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EuPTHUAp1645-44642009000100004

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National varietyEu
Year2009
SourceScielo

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O relacionamento bancário e o financiamento das PME: Uma revisão da literatura

De um modo geral, as empresas de pequena dimensão, que têm um papel relevante na criação de riqueza e de emprego em qualquer economia, enfrentam grandes constrangimentos no acesso e nas condições do crédito bancário obtido.

As dificuldades significativas no acesso ao crédito advêm em parte das suas fragilidades financeiras e da opacidade da informação que transmitem aos financiadores. É frequentemente questionada a relação entre a informação contabilística e a performance económico-financeira que, na realidade, evidenciam, dada a liberdade de «construção» da informação contabilística, raramente auditada e não notada (por agências de notação de risco) e com múltiplos esquemas de apresentação de contas.

Daí que as técnicas e os modelos de avaliação de risco de crédito para Pequenas e Médias Empresas (PME) (em particular, modelos de rating inspirados nos modelos aplicados às grandes empresas), apesar de permitirem avaliações rápidas, imparciais e de custos reduzidos, ao privilegiarem a análise económico-financeira, geram classificações baixas, dado o elevado risco percebido.

As PME(1), e em particular as Micro e Pequenas Empresas (MPE)(2) , operam num contexto particular, caracterizado por uma forte interdependência entre a «esfera pessoal» do empresário e a «esfera empresarial», por uma organização administrativa e financeira que privilegia a informalidade dos relacionamentos e por uma importância vital e dominante do(s) empresário(s).

Pelo que é pela avaliação do relacionamento bancário, cujas variáveis explicativas estão geralmente afastadas das ferramentas tradicionais de avaliação de risco de crédito às PME (em particular, dos modelos de credit scoring) que passa grande parte do processo de decisão de crédito destinado a este tipo de cliente bancário.

Caracterização e múltiplas abordagens sobre relacionamento bancário O conceito de «relacionamento bancário» ainda não está definido de forma objectiva na literatura sobre intermediação bancária. Numa relação informacional intensiva com um cliente estão geralmente presentes três condições, de acordo com Berger (1999): • o banco recolhe informação, para além da informação pública disponível; • a recolha de informação incide sobre a forma de utilização de produtos e serviços, a partir das interacções múltiplas decorrentes; • a informação é essencialmente qualitativa e permanece confidencial (privada).

Groessl e Levratto (2004) questionam como podem os parceiros (bancos e PME) ser motivados para trocar informação valiosa que regista um alto grau de privacidade. Daí introduzirem o conceito de «confiança mútua» na relação banco- empresa. A confiança torna-se um processo de aprendizagem que é marcado pela troca de soft information(3) e de experiências positivas vividas pelas partes intervenientes no contrato de crédito, permitindo, dessa forma, reduzir o clima de incerteza em torno dessa relação(4) e recompensar a empresa financiada com condições de crédito mais favoráveis.

As partes envolvidas devem começar com acordos em pequenos contratos de prazos curtos que lhes permitam periodicamente avaliar os riscos detectados e, em seguida, tomar as acções apropriadas. O crescimento da relação irá gerando uma redução gradual das assimetrias de informação, que é sobretudo alcançada pela reciprocidade, seguido do seu enriquecimento gradual (que, numa fase inicial, era puramente empresarial e transaccional e posteriormente passa a ter ligações pessoais).

Tornou-se, portanto, quase inevitável que o relacionamento bancário não tivesse também começado a receber explicações e análises do ponto de vista sociológico.

A forma como a confiança mútua pode facilitar o acesso às pequenas empresas de condições de crédito mais favoráveis, foi demonstrada por Uzzi (1999) recorrendo à teoria de social embeddedness de Granovetter (1985). De acordo com essa teoria, qualquer transacção económica está imbuída em relações sociais, onde a intensidade é mais alta em contratos relacionais e mais baixa em contratos transaccionais.

Além disso, constatada a importância crescente do relacionamento bancário na fidelização das empresas e, sobretudo, no aumento generalizado da rendibilidade da actividade da banca de retalho, o tema começa também a atrair as atenções do marketing financeiro, e em particular do marketing relacional, a partir de meados da década de 1990, conforme trabalhos de Proença (1995), Carpenter (1998) e Yeung et al. (2002), entre outros.

