Intenções empreendedoras dos estudantes do ensino secundário: o caso do
programa de empreendedorismo na escola
JEL:I21
INTRODUÇÃO
O Entrepreneurship Center da Universidade de Miami define que o
empreendedorismo é o processo de identificação, desenvolvimento e captação de
uma ideia para a sua concretização. O resultado final deste processo
(desenvolvimento de uma ideia inovadora ou identificação de uma oportunidade) é
a criação de uma nova empresa, atendendo às condições de risco e a uma
considerável incerteza (Sarkar, 2010). De acordo com o Global Entrepreneurship
Monitor,o empreendedorismo é considerado como uma qualquer tentativa de criar
um novo negócio que pode envolver o autoemprego, uma nova organização
empresarial ou a expansão de um negócio já existente, por um individuo ou
equipa de indivíduos (GEM, 2012).
A junção dos termos educação e empreendedorismo é relevante, uma vez que a
sociedade precisa de contribuir mais e melhor para o desenvolvimento integrado
dos cidadãos, pois há um papel mais importante a desempenhar: ser empreendedor.
Assim sendo, há que apostar em escolas e instituições empreendedoras de forma a
que a sociedade seja mais capaz de enfrentar contratempos e responder com
inovação e novas iniciativas. É também nestas mesmas escolas que está todo o
potencial, os estudantes, e são eles que são os futuros empreendedores e sendo
também a eles que se deve prestar um melhor serviço de (in)formação, de
capacidades de liderança, de criatividade, de problem solving(Comissão
Europeia, 2006).
O empreendedorismo pode e deve ser ensinado (Drucker, 1985; Oosterbeek et al.,
2010; Parker, 2007; Kuratko, 2005; Roxas et al., 2008; Kuckertz, 2011) e, mais
importante, incentivado. Várias instituições públicas, mas maioritariamente
privadas, têm colocado à disposição das escolas programas de atividades ligadas
ao empreendedorismo. Essas atividades visam fomentar o empreendedorismo através
de atividades de aprender fazendo, (learning by doing) (Fayolle e DeGeorge,
2006; Kuratko, 2005; Moberg, 2011) do uso da imaginação, criatividade e
inovação, assim como a aplicação destas mesmas características no
desenvolvimento de novos produtos e novos negócios.
Desta forma, esta investigação visa analisar qual o impacto destes programas e
das suas atividades na construção do perfil empreendedor dos estudantes do
ensino secundário e saber se estas mesmas atividades influenciam as suas
intenções futuras.
O programa foi elaborado para os estudantes do ensino secundário e teve como
base a metodologia pedagógica recomendada pelos investigadores desta área,
direcionada para a criatividade e conceptualização abstrata (por exemplo, de
novos produtos) (Rasheed, 2000; Paço et al., 2011; Raposo et al., 2008),
conciliando assim uma vertente teórica com uma componente prática e criativa e
permitindo a conceção de novos produtos inovadores.
Para além desta primeira secção introdutória, o artigo é composto por mais
quatro secções. A segunda apresenta a contextualização teórica à volta do tema
do empreendedorismo e educação para o empreendedorismo. Na terceira secção
apresenta-se a metodologia aplicada. Na quarta secção efetua-se a análise de
resultados através da caracterização da amostra, a apresentação da análise
fatorial desenvolvida e do modelo de regressão logística. Por último, a quinta
secção, apresenta as considerações finais das questões mais relevantes
discutidas ao longo da investigação.
Assim, esta investigação visa ser mais um contributo neste campo recente de
investigação, que é a Educação para o Empreendedorismo, ao nível do ensino
secundário, e um mote para investigações futuras, com o desejo de se conseguir
chegar a respostas e ferramentas mais concretas para o desenvolvimento do
empreendedorismo como prática comum na maioria das escolas secundárias.
FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA: EDUCAÇÃO PARA O EMPREENDEDORISMO
A educação é uma peça fulcral no desenvolvimento de competências de qualquer
indivíduo e contribui para o desenvolvimento de uma sociedade empreendedora. De
acordo com a Comissão Europeia, «é necessário criar na sociedade um ambiente
mais favorável ao empreendedorismo» (CE, 2006, p. 3). Assim, a promoção do
empreendedorismo entre os jovens é um elemento-chave e deve ser incentivada e
desenvolvida. Neste seguimento, é essencial que esta educação para o
empreendedorismo seja facultada desde a mais tenra idade, com início no
primeiro ciclo do ensino básico até aos anos de universidade (Leproute et al.,
2010; Rasheed, 2000; Odegärd, 2011; Kuckertz, 2011; Paço et al.,2011). Não é só
dada importância a este assunto pelos investigadores da área, mas também pelas
entidades públicas, neste caso, pela Assembleia da República Portuguesa, mais
concretamente na Resolução n.º 58/2012.
