Uma Mulher Singular: Mary Shelley (1797-1851)
DOSSIER: HISTÓRIA, HISTÓRIA DAS MULHERES, HISTÓRIA DO GÉNERO. PRODUÇÃO E
TRANSMISSÃO DO CONHECIMENTO HISTÓRICO
RESUMÉ
Frankenstein est devenu un mythe qui dure depuis 200 ans et est mondialement
connu. Mary Shelley, auteur de Frankenstein ou le Prométhée Moderne, est restée
inconnue soit auprès du public, soit dans les milieux académiques pendant de
nombreuses années. L'éclat de ses parents, Mary Wollstonecraft et William
Godwin, de son mari, Percy Shelley et de son cercle d'amis, y compris Lord
Byron, sont parmi les nombreux éléments qui ont contribué à ce qu'elle fut
cachée de l'histoire. Dans cet article, nous prétendons présenter un bref
résumé de la vie et de l'immense ouvre de cette femme indépendante, déterminée,
innovante, d'une culture exceptionnel, qui ne s'est pas pliée au rôle imposé
aux femmes de son époque.
Mots-clés: discrimination, genre, Romantisme, cachée de l'Histoire.
As personagens Dr. Frankenstein e a sua Criatura são mundialmente conhecidas; a
autora, Mary Shelley, nem tanto. É certo que, por vezes, criador e criatura se
confundem e, no imaginário que as representações teatrais e cinematográficas
nos deixaram, a designação Frankenstein seja atribuída à Criatura. Essa
confusão (ou fusão, decorrente do horror que ambos causam) não altera a
popularidade com que o mito Frankenstein se mantém há duzentos anos. Desde 1 de
janeiro de 1818, quando pela primeira vez Frankenstein: Or, The Modern
Prometheus foi publicado, sucessivas edições mantiveram-no, até hoje, presente
nas livrarias. Ao invés, a extraordinária vida e a vasta obra de Mary Shelley
permaneceram mais de um século na obscuridade, envoltas no espesso véu que a
História, com muito engenho e arte, tem imposto a tantas mulheres notáveis.
A visão androcêntrica do mundo ' interiorizada por muitas mulheres a quem foram
negados o direito ao ensino, a participação na vida pública e política, a
possibilidade de exercerem atividades fora do lar; as leis que lhes negaram
quaisquer direitos tornando-as pertença do pai ou do marido, a moral social
instituída, a intransigência do puritanismo vitoriano e a sua influência além-
fronteiras ' oferece uma explicação óbvia para a invisibilidade das mulheres em
geral e da obra e da vida daquelas que não respeitaram e contrariaram a ordem
social estabelecida, como é o caso de Mary Shelley. A autora foi apresentada em
textos mencionando aspetos parcelares da sua vida e obra, por vezes deturpados,
ou mesmo injuriosos, como, por exemplo, o de Edward John Trelawny publicado em
1878 e mais tarde reeditado (Trelawny, 2000: 297-99). Lembremos ainda que a
nora de Mary Shelley, a transbordar de amor e admiração pelos sogros, organizou
a publicação de um livro em que as suas vidas e obras são limadas, em parte
ocultadas e igualmente deturpadas, neste caso, para as retratar em consonância
com as virtudes exigidas pelos cânones vitorianos (Shelley, 1859).
Porventura, outros fatores de ordem específica contribuíram para tão flagrante
esquecimento: a notoriedade de que os pais de Mary Shelley foram alvo; a
celebridade que a poesia do marido alcançou ' ironicamente em grande parte
devida ao excelente trabalho de Mary na divulgação da sua obra '; a sua
personalidade sóbria, pouco expansiva; o próprio vulto que o seu livro mais
famoso adquiriu. Frankenstein ganhou vida própria, independentizou-se da sua
autora. Mary Shelley foi, não raras vezes, mencionada como a filha da grande
defensora dos direitos das mulheres, Mary Wollstonecraft, e do romancista e
grande teórico da justiça política, William Godwin; foi avaliada como a mulher
do grande poeta do Romantismo britânico, Percy Bysshe Shelley, beneficiando do
convívio com Lord Byron e outras figuras eminentes. No auge do movimento
feminista, Margaret Leighton publicava uma biografia de Mary Shelley, a que
dava o título Shelley's Mary. Era, pois, ainda possível, em 1973, designá-la
por Mary do seu marido Shelley'.