Com efeito, o relacionamento bancário é um processo personalizado, de longo prazo, que envolve a transferência de informação privada do cliente para o banco e deve ser proveitoso para ambas as partes (redução dos problemas decorrentes da assimetria informacional para o banco financiador, que os reflecte na empresa financiada em melhores condições de crédito), mas tende a ser assimétrico, dado que o aproveitamento da qualidade do relacionamento e da sua eficácia mantém-se geralmente do lado do financiador.

Os principais temas abordados pela investigação A investigação sobre o relacionamento banco-PME tem-se centrado na análise do seu impacto ao nível da empresa, conforme apresentado na Figura 1, em particular, nas condições de crédito bancário em termos de acesso, pricing, montante e colaterais afectos que, consequentemente, poderão influenciar também o seu crescimento/desenvolvimento e o próprio valor.

Figura 1 Investigação sobre o relacionamento banco ' PME

Paralelamente, é também analisado o impacto de outras variáveis com impacto directo no relacionamento bancário, como sejam a estrutura bancária e outras relacionadas com a localização e distância banco-empresa, que, por sua vez, também terão algum impacto directo nas condições de crédito bancário dessas empresas.

Por último, a perspectiva macroeconómica é analisada sob diversos prismas, quer a sua interacção e correlação com as condições de crédito das empresas, incluindo o seu desempenho, quer com o próprio relacionamento bancário.

Desde os artigos «inovadores» de Hodgman (1961), Kane e Malkiel (1965), Stiglitz e Weiss (1981 e 1983) e Diamond (1984 e 1991), muito se teorizou e investigou sobre a importância e o valor gerado pelo relacionamento bancário, para os bancos financiadores e sobretudo para os seus clientes, em especial as empresas de menor dimensão.

Foi refinado o conceito do relacionamento bancário, desvendados alguns conceitos conexos (e.g. transmissão de informação privilegiada e interacções múltiplas), as suas dimensões (e.g. duração do relacionamento e extensão de produtos adquiridos) e modelizados e analisados empiricamente os seus custos e benefícios, em particular para as PME, realçando, antes de mais, as vantagens em termos de confidencialidade, flexibilidade, controlo e reputação, reflectidos nos seus efeitos no acesso e nas condições do crédito para as PME financiadas.

Em simultâneo, é também analisada a medição do soft budget constraint problem, com os trabalhos de Dewatripont e Maskin (1995) e Bolton e Scharfstein (1996), mas sobretudo do hold up problem, com Greenbaum et al. (1989), Rajan (1992) e Von Thadden (1995). A teorização e a análise empírica em torno do tema da duração do relacionamento e o dilema entre um único relacionamento e múltiplos relacionamentos bancários, como forma de minimização do hold up problem, são assuntos também alvos de investigação, com destaque para o trabalho de Farinha e Santos (2002).

Na sequência da análise do impacto do relacionamento bancário nas empresas, uma outra corrente de investigação tem-se preocupado em compreender e analisar o verdadeiro contributo do relacionamento bancário na variação do valor da empresa e no seu desenvolvimento e crescimento, embora mais recentemente tenha sido dado um maior relevo ao tratamento do caso específico das PME.

A investigação sobre o relacionamento bancário entretanto segue outras direcções, abandonando a questão nuclear do valor do relacionamento bancário para os seus intervenientes directos. Uma nova corrente de investigação procura avaliar e incorporar na análise a influência de factores externos, como é o caso da estrutura da indústria bancária, com destaque para a estrutura do mercado bancário local e nacional e do próprio ambiente competitivo em torno do processo creditício, analisando alterações decorrentes de processos de consolidação bancária (e.g. por via de fusões e aquisições de bancos) e também alterações na estrutura organizacional bancária e em que medida afectam o investimento na recolha de informação e, em última instância, a importância conferida ao relacionamento bancário.

Em particular, a análise da estrutura do mercado bancário na relação creditícia com as PME é multifacetada, apresenta muitas especificidades, interage com outras variáveis nem sempre percebidas ou devidamente ponderadas, sendo por isso complexa e ambígua.

