Editorial
Editorial
Maria de Lourdes Dionísio
Fruto do modo como temos respondido e antecipado os desafios criados pelas
novas condições da edição científica, nos últimos anos tem-se tornado quase uma
rotina anunciar nestes editoriais a inclusão da RPE em mais uma base de dados.
Neste número o prazer é redobrado já que anunciamos a integração da Revista na
Web of KnowledgeviaSciELO Citation Index da Thomson Reuters, e a adoção do
formato digital no sistema OJS, após o sucesso do concurso para alojamento de
Revistas Científicas no Repositório Científico de Acesso Aberto de Portugal
(RCAAP). Em qualquer dos casos trata-se do resultado de esforços vários que
importa aqui destacar. Desde logo, os da equipa SciELO de Portugal, que sempre
reconheceu que apenas medidas assumidas coletivamente poderiam colocar as
revistas nacionais nestas plataformas pouco abertas à diversidade linguística.
Depois, os de todos os que, de diversas formas, estão envolvidos na produção da
Revista, desde o Comité Editorial que lê e encaminha os textos para a
avaliação, ao nosso cada vez mais numeroso grupo de avaliadores, passando pelos
técnicos sobre quem recaem muito as exigências dos patamares que vamos
alcançando. Naturalmente também aos autores que nos escolhem como base de
disseminação dos seus resultados científicos e que generosamente compreendem os
tempos e modos da edição académica.
Estamos cientes que a presença na Web of knowledge e a adesão à plataforma de
gestão online vêm tornar ainda maior a procura da Revista, complexificando e
exigindo mais rigor a todo o processo editorial. Mas, apesar de critérios de
aceitação mais seletivos, o cada vez maior volume de textos propostos tem
obrigado a RPE a aumentar o número de artigos dos seus volumes. Este segundo
número de 2013 é disso mais um exemplo. Para além de um núcleo temático
constituído, na segunda parte da revista, por seis textos que têm origem em
algumas das conferências organizadas pelo Núcleo de Educação para os Direitos
Humanos do Instituto de Educação, da Universidade do Minho, incluem-se ainda
cinco outros artigos do fluxo de submissão contínuo.
O primeiro texto, da autoria de uma equipa de investigadores da Universidade do
Estado do Rio de Janeiro e do Instituto Politécnico do Porto, procede a uma
análise comparativa das políticas de descentralização da educação no Brasil e
em Portugal a partir dos anos 90. Apesar das semelhanças encontradas,
nomeadamente quanto ao facto de "entre avanços e recuos", as tentativas no
âmbito destes processos não serem mais do que "movimentos de alguma
desconcentração de poderes, ainda marcados pela mesma lógica centralizadora",
concluem os autores que, ainda assim, o Brasil goza de maior autonomia na
constituição dos seus sistemas de educação enquanto que no caso português, "a
tendência de reforço das competências das entidades locais encontra-se mais
direcionada às instituições escolares do que à esfera autárquica".
O segundo artigo, de Paula Guimarães, toma como objeto as transformações
ocorridas nas organizações do terceiro setor com intervenção na educação de
adultos. Estudando o caso de uma associação de desenvolvimento local, os dados
ilustram como uma destas organizações, com forte vínculo à comunidade local, e
por causa de parcerias estabelecidas com o Estado e com a União Europeia,
passou a partilhar algumas características de empresas, pondo em causa, segundo
a autora, "a sua autonomia e a sua capacidade de desenvolver projetos
educativos de carácter crítico e emancipatório".
Quanto ao terceiro texto, o seu objetivo é discutir o eventual esvaziamento do
campo teórico-científico da ciência didática. Para tal, a autora analisa o
"estado da pesquisa e da produção didática, no período de 2004 a 2010, em três
Programas de Pós-Graduação em Educação pertencentes à região Sul do Brasil,
tomados como estudos de caso". Da análise verifica-se que, apesar de se
investigar e produzir conhecimento na dimensão dos fundamentos didáticos, não
são objeto de interesse "as questões sobre ensino de didática enquanto
disciplina acadêmica, bem como as formas e maneiras de se efetivar, do ponto de
vista metodológico, o processo de ensino-aprendizagem".