Na comunicação da Comissão Europeia de 13 de fevereiro de 2006, releva-se
também a importância do ensino secundário profissional, referindo que é neste
ensino «que o empreendedorismo e o emprego por conta própria são mais
frequentemente definidos como objetivos de aprendizagem» (CE, 2006, p. 5).
Refere-se também que é extremamente importante que haja uma formação específica
sobre criação de empresas, dada a estes estudantes, uma vez que estão quase a
entrar na vida ativa e podem encarar o emprego por conta própria como uma opção
válida (Roxas et al., 2008). Daí ser também importante a aposta na
sensibilização e na criação de programas de empreendedorismo no ensino
secundário, que corresponde a um estádio de desenvolvimento importante do
estudante, que pode levar, como foi referido, a considerar a carreira do
autoemprego ou trabalho independente como uma opção de carreira ainda em aberto
(Rasheed, 2000; Alberto e Silva, 2007; Roxas et al.,2008; Huber et al., 2012).
A educação para o empreendedorismo é atualmente uma prioridade na política
levada a cabo pelo mundo industrialmente desenvolvido e em desenvolvimento
(Matlay, 2006; Alberti, 2004; Rasheed, 2000; Postigo et al., 2006). Nas últimas
duas décadas, o número e a variedade de programas de empreendedorismo nas
escolas cresceram consideravelmente, tanto na Europa como em todo o mundo, no
ensino básico, secundário e universitário (Matlay, 2006; Roxas et al., 2008;
Huber et al., 2012; Franco et al., 2010). Em Portugal, muitas entidades
privadas têm desenvolvido, por si só, atividades de empreendedorismo na escola,
em várias localidades e, elas mesmas, têm sido um vetor muito importante na
sensibilização do empreendedorismo junto dos estudantes, se não o mais
importante (Mendes et al., 2011).
Desta forma, torna-se então importante definir a educação para o
empreendedorismo. Na referida Comunicação da União Europeia de 13 de fevereiro
de 2006, foi também definida a «Educação para o Empreendedorismo», como o
processo dinâmico e social onde indivíduos identificam oportunidades para
inovar e transformam as suas ideias em atividades práticas e sinalizadas, seja
num contexto social, cultural ou económico. Nesta definição está indicado o
objetivo principal da educação para o empreendedorismo, onde figura tanto o
desenvolvimento pessoal do indivíduo como o conhecimento formal (Odegärd,
2011).
A investigação feita na área do empreendedorismo é o estudo do impacto destas
atividades de empreendedorismo nos estudantes, mas não geram consensos (Huber
et al., 2012), isto porque em alguns estudos se consegue demonstrar a relação
entre as atividades de empreendedorismo e as intenções futuras dos estudantes
(Odegärd, 2011; Roxas et al., 2008; Paço et al., 2011), enquanto outros não
revelam quaisquer conclusões significativas (Oosterbeek et al., 2010).
Nesta investigação, a questão a responder será se realmente estes programas têm
algum impacto direto nos estudantes (da Escola Secundária) ou se já tudo o que
tinham considerado como válido (abrir uma empresa, ter um perfil empreendedor
na sua vida, ou simplesmente ter um emprego estável e sem intenções de abrir
empresa ou negócio próprio) se mantém inalterado. O programa elaborado para
estes estudantes do ensino secundário teve como base a metodologia pedagógica
recomendada pelos investigadores desta área direcionada para a criatividade e
conceptualização abstrata, por exemplo, de novos produtos (Rasheed, 2000; Paço
et al., 2011; Raposo et al., 2008). Contou, assim, com uma vertente teórica e
com uma componente prática e criativa que permitiu a conceção de novos produtos
inovadores.
Desta forma, foi desenvolvido o programa Empreendedorismo nas Escolas 2011/2012
para apoiar esta investigação. As atividades desenvolvidas passaram por:
reuniões de trabalho com os professores; um Seminário de «Empreendedorismo
Jovem» que contou com a presença de diferentes personalidades, de forma a
passarem as diferentes abordagens de empreendedorismo junto dos estudantes;
Workshopssobre criação de ideias inovadoras e apresentação de ideias em público
e, finalmente, o desenvolvimento de um Concurso de Ideias para os jovens
empreendedores, do ensino secundário.
METODOLOGIA
Amostra e recolha de dados
A população em estudo foram os estudantes do ensino secundário profissional da
Escola Secundária de Estarreja. Esta escola tem um total de 423 estudantes que
frequentam cursos técnico-profissionais.
Estes foram escolhidos como população a estudar uma vez que o ensino
profissional tem vindo a crescer cada vez mais no nosso país e, sobretudo na
região Centro, é uma referência como solução para as necessidades do tecido
empresarial local (Carvalhais, 2009)[1].