Apesar dos modelos teóricos no âmbito da economia industrial alertarem, de um modo geral, para as ineficiências da existência de um poder de mercado significativo, que se reflectirá, no caso dos bancos, em menor disponibilidade de crédito, conforme Berger et al. (1998), e em pricingsmais elevados, de acordo com Blackwell e Winters (2000) e Degryse e Ongena (2005), um mercado mais concentrado poderá valorizar o relacionamento creditício, ao possibilitar uma redução da assimetria informacional e dos problemas de agência, conforme Petersen e Rajan (1995) e Guzman (2000).

Em mercados bancários competitivos, a soft information tenderá a dispersar-se, tornando-se por isso mais dispendiosa a sua recolha por parte do banco financiador integrado nesse mercado e, consequentemente, esse custo terá de reflectir-se em maiores pricings de crédito, em particular para os pequenos tomadores de crédito, de acordo com Marquez (2002). Em suma, parece não existir uma relação monotónica entre o grau de concentração dos mercados bancários e o valor do relacionamento creditício para as PME.

A generalidade dos investigadores, que se debruçaram sobre este tema, começa por isso a admitir que são ainda necessárias pesquisas futuras para examinar e explicar estas conclusões com maior detalhe, de acordo com Boot (2000), Boot e Schmeits (2005), Degryse e Ongena (2007) e Udell (2008).

Além disso, com a globalização, as novas tecnologias (introdução e sofisticação de novos canais de comunicação com o banco) e a desintermediação por que passa a prestação de alguns serviços financeiros, passou também a ser questionada e debatida a influência e a importância da localização e da distância física entre a PME e o banco, no relacionamento bancário (e consequentemente na viabilidade e nas condições do financiamento), com os trabalhos de Degryse e Ongena (2005), entre outros.

Por último, a investigação recente direccionou-se para o estudo do contexto macroeconómico, investigando a interacção entre o relacionamento bancário e a redução das restrições de liquidez na economia e o consequente impacto no crescimento económico. Também o impacto de um ambiente macroeconómico adverso (e.g. crise financeira) no relacionamento bancário (reflectido em riscos de falência dos bancos e nos credit crunch) tem sido alvo de estudo recente.

O impacto do relacionamento bancário: teoria e evidência empírica A generalidade das investigações empíricas (realizadas maioritariamente do ponto de vista da empresa financiada e não do banco financiador), tem concluído que o relacionamento bancário aumenta o acesso e melhora as condições de financiamento e consequentemente aumenta o desempenho e o valor das PME.

Contudo, deve ser notado que as conclusões da investigação realizada estão longe de ser consensuais, dado que não são apenas encontrados benefícios na relação. Os problemas relacionados com o relacionamento bancário surgem quando o valor criado não é repartido equitativamente pelo banco e pela empresa financiada.

• As dimensões do relacionamento bancário As principais conclusões são geralmente alcançadas através de uma avaliação e medição dos dois principais indicadores do relacionamento bancário: a duração da relação e a extensão dos produtos bancários adquiridos.

A duração do relacionamento bancário O primeiro indicador realça que a importância de uma relação dependerá da duração da ligação entre o cliente e o seu banco. A duração de uma relação é importante, porque ao longo de repetidas operações vai sendo acumulada e filtrada informação maioritariamente não transferível para fora da relação, revelando a capacidade da empresa financiada em respeitar compromissos.

Os benefícios da duração nas condições de crédito ao nível da taxa de juro obtida no crédito encontram suporte teórico nos estudos de Diamond (1989). Boot e Thakor (1994) num modelo teórico demonstram que, ao início, as empresas podem ter de suportar elevadas taxas de juro, mas à medida que a duração da relação de crédito aumenta, mediante uma sucessão de créditos bem sucedidos, a taxa de juro decresce e aumenta também a probabilidade de serem diminuídos os colaterais a afectar ao crédito.

Dos primeiros trabalhos empíricos que avaliam a importância da duração do relacionamento na obtenção de melhores condições de crédito, em particular uma maior disponibilidade de crédito e menores taxas de juro, destacam-se as investigações de Petersen e Rajan (1994) e Berger e Udell (1995).

