As quatro dinâmicas de abrangência na resposta à crise portuguesa
O enquadramento do caso português deve ser lido à luz das diferentes formas e
dinâmicas do processo de internacionalização, até porque iniciar uma política
de atividade centrada em processos de internacionalização, continua a ser
vista, por muitos, como um meio para tentar resolver a crise económica,
financeira e, agora também, social, com que o país se tem confrontado
fundamentalmente nos últimos cinco anos.
Porém, a resolução do problema português é parte de um problema muito maior,
nomeadamente o de tentar resolver um problema europeu que tem dado nos últimos
tempos indícios de grande descontrolo, provocando o agravamento das crises de
muitos países (Clark e Mallory, 1993; Ferrera, 1996; Deeg, 2005).
Uma união verdadeiramente europeia pode ser, por isso, caracterizada como uma
mera ilusão, que, ainda que bem-intencionada, não basta para explicar o
benefício económico mútuo que deveria representar para os seus Estados-membros,
a partir dos seus acordos formais concretizados ao longo da história, iniciados
na década de 1950, com o Tratado de Roma em 1957, até ao Tratado de Lisboa que
entrou em vigor em dezembro de 2009 (Gambarotto e Solari, 2012).
Existem, por esta razão, várias «Europas», todas com pretensão legítima ao
trono mas nenhuma com monopólio, umas que se conhecem e outras que se querem
tornar conhecidas, umas com membros respeitáveis e íntegros, e outras com um
conjunto de parentes pobres, embaraçosos, algo aborrecidos e sempre incómodos.
Ou seja, ainda que se saliente que determinados países europeus têm tido
desenvolvimentos notáveis, jamais se poderá considerar ou ter a pretensão que
um dia poderemos vir a ter uma «europeidade central», pois esta ideia é, na
melhor das hipóteses, nostálgica, e, na pior, uma farsa [Deeg, 2009; (Rangone e
Solari, 2012)].
A Europa é um conceito demasiado grande e nebuloso para que se possa construir
à sua volta uma comunidade humana convincente, ligada a uma unidade nacional
histórica da identidade com a sua própria nação, o que se reproduz numa faixa
enorme de população idosa, frustrada, entediada, improdutiva, e que pode, e já
está a resultar, em alguns casos, numa imensa crise social.
A produção, o comércio e as finanças europeias estão hoje organizadas
globalmente. No entanto, a importância crescente da perda do papel da família,
da igreja, dos partidos políticos ou dos sindicatos, e a pressão crescente
sobre os governos para reduzir os benefícios adquiridos pelos cidadãos, ao
longo dos anos, em termos de segurança social e solidariedade, sem que se tenha
em conta a história intrínseca de determinados países, leva irremediavelmente à
desagregação inevitável dos diferentes países que a constituem. O resultado é
uma Europa cada vez mais fechada, cujos critérios macroeconómicos se conjugam
pelos definidos pela Alemanha. Dificilmente poderá ser constituído um governo
europeu capaz de dominar os mercados.
As teorias económicas da internacionalização
Nas últimas décadas, temos assistido a um considerável avanço no que ao estudo
das teorias económicas de internacionalização diz respeito. A um nível meso,
este avanço tem sido assim explicado fundamentalmente a partir de quatro
âmbitos de análise: num âmbito de investigação relativo ao investimento direto
estrangeiro (Vermon, 1966, 1974, 1979; Greuber et al., 1967; Hymer, 1976); numa
ótica de localização e análise de alianças estratégicas e franchisings,
protagonizada por Aliber (1970) e sobretudo pelos estudos de Dunning (1977,
1980, 1981, 1997, 2000, 2001, 2003, 2008); na observação de dados focalizados
na análise de exportações e licenciamentos (Knickerbocker, 1973; Buckley e
Casson, 1976); e numa ótica refletida nas vantagens e desvantagens da
internalização/externalização das mais variadas atividades empresariais
(Buckely e Casson, 2010).