O texto de António Gomes Ferreira e Luís Mota parte de um espólio documental
muito diversificado, onde se destacam as fontes de arquivo da Escola Normal
Superior de Coimbra, para discutir o modelo de formação de professores das
Escolas Normais Superiores, inspiradas na École Normale Supérieur de Paris,
segundo os autores, "marcadas pela pedagogia do movimento da Escola Nova e
portadoras de um caráter inovador". A análise mostra como a formação de
professores do ensino liceal estava alinhada "com as leis científicas que
deveriam governar a educação" e "reconhecendo a importância do conhecimento
científico da criança para o ato educativo".
O quinto texto, sobre a avaliação da competência comunicativa oral no Ensino
Básico, defende que o uso sistemático de uma grelha de observação em sala de
aula é útil para promover a formação de leitores fluentes e competentes. O
estudo consiste na construção e validação de um instrumento capaz de traduzir
"com rigor o nível de desempenho dos alunos".
O sexto artigo, da autoria de Maria José Casa-Nova, consiste no texto
introdutório do núcleo temático, problematizando, por um lado, em várias
dimensões, a Declaração Universal dos Direitos Humanos, e, por outro lado,
apresentando propostas capazes de participar na humanização das sociedades. O
texto desenvolve-se nas linhas de argumentação que constituem o fio condutor
dos cinco artigos do núcleo que a Autora apresenta.
O texto de Cândido Alberto Gomes e Adriana Lira problematiza a possibilidade de
os Direitos Humanos serem uma utopia num mundo distópico, organizando-se à
volta de questões como o possível desvanecimento dos direitos humanos, as
perspectivas das novas gerações, a viabilidade da educação para os direitos
humanos e, numa resposta afirmativa, as suas principais características.
Carlos Estêvão reflete sobre a complexidade da relação entre "novo humanismo" e
"conceitos de democracia, direitos humanos e justiça". Na medida em que está ao
serviço de lógicas de mercado, "o discurso humanista atual esconde", segundo o
autor, "pontos cegos" que importa tornar visíveis. A fim de "reverter
criticamente a situação" e "dignificar a democracia, os direitos e a justiça",
o autor conclui com uma proposta de um outro humanismo.
O texto de Mariano Fernández Enguita sustenta que os educadores têm que
traduzir na escola valores sociais onde se combinem igualdade e equidade, ao
mesmo tempo que têm de compatibilizar critérios que, apesar de estarem em
contínua tensão, compõem a justiça escolar: respondendo "a duas possibilidades
extremas mas não raras: por um lado, a de quem, desfavorecido pela natureza ou
pela história, se vê condenado a uma posição de desvantagem por um tratamento
formalmente igual, requerendo um esforço compensatório, de solidariedade; por
outro, a de quem possui capacidades extraordinárias, que também tem direito a
desenvolver ao máximo, o que requer uma política de cultivo da excelência"
O penúltimo texto de Álvaro Laborinho Lúcio defende a necessidade de se educar
para os direitos, o que, segundo ao Autor, significa "educar para os direitos
do outro", exigindo também que nas práticas do quotidiano da escola se tenha
efetivamente inscrito uma cultura "que estimule a solidariedade, que desenvolva
o sentido de cada um na sua projeção no outro e que permita, assim, logo no
interior da escola, uma efetiva aprendizagem da inclusão, contra a exclusão".
Ana Maria Eyng apresenta um estudo sobre as percepções de gestores escolares,
professores, pais e conselheiros tutelares sobre a rede de proteção na garantia
de direitos de crianças e adolescentes. Com os resultados do diagnóstico é
possível, segundo a Autora, "esboçar ações estratégicas, no fortalecimento dos
sujeitos para as múltiplas configurações que o trabalho de proteção e garantia
de direitos demanda a partir da escola".
Resta-nos esperar que estes textos que agora são dados ao diálogo científico
sejam de grande impacto para todos, sobretudo para a compreensão dos fenómenos
educativos e, concretizando algumas das suas propostas, contribuam para uma
escola mais justa e solidária.
Centro de Investigação em Educação
Instituto de Educação
Universidade do Minho - Campus de Gualtar
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