Petersen e Rajan (1994) estudaram uma amostra superior a 3000 empresas, recolhida a partir do National Survey of Small Business Finances(5) (NSSBF) de 1987, e concluíram que a duração da relação não tem uma influência estatisticamente significativa sobre a taxa de juro do crédito oferecida por um banco à empresa. Porém, parece influenciar positivamente a disponibilidade de crédito do banco a clientes. Empresas com relações bancárias mais longas registam um maior acesso ao crédito, do que empresas com um período mais curto de relacionamento bancário.

Numa investigação posterior que utilizou o mesmo conjunto de dados, Berger e Udell (1995) argumentam que Petersen e Rajan (1994) falharam na determinação de uma relação entre taxas de juro e duração porque eles não fazem uma focalização na forma mais importante de empréstimo do banco comercial: a linha de crédito.

Berger e Udell (1995) concluíram que as taxas de juros cobradas em linhas de crédito diminuem à medida que a duração do relacionamento aumenta. Os autores argumentam que os resultados são consistentes com o facto de uma relação bancária envolver a revelação de soft information que melhora as condições contratuais para a empresa, pelo que os bancos parecem não aplicar pricings de monopolista.

Numa actualização dos estudos de Petersen e Rajan (1994) e Berger e Udell (1995), Cole (1998) utiliza uma amostra recolhida junto do NSSBF de 1993 para mostrar que a probabilidade de acesso ao crédito aumenta com o tempo decorrido da relação, durante o seu primeiro ano, mas não aumenta depois disso.

A generalidade dos resultados obtidos nos estudos conduzidos ao nível de empresas americanas parece não ser facilmente transposta para o caso europeu, em particular os resultados relacionados com o impacto em termos de custo do crédito.

Harhoff e Körting (1998) e Elsas (2005), com base em dados sobre o crédito concedido por bancos alemães, não identificaram correlações significativas entre a duração do relacionamento bancário e a taxa de juro ou o maior acesso ao crédito por parte de PME alemãs. Porém, Harhoff e Körting (1998) obtiveram uma correlação significativa e negativa entre a duração do relacionamento bancário e a exigência de prestação de colaterais. Cánovas e Solano (2006) concluíram para o caso espanhol, repartindo a amostra recolhida em duas subamostras a partir da mediana da variável duração, que, para relacionamentos inferiores a 15 anos, o banco exerceria o seu poder de monopólio ao impor prémios de risco mais elevados e ao aumentar a probabilidade de afectação de colaterais aos créditos concedidos.

A extensão de produtos bancários adquiridos ao banco financiador O segundo indicador refere-se à amplitude (ou extensão) de produtos bancários adquirida pelo cliente de crédito. Os bancos, para além de concederem crédito, prestam um vasto número de serviços financeiros aos seus clientes, o que, de acordo com Fama (1985), lhes permite repartir também os custos de produção de informação por vários produtos e complementar a rendibilidade global da estrutura.

O rigor e a eficiência da informação recolhida podem ser aumentados através da interacção dos clientes com outros produtos financeiros adquiridos. Os trabalhos pioneiros de Kane e Malkiel (1965) e Fama (1985) demonstram teoricamente que a utilização dos produtos e serviços bancários confere ao banco a oportunidade de aprender mais sobre as perspectivas de solvência do crédito concedido e de flexibilidade contratual adicional e permite também fixar políticas de preços específicas em função dos diferentes serviços.

No entanto, constata-se que pouca evidência que documente a influência da extensão de outros produtos e serviços bancários adquiridos. A razão primária está relacionada com a ausência de dados publicados que a análise deste indicador requer. Informação financeira detalhada, ao nível dos serviços adquiridos, é tipicamente privada e portanto indisponível.

Petersen e Rajan (1994) averiguaram a relação entre uma empresa manter depósitos, ou outros serviços de não crédito, no seu banco e o custo e a disponibilidade do crédito. Não encontraram uma relação entre as variáveis de extensão e de custo do crédito, mas concluíram que empresas que compram outros serviços do banco são menos afectadas por restrições no acesso ao crédito.