Estes estudantes considerados como população da investigação são alunos do
10.º, 11.º e 12.º anos, 175, 129 e 119 estudantes, respetivamente, e
distribuídos por diversos cursos. Optou-se por identificá-los através das
chamadas famílias profissionais: Administração, Comércio, Desporto,
Eletricidade e Eletrónica, Informática, Mecânica e Serviço de Apoio Social.
Desta população, obteve-se uma amostra de 238 estudantes, que responderam ao
primeiro questionário em janeiro de 2012, tendo-se obtido uma segunda amostra
de 241 estudantes, que responderam ao segundo questionário em abril de 2012. De
referir que 208 estudantes responderam aos dois questionários, ou seja, 86% dos
estudantes considerados na amostra responderam ao questionário nos dois
momentos distintos. Da primeira aplicação de questionários obteve-se uma taxa
de resposta de 56% em relação ao total da população e, na segunda aplicação de
questionários, obteve-se uma taxa de resposta de 57% em relação ao total da
população. Assim, usou-se a primeira amostra para a caracterização da amostra e
considerou-se a segunda amostra para a Análise Fatorial e para a construção do
Modelo de Regressão Logística.
Nesta investigação recorreu-se ao uso de dados primários, através da elaboração
de um questionário, de forma a estudar-se as intenções empreendedoras dos
estudantes do ensino secundário. O questionário foi aplicado em dois momentos
diferentes, o primeiro realizado para se estudar as características da
população e o segundo realizado após a finalização de todas as atividades de
empreendedorismo, de forma a avaliar-se a influência que as mesmas tiveram nos
estudantes e nas suas intenções empreendedoras.
Variáveis utilizadas
A «variável dependente» utilizada nesta investigação é «a intenção
empreendedora» dos estudantes do ensino secundário. Esta variável é binária,
assumindo o valor 1 se os alunos têm propensão para criar o seu próprio negócio
e 0 caso contrário.
As «variáveis independentes» identificam-se como aquelas que dão a conhecer o
impacto que produzem na variável dependente. Nesta investigação utilizaram-se
as seguintes variáveis: Antecedentes Familiares, Experiência Anterior,
Frequência Universitária, Carreira Futura, Atividades Extracurriculares,
Interesse, Importância do Empreendedorismo, Incentivo e Perfil Empreendedor.
Tal como em outros estudos (Silva e Leitão, 2009, Silva et al., 2012), foram
utilizadas algumas «variáveis de controlo» nesta investigação que estão
diretamente ligadas às características pessoais dos inquiridos, tais como a
idade e o género.
No seguimento, as hipóteses de investigação formuladas testam a dependência
entre as atividades ligadas ao empreendedorismo desenvolvidas no âmbito escolar
e a futura criação de empresas por parte dos estudantes que participam nelas,
analisando-se o tipo de ligações que estas podem ter com as intenções
empreendedoras dos mesmos.
Hipótese 1: Os estudantes que consideram importante o tema de empreendedorismo
em ambiente escolar têm maior propensão para criar o seu próprio negócio.
Hipótese 2: Os estudantes que têm interesse em participar em atividades de
empreendedorismo em ambiente escolar têm maior propensão para criar o seu
próprio negócio.
Hipótese 3: Os estudantes que participam em atividades extracurriculares têm
maior propensão para criar o seu próprio negócio.
Hipótese 4: Os estudantes que sentem o incentivo para participar em atividades,
dado pelos agentes escolares, têm maior propensão para criar o seu próprio
negócio.
Hipótese 5: Os estudantes que conhecem empreendedores têm maior propensão para
criar o seu próprio negócio.
Hipótese 6: Os estudantes que têm experiência de trabalho anterior têm maior
propensão para criar o seu próprio negócio.
Hipótese 7: Os estudantes que têm interesse em frequentar o ensino
universitário têm maior propensão para criar o seu próprio negócio.
Hipótese 8: Os estudantes que têm perspetivas futuras em empreender têm maior
propensão para criar o seu próprio negócio.
Hipótese 9: O perfil dos estudantes influencia a propensão para criar o seu
próprio negócio.
A cada hipótese é associada uma variável e, desta forma, pretende-se testar
empiricamente essas mesmas.
MÉTODOS UTILIZADOS
Análise fatorial
O perfil empreendedor dos estudantes tem sido um tema abordado em diversas
investigações e já referenciadas anteriormente, por Mclelland (1987) e Miner
(1997) (Sarkar, 2010). Todavia, o interesse mantém-se. Assim, este estudo do
perfil empreendedor é importante para se poder avaliar a eficácia das
atividades ligadas ao empreendedorismo, desenvolvidas em várias escolas, como
referido na revisão de literatura já mencionada e se realmente têm impacto
aquando da escolha de uma carreira futura (Rasheed, 2000; Alberto e Silva,
2007; Roxas et al.,2008; Huber et al., 2012).
