PSICOLOGIA COMUNITÁRIA (2008)
PSICOLOGIA COMUNITÁRIA (2008) - José Ornelas. Lisboa: Climepsi Editores,
478 pp.
De autor português, temos finalmente um manual de Psicologia Comunitária com
qualidade inquestionável e que, sendo histórico por ser o primeiro, fica para a
história da Psicologia Comunitária em Portugal. Focalizado na prevenção e na
perspectiva ecológica, como bases essenciais da mudança dos indivíduos e das
comunidades, fica também para a história porque o autor e a sua acção se
confundem, de facto, com a história da psicologia comunitária no nosso país:
José Ornelas foi o introdutor da psicologia comunitária em Portugal, quer em
termos do ensino, investigação e formação de técnicos, quer na intervenção
comunitária, em especial com pessoas com experiência de doença mental. O autor,
professor associado no ISPA e fundador da AEIPS - Associação para o
Estudo e Integração Psicossocial e da Sociedade Portuguesa de Psicologia
Comunitária, foi o primeiro presidente da Associação Europeia de Psicologia
Comunitária e integra a Comissão Nacional para a Reestruturação dos Serviços de
Saúde Mental.
O livro "Psicologia Comunitária" é uma publicação que se pode
considerar um manual que, como é indicado, tem como finalidade principal
contribuir para a consolidação do ensino da disciplina de Psicologia
Comunitária, considerando que esta contribui para a melhoria efectiva do bem-
estar das populações, em particular das pessoas que se encontram em situação de
maior vulnerabilidade social. Embora não esteja formalmente organizado
formalmente deste modo, os conteúdos do livro dividem-se essencialmente em três
partes, que são clássicas em qualquer manual duma área científica: fundamentos,
metodologias de investigação e intervenção e aplicações práticas. Ou seja: tudo
aquilo que o leitor quer saber sobre psicologia comunitária mas tem vergonha de
perguntar...
No que se refere aos fundamentosda psicologia comunitária, após a delimitação
do conceito de psicologia comunitária e do seu objecto de estudo, o autor
descreve o desenvolvimento socio-histórico da área científica de forma
detalhada, incluindo uma referência à Conferência de Swampscott (Boston, 1965),
que incidiu sobre o papel dos psicólogos no movimento da saúde mental
comunitária. Seguidamente, aborda os valores partilhados pelos psicólogos
comunitários: bem-estar individual, sentimento de comunidade, justiça social,
participação cívica, colaboração e fortalecimento comunitário, respeito pela
diversidade e fundamentação empírica do conhecimento em processos de
investigação participada. Os grandes modelos teóricos que suportam a
intervenção na comunidade assumem lugar de destaque, nomeadamente o
empowerment, modelo ecológico, ajuda mútua e suporte social. Um capítulo
extenso e muito claro é dedicado à saúde mental comunitária, no qual são
desenvolvidas questões referentes ao movimento da desinstitucionalização,
sistema de suporte comunitário e programas de integração comunitária (habitação
apoiada, emprego apoiado e educação apoiada, entre outros aspectos).
Em relação às metodologiasaborda sucessivamente as metodologias de investigação
colaborativa, as metodologias de avaliação de programas comunitários e as
metodologias de intervenção e mudança social.
Finalmente, quanto às aplicações práticas os focos são a saúde mental
comunitária, a prevenção em saúde mental e, também, exemplos concretos de
intervenção relacionada com maus-tratos e abuso sexual de crianças e com
mulheres sobreviventes a violência.
Acrescem ainda capítulos de grande utilidade para quem se interessa pela
psicologia comunitária, nomeadamente:
-Notas biográficas de psicólogos comunitários de renome de vários países, numa
espécie de "quem é quem" no panorama científico internacional
-Listagens de sociedades, associações e publicações científicas
-Oportunidades de formação académica específica em psicologia comunitária a
nível internacional.
Com este manual de psicologia comunitária temos acesso ao conhecimento dos
fundamentos teóricos, métodos e técnicas de uma área específica da Psicologia
que pode contribuir para a melhoria do bem-estar e qualidade de vida dos
indivíduos e das comunidades.
Em nossa opinião, as mais valias deste livro são a sua consistência e rigor
científicos, uma orientação claramente teórico-prática que serve de guia para o
saber-fazer, a sua actualização face aos avanços que se têm registado na área
científica e, não menos relevante, a sua oportunidade em relação ao momento
sociopolítico que atravessamos, na medida em que o livro e o seu autor mostram
um compromisso sério com a exigência de justiça social e com a defesa dos
direitos das pessoas em situação de fragilidade social e da sua participação
nos processos de mudança.
Este manual pode interessar desde logo aos psicólogos e estudantes de
Psicologia, em particular aos que frequentem unidades curriculares de
psicologia comunitária e/ou que pretendam especializar-se em intervenção na
comunidade. Mas pode interessar também a técnicos de outras profissões que
trabalhem em programas comunitários e em organizações da comunidade,
especialmente nos campos da saúde, educação, reabilitação e inserção social.
Nesse plano, o livro é dotado de uma certa transversalidade. Uma vez que todos
vivemos em comunidade, todos temos alguma coisa a aprender com as propostas da
psicologia comunitária que visam contribuir para comunidades mais saudáveis,
propostas assentes na participação, na equidade e no desenvolvimento do capital
social.
José A. Carvalho Teixeira