Pode observar-se, portanto, que têm sido várias as teorias económicas de
internacionalização criadas por diferentes autores para explicar esta temática,
quer a partir da sua agregação macroeconómica, quer pelas próprias influências
comportamentais que enfatizam os problemas associados com a aprendizagem, o
comprometimento, e os aspetos culturais da internacionalização no seu processo
gradual de aprendizagem.
Por mais que historicamente se construam teorias para explicar a história dos
negócios internacionais no tempo e no espaço (Buckley, 2009), qualquer processo
de internacionalização deve sempre identificar as principais modalidades de
entrada no estrangeiro.
É necessário restringir as opções de internacionalização das empresas em função
de vários fatores: enquadramentos legais; dificuldades de penetração nos
canais; reconhecimento da marca; historial de internacionalização; análise de
modalidades de internacionalização para fazer face aos competidores
estrangeiros; variações cambiais; instabilidade política; diferenças culturais;
imperativo de defesa da marca e da proteção da tecnologia própria; necessidade
de garantia de qualidade; maior ou menor possibilidade de transferência das
operações para o estrangeiro; especificidade dos produtos; custos de
penetração; competitividade dos produtos nesses mercados; dimensão requerida
para alcançar economias de escala; quantidade e capacidade dos recursos da
empresa; dimensão e natureza dos produtos; nível tecnológico; e intensidade de
investimento requerido (Dunning, 1981; Buckely e Casson, 2010).
Em suma, a existência de longo prazo de empresas globais depende sempre de
fatores de controlo sobre ativos e vantagens e da capacidade em gerir uma rede
internacional ativa e segurá-la por longos períodos de tempo. O que requer uma
equipa qualificada e a capacidade em reter um conjunto de competências-chave ao
longo dos tempos, superando assim «o efeito de Penrose»[1] e ultrapassando
tarefas traduzidas pelos fatores extensão, crescimento e diversificação
(Buckley e Casson 2007). Mas, para que tal processo possa ser absorvido, a
gestão global aqui descrita requer aprendizagem, custos de formação avultados e
aculturação, fatores que só podem ser conseguidos a partir de equipas de gestão
multinacionais (Buckley, 2011).
De forma a garantir a pertinência do problema formulado, que esteve na base do
objetivo da realização desta investigação, este artigo visa contribuir, numa
primeira vertente, relacionar o contexto económico português num enquadramento
focalizado nas dinâmicas e formas possíveis de internacionalização e, numa
segunda vertente, criar um quadro de análise mais alargado para aferir um
conjunto de variáveis/fatores que deverão estar na base do desenvolvimento da
economia portuguesa.
Metodologia
Em termos de verificação e demonstração do que se afirma em termos de
investigação, quanto aos fins que a sustentam, esta investigação teve implícito
um caráter aplicado e uma vertente exploratória. No primeiro caso, o caráter
aplicado resultou da tentativa de investigar um fenómeno contemporâneo no
contexto da vida real (Yin, 1994), o qual foi coadjuvado com a apresentação de
uma vertente exploratória, dada a pouca existência de estudos científicos
concretos sobre o fenómeno social de fomento do crescimento económico
português.
No que aos meios diz respeito, a presente investigação teve por base um caráter
pragmático ou indutivo, e foi conduzida a partir de uma amostra não
probabilística por conveniência, constituída de acordo com a disponibilidade e
acessibilidade dos elementos abordados (Carmo e Ferreira, 1998), neste caso por
17 consultores seniores com grande experiência em trabalhos realizados em
território nacional e internacional, sendo que a amostra ao nível das
entrevistas realizadas teve um caráter intencional, pois foram selecionados os
participantes que melhor representavam o fenómeno investigado em termos de
conhecimento.