Com o intuito de conhecer o «perfil empreendedor» dos estudantes envolvidos no
estudo, aplicou-se a técnica da análise fatorial a um conjunto de 10 variáveis
originais, medidas numa escala ordinal crescente de concordância, do tipo
Likert, de 5 pontos. A decisão do número de fatores a extrair foi feita com
base no número de valores próprios superiores à unidade. Assim, pela aplicação
do método de componentes principais na extração dos fatores, após rotação
Varimax, obteve-se uma solução fatorial com três fatores latentes. A estimação
dos scores foi efetuada pelo método dos mínimos quadrados ponderados.
Do agrupamento das 10 variáveis, identificaram-se três fatores latentes que
indicam o perfil empreendedor dos estudantes em estudo. Deste modo, o primeiro
fator foi designado por «Criação e concretização de projetos empreendedores», o
segundo por «Vontade de vencer» e o terceiro por «Perfil não empreendedor». O
primeiro fator tem a ver com as competências empreendedoras (Zampier e
Takahashi, 2011), nas quais o empreendedor tem de estar apto para identificar
cenários favoráveis e atuar sobre as potenciais oportunidades de negócios, de
forma a avaliá-los e a transformá-los em situações positivas.
A «Vontade de vencer», o segundo fator, está ligada ao Need for achievement na
literatura e está relacionada com a qualidade de educação empreendedora de que
se dota os estudantes e que permite que a sua necessidade de vencer e de
concretizar projetos também aumente (Huber et al., 2012). Desta forma, são mais
propensos a criar o seu próprio negócio (Rasheed, 2000), esforçando-se para
conseguirem alcançar os seus objetivos profissionais (Oosterbeek et al., 2010).
Weber et al. (2009) distinguiram dois perfis: o empreendedor e o empregado.
Este empregado diz respeito aos estudantes cujo perfil encaixa num perfil menos
empreendedor. No entanto, esta diferenciação pode ser mal entendida: como o
conceito de «empregado» pode ser encarado de uma forma pejorativa designou-se,
desta forma, o terceiro fator como «Perfil não empreendedor».
Estes três fatores resultantes da análise fatorial serão introduzidos no modelo
de regressão logística em estudo como variáveis independentes ou explicativas.
Tendo em conta os três fatores construídos, e com base na hipótese genérica,
formularam-se mais três hipóteses específicas de investigação:
Hipótese 9a: Os estudantes que têm um perfil de criar e concretizar projetos
empreendedores têm maior propensão para criar o seu próprio negócio.
Hipótese 9b: Os estudantes que têm um perfil de possuírem vontade de vencer têm
maior propensão para criar o seu próprio negócio.
Hipótese 9c: Os estudantes que têm um perfil não empreendedor têm maior
propensão para criar o seu próprio negócio.
Modelo de Regressão Logística
Uma vez que se pretende avaliar quais as variáveis que influenciam as intenções
empreendedoras dos estudantes do ensino secundário, o Modelo de Regressão
Logística é o modelo indicado, uma vez que permite avaliar a significância de
cada variável independente no modelo. Desta forma, o modelo criado pretende
criar uma resposta das variáveis independentes perante a dependente. Assim, é
apresentado da seguinte maneira:
Onde: IE ' Intenções Empreendedoras; β ' Coeficientes; AntF ' Antecedentes
Familiares; ExpAnt ' Experiência Anterior; FreqU ' Frequência Universitária; F1
' Fator 1; F2 ' Fator 2; F3 ' Fator 3; Act Ext ' Atividades Extracurriculares;
Int ' Interesse; Imp ' Importância do Empreendedorismo e Inc ' Incentivo.
Uma vez que os erros deste Modelo de Regressão Logística não seguem uma
distribuição normal, nem uma variância constante, não é possível obter ótimas
estimativas dos coeficientes do modelo pelo método dos mínimos quadrados.
Assim, o método do ajustamento utilizado foi o Método da Máxima Verosimilhança.
Este método estima os coeficientes da regressão que maximizam a probabilidade
de se encontrar realizações na variável dependente, fazendo com que a
verosimilhança entre os valores seja maximizada (Maroco, 2007).
ANÁLISE E DISCUSSÃO DOS RESULTADOS
Neste capítulo apresenta-se o estudo das variáveis que influenciam a construção
de um perfil empreendedor e as intenções empreendedoras dos estudantes do
ensino secundário, de acordo com o Modelo de Regressão Logística. Desta
maneira, a partir dos resultados obtidos analisar-se-á a problemática desta
investigação, de forma a avaliar se as hipóteses formuladas são válidas e
sustentadas na literatura.