Porém, Cole (1998) encontra uma dependência negativa entre a compra de serviços financeiros e a disponibilidade de crédito. Degryse e Van Cayseele (2000) concluíram que a compra de outros serviços bancários, propensos à geração de informação para o banco, reduz a taxa de juro a cobrar ao cliente, e Angelini et al. (1998) concluíram que os clientes de um banco cooperativo obtêm um acesso mais fácil ao crédito e a taxas mais baixas que os não clientes.

O trabalho de Mester et al. (1998) parece ser a primeira investigação empírica em que o acompanhamento das contas bancárias do tomador de crédito, e a sua influência nas condições de crédito, é analisado mais pormenorizadamente.

Através do recurso a uma base de dados de um banco canadiano anónimo foi recolhida uma amostra de 100 pequenas empresas, tendo-se concluído que um banco que tenha acesso exclusivo ao fluxo de informação, extraído da movimentação bancária dos seus clientes tomadores de crédito, melhora a monitorização do crédito e a detecção prematura de problemas. Com efeito, é pela observação das contas de depósitos dos clientes-empresa, que um banco pode retirar conclusões sobre a natureza e proveniência dos seus cash-flows, das suas crises de liquidez, dos seus negócios (e até dos seus parceiros financeiros) e sobre o seu grau de aversão ao risco, e consequentemente sobre o(s) tipo(s) de investimento que terá capacidade para empreender.

A quantidade de produtos de crédito e a concentração de responsabilidades junto do banco financiador têm sido utilizados com frequência como proxy da solidez da relação nos trabalhos empíricos realizados. Blackwell e Winters (1997), Charlier (1998), Harhoff e Körting (1998) entre outros, concluem que uma maior concentração de crédito junto do banco financiador está associada a menores custos do crédito e/ou a maior acesso ao crédito ou mesmo mais crédito concedido. A par com este último indicador, existe também extensa investigação que analisa o impacto teórico e empírico da quantidade de relacionamentos bancários(6) nas condições creditícias obtidas.

Mais recentemente, Cardone et al. (2005) analisam a importância nas condições de crédito de outras formas concretas de compensação nos contratos (para além do colateral) - como sejam a domiciliação de salários dos empregados, a abertura de contas de poupança ou a adesão a outros produtos -, concluindo que a adesão a outros produtos financeiros poderia reduzir a afectação de colaterais e também o custo do crédito.

• A análise e determinação dos benefícios e dos custos A investigação teórica tem demonstrado que as relações entre o tomador de crédito e o banco asseguram um clima de confidencialidade, de acordo com Bhattacharya e Chiesa (1995), melhoram a flexibilidade contratual, de acordo com Boot e Thakor (1994) e Von Thadden (1995), reduzem os problemas de agência, através do aumento do controlo, conforme demonstrado por Stiglitz e Weiss (1983) e Von Thadden (1995) e permitem construir uma imagem de reputação, de acordo com Lummer e McConnel (1989) e Chemmanur e Fulghieri (1994).

Contudo, a abstracção dos benefícios teóricos do relacionamento bancário (ver Figura 2) tem empurrado os investigadores para a observação dos seus efeitos concretos e que passam mais pela análise do seu impacto em termos de maior acesso ao crédito, redução do custo do crédito, maior montante de crédito e menores exigências em termos de afectação de colaterais e/ou cláusulas restritivas (covenants).

Figura 2 Benefícios do relacionamento bancário

O relacionamento bancário comporta alguns inconvenientes (ver Figura 3) que afectam tanto o banco como a empresa financiada, e que Boot (2000) resume em soft-budget constraint problem e hold up problem.

Figura 3 Tipologia dos problemas derivados do relacionamento bancário

O primeiro problema refere-se a uma restrição monetária menos forte a que fica sujeita a empresa financiada e que se explica pela maior facilidade do banco em conceder crédito à empresa (e de montante superior ao do risco realmente apresentado), com a qual se encontra consolidada uma determinada relação de confiança, baseada na recolha e análise regular de soft information de acordo com Dewatripont e Maskin (1995) e Bolton e Scharfstein (1996).

Enquanto o segundo problema advém do monopólio informacional que o banco desenvolve durante o horizonte temporal em que subsiste o financiamento e que poderá traduzir-se na prática de pricings superiores aos que definiria em condições de repartição equitativa dos benefícios, conforme Greenbaum et al.