Assim, a metodologia qualitativa utilizada resultou da análise de um conjunto
de entrevistas, procurando medir o fenómeno em estudo, em termos da dinâmica
social, individual e holística do ser humano, tentando compreender o
significado que as pessoas atribuem aos fenómenos analisados, mais do que
propriamente interpretá-los. Deste modo, foi possível analisar a informação de
forma indutiva, a partir da observação, recolha e análise in loco dos factos
científicos.
Em termos da técnica de análise qualitativa utilizada para interpretação dos
dados reproduzidos das entrevistas, este estudo traduziu-se numa análise de
conteúdo, tentando relacionar as estruturas semânticas (significantes) com as
estruturas sociológicas (significados) dos enunciados, de forma a articular a
superfície dos textos com os fatores que determinam as suas características
(variáveis psicossociais, contexto cultural e contexto, processos e reprodução
da mensagem), de acordo com o exposto na Figura_1.
Importa referir que a técnica de entrevista semiestruturada utilizada foi
desenvolvida numa base previamente estruturada de perguntas, ainda que
implícita num caráter adaptável e não rígido, permitindo quase sempre que a
conversação decorresse de modo fluido. Ou seja, apesar das perguntas terem sido
previamente preparadas, a maioria delas surgiu à medida que a entrevista
decorreu, permitindo ao entrevistador e aos entrevistados a flexibilidade para
aprofundar ou confirmar determinados dados quando se mostrou necessário.
De modo a consubstanciar esta análise de conteúdo, através de uma base
quantitativa, foi também requerido que os entrevistados pudessem identificar as
cinco dinâmicas principais e formas de internacionalização para revitalizar a
economia portuguesa, as cinco principais razões para a fraca competitividade do
país, assim como os cinco principais fatores que poderão estar na base do
desenvolvimento da economia portuguesa. (Ver Tabelas_1, 2 e 3).
Resultados da pesquisa
De facto, o que se conseguiu aferir através desta investigação é que a
revitalização da economia portuguesa pode ser conseguida através de uma maior
procura por mercados alternativos, de uma maior capacidade para obtenção de
investimento externo e, principalmente, pela introdução de novas dinâmicas e
formas de internacionalização.
As dinâmicas de internacionalização das PME ligadas a outros fatores de gestão
interna nacional, que poderão permitir desenvolver a economia no futuro,
assentam nesta investigação em algo de profundo, não se limitando apenas a
questões obrigatórias. Este estudo do universo nacional aponta para o que é
necessário otimizar em termos de processos para obtenção de resultados
satisfatórios.
Pelo que se pode constatar, o desenvolvimento da economia nacional deverá estar
fortemente ligado ao contexto de competitividade das empresas,
independentemente das suas áreas de intervenção, e assentar em manobras
estratégicas importantes, particularmente no continente asiático, que potenciem
as condições que Portugal goza nestes mercados face à história do próprio país.
A procura de mercados alternativos, a captação de investimento externo e,
fundamentalmente, a utilização de novas formas e dinâmicas de
internacionalização, ligadas essencialmente à redução de custos conjunturais, a
uma melhor gestão do crédito e do capital, a uma efetiva ligação das empresas
ao contexto universitário e à utilização da diplomacia económica como forma de
diversificação dos nossos mercados, assumem neste domínio um lugar de destaque.
Variáveis como a falta de aposta nos licenciamentos, no investimento na energia
e na fiscalidade como estímulo ao desenvolvimento, a inexistência de pré-
financiamentos e financiamentos à exportação, a incapacidade de lidar com a
baixa relação entre capitais próprios e investimento das empresas, a ausência
de linhas de crédito do Estado para dinamizar a economia, o QREN e a
inexistência de seguros de crédito alicerçados no pré-financiamento das
empresas, são, desde logo, algumas das razões apontadas pelos inquiridos para a
fraca dinâmica da economia portuguesa.