Caracterização da amostra
Dos 238 estudantes inquiridos dos Cursos Profissionais da Escola Secundária de
Estarreja, 60,9% são do género masculino (145 estudantes) e 39,1% do género
feminino (94 estudantes), com idades compreendidas entre os 14 e os 20 anos,
sendo a idade mais frequente os 17 anos. Verifica-se também que 51,3% dos
estudantes frequentam o 10.º ano de escolaridade, 35,7% o 11.º ano de
escolaridade e 13% o 12.º ano de escolaridade.
No que diz respeito à distribuição dos estudantes pelos diferentes cursos
profissionais, pode ver-se que há uma predominância dos cursos ligados à
família profissional de «Mecânica» (67 estudantes) e de «Administração» (60
estudantes), seguidos pelos cursos ligados ao «Comércio», «Informática»,
«Desporto» e «Serviço de Apoio Social».
Relativamente aos antecedentes familiares, no que diz respeito à relação de
parentesco entre os estudantes e sujeitos empreendedores, verifica-se que 57,1%
dos estudantes conhecem alguém que criou a própria empresa/emprego.
Relativamente a estes estudantes em particular, analisou-se qual a ligação
existente entre os mesmos e o seu próprio interesse em estarem envolvidos num
projeto futuro de criação. Nesta amostra em concreto há dependência entre o
facto de o estudante conhecer alguém empreendedor e as suas perspetivas futuras
de criação de algo, como se pode verificar na Tabela_1, através do resultado
obtido pela estatística do Qui-quadrado (p-valor 0,02), para um nível de
significância de 5%.
Relativamente ao interesse manifestado pelos estudantes face a atividades
empreendedoras em meio escolar, observa-se que apenas 91 dos estudantes
inquiridos participam em atividades extracurriculares, e que apenas 14,6%
(antes das atividades) já participaram em alguma atividade ligada ao tema do
empreendedorismo. Após a aplicação do segundo questionário, verificou-se um
aumento da percentagem de estudantes que afirmaram participar em atividades de
empreendedorismo, para 24,8%.
Em relação à importância atribuída pelos estudantes à Escola, enquanto agente
promotor de atividades relacionadas com o empreendedorismo, verifica-se que
apenas 31,3% dos estudantes manifestaram interesse em participar em atividades
relacionadas com empreendedorismo dinamizadas na Escola. Note-se que, mesmo
depois de terem tido acesso a atividades de empreendedorismo, a percentagem de
estudantes com interesse em participar nas mesmas não difere muito do interesse
demonstrado antes da realização das atividades (30,4%). Quando questionados
sobre a importância desta temática em ambiente escolar, os estudantes, na sua
maioria, consideram a temática relevante (59,2%). De notar que, após a
realização das atividades, esta percentagem revelou um aumento, para 65,8%.
Pode-se concluir que, após conhecerem a temática do empreendedorismo e de terem
sido sensibilizados para ela, um número maior de estudantes dá importância ao
empreendedorismo em ambiente escolar.
Inquiriu-se também os estudantes para saber se algum agente escolar já os tinha
incentivado para a participação em atividades de empreendedorismo. Observou-se
que 66,4% dos estudantes afirmam que nunca foram incentivados por nenhum agente
escolar para participar em atividades. No entanto, é importante notar que após
as atividades de empreendedorismo realizadas, observou-se um ligeiro aumento em
relação ao incentivo dado pelos agentes escolares: 38,8%.
Ainda com o objetivo de conhecer as perspetivas futuras destes estudantes no
que se refere à intenção de criação do seu próprio posto de trabalho como
carreira futura, bem como a intenção de concretizar um projeto profissional que
leve à criação de algo novo, analisaram-se descritivamente as duas variáveis.
Verifica-se que apenas 15,3% dos estudantes apresentam perspetivas
empreendedoras face à sua carreira profissional futura, perspetivando a criação
do seu próprio negócio no médio prazo (após a realização das atividades).
Relativamente à intenção empreendedora destes estudantes, constata-se que 80,4%
gostariam, no futuro, de estar envolvidos num projeto profissional empreendedor
(percentagem essa verificada antes da realização das atividades). É
interessante observar que houve um aumento do número de estudantes que, após as
atividades de empreendedorismo, demonstraram não quererem criar algo novo
(74,5% ao contrário dos 80,4% iniciais), nem perspetivam a criação do próprio
negócio no médio prazo (15,3% ao contrário dos 19,5%).
Análise dos resultados
Depois de efetuada a caracterização da amostra, passar-se-á à análise dos
resultados decorrentes do Modelo de Regressão Logística proposto. Ao longo
deste capítulo também se constatará se as hipóteses formuladas previamente são
suportadas ou não pelo modelo.