A confluência de vários factores veio alterar drasticamente esta situação.
Acervos, durante décadas guardados, passaram a estar disponíveis ao público e
foram organizados; um renovado interesse em Frankenstein foi suscitado pelo
olhar crítico que o livro lança a uma ciência sem escrúpulos, ávida de poder;
os movimentos ecologistas ' e não só ' descobriram nele os inúmeros desafios
éticos, políticos, antidiscriminatórios, premonitórios. A acusação de que a
autoria de Frankenstein se devia primordialmente a Percy Shelley foi
liminarmente refutada após a análise dos respectivos manuscritos. A sua
publicação fac-similada e anotada (Robinson, 1996) revela cabalmente que o
manuscrito saiu da pena de Mary. São visíveis algumas sugestões de alteração e
notas nas margens do manuscrito com a caligrafia de Percy, decorrentes da
revisão que, certamente, Mary lhe pediu e que, curiosamente, na opinião de
alguns autores, nem sempre contribuíam para melhorar o texto. A colaboração
entre os dois era, aliás, uma prática regular e, não só Mary pedia opinião a
Percy sobre os seus textos, como lhe dava a sua opinião sobre temas, textos,
poemas que o poeta escrevia e que Mary copiava.
A aproximação do bicentenário do nascimento de Mary Shelley atraiu
investigadoras e investigadores. As suas cartas (Bennett, 1980-83) e o diário
(Feldman, e Scott-Kilvert, 1987) ' inicialmente com entradas tanto de Mary como
de Percy e, a partir de certa altura, exclusivamente de Mary ' foram estudados,
anotados e publicados, os seus contos (Robinson, 1976), romances, ensaios,
biografias, poemas foram descobertos e reeditados (Crook, 1996 e 2002), estudos
sobre Mary Shelley, fundamentados em fontes primárias, começaram a aparecer. Em
Portugal, publicam-se ensaios (v.g. Vasconcelos, 1985; Pires, 1985; Sousa,
1993). A grande revelação surgira: Mary Shelley é uma mulher de cultura
invulgar, com uma vasta obra em grande parte publicada sob anonimato; a sua
vida é rica em tragédia, determinação e luta.
Filha de dois defensores da liberdade de direitos para homens e mulheres,
famosos pelas suas teorias sobre reformas sociais expressas em livros e pela
aplicação desses princípios às suas vidas pessoais, Mary Shelley teve uma
infância iluminada, numa época de revolução política, social e científica.
Onze dias após o seu nascimento em Londres, a 30 de agosto de 1797, a sua
aclamada mãe morria de uma infecção pós-parto. Mary cresceria, porém, num
ambiente intelectual, acarinhada pelo pai e acompanhada pela meia-irmã Fanny,
que Godwin considerava como sua própria filha, embora fosse fruto de uma
anterior ligação de Mary Wollstonecraft com o americano Gilbert Imlay. A
presença da memória da mãe, constantemente evocada, era simbolizada pelo seu
retrato pendurado na parede. A casa era frequentada pelos amigos da família,
intelectuais radicais, escritores, entre os quais se contavam os poetas da
primeira geração do Romantismo britânico: Coleridge, Wordsworth, Hazlit,
Southey. Hanna, irmã de William Godwin e entusiástica admiradora de Mary
Wollstonecraft, acrescentava o cuidado e a atenção que se prestava à educação e
ao crescimento das meninas.
O segundo casamento de William Godwin com Mary Jane Clairmont iria alterar
radicalmente o ambiente daquela casa: o núcleo familiar duplicou. Mary Jane
trazia consigo Claire, de três anos, e Charles, de seis, filhos de duas
relações que tivera. Fanny era, então, uma criança de sete anos e Mary de
quatro. Algum tempo depois nascia William, filho de Mary Jane e de Godwin.
Embora as tertúlias intelectuais, políticas e artísticas continuassem, alguns
assíduos frequentadores afastaram-se; as visitas da tia Hanna terminaram. Os
que deixaram de aparecer lamentavam que a nova Mrs. Godwin em nada se
comparasse à extraordinária Mary Wollstonecraft. A pequena Mary Wollstonecraft
Godwin detestava a madrasta, sentia que a estreita relação que tinha com o pai
(e com a mãe, através dele) lhe fora roubada.