Por um lado, a intervenção estatal deve trazer para este contexto o fator
novidade e, dependendo dos objetivos, trazer também novas ideias, de modo a que
possam ser apresentadas as melhores soluções face às necessidades
identificadas. Segundo os inquiridos, essa intervenção deverá passar por
iniciar negociações Estado a Estado, maior apoio às empresas, existência de
negócios estrangeiros na Europa (mais investimento estrangeiro, oriundo de fora
da Europa) e aposta numa maior diplomacia como forma de diversificação de
mercados para exportação dos produtos e serviços nacionais.
Por outro lado, dado que a turbulência económica e empresarial assumiu nos
últimos vinte anos pressupostos nunca vistos anteriormente, até porque nos dias
de hoje as especificidades de negócio são muitas, foi manifestamente referida
pelos inquiridos a necessidade das empresas portuguesas concorrerem pela
qualidade, através da venda de produtos e serviços de valor acrescentado e de
uma boa escolha de parceiros locais que facilitem a entrada das empresas em
países estrangeiros. Ficou ainda evidente que as exportações são a única forma
viável para alavancar o país, ainda que isso apenas seja possível através da
constituição de um Banco de Fomento para apoio às PME e da concretização de
coberturas de risco ao crédito da venda e dos fornecedores às empresas
portuguesas.
Conhecer o negócio, fazer uma boa leitura dos problemas, definir bons planos de
ação, focalizar nos objetivos e centrar as exportações nos serviços e numa base
mais alargada de exploração que não se foque apenas na proximidade geográfica,
como hoje acontece, são considerados também fatores-chave de mudança da
economia portuguesa.
Numa base mais alargada em termos do âmbito de análise, ligada não apenas à
questão das dinâmicas e formas de internacionalização, os inquiridos
consideraram no total 25 fatores que poderão estar na base do desenvolvimento
da economia portuguesa, apesar de muitos destes não serem de fácil
implementação e estarem envoltos numa certa base de controvérsia face a uma
eventual implementação:
* Aumento das exportações;
* Redução das ineficiências e desperdícios;
* Sair do Euro ' como mencionado por diversos inquiridos, este é o cenário mais
provável, apesar das visões otimistas;
* Ouvir as empresas, sendo esta uma questão de base; saber o que precisam para
ter melhores resultados;
* Aumento do capital do Banco Europeu de Investimento, embora neste caso esta
medida não beneficie o país em virtude do rating da dívida soberana de longo
prazo ser considerado especulativo (vulgo lixo financeiro);
* Plano de ataque à economia paralela;
* Acesso a linhas de crédito ao investimento com taxas de juro mais baixas;
* Aposta nos setores da agricultura e pesca sem barreiras e restrições
governamentais e europeias;
* Adesão ao regime de IVA em função do pagamento pelo adquirente, fazendo com
que as empresas deixem de se preocupar com o IVA e se possam focalizar no
crescimento;
* Reposição dos subsídios de Natal e Férias para fomentar a procura e injetar
capital na economia (entretanto realizado);
* Reduzir custos com o endividamento público;
* Transformar a moeda única em moeda comum ou sair do Euro, suportando os
custos como forma de privilegiar uma perspetiva de futuro. Esta é considerada
a via para fazer face à sobrevalorização do Euro, que está valorizado em
cerca de 40% face àquilo que deveria servir como ponto de equilíbrio, o que
torna a situação insustentável;
* Existência de estabilidade fiscal ou de um certo grau de previsibilidade
fiscal, por forma a captar investimento direto estrangeiro e a entrada de
holdings em território nacional;
* Libertação dos bancos da ligação estreita que têm à dívida pública nacional,
por forma a gerar maiores níveis de liquidez e poderem, deste modo, injetar
capital na economia através de empréstimos em condições vantajosas para as
empresas privadas;
* Induzir o consumo através dos 4 milhões de emigrantes. Neste caso, baixando o
