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EuPTCVHe1647-21602014000100005

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National varietyEu
Year2014
SourceScielo

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Indicadores de saúde mental como fatores preditores de fragilidade nos idosos

Introdução A fragilidade tem vindo a merecer uma atenção crescente por parte dos clínicos e investigadores, o que fez espoletar um aumento do termo na literatura atual.

Contudo verifica-se alguma confusão na utilização do mesmo, pois em inúmeras situações este é mencionado sem na realidade fazer referência ao que se pretende enunciar, facto do qual emana a necessidade de se clarificar este conceito no seio dos múltiplos modelos teóricos que o procuram fundamentar. Da análise temporal dos modelos teóricos existentes, constata-se o reconhecimento de uma progressiva complexificação do conceito desde a sua origem até às abordagens mais contemporâneas. Este conceito nasce nos modelos de cariz mais biológico e evolui até aos modelos multidimensionais que explicam o conceito de fragilidade nas pessoas idosas.

Um dos contributos de destaque prende-se com o estudo longitudinal de Fried e colaboradores (2001) que fundamenta o Fenótipo de Fragilidade através da presença de três ou mais dos seguintes indicadores: 1)perda de peso:não intencional no último ano, 5% do peso corporal no ano anterior (por medição direta do peso); 2) fraqueza: diminuição da força (medida com o dinamómetro); 3) exaustão: auto relato de fadiga, identificado por duas questões da Escala de Depressão do Centro de Estudos Epidemiológicos (CES-D); 4) lentidão: medida pela velocidade da marcha, indicada em segundos (distância de 4,6m) e 5) nível de atividade: resultado calculado de quilocalorias (kcal) gastas por semana e medido em função do auto relato das atividades e exercício físico realizados.

Desta forma, os autores definiram três níveis de fragilidade: quando o sujeito apresenta três (ou mais) destes critérios é considerado frágil, quando apresenta um ou dois destes indicadores considera-se no estádio pré - frágil e os que não apresentam nenhum comprometimento a este nível são considerados robustos (não frágeis) (Fried et al., 2001). Sabe-se que esta condição potencia o risco de incapacidade, institucionalização, hospitalização e morte (Strandberg, Pitkãlã & Tilvis, 2011). Da revisão da literatura efetuada é identificada uma panóplia de fatores predisponentes desta condição, onde estão também presentes indicadores de saúde mental, mais precisamente ao nível da cognição e do humor.

No que se refere ao domínio cognitivo, vários são os estudos que fundamentam a associação entre a fragilidade física, com o desempenho intelectual (Ávila ' Funes et al., 2009; Fried et al., 2001; Samper- Ternent, Snih, Raji, Markides & Ottenbacher, 2008). O projeto Rush Memory and Aging Project constatou que o risco de se desenvolver doença de Alzheimer foi de 2,5 vezes superior quando a fragilidade física estava presente (Buchman, Boyle, Wilson, Tang & Bennett, 2007). Outro dos estudos, é o Three- City Study que demonstrou que o declínio cognitivo é considerado um indicador preditivo da fragilidade fenotípica. Outros estudos corroboram estes resultados, na medida em que sugerem que o estado cognitivo dos indivíduos é considerado um marcador de risco da fragilidade fenotípica (Raji, Snih, Ostir, Markides & Ottenbacher, 2010). No Italian Longitudinal Study on Aging - ILSA constatou-se que o baixo desempenho cognitivo e a presença de sintomas depressivos estão associados com a fragilidade física (Solfrizzi et al., 2011). No Brasil, umas das linhas do projeto Fragilidade em Idosos Brasileiros ' FIBRA constatou que as pessoas frágeis tinham um desempenho cognitivo pior, do que os pré-frágeis e os não frágeis (Yassuda et al., 2012). Os resultados do Jerusalem Longitudinal Cohort Studydemonstraram que a condição de fragilidade está significativamente associada ao comprometimento cognitivo, com umodds ratio (OR)de 3,77 (Jacobs, Cohen, Ein - Mor, Maaravi & Stessman, 2011).Todavia, estes estudos não são totalmente conclusivos, pois parece existir um conjunto de mecanismos que influenciam mutuamente a condição de pessoa idosa frágil e a sua associação com a cognição. Deste modo, ressalva-se a necessidade de mais estudos, neste domínio, no sentido de se explicar esta relação, bem como perceber a progressão da condição de fragilidade (Shatenstein, 2011).