Quando, aos dezasseis anos, Mary decidiu fugir com Percy Shelley, o poeta
rebelde, que viria a ser reconhecido como um dos expoentes da segunda geração
do Romantismo, a sua cultura era já vasta. Das cinco crianças que cresceram
juntas, sob o teto protetor de William Godwin, onde a justiça, a ética, a
cultura eram valores dominantes, Mary era olhada como a continuadora dos ideais
republicanos e literários que imperavam na família.
A fuga foi um ato consciente de coragem e de determinação: Mary escolheu a
paixão. Essa escolha representa uma ruptura brusca na vida de Mary Shelley; vai
marcar todo o seu percurso futuro. Ainda que os pais se tivessem pronunciado
contra as amarras que o casamento significava numa sociedade opressora, Godwin
opôs-se-lhe categoricamente. Conhecia bem Percy ' um jovem talentoso expulso de
Oxford pela publicação de The Necessity of Atheism, influenciado pelos
princípios godwinianos ' que o visitava com a mulher, Harriet, como um
discípulo que procura o mestre escolhido. Embora, na altura em que fugiram,
Percy não vivesse com Harriet, esta estava grávida da segunda criança do casal.
Após a fuga consumada, Godwin cortou relações com os fugitivos. Essas relações
seriam, contudo, passados alguns anos, reatadas.
Nada faltou ao sabor romântico e romanesco de que esta fuga, no dia 28 de junho
de 1814, se revestiu. Fugiram numa carruagem até Dôver, onde fariam a travessia
do Canal da Mancha num pequeno veleiro. A tremenda tempestade que se levantou
ameaçava naufrágio. À vista de terra, Percy exclamou: «Olha, Mary. O Sol ergue-
se sobre França» (Feldman e Scott-Kilvert, 1995: 7). Em Calais, desembarcaram
numa praia; lentamente, caminharam na areia até ao hotel, onde pernoitaram. Um
hotel com história, aquele onde Laurence Sterne iniciara o seu livro A
Sentimental Journey Through France and Italy. Por bagagem, levavam escassa
roupa, muitos livros e pouco dinheiro. O seu destino era Uri, o berço da
Confederação Helvética, precursora da moderna Suíça. Atraía-os a lenda de
Guilherme Tell, os ecos da Revolução Francesa que ainda perduravam, o
Iluminismo que nascera no continente europeu. Desejavam aí permanecer, fundar
uma comunidade livre de preconceitos, em que os direitos das mulheres fossem
reconhecidos. Deixavam com prazer a despótica Inglaterra.
Claire, a filha de Mrs. Godwin, acompanhava-os na fuga. Porquê, nunca ficou
cabalmente esclarecido. Nenhuma carta, documento, apontamento em diários nos
permite afirmar se Claire exigiu que a levassem na grande aventura, ou se pediu
e o seu pedido foi naturalmente aceite (Stocking, 1968 e 1995). Certo é que
Claire seria daí em diante uma presença constante nas vidas de Mary e Percy,
Constantia Clairiae, como ironicamente se lhe referiam quando surgiam atritos
entre Claire e algum deles.
O grupo era atraente. As jovens envergavam os seus vestidos de viagem de seda
preta, como a moda exigia: «uma [Mary] esguia, frágil, não muito alta, de
cabelo cor de fogo e ouro e profundos olhos de um cinzento-escuro-esverdeado, e
outra [Claire], mais robusta, de cabelo preto e olhos negros vibrantes»
(Queiroz, 2014: 21). Percy, nos seus 21 anos, alto, louro e de olhos azuis,
olhar terno e franco, vestia «em consonância com a moda de um gentleman da
época» (Bieri, 2008: 60), divergindo deste no modo despreocupado como usava a
sua cara roupagem e no cabelo, que deixava crescer.
Os três deambularam pela Europa a pé, de burro, numa mula, em pequenos barcos
de pescadores, ocasionalmente em diligências, dormindo onde podiam, comendo
quando podiam. Como hippies (com século e meio de avanço), viveram seis semanas
de felicidade plena, não exigindo mais da vida do que o amor que os unia, as
paisagens que os extasiavam, a escrita, a permanente leitura, entre outros, de
Shakespeare, de Mary Wollstonecraft, do abade Barruel que, embora crítico feroz
das ordens maçónicas e dos Illuminati da Baviera, lhes fornecia dados
preciosos, que os interessavam. Sentiam-se viajantes com uma missão, viam-se a
dar os primeiros passos na construção de uma comunidade nova, livre de
injustiças sociais. Muito ficou meticulosamente registado nos seus diários: no
de Mary e Percy ' Shelley and Mary's Journal Book ' e no de Claire.
