que pretendiam avaliar os conhecimentos dos adolescentes e jovens nos domínios referidos. A vinheta que descreve a depressão, cujos resultados são aqui analisados, era a seguinte: "A Joana é uma jovem de 16 anos que se tem sentido invulgarmente triste durante as últimas semanas. Sente-se sempre cansada e tem problemas para adormecer e manter o sono. Perdeu o apetite e ultimamente tem vindo a perder peso. Tem dificuldade em concentrar-se no estudo e as notas desceram. Mesmo as tarefas do dia-a-dia lhe parecem muito difíceis, pelo que tem adiado algumas decisões. Os seus pais e amigos estão muito preocupados com ela."

Análise dos Resultados As respostas consideradas corretas no reconhecimento do problema descrito na vinheta foram as que apresentavam obrigatoriamente a seleção apenas de depressão, e as várias associações de depressão com problemas psicológicos/ emocionais/mentais, doença mental, stresse e tem um problema. Na resposta à questão "Na tua opinião, o que é que se passa com a Joana?", 32% da amostra reconhece como depressão os sintomas descritos na vinheta.

Na questão relativa à confiança que o jovem sente em procurar ajuda caso estivesse na mesma situação que a da vinheta ("Se estivesses a viver atualmente uma situação como a da Joana, procurarias ajuda?"), observa-se que a afirmação da intenção de procura de ajuda é de 66,3%. Contudo, na opção de resposta "Não sei" se procuraria ajuda, os valores ainda correspondem a 29,7% da amostra. Apenas 4,1% da amostra refere que não procuraria ajuda caso estivesse numa situação semelhante à da Joana (Quadro 3).

QUADRO 3 ' Distribuição percentual das respostas ao item da procura de ajuda

Em relação à pessoa ou pessoas a quem dirigiria o pedido de ajuda, foi utilizado o formato de resposta tipo Likert, de 1 (De modo nenhum) a 5 pontos (Seguramente). Observa-se que os jovens elegeram a mãe como pessoa a quem pedir ajuda (valores médios de x=4,21), seguido dos namorados/as (valores médios de x=4,02). Salientam-se ainda os valores médios reduzidos dos professores como pessoas a quem pedir ajuda (em redor dos 2 pontos).

Quando questionados em que medida se sentem confiantes para pedir ajuda às pessoas selecionadas, verifica-se que o nível de confiança em pedir ajuda situa-se nos valores próximos dos 3,00 pontos. O formato de resposta era novamente do tipo Likert de 1 (Muitíssimo confiante) a 5 pontos (Nada confiante).

Nas questões relativas às barreiras percebidas à procura de ajuda (quadro 4), verificamos que os impedimentos mais comuns à procura de ajuda são: considerar- se uma pessoa tímida (41,28%), a pessoa não valorizar o que se diz (36,63%), pensar que nada poderá ajudar (33,72%), seguido do medo da pessoa partilhar a informação sobre o problema com outra pessoa (28,02%).

QUADRO 4 ' Distribuição percentual das respostas (afirmativas) aos itens de impedimento à procura de ajuda

Na questão com quem estaria à vontade para falar, caso estivesse numa situação similar à da Joana (quadro 5), podemos observar que a pessoa de eleição é a mãe (77,3%), seguida do pai (40,8%). A opção "Não sei" apresenta valores de 12,9%.

QUADRO 5 ' Distribuição percentual das respostas (concordância) ao item da perceção da pessoa com quem estaria à vontade para falar

Discussão dos Resultados O reconhecimento da depressão por estes jovens portugueses foi inferior ao observado em vários estudos de outros países, em que a identificação desta perturbação rondou os 50% (Wright et al., 2005; Burns & Rapee, 2006; Klineberg et al., 2010; Khan et al., 2010).

Apesar do baixo reconhecimento da depressão (32%), a intenção de procura de ajuda face a este cenário atingiu mais de 66%, no entanto no estudo de Burns e Rapee (2006) este valor foi muito superior, uma vez que cerca de 93% dos participantes consideram necessária a ajuda de outra pessoa para lidar com o problema. Segundo Wright, Jorm e Mackinnon (2007) é na depressão que se verifica uma maior intenção de procurar ajuda, mas 16,4% dos jovens inquiridos por Klineberg et al. (2010) recorreriam ao médico se tivessem o mesmo problema.

As fontes informais privilegiadas na procura de ajuda são a família e os amigos e as formais são o médico e o psicólogo (Sheffield, Fiorenza & Sfronoff, 2004). No estudo de Kelly, Jorm e Rodgers (2006) 23% dos adolescentes consideraram útil a ajuda do pai, de um professor ou de um conselheiro. estes jovens portugueses afirmam que seguramente se sentiriam confiantes para pedir ajuda à mãe e aos/às namorados/as, sendo que dificilmente o fariam a um professor e 40,8% falaria sobre o assunto com o pai.

Relativamente às barreiras percebidas na procura de ajuda Hernan et al. (2010) verificaram que os adolescentes valorizaram mais as barreiras pessoais em detrimento das logísticas. Outros estudos analisados referem questões relacionadas com a confidencialidade, com os custos, com o facto de não saberem onde procurar ajuda e pensarem que resolvem os problemas sozinhos; dúvidas acerca da utilidade do tratamento; a vergonha e o não querer falar com desconhecidos; (Sheffield, Fiorenza & Sfronoff, 2004; Speller, 2005; Wilson, Rickood & Deane, 2007). À semelhança daqueles, os jovens portugueses referiram fatores relacionados com falta de confiança tanto em si próprios - "considerar-se uma pessoa tímida" - como nas pessoas que os poderão ajudar, assinalando tanto a desvalorização da resolução do problema sob o olhar do próprio ' "nada poderá ajudar", como das pessoas que poderão ser vetores de ajuda ' "a pessoa não valorizar o que se diz".

Conclusão O reconhecimento da depressão por parte desta amostra de jovens apresenta valores muito baixos para aquilo que seria expectável. Contudo, a intenção de procura de ajuda apresenta valores mais elevados, demonstrando que apesar de não conseguirem reconhecer, muitos jovens procurariam ajuda se experienciassem um quadro de depressão; tendo-se verificado também que existem muitos jovens que não sabem se procurariam ajuda num caso como o da vinheta.

A mãe surge como primeira opção para pedir ajuda, caso se encontrem na mesma situação que a da Joana. Estes resultados refletem a preferência dos jovens por ajuda informal em vez de ajuda profissional quando confrontados com um problema de saúde mental. Realçamos também o papel relevante dos namorados/as como fonte de procura de ajuda se os jovens enfrentassem uma situação semelhante à Joana, enquanto os professores não surgem como uma fonte de ajuda preferencial. Em relação à confiança para pedir ajuda a essa pessoa, verificou-se que o nível de confiança é elevado.

Estes resultados implicam uma maior necessidade de promover a correta identificação do problema de forma a evitar grandes desfasamentos entre a linguagem do senso comum e a dos profissionais, o que permitirá a adequada procura de ajuda e facilitará a interação entre todos os possíveis atores deste processo. Focar aspetos relativos à procura de ajuda apropriada, como a procura de profissionais de saúde especializados é importante na medida em que estes jovens valorizam o apoio informal.

Os resultados demonstram que são necessárias ações de educação e sensibilização para a saúde mental em contexto escolar, de forma a elevar os valores de literacia em saúde mental dos adolescentes e jovens portugueses. O aumento da literacia em saúde mental levará a um reconhecimento precoce e correto das perturbações mentais, levando a comportamentos de procura de ajuda adequados e melhores resultados futuros.


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