No que diz respeito ao estudo do humor relacionado com a condição de pessoa idosa frágil a maioria dos resultados relata uma associação positiva entre a sintomatologia depressiva e a condição de fragilidade (Mezuk, Edwards, Lohman, Choi & Lapane, 2011). Contudo a investigação empírica espelha uma relação bidirecional entre estas duas condições. Gayman, Turner e Cui (2008) apuraram que a condição de fragilidade estava significativamente associada à sintomatologia depressiva. Chang e colaboradores (2009) atestaram que a fragilidade foi fortemente associada à presença de sintomas depressivos, no início da manifestação da fragilidade.

Em suma, parece que a condição de pessoa frágil assume uma interligação com a saúde mental, nomeadamente défice cognitivo e sintomatologia depressiva o que sustenta a pertinência do presente trabalho empírico que visa identificar dimensões relacionadas com a saúde mental que possam ser preditoras da condição de fragilidade fenotípica.

Metodologia A metodologia de investigação alicerçou-se num conjunto de passos investigacionais ao nível da composição da amostra, definição do instrumento utilizado e nomeação dos procedimentos para que a trabalho empírico fosse operacionalizado. Trata-se de um estudo transversal correlacional.

Amostra Este estudo conta com uma amostra representativa, estratificada por classes etárias, de pessoas idosas a residirem na comunidade, no concelho de Guimarães, oriundas de 10 freguesias de duas comissões sociais. A definição das percentagens para cada um dos estratos realizou-se a partir dos dados do Censos 2001 (INE, 2002) relativos ao referido concelho. A amostra foi estratificada em três faixas etárias: entre 50- 59 anos (39,5%) 134 sujeitos; entre 60 ' 69 anos (31,6%) 107 sujeitos; entre 70 ' 79 anos (19,8%) 67 sujeitos e com mais de 80 anos (9,1%) 31 sujeitos, que perfaz um total de 339 inquiridos.

Instrumentos Desenvolveu-se um protocolo alargado, que integrou os critérios ajustados ao modelo de fragilidade fenotípica: 1) perda de peso, 2) resistência, 3) fraqueza, 4) nível de atividade física e 5) lentidão (Fried et al., 2001); indicadores biocomportamentais e geriátricos, funcionalidade (Atividades de Vida Diária e Atividades Instrumentais de Vida Diária) e por fim indicadores de saúde mental (cognição e humor). A capacidade mental foi avaliada através Mini Exame do Estado Mental (Folstein, Folstein & McHugh, 1975) e a presença de sintomatologia depressiva com a Escala de Depressão Geriátrica (versão 15) (Sheikh & Yesavage, 1986).

Procedimentos Os procedimentos incluem um conjunto de tarefas de forma a agilizar a investigação empírica. Desta forma, foi constituída uma equipa, composta por dez profissionais de saúde, devidamente instruídos e treinados para a recolha de dados no domicílio. Cada protocolo foi administrado num único momento de avaliação e demorou cerca de 45 minutos a ser aplicado. Foram salvaguardados os princípios éticos e os direitos fundamentais do anonimato, do sigilo e da confidencialidade. Recorreu-se ao consentimento informado escrito. Para os procedimentos estatísticos recorreram-se a determinadas estratégias de análise, que passaram pela criação de um modelo ajustado ao modelo de Fried e colaboradores (2001) e definição da variável dependente (frágil vs não frágil) para a aplicação do Modelo de Regressão Logística, no sentido de se averiguar o poder preditivo das variáveis de saúde mental na condição de fragilidade. O suporte estatístico utilizado foi o SPSS - Statistical Package for Social Sciences, versão 20.0.

Resultados Os resultados são apresentados em três patamares distintos, mais precisamente ao nível descritivo, com a caraterização sociodemográfica da amostra, prevalência do fenótipo de fragilidade e por fim ao nível inferencial, com aplicação do modelo de regressão logística. A amostra é composta por 158 Homens (46,6%) e 181 Mulheres (53,4%). A média (m) de idades é de 64,4 anos, com um desvio padrão (dp) de 9,25 anos. Ao nível do estado civil, 4,7% dos participantes são solteiros, 82% são casados e os restantes (13,3%) são viúvos, separados ou divorciados. Em termos do nível de literacia destaca-se que 11,2% da amostra são iletrados e os restantes 88,8% frequentaram a escola (Tabela_1).

Quanto ao estudo da prevalência da fragilidade fenotípica, verifica-se que 14,2% das pessoas idosas não pontuaram em nenhum dos cinco critérios de fragilidade; 172 (50,9%) pontuaram em um a dois critérios de fragilidade e 118 (34,9%) assumiu três a cinco critérios definidos pelo fenótipo de fragilidade (Tabela_2). É de salientar que um dos sujeitos foi eliminado do estudo porque não preencheu parte destes critérios, o que fez com que fosse excluído da amostra final.