Passadas seis semanas, o sonho caía por terra. Já não tinham dinheiro, não
havia mais relógios ou correntes de ouro para vender. Rendidos, voltaram a
Londres. Viver em Inglaterra não foi fácil. O escândalo da fuga alastrara, o
anátema do pecado, do comportamento impróprio pesava sobre eles, sobretudo
sobre ela: as portas dos amigos fechavam-se. Percy Shelley, filho de um barão
rico, tinha más relações com o pai. As divergências políticas e religiosas eram
incompatíveis. Primogénito, por lei herdeiro do baronato, obtinha, então,
empréstimos causa mortis, a juros elevadíssimos, que lhe permitiam viver. A
primeira criança, uma menina, nasceu prematura e morreria poucos dias depois.
Mary teve um enorme desgosto. No seu isolamento, mudando de casa frequentemente
para fugir a credores, nenhum deles descurava o trabalho: estudavam, liam,
escreviam. Percy desgostava-se com o mau acolhimento que a sua poesia recebia
dos críticos, com a repressão que o governo conservador exercia sobre os
trabalhadores. Em breve, decidiram partir de novo.
Já com outro bebé, William, Mary e Percy, novamente acompanhados por Claire,
deixavam Inglaterra a 3 de maio de 1816, com destino a Genebra. Aí deu-se o
famoso encontro com Byron, que tivera em Londres uma breve relação sexual com
Claire. Nas margens do lago Léman, o grupo de Mary arrendou uma simpática
vivenda, Maison Chapuis. Byron, que apreciava o convívio com Shelley, instalou-
se com o seu grupo, que contava com o seu médico John Polidori e o mordomo
Fletcher, numa bela e vasta mansão, Villa Diodati. As duas casas ficavam a
escassos passos de distância.
Além dos passeios de barco no lago, aos arredores e glaciares, extensamente
documentados em poemas, cartas, diários e livros, as extraordinárias
tempestades que se abateram sobre o lago nesse ano sem Verão' proporcionavam
os longos serões no salão de Villa Diodati. Claire reatou temporariamente a sua
relação com Byron; o belo jovem Polidori sentia-se atraído por Mary.
Na Villa Diodati falava-se de poesia, política, ciência, lia-se literatura
gótica. Num desses serões, Byron propôs aos convivas que, cada um, escrevesse
uma história de fantasmas. É curioso que, em lugar de um fantasma, um espírito,
Mary tenha respondido ao desafio oferecendo a enorme criatura humana construída
pelo Dr. Frankenstein, ou seja, um corpo, uma personagem profundamente
materializada.
Este grupo com a sua aura de fama e escândalo atraía as atenções dos
veraneantes britânicos, que enviavam relatos sobre o facto de Shelley viver com
Mary e com a sua quase-irmã Claire, sobre a constante movimentação entre as
duas casas e sobre os serões na Villa Diodati de onde, com frequência, só se
saía no dia seguinte. Os jornais britânicos publicavam estes mexericos: o
epíteto de liga do incesto' foi-lhes atribuído. Embora os principais visados
fossem os poetas, a maledicência abrangia Mary, Claire, Polidori e chamuscava
algum amigo mais próximo que ocasionalmente os visitava.
De volta a Londres, à reprovação social acrescentaram-se duas tragédias que a
afectariam profundamente: o suicídio da sua meia-irmã Fanny e, dois meses
depois, o de Harriet. Mary e Percy lutaram com todas as armas de que dispunham
para ficar com a custódia dos filhos de Harriet e Shelley. A conselho de um
advogado, mas contra os seus princípios, casaram. De nada lhes valeu, o
casamento não apagava o passado; a custódia foi-lhes negada. No julgamento, o
Lorde Chanceler Eldon trouxe a lume o ateísmo de Shelley, a sua posição
política radical, a liga do incesto' a que pertenciam. Frankenstein saiu e a
crítica conservadora não a poupou: construir uma criatura humana com pedaços de
corpos humanos era blasfémia; dar-lhe vida sem intervenção divina era heresia.