IMT (Imposto Municipal sobre Transmissões) para fazer com que esses
emigrantes voltem a investir no país, principalmente na área da construção
civil;
* Deixar de franquiar as empresas por parte do Ministério das Finanças. Hoje,
para obtenção de financiamento bancário, as empresas necessitam de uma
certidão das finanças a mencionar a não existência de dívidas, o que faz com
que os bancos, na ausência dessa certidão, pratiquem spreads absurdos. Neste
caso, segundo um dos inquiridos, podia existir uma situação excecional para
os próximos quatro anos, possibilitando o acesso ao crédito de forma mais
facilitada, o que lhes permitiria crescer e fundamentalmente pagar dívidas;
* Redução dos custos energéticos, dos mais altos da União Europeia;
* Existência de instrumentos de controlo de gestão como o The balanced
scorecard, que permitam focar o controlo também na vertente intangível de
análise e não apenas em questões orçamentais;
* Baixar a taxa social única;
* Existência de programas de apoio por parte do Estado, controlados por uma
comissão avaliadora ligada aos polos universitários, podendo avaliar e aferir
a possibilidade de injeção destes capitais na economia;
* Baixar o IVA;
* Baixar o IRC em 10 pontos percentuais para empresas exportadoras;
* Reabilitação urbana. A licença para ocupação da via pública demora atualmente
um mês a ser conseguida, sendo que os licenciamentos não têm prazo. Neste
caso, deverão existir mínimos de tempo para obtenção de respostas;
* Deve ser criado um programa de auditoria às empresas para aferir os pontos a
serem melhorados;
* Diminuir o horário de trabalho em uma hora e consequentemente o salário,
permitindo a entrada no mercado de trabalho de licenciados desempregados;
* Fomentar o trabalho a tempo parcial, permitindo uma redução significativa da
taxa de desemprego.
Quatro dinâmicas
O alargamento da Europa e, principalmente, a exposição das dívidas públicas de
alguns países europeus aos mercados financeiros, desde 2008, vieram iniciar uma
nova fase problemática na história da Europa, agravando as crises de Itália,
Grécia, Espanha, da própria França (que se viu obrigada inclusive a reduzir em
20% os salários) e de Portugal.
É nesta medida que os resultados desta investigação vêm tentar responder a esta
problemática, basicamente na tentativa de responder ao problema português em
quatro dinâmicas de abrangência, conforme Figura_2.
Como verificado através da literatura, o problema português é parte de um
problema muito maior ' o europeu. Muito embora diversos tipos de reformas
tenham tentado resolver a crise portuguesa, é importante que se perceba que o
problema nacional só será verdadeiramente resolvido após a resolução do
problema europeu, pois só assim o país poderá ficar numa situação clara de
reforma. Até porque o país goza de um estatuto que muitos países europeus não
detêm, o de usufruirmos, em várias partes do mundo, da condição de sermos uma
potência histórica, nomeadamente na Ásia, tendo, portanto, a capacidade de
fazer a ligação europeia a este mundo emergente.
No entanto, até que essa situação se possa vir a concretizar, é essencial o
foco nas quatro dinâmicas de abrangência da Figura_2, tendo Portugal de
acompanhar uma linha clara de procura em termos de mercados alternativos, a
captação de investimento externo, a utilização de dinâmicas de
internacionalização e um conjunto de linhas estratégicas que permitam fomentar
o seu crescimento económico.
As formas de internacionalização ganham, por conseguinte, nesse contexto, uma
importância vital, devendo Portugal concentrar-se principalmente em quatro
linhas estratégicas: (1) minimizar os custos contextuais e apostar na
exportação; (2) potenciar uma melhor gestão de crédito e de capital; (3)
promover uma maior ligação das PME ao contexto universitário e (4) fomentar uma
clara diplomacia económica que permita potenciar a componente da
internacionalização.