Quando se pretende estudar o perfil empreendedor dos estudantes há sempre uma
ligação a fazer-se: para dotar os estudantes de capacidades empreendedoras
através de atividades de empreendedorismo, estas têm de capacitar os estudantes
com competências empreendedoras. As competências empreendedoras consistem no
corpo de conhecimento, área ou habilidade, qualidades pessoais ou
características, atitudes ou visões, motivações e desejos futuros que, de
diferentes formas, podem contribuir para o pensamento do negócio ou ação futura
para o negócio (Zampier e Takahashi, 2011).
Desta forma, nesta análise que se apresenta, foram estudadas as diversas
competências empreendedoras de modo a avaliar-se quais as que têm peso na
definição do perfil empreendedor dos estudantes inquiridos.
Perfil empreendedor
Como referido anteriormente, aplicou-se a técnica de análise fatorial a um
conjunto de 10 variáveis originais, medidas numa escala ordinal crescente de
concordância, do tipo Likert, de cinco pontos, com o objetivo de se conhecer o
perfil empreendedor dos estudantes inquiridos.
O valor de KMO (Kaiser-Meyer-Olin) encontrado foi de 0,826, o que indica uma
adequação muito boa desta técnica aos dados (Maroco, 2007) e, através do teste
de esfericidade Bartlett =0,000, também se demonstrou que as variáveis estão
todas correlacionadas significativamente, isto para qualquer nível de
significância, como se pode constatar na Tabela_2.
A decisão do número de fatores a extrair foi feita com base no número de
valores próprios superiores à unidade. Assim, pela aplicação do método de
componentes principais na extração dos fatores, após rotação Varimax, obteve-se
uma solução fatorial com três fatores latentes. A estimação dos scores foi
efetuada pelo método dos mínimos quadrados ponderados. Eliminaram-se da matriz
de componentes as variáveis com pesos fatoriais inferiores a 0,30 (em valor
absoluto). Os três fatores extraídos explicam cerca de 67,7% da variabilidade
total.
Analisando o agrupamento das variáveis, os três fatores encontrados podem ser
interpretados do seguinte modo: o primeiro fator apresenta pesos fatoriais
elevados (todos acima dos 50%) relativamente aos desejos dos estudantes para
gerirem uma empresa e de criarem algo novo e/ ou criarem um novo projeto
empresarial futuro, da facilidade de identificarem novos produtos, o que
explica 39,1% da variância total. O segundo fator também revela pesos fatoriais
elevados relativos à vontade demonstrada em despender tempo para aprender,
sobre como criarem os próprios projetos empresariais, pouparem dinheiro e
pensarem sobre esse mesmo projeto. Explica 17,9% da variância total.
Finalmente, o terceiro fator apresenta pesos fatoriais elevados, mas
relativamente ao «não empreendedorismo», ao facto de os estudantes não terem
planos para procurarem oportunidades de negócio e, posteriormente, criarem o
seu próprio projeto, bem como no que respeita à criação de novos produtos. Este
fator explica 10,6% da variância total. De notar também que a consistência
interna dos dois primeiros fatores é aceitável, uma vez que o Alpha de Cronbach
é superior a 0,70.
Como referido anteriormente o primeiro fator será designado por «Criação e
concretização de projetos empreendedores», o segundo por «Vontade de vencer» e
o terceiro por «Perfil não empreendedor». Estes fatores foram introduzidos no
modelo de regressão logística em estudo como variáveis independentes.
Intenções Empreendedoras
Seguidamente está presente a Tabela_4, que analisa a relação entre as diversas
variáveis que podem influenciar o perfil empreendedor dos estudantes e as suas
intenções empreendedoras como perspetivas futuras. Também, no final da Tabela,
se encontram os dados relativos ao ajuste do modelo.
Analisando a qualidade do ajuste do Modelo Inicial constata‑se que a sua
capacidade preditiva é 82,1%. A estatística de teste do qui‑quadrado tem o
valor de 55,48 com valor de prova inferior ao nível de significância de 0,05. A
estatística da log likelihood com o valor 129,98 também corrobora a
significância global do Modelo Inicial comparativamente com o modelo nulo.
Da análise da tabela anterior e, tendo sido usado o teste estatístico de Wald
constata-se, no Modelo Inicial, a existência de seis variáveis explicativas que
não são estatisticamente significativas a 5%: «Importância do empreendedorismo
em ambiente escolar», «Interesse em participar em atividade relacionadas com
empreendedorismo», «Conhece alguém empreendedor», «Onde se vê daqui a 10 anos»,
«Já trabalhou» e «Perfil não empreendedor (Fator 3)». Desta forma, nada se pode
concluir relativamente ao efeito destas variáveis na propensão para a criação
do próprio negócio. Perante estes resultados não é possível confirmar
empiricamente as hipóteses H1,H2, H5,H6, H8,eH9c.