Voltam com Claire ao continente europeu a 12 de março de 1818; o destino é
Itália, onde permanecem, sempre temporariamente, em várias cidades. Com eles
levam três crianças: os seus filhos William e Clara, que entretanto nascera, e
Allegra, a filha que Claire teve de Byron. Mary reata relações com duas amigas
da mãe ' Mrs. Gisborne em Livorno, Mrs. Mason em Pisa ', importantes no
reestabelecimento de elos afetivos com o passado. Dão-se com italianos, com
alguns britânicos, com revolucionários gregos que preparam a libertação da
Grécia do Império Turco. Criam raízes. Mais uma vez, associam-se a Byron, que,
desde os tempos do lago Léman, não voltara a Inglaterra e vivia, agora, em
Itália. Em Pisa, Mary funda com Percy Shelley, Byron e Leigh Hunt um periódico
literário, irreverente, The Liberal. O fulgurante e talentoso círculo de Pisa
em que se move vai ser apelidado por Southey a escola satânica'. Os jornais
conservadores britânicos ocupam-se a denegrir as suas imagens.
Se o estilo de vida intelectual e social que Mary manteve em Itália foi
grandioso, a permanência nesse país foi igualmente intensa em tragédia: com
intervalo de poucos meses, morrem os seus dois filhos ' Clara com uma infeção
intestinal, William de malária. Uma gravidez, que termina em aborto, quase a
mata. Allegra, a filha que Claire tivera de Byron, morre de tifo. Várias vezes
a depressão apodera-se dela e isola-se. Refugia-se no trabalho e escreve
artigos, poemas e dois romances, Matilda e Valperga. Acompanha o trabalho de
Percy, apoia-o com o seu juízo crítico e sereno; Byron pede-lhe conselho sobre
a publicação das memórias que escreveu; copia muitas vezes os manuscritos dos
dois poetas. No dia 8 de junho de 1822, Percy Bysshe Shelley morre num
naufrágio, ao regressar de Livorno para casa, a Villa Magni no golfo de La
Spezia, onde estão a passar o Verão. Percy tinha 29 anos, Mary 24.
Encerrava-se uma etapa fortíssima e determinante da sua vida. Com óbvia
modéstia e generosidade, confidenciava no diário:
Durante oito anos comuniquei com ilimitada liberdade com alguém cujo
génio transcendia a grande distância o meu, despertava e guiava os
meus pensamentos. [ ] Agora estou só oh, tão só! [ ] Pensei em como
tinha sido superiormente privilegiada ao estar unida a alguém a quem
me podia revelar e que me podia compreender! Bem, agora estou
reduzida a estas páginas brancas que mancho com negras imagens
(Feldman e Scott-Kilvert, 1995: 429-30).
Mary lutou desesperadamente para se manter com Percy Florence Shelley, o filho
que entretanto nascera e seria o único a sobreviver. Queria ficar em Itália com
o filho, viver do seu trabalho de escritora, apoiar-se no afecto dos amigos,
publicar a obra de Shelley, tão maltratada e tão mal divulgada; horrorizava-a a
ideia de voltar a Inglaterra, onde iria encontrar a hostilidade da sociedade
puritana e da família de Shelley, que a desprezava.
Mas Byron, que a apoiara depois da morte de Percy, decidira juntar-se à luta da
Grécia e para lá seguiria, onde viria a morrer vítima de uma infeção, a 19 de
abril de 1824. Os amigos dispersaram-se: alguns voltaram a Inglaterra; Leigh
Hunt, numa situação financeira desastrosa, foi para Florença com a sua numerosa
família; Claire juntou-se ao seu irmão Charles Clairmont em Viena, onde este
vivia. Daí, viajou para a Rússia, onde trabalhou largos anos como precetora. O
círculo de Pisa desmoronara-se.
Após um ano de luta para se manter com o filho em Itália, Mary reconhece que
não consegue sobreviver. É com ansiedade que volta a Inglaterra, onde chega a
25 de agosto de 1823. O sogro, Sir Timothy, recusa-se a vê-la, mas acede a
contribuir com uma pequena anuidade para a educação do seu neto Percy Florence,
por quem se não interessa. Depois da morte do seu legítimo herdeiro, o poeta
Percy Bysshe Shelley, o sucessor ao baronato é, por lei, Charles Bysshe
Shelley, o primeiro filho de Percy e de Harriet. Sir Timothy já o instalara e
orientava a sua educação em Field Place, a mansão ancestral dos Shelley, em
Sussex. Contudo, quase com 12 anos, Charles morre com tuberculose a 14 de
setembro de 1826. O facto de, agora, Percy Florence passar a ser o herdeiro dos
domínios de Field Place não demove os avós, que pouco alteram o seu
desinteresse pela educação do neto. Mary nunca se encontraria com a família do
marido; Sir Timothy impõe que as negociações sejam mediadas pelo seu procurador
e avisa Mary de que o apoio financeiro concedido não é mais do que um
empréstimo, a ser pago com juros após a morte de Sir Timothy.