O tecido empresarial português é composto em 99% por PME, estando estas na base
do fraco desenvolvimento do país, substancialmente pelo facto de Portugal nunca
ter conseguido tornar-se competitivo após a integração na União Económica
Europeia. Após ter ganho competitividade, ao longo de anos, através da
possibilidade de desvalorização do escudo, o foco deveria ter incidido sobre a
vertente das exportações, e é exatamente aqui que tem residido um dos problemas
da economia portuguesa. Ou seja, se excluirmos o facto da inexistência total da
aposta em licenciamentos, na indústria da energia e no aproveitamento da
fiscalidade como estímulo ao desenvolvimento, um dos principais problemas com
que o país se viu confrontado foi, fundamentalmente, a focalização do índice de
exportações numa lógica de proximidade.
Apesar de se ter reduzido o índice de exportações para a Europa em cerca de 8
pontos percentuais desde 2000, o que é um fator positivo face ao contexto de
crise no espaço europeu, a verdade é que continua a assentar numa base de
proximidade (só para Espanha são cerca de 25% das exportações portuguesas) e
está concentrado no setor têxtil, calçado, automóvel, mobiliário e
equipamentos.
Conclusão
As exportações são efetivamente a única via viável para o desenvolvimento e
promoção de Portugal no contexto económico mundial.
No entanto, a viabilidade do aumento das exportações, por parte das PME, será
impossível sem o pré-financiamento e financiamento às exportações e a
necessidade de capitalização das empresas. A existência de linhas de crédito
estatais, a utilização do QREN e, principalmente, algo que não tem sido
manifestamente o foco de muitas análises, a cobertura do risco de crédito da
venda e a cobertura do crédito dos fornecedores às empresas portuguesas, ganham
neste domínio um lugar de destaque. Com o comércio internacional a rondar
valores muito próximos dos 15 biliões de euros, mais importante que vender
muitas vezes é receber. É neste sentido que a cobertura do risco de crédito
deve ser considerada de forma muito mais efetiva, o que não tem acontecido
atualmente, sendo que o seguro sobre o crédito representa apenas cerca de 10%
das exportações portuguesas e mundiais.
Ou seja, a utilidade da existência de uma instituição de fomento em Portugal
que apoie claramente as PME, não deve existir apenas para centralizar o apoio a
estas empresas, cobrindo as suas necessidades, mas, sobretudo, e também, para
privilegiar a cobertura do risco do crédito caso as coisas corram mal.
Por outro lado, é utópico pensar que será pela redução de salários que nos
tornaremos competitivos, até porque neste domínio jamais o conseguiremos ser em
comparação com outros países. A necessidade de Portugal concorrer pelo fator
qualidade é um aspeto fulcral do seu desenvolvimento, o que vem sendo limitado
pelos cortes consecutivos que se têm vindo a realizar fundamentalmente no
domínio do desenvolvimento de projetos ligados ao desenvolvimento tecnológico.
A ligação das universidades ao contexto empresarial é, por conseguinte, outro
fator crucial, dado que a qualidade está estritamente ligada ao meio académico.
Além da extraordinária preparação que as universidades portuguesas detêm em
termos de recursos e competências para preparar os empresários para o previsto,
têm a capacidade de os preparar para algo mais abrangente, o imprevisto.
A indústria do calçado é um ótimo exemplo das vantagens que podem ser
absorvidas por esta ligação, tendo Portugal apresentado bons resultados neste
setor de internacionalização.
Em termos de caracterização do setor do calçado, o mundo produz 20 mil milhões
de sapatos por ano, com o continente asiático a fornecer 85% desse volume. Só a
título de exemplo, para que se consiga aferir o domínio asiático no mundo, a
China produz e exporta mais do que a Alemanha e EUA juntos. No setor dos
têxteis, a China exporta mais têxteis do que o equivalente ao PIB português. Na
indústria do calçado, a hegemonia asiática deixa apenas para a Europa Ocidental
3% da produção mundial. Estes são apenas alguns exemplos da consequência da
exploração de economias de escala pelas economias asiáticas, o que no setor do
calçado se traduz num preço médio de venda pela China de 3 dólares com os
valores em Portugal a rondar os 25 dólares, o que deixa o setor do calçado
português numa clara dificuldade em termos de capacidade competitiva.