Como as variáveis de controlo visam retirar o efeito da própria variável no
modelo, bem como testar a robustez e a consistência das variáveis explicativas,
procedeu-se à inclusão da «Idade» e «Género» no modelo inicial. Como o «Género»
não é uma variável estatisticamente significativa a 5%, optou-se por retirá-la
no Modelo Final.
Relativamente à qualidade do ajuste do Modelo Final, constata-se uma ligeira
melhoria da estatística de teste do qui-quadrado e na estatística da
log‑verosimilhança, e um ligeiro decréscimo na capacidade preditiva
relativamente ao modelo anterior. Os resultados mostram que a capacidade
preditiva do modelo é de 81,9%. A estatística de teste do qui-quadrado tem o
valor de 61,08, que reflete uma melhoria deste modelo, mantendo-se o mesmo
nível de significância. A estatística da log-verosimilhança, com o valor de
194,19, corrobora a significância global do modelo comparativamente ao modelo
nulo e uma ligeira melhoria relativamente ao Modelo Inicial.
Comparando as variáveis explicativas incluídas no Modelo Final, com as
variáveis do Modelo Inicial, constata-se que mantêm o mesmo comportamento, quer
no que respeita à estimativa pontual dos parâmetros, quer relativamente ao
nível de significância. Seguidamente efetua-se a análise das estimativas do
Modelo Final e, simultaneamente, testam-se as hipóteses formuladas H3,H4, H7,
H9ae H9b.
A primeira hipótese relaciona a participação dos estudantes em atividades
extracurriculares e a propensão de criação do próprio negócio, conforme se
expressa naH3:«Os estudantes que participam em atividades extracurriculares têm
maior propensão para criar o seu próprio negócio».Conforme indica o valor da
estimativa dos coeficientes associados à variável, constata-se que os
estudantes que participam em atividades extracurriculares têm uma maior
propensão para criarem o próprio negócio do que aqueles que não participam.
A segunda hipótese relaciona o incentivo que os estudantes sentem por parte dos
agentes escolares para participarem em atividades de empreendedorismo, com a
propensão de criação do próprio negócio, conforme se expressa na H4:«Os
estudantes que sentem o incentivo para participar em atividades de
empreendedorismo, pelos agentes escolares, têm maior propensão para criar o seu
próprio negócio». De acordo com os resultados do modelo, confirma-se que o
incentivo dado pelos agentes escolares para a participação em atividades de
empreendedorismo tem influência positiva e significativa na propensão para
criar o seu próprio negócio, conforme indica o valor da estimativa dos
coeficientes associados à variável. Perante estes resultados, constata-se que
quanto maior for o incentivo dados pelos agentes escolares, maior é a propensão
para criar o seu próprio negócio.
A terceira hipótese relaciona o interesse dos estudantes em frequentarem o
ensino universitário, com a propensão de criação do próprio negócio, conforme
se expressa na H7: «Os estudantes que têm interesse em frequentar o ensino
universitário têm maior propensão para criar o seu próprio negócio». De acordo
com os resultados do modelo, confirma-se que o desejo, por parte dos
estudantes, em frequentarem a universidade tem influência positiva e
significativa na propensão para criar o próprio negócio, conforme indica o
valor da estimativa dos coeficientes associados à variável.
A quarta hipótese relaciona o perfil de criação e concretização de projetos
empreendedores dos estudantes com a propensão de criação do próprio negócio,
conforme se expressa na H9a: «Os estudantes que têm um perfil de criar e
concretizar projetos empreendedores têm maior propensão para criar o seu
próprio negócio». De acordo com os resultados do modelo, confirma-se que os
estudantes que têm uma maior capacidade de criação e concretização de projetos
empreendedores, também têm uma maior propensão para criarem o próprio negócio.
A quinta e última hipótese relaciona o perfil dos estudantes que possuem
vontade de vencer e a propensão para a criação do próprio negócio, conforme se
expressa na H9b: «Os estudantes que têm um perfil que expressa vontade de
vencer têm maior propensão para criar o seu próprio negócio». De acordo com os
resultados do modelo, confirma-se que os estudantes que têm uma maior vontade
de vencer, também têm uma maior propensão para criarem o próprio negócio.
De forma a dar-se resposta à questão fulcral desta investigação ' a ligação
entre a participação em atividades de empreendedorismo e as intenções
empreendedoras ', analisou-se qual a dependência destas duas variáveis
aplicando o teste de independência de qui-quadrado, com aproximação de Monte-
Carlo.