(1989), Rajan (1992) e Von Thadden (1995), em particular, em mercados locais onde o banco financiador possui um poder de mercado significativo.

Bornheim e Herbeck (1998), atentos às dificuldades em determinar o valor líquido do benefício do relacionamento, desenvolveram uma representação gráfica que ajuda a conceptualizar o valor e as implicações do relacionamento entre uma PME e o seu banco.

Na Figura 4 estão definidas três funções: 1. Os benefícios marginais ' representados por uma curva que resulta de uma função exponencial estritamente decrescente que se aproxima de «0» à medida que a duração do relacionamento aumenta. Essa curva é determinada pelos factores que o autor designa de «benefícios potenciais do relacionamento» para os dois intervenientes na relação de crédito: • PME ' baixo custo, maior acesso ao crédito e menor exigência de colaterais; • Banco ' mais informação sobre o cliente de crédito e respectivo aproveitamento da vantagem informacional.

2. As barreiras marginais à saída ' representadas por uma curva que intersecta o eixo das ordenadas na origem e representa uma função linear de declive positivo(7). As barreiras encontradas são a dependência em relação a um único banco, a utilidade decrescente da concorrência no mercado bancário e os custos crescentes associados à mudança de banco.

3. Os benefícios marginais líquidos são representados por uma curva, cuja função resulta da diferença entre os benefícios e as barreiras marginais. O ponto de inflexão t* é atingido quando os benefícios marginais líquidos são nulos e correspondem a um período de duração da relação que coincide graficamente com a intersecção das curvas dos benefícios e das barreiras marginais em B*. Para deste tempo de duração, a relação incorre num benefício marginal líquido negativo.

Figura 4 Os benefícios líquidos do relacionamento banco ' PME Fonte: Bornheim e Herbeck (1998, p. 328)

Os autores advertem ainda que podem ser incluídas condições específicas a cada mercado local no modelo, que se reflectirão numa variação da inclinação das curvas.

Conclusão Apesar de se reconhecer de uma forma geral a importância do relacionamento bancário no crédito às PME, as diversas abordagens existentes sobre o tema não são consensuais quanto aos seus verdadeiros benefícios líquidos em termos de viabilidade e condições das operações de financiamento. O relacionamento bancário é por isso um tema complexo, mas incontornável na análise do financiamento das PME.

A generalidade das investigações empíricas realizadas, apesar de concluir que o relacionamento bancário aumenta o acesso e melhora as condições de financiamento para as PME e, consequentemente, contribui para o aumento do desempenho e valor da empresa, alerta também para os seus inconvenientes, em particular, os custos associados ao hold up problem em que a empresa pode incorrer resultantes do facto do banco deter o monopólio de informação acerca da empresa financiada.

Verifica-se também que os principais estudos empíricos realizados, abordando o tema do relacionamento banco-PME, se circunscrevem geograficamente ao território norte-americano(8) .

Na Europa, existem algumas dificuldades no acesso a dados desta natureza , atendendo a que as principais investigações empíricas realizadas têm recorrido geralmente a informação obtida por via de inquéritos ou cedida directamente por um número limitado de bancos.

É de salientar também que o relacionamento banco-empresa verificado em cada região interage com uma grande variedade de factores externos específicos, nomeadamente a estrutura de mercado do sistema bancário em que a relação creditícia ocorre, a «infra-estrutura de financiamento», que define as normas e a flexibilidade que contextualiza o cenário em que as Instituições de Crédito (IC) financiam as PME(9) , o nível de desenvolvimento e inovação dos mercados financeiros e o próprio ambiente macroeconómico em que está integrado.

Daí que seja notória também alguma dificuldade na comparabilidade e na consensualização das conclusões a que as várias investigações empíricas realizadas chegam, a que acrescem ainda as especificidades das empresas que compõem as amostras analisadas e dos indicadores explicativos do relacionamento bancário e as características da (s) linha (s) de crédito alvo de análise, cuja decisão de atribuição e condições de crédito obtidas podem exigir diferentes valorações do relacionamento bancário.