Esta dificuldade fez com que o setor do calcado em termos de exportação se
direcionasse, numa primeira fase, para mercados de proximidade e, numa segunda,
para mercados com um target alto, competindo pela especialização ou focus pela
diferenciação nas 10 principais cidades da América do Sul, nas 14 principais
cidades da China e na Europa como um todo, visto que os 250 milhões de
habitantes europeus se podem posicionar neste target, mostrando um
comportamento ótimo em termos de desempenho com a escolha deste posicionamento
estratégico.
Mas se a ligação às universidades tem aqui um papel fundamental, não podemos,
no entanto, negligenciar a necessidade de uma aposta mais efetiva na diplomacia
económica. Negociação Estado a Estado, apoio às empresas, ter negócios
estrangeiros ao invés de estarmos apenas presentes no estrangeiro com o
Ministério das Finanças e a diplomacia como forma de diversificação de
mercados, são, por esta razão, apostas de futuro, olhando para países que nos
possam potenciar em termos de desenvolvimento da nossa economia.
Países como Angola, Moçambique, Zâmbia e toda a África Austral, ricos em
energia, gás natural, carvão e outros tipos de minérios, são, consequentemente,
países principais para o fenómeno de internacionalização das empresas
portuguesas. Uma boa relação diplomática e a escolha de um parceiro global que
permita facilitar a entrada nestes países, devido ao conhecimento da sua
história, da sua estrutura de decisão (poder aparente vs. real) e de eventuais
relações políticas que possam usufruir junto das classes políticas, são aspetos
cruciais a reter em termos de aposta.
A diplomacia económica em África mas também no Brasil, nos mercados asiáticos,
nos EUA (crescer 0,25 % nos EUA é mais importante, por exemplo, que crescer 6%
em África) ou até mesmo nos mercados do Golfo Pérsico, apesar das dificuldades
que se possam enfrentar, é a forma mais sólida de crescer e vender produtos com
mais valor acrescentado, possibilitando remunerar pessoas convenientemente e
gerar emprego.
Em suma, o crescimento económico do país deve, por isso, ficar ligado às quatro
dinâmicas de internacionalização ilustradas na Figura_2 que, para além dos
dados aqui apresentados, deverão ter ainda um âmbito de análise mais alargado,
designadamente, ao nível dos dados apresentados no capítulo dos resultados
desta pesquisa.
Convém, ainda, realçar que, apesar dos inquiridos terem identificado um
conjunto de quatro linhas estratégicas para o país, na verdade, parecem
desconhecer as principais modalidades de entrada no estrangeiro identificadas
no constructo teórico desta investigação, restringindo as opções de
internacionalização das empresas em função apenas de alguns enquadramentos.
Para concluir, obviamente que há que ter em conta que as constatações
apresentadas neste estudo resultam de limitações inerentes a uma investigação
reduzida em termos de tamanho da amostra (inquiridos) e do facto de reproduzir
resultados de um determinado contexto (PME) num determinado país (Portugal).
Neste sentido, em termos de validade externa, ou seja, da possibilidade de
generalizar os resultados encontrados a outros contextos ou amostras, embora
este estudo procure reforçar alguma da teoria já existente relativamente aos
meios de aplicação das teorias económicas de internacionalização, tratou-se
apenas de um estudo exploratório que não pode ser generalizado ou ser
representativo.
Por outro lado, apesar das fontes secundárias que foram utilizadas, também este
fator não pode justificar que os resultados aqui apresentados possam ser vistos
como necessariamente generalizáveis em termos da prática de aplicação das
teorias económicas.
Assim, ainda que este artigo vise fundamentalmente responder às duas questões
de pesquisa colocadas, é necessário que pesquisas futuras incluam a construção
de um modelo que permita relacionar todas estas variáveis, identificando quais
são as mais determinantes para o sucesso do país.