Mary escreve incessantemente. Publica o primeiro livro de poemas do marido:
Posthumous Poems of Percy Bysshe Shelley (1824), bem aceite pelo público e pela
crítica. No prefácio, onde promete a publicação de uma biografia do poeta para
breve, dá conta da causa por uma sociedade socialmente mais justa, que orientou
a vida e obra de Percy Shelley. Anota os poemas, referindo datas, dados
biográficos e descritivos das condições pessoais, sociais e políticas
subjacentes à origem de cada um, um trabalho que só ela, que acompanhara de
perto a elaboração da obra de Shelley, poderia ter feito. Essa prática,
inovadora na época, vai repeti-la uns anos mais tarde (1839-40), quando,
finalmente, consegue publicar a obra completa de Shelley.
A organização da obra de Percy Shelley é reconhecida como um trabalho
extraordinário. A partir de um amontoado de cartas, folhas de papel quase
ilegíveis, amarelecidas pelo tempo, desorganizadas, muitas sem data, textos e
poemas incompletos, Mary conseguiu criar, não um corpo humano como em
Frankenstein, mas «um corpus literário póstumo» (Wolfson, 2003: 197). Para
Emily Sunstein,
A edição de Mary Shelley da obra de Shelley afirmou-o como um dos
maiores poetas ingleses e as suas notas continuam a ser uma mina para
os estudiosos de Shelley. Tem sido dito que as tentativas de
relacionar a obra de um poeta com as circunstâncias em que foi
escrita teve origem nela (Sunstein, 1991: 345).
Susan Wolfson confirma esta apreciação ao comentar que «as suas edições
constituíram um momento de viragem na receptividade [à obra] de Percy Shelley e
influenciaram profundamente editores posteriores» (Wolfson, 2003: 209, n.12).
Muriel Spark comenta que o facto de «as Notas de Mary terem sido incluídas na
edição definitiva da poesia de [Percy] Shelley da Oxford é, possivelmente, o
mais elevado reconhecimento que ela recebeu neste século [XX]» (Spark, 2002:
214).
Posthumous Poems teve êxito. As críticas foram favoráveis e, embora o nome de
Mary não constasse como a organizadora e anotadora da obra, Mary era citada nos
jornais de crítica literária. A fúria de Sir Timothy explodiu. Através do seu
procurador, fez saber a Mary que, ou os exemplares ainda não vendidos eram
retirados do mercado, ou não haveria qualquer apoio financeiro ao seu filho
Percy Florence. O nome de Percy Bysshe Shelley não deveria aparecer a público
enquanto Sir Timothy fosse vivo; nem tão pouco o de Mary Shelley. Ela e o filho
não deveriam ausentar-se de Inglaterra. Esta sentença monstruosa foi, de certo
modo, atenuada com a intervenção de Thomas Love Peacock, um amigo de longa
data, na altura com uma posição socialmente respeitável aos olhos de Sir
Timothy e do seu procurador. Peacock argumentou que Mary não poderia sobreviver
com a miserável anuidade que lhe era concedida, que o seu nome tinha aparecido
na imprensa porque era conhecida como escritora: Mary não assinara o livro. Sir
Timothy reconsiderou, aumentou-lhe um pouco a anuidade e já não eram muitos os
exemplares que restavam quando foram retirados das livrarias.
O poder de Sir Timothy, a lei que não defendia as mulheres, a terrível
lembrança de que a custódia dos filhos de Harriet fora recusada, a si e a
Percy, assustaram Mary. Os riscos que o filho e ela corriam eram demasiadamente
sérios para não serem levados em consideração. Assim, Mary não ousou lançar-se
na publicação imediata da restante obra.