Em síntese, as PME que procuram beneficiar das vantagens de uma relação fidelizada (ao nível da concentração do seu crédito) e duradoura com um banco, devem ter em conta que o monopólio de informação adquirido pelo banco financiador pela duração do relacionamento, coadjuvado por alguma opacidade da empresa financiada e pelo seu maior poder de mercado local, pode traduzir-se em prejuízos para a empresa. Desta forma, a mobilidade em termos de mudança de banco deve ser experimentada, o que também se revela viável em zonas em que o mercado bancário local esteja pouco concentrado.

O relacionamento bancário será benéfico para todos os intervenientes no mercado do crédito bancário (oferta/bancos e procura/PME), e consequentemente para a economia, de uma forma geral, na medida em que não se verifique um aproveitamento da vantagem informacional por parte de nenhum dos intervenientes da relação (com maior destaque para a parte que geralmente possui maior poder negocial ' o banco financiador) e ao nível de uma eventual redução de incentivos à monitorização da evolução dos créditos concedidos.

Dado o particular interesse do relacionamento bancário para as PME, na melhoria do seu acesso ao crédito, a investigação deverá continuar a centrar a sua atenção na determinação objectiva dos indicadores que influenciam o relacionamento bancário, tendo em vista compreender e quantificar os seus benefícios líquidos, sendo necessário, para alcançar esse objectivo, realizar também uma avaliação rigorosa e objectiva das suas desvantagens, com destaque para o impacto do eventual comportamento monopolista do banco, incluindo na análise, um conjunto cada vez mais abrangente de factores exógenos relevantes, com destaque para a infra-estrutura de financiamento, em que se desenrola a relação.

Notas (1) Recorrendo à definição europeia em vigor (Recomendação da Comissão 2003/ 361/CE, de 6 de Maio), as PME são caracterizadas por terem menos de 250 trabalhadores, um volume de negócios anual que não excede os 50 milhões de euros, ou um balanço total anual que não excede 43 milhões de euros e por não serem propriedade, em 25% ou mais, do capital ou dos direitos de voto, de uma empresa ou conjuntamente de várias empresas que não se enquadrem na definição de PME. De acordo com o INE, em 2005, as PME constituíam 99,6% das empresas em Portugal e eram responsáveis por 75,2% do emprego privado e 56,2% do volume de negócios.

(2) Dentro das PME, as MPE distinguem-se por terem menos de 50 trabalhadores e um volume de negócios ou um balanço total anual que não excede 10 milhões de Euros.

(3) Trata-se de informação de cariz qualitativo, que geralmente não está registada de forma uniformizada em bases de dados, nem é facilmente e fielmente transmitida entre os vários órgãos de decisão de crédito do banco.

(4) Reflectido nos problemas decorrentes da selecção adversa na fase pré- contratual e do risco moral após a formalização do contrato de crédito.

(5) Informação detalhada sobre os NSSBF em http://www.federalreserve.gov/Pubs/ Oss/Oss3/nssbftoc.htm (acedido em 02/01/2009).

(6) De notar que, nas investigações empíricas, o grau de concentração de crédito junto do banco financiador deverá ser preferido em relação à quantidade de relacionamentos bancários. Esta variável, segundo Memmel et al. (2007), é considerada muito restritiva quando analisada isoladamente, dado que apresenta um menor valor explicativo que o grau de concentração de crédito. A quantidade de relacionamentos pressupõe geralmente igualdade de quotas de crédito pelos bancos (Ongena et al., 2007), não permitindo determinar o nível de pulverização ou dispersão do crédito pelos vários bancos com que a empresa se relaciona.

(7) Os autores consideraram irrelevante o facto de a função ser linear ou não linear, no entanto a função encontrada é determinada por uma variedade de factores potenciais, como sejam a estrutura de mercado bancário ou o próprio sistema de regulação da actividade bancária.

(8) A que não é alheio o facto de, neste país, existirem os NSSBF, o que permite a obtenção de uma base de dados de acesso público que agrega informação relevante e representativa do universo analisado.

(9) Tal ainda inclui aspectos tão distintos como o quadro normativo em termos de leis comerciais, fiscais, falimentares e as características do próprio sistema judicial vigente no meio em que a PME actua, assim como a regulação da actividade das IC e as eventuais restrições legais ao financiamento.


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