No que se refere ao estudo inferencial verifica-se que os indicadores de saúde mental estão relacionados com a condição de fragilidade de forma estatisticamente significativa (p <0,05) no modelo não ajustado, considerando um intervalo de confiança (IC) a 95%. O mesmo se verifica quando se testa o modelo ajustado a estas mesmas variáveis e às variáveis sociodemográficas sexo e idade. Desta forma, um idoso que apresente défice cognitivo assume 2,9 vezes maior probabilidade de ser frágil (OR=2,9, IC 95%: 1,6 - 5,3) relativamente a um idoso que não apresente défice cognitivo. No mesmo sentido, relaciona-se a presença de sintomatologia depressiva, verificando-se que uma pessoa idosa que apresente humor deprimido tem 4,2 vezes maior probabilidade de assumir características de uma pessoa frágil, quando comparada com uma pessoa idosa que não apresente humor deprimido (OR=4,2, IC 95%: 1,9 - 9,2). No geral, estes resultados demonstram o comprometimento ao nível cognitivo, e a presença de sintomatologia depressiva como fatores preditores de fragilidade, controlando para as variáveis sociodemográficas (Tabela_3).

Discussão Quanto à prevalência do fenótipo de fragilidade, é evidente o impacto desta síndrome na população em que 34,9% foram considerados frágeis. À semelhança com outros estudos, que testaram o fenótipo de fragilidade, este resultado encontram-se dentro do intervalo detetado, que varia ente 4,0- 59,1% (Collard, Boter & Schoevers, 2012). Contudo, ressalva-se que a prevalência da fragilidade varia amplamente, em função da definição do conceito (que tem implicações no instrumento de avaliação utilizado), bem como na da população estudada. Esta prevalência poderá advir do facto desta população ser uma comunidade assinalada, pelos agentes locais, por apresentar alguns indicadores de maior vulnerabilidade e alguma carência social. No entanto, é de salientar que metade da amostra (50,9%) encontra-se na condição de pré- fragilidade. Aqui os resultados encontram-se equiparados a outros estudos de referência (Graham et al., 2009; Santos - Eggimann, Cuénoud, Spagnoli & Julien, 2009). Este é um dado importante, pois a literatura, baseando-se em estudos longitudinais, sustenta a ideia de que as pessoas que se encontram neste estádio apresentam grande probabilidade, com o avançar dos anos, de transitarem para a condição de frágil (Gill, Evelyne, Gahbauer, Heather & Han, 2006). Com uma percentagem mais reduzida, 14,2% da amostra foi considerada não'frágil (robusta).

Do modelo de regressão logística para a fragilidade ajustado à saúde mental, controlando as variáveis sociodemográficas (sexo e idade) denota-se que ambos os indicadores de índole psicológica, foram identificados como preditores da condição de pessoa idosa frágil. No que diz respeito, ao valor preditivo do padrão cognitivo para a condição de fragilidade denota-se, neste estudo, que as pessoas que apresentam comprometimento ao nível cognitivo assumem 2,9 vezes de probabilidade de risco de serem frágeis (OR=2,9, IC 95%:1,6- 5,3s. A literatura sustenta esta mesma premissa, com um conjunto de estudos nesta área (Ávila ' Funes et al., 2009) Por outro lado, destaca-se o peso do valor preditivo do humor para a condição de pessoa idosa frágil, em que a probabilidade de uma pessoa que apresente uma sintomatologia depressiva ser frágil é 4,2 vezes superior (OR=4,2, IC 95%: 1,9 - 9,2). Este indicador assume valor preditivo mais alto, o que reflete a importância das condições emocionais e afetivas do sujeito, enquanto potenciadoras de fragilidade. Na realidade a literatura assume uma relação bidirecional entre a depressão e a fragilidade (Mezuk et. al., 2011), sendo vários os estudos transversais e de coorte que explanam esta relação nos dois sentidos. Por sua vez, as investigações acerca da condição de fragilidade e o défice cognitivo são escassas, todavia parece evidente que existe uma relação entre estas condições (Buchman et al., 2007). Contudo, no seio da comunidade científica ainda não consenso no que concerne à definição clara e evidente da relação entre estas duas condições do foro mental e a fragilidade nos idosos.

Conclusões Conclui-se que a fragilidade fenotípica apresenta uma prevalência significativa na população estudada, o que reforça a atenção e a necessidade de se estudar esta síndrome nos idosos a viver na comunidade sem qualquer tipo de assistência médica. É evidente que o comprometimento ao nível da saúde mental das pessoas idosas é um fator predisponente para a condição de fragilidade.

Assim sendo, torna-se pertinente para a prática clínica, o desenvolvimento de estratégias de intervenção focadas no desempenho cognitivo e no humor de forma a retardar e a minorar a condição de fragilidade associada ao processo de envelhecimento.


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