Porém, o receio das represálias de Sir Timothy não a paralisou. Continuou a
recolher e copiar poemas, textos, cartas dispersas de Percy; estava determinada
a completar esse trabalho e esperava a ocasião certa para o fazer. Esta só
ocorreu quinze anos após a publicação de Posthumous Poems. Entretanto, muitas
publicações traziam poemas de Shelley, alguns secretamente fornecidos por Mary,
e as edições piratas com os poemas de índole política, divulgadas entre as
classes trabalhadoras e adoptadas quer pelos Cartistas quer pelos partidários
da utopia de Owen, apareciam em grande quantidade, muitas vezes extratos, com
os poemas deturpados ou com omissões. A poesia de Shelley chegara aos meios
radicais americanos numa edição saída em Nova Iorque, em 1821; apareceram
várias traduções em alemão, uma delas, mais tarde, da autoria do jovem Engels,
quando fervilhavam os movimentos revolucionários de 1848. Sir Timothy
convenceu-se, por fim, de que não conseguia esconder do público o nome e os
poemas do filho: em 1839, Mary foi autorizada a publicar os restantes volumes,
o que oferecia, ao menos, a garantia de que apareceria a púbico a obra
fidedigna de Percy Bysshe Shelley.
Do mesmo modo, Mary continuou a escrever, embora não assinasse o que publicava.
Além de romances, escrevia contos, crónicas, críticas, poemas para vários
periódicos e anuários muito em voga na época. Os anuários eram álbuns
destinados a serem presentes de Natal ou de aniversário, que saíam em novembro
de cada ano e cujos textos contribuíram muito para o desenvolvimento do conto
moderno. The Keepsake, onde Mary publicou muitos dos seus trabalhos, continha
poesia, ficção, belas ilustrações; com larga difusão, a edição era muito
cuidada e cara. A qualidade dos textos publicados pode ser avaliada pela
crítica de The Athenaeum à edição de The Keepsake de 1829, ao assinalar «com
aprovação a presença entre os seus colaboradores de Coleridge, Scott, Southey e
Wordsworth, lado a lado com Mackintosh, Moore e Mrs. Shelley» (Williams, 2000:
129).
Mary Shelley colaborou com enorme prazer nos cinco volumes dedicados à
biografia da prestigiada enciclopédia dirigida por Dionysius Lardner, The
Cabinet Cyclopaedia. Lives of the Most Eminent Literary and Scientific Men of
Italy, Spain and Portugal (1835-7) e The Cabinet Cyclopaedia. Lives of the Most
Eminent Literary and Scientific Men of France (1838-9). Embora muitas
contribuições para The Cabinet Cyclopaedia não fossem assinadas, foram já
referenciados trinta e oito autores. No que toca aos volumes em que Mary
Shelley colaborou, das sessenta e oito biografias de eminent men (em que estão
incluídas quatro mulheres: Vittoria Colonna, Madame de Sévigné, Madame Roland e
Madame de Staël), sessenta e uma foram identificadas como sendo da sua autoria.
As biografias dos autores portugueses ' Bernardim Ribeiro, Gil Vicente,
Francisco de Sá de Miranda, António Ferreira, Luís Vaz de Camões ' saíram todas
da pena de Mary, que menciona também Jorge de Montemor, o qual, ainda que
escrevesse em castelhano, era português.
As contribuições para os anuários ostentam o cunho do seu estilo literário, da
sua vasta cultura e ironia; contudo, era, em parte, a necessidade de ganhar
dinheiro que levava Mary Shelley a escrevê-las. Além de serem textos
encomendados, muitas vezes para acompanhar belas ilustrações previamente
escolhidas (e não o contrário), ficava desesperada por não poder dar largas à
sua imaginação e por ter um espaço limitado para expor as suas ideias:
Quando escrevo para eles, morro de preocupação para fazer as minhas
coisas cada vez mais curtas ' até me convencer que as pessoas apanham
as ideias por intuição ' e que é uma superstição considerar que as
palavras são necessárias para a sua expressão (Bennett, 1995: 256),
lamentava-se Mary a Mrs. Gisborne.
Por outro lado, ao escrever as biografias para The Cabinet Cyclopaedia, entre
1834 e 1839, Mary sentia-se mergulhada na vida de autores que tão bem conhecia
e tanto apreciava. Considerava o género biográfico o melhor meio para veicular
a História. Uma historiografia convencional ' que descrevesse a trama de
conquistas militares e do poder monárquico, um amplo traçado dos movimentos
nacionais na direção do progresso ' não lhe interessava. Ainda que não
desprezasse o rigor dos factos, Mary via na convergência entre a biografia e a
História um meio de, através da vida passada, chamar a atenção para a política
do tempo presente. As suas biografias consistem numa inserção do privado no
contexto social, político e histórico, em que os afetos são parte integrante.