Deste modo, verifica-se que dos 30 estudantes que afirmaram já terem
participado em atividades de empreendedorismo na escola apenas seis estudantes
(20%) perspetivam a criação do próprio posto de trabalho como carreira futura.
Também os estudantes que nunca participaram em atividades sobre esta temática
apresentam reduzidas expectativas face à possibilidade de criação do seu
próprio emprego (8,3%). De facto, o p-valor associado à estatística de teste de
qui-quadrado foi de 0,091, pelo que não se rejeita a hipótese nula de
independência destas duas variáveis, para o nível de significância de 5%, ou
seja, não se verifica uma dependência entre o facto de os estudantes
participarem em atividades de empreendedorismo e a forma como encaram a criação
do seu próprio posto de trabalho.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Nesta investigação, visou analisar-se qual o impacto das atividades de
empreendedorismo no desenvolvimento do perfil empreendedor dos estudantes do
ensino secundário e saber se estas mesmas atividades influenciavam as suas
intenções futuras. Paralelamente, procurou-se também observar que outras
variáveis influenciavam as suas intenções empreendedoras. Desta forma, para
apresentação das considerações finais, partiu-se da análise do objetivo
principal desta investigação, de todo o enquadramento teórico proposto e,
também, do modelo conceptual sugerido. Assim, para a formulação deste, partiu-
se da revisão teórica da literatura, na qual se pode constatar quais as
variáveis que poderiam influenciar o perfil empreendedor dos estudantes e, qual
a contribuição de cada uma para a construção desse mesmo perfil.
A escolha da temática da investigação prendeu-se com o facto de a educação para
o empreendedorismo ser um dos temas de maior relevância atual, uma vez que em
situações de crise como a que se atravessa neste momento, o empreendedorismo
pode desempenhar um papel muito importante tanto na criação de empresas, como
na mudança de mentalidades (com ênfase nos jovens estudantes) viradas para a
cultura empreendedora e que, com criatividade e inovação, se encare as soluções
e não apenas os problemas. Desta forma, esta é a uma das principais conclusões
a referir: o facto de ser um tema importante e pertinente e a necessária
análise da sua influência, neste caso, nos estudantes do ensino secundário.
Nesta investigação foi utilizado um inquérito que permitiu analisar o
posicionamento dos estudantes em relação ao empreendedorismo e as suas
intenções empreendedoras. Constata-se que a amostra é constituída por
estudantes do ensino secundário profissional, de diferentes áreas
profissionais, onde se destacaram os cursos ligados à Administração e à
Mecânica. É importante realçar que grande parte dos estudantes já esteve em
contacto com empreendedores, considerando relevante o tema do empreendedorismo
em âmbito escolar. Estes dados permitem-nos perspetivar que, para além dos
agentes escolares, os estudantes também têm a noção da importância do
empreendedorismo e que realmente é importante que os professores e encarregados
de educação desempenhem um papel ativo na sensibilização do empreendedorismo na
escola.
Da análise ao modelo proposto, verificou-se nesta investigação que várias
variáveis têm um efeito positivo nas intenções empreendedoras dos estudantes: a
primeira é o incentivo dado pelos agentes escolares para participarem em
atividades ligadas ao empreendedorismo, fomentando o comportamento empreendedor
dos estudantes. A participação dos estudantes em atividades extracurriculares
também influencia positivamente as intenções empreendedoras dos mesmos, bem
como o objetivo de frequentarem a Universidade. Em relação ao perfil
empreendedor dos estudantes, concluiu-se que dois dos fatores construídos são
suportados pelo Modelo de Regressão Logística apresentado: os estudantes que
têm uma maior capacidade de criação e concretização de projetos empreendedores,
bem como vontade de vencer, têm uma maior propensão para criarem o próprio
negócio.
Durante esta investigação surgiram algumas limitações ao nível da construção da
base de dados. Isto porque é complicado aplicar inquéritos sobre intenções
futuras e perfis empreendedores a estudantes (adolescentes) que ainda não têm
bem definido qual o seu percurso futuro e que ainda não têm a certeza sobre a
criação e concretização de projetos empreendedores.
No entanto, e tendo em conta as conclusões apresentadas acima, recomenda-se que
em investigações futuras, seja aconselhável uma análise mais abrangente de
forma a se conseguir avaliar a importância de cada agente escolar (professores,
pais, direções das escolas) na construção do perfil empreendedor dos estudantes
e na sensibilização do empreendedorismo em ambiente escolar. E, desta forma,
dar-se resposta sobre a eficácia das atividades de empreendedorismo em ambiente
escolar. Para isso, é importante a criação de atividades de empreendedorismo
homogéneas e que se possam realizar em todas as escolas secundárias de uma
região ou distrito, permitindo assim uma avaliação mais global.