Mary Shelley considera que a literatura biográfica deve «formar, tal como se
fosse uma escola onde se estuda a filosofia da história» (Cit. in Kucich, 2003:
228). Para Johanna Smith, as «lições» históricas de Shelley antecipam
claramente as críticas àquilo que as historiadoras feministas hoje designam
«sistemas de sexo-género» que são «injuriosas para as mulheres» (Smith, 1996:
122).
As grandes causas da vida de Mary Shelley após a morte do poeta ' publicar a
obra de Percy Shelley, educar o filho, escrever ' foram cabalmente conseguidas,
maugrado a cruel rejeição de Sir Timothy. Percy Florence frequentou a public
school de Harvard e licenciou-se em Cambridge; quando o avô morreu aos 90 anos,
a 24 de abril de 1844, herdou o título de 3º barão de Castle Goring, bem como
as propriedades da família Shelley. Sabendo que Field Place viria a pertencer a
um neto que mal conhecia, bem como a Mary, que detestava, Sir Timothy deixou
degradar o domínio; no seu testamento, doava todos os bens que a lei permitia à
mulher, Lady Elizabeth Shelley, às duas filhas solteiras e ao filho mais novo.
O rendimento com que Mary e Percy Florence ficaram não era suficiente para
pagar as dívidas e cumprir os compromissos. Uma gestão cautelosa e o casamento,
em 1848, de Sir Percy Florence com Jane St. John, agora a nova Lady Shelley,
uma viúva que tinha algum dinheiro, alteraram radicalmente a vida de Mary.
Voltou várias vezes a Itália, o país onde tinha querido viver e onde deixara as
cinzas de Percy Shelley e de dois filhos. Os últimos anos de vida de Mary
Shelley foram atormentados por cefaleias e paralisias temporárias, só mitigadas
pela constante companhia de Percy Florence e pela grande amizade que uniam
sogra e nora. Morreu, provavelmente com um tumor cerebral, a 1 de fevereiro de
1851. Tinha 53 anos.
Nas cartas e no diário, Mary lamenta muitas vezes a solidão da sua vida depois
da morte de Percy. Contudo, embora não fosse recebida nos salões de uma elite
convencional, que se escandalizava com o seu passado e com a heterodoxia da sua
vida e da sua obra, conviveu com intelectuais e artistas, que a estimavam, ia
ao teatro, à ópera, a concertos. Mary teve vários pretendentes, mas não voltou
a casar. Os retratos que chegaram até nós e as memórias de autores seus
contemporâneos, dão-nos uma ideia dos seus traços físicos e da recordação que
deixava nos meios em que se movia.
Mary Cowden Clarke, filha de Vincent Novello, um músico de renome e organista
na Capela da Embaixada de Portugal em Londres, menciona-a nos seus livros. Num
deles, escreve:
Certamente, Mary Wollstonecraft Godwin Shelley era, então, a figura
central de atenção aos meus olhos de jovem; e eu olhava para ela com
imparável admiração tanto pelos seus encantos pessoais como pela sua
distinção literária. [...] Para mim, concentrava o charme e o
interesse que perpetuamente me excitavam e absorviam enquanto
visitante da casa de meus pais. O meu pai tinha uma consideração
especial por ela; e ela evidenciava uma estima por ele igualmente
afectuosa (Clarke, e Cowden, 1878: 41).
Na opinião de Eliza Rennie, Mary era
Uma mulher muito interessante, adorável, [...] com uma pele
requintadamente clara, olhos cinzentos; feições delicadas, [...]
cabelo castanho-claro brilhante, sedoso na textura e luxuriante na
profusão, pendendo em longos canudos sobre a sua face pálida e,
apanhados atrás, caíam ondeados nos seus ombros; uma testa alta.
[Tinha uma voz] baixa, suave, murmurante. [ ] Mas, com esta
suavidade, não havia traços de indecisão nem de fraqueza [...], antes
o mais firme propósito. Com afectos calorosos e fortes, [era] uma
amiga sincera e fiel (Rennie, 1860: 106, 107 e 109).
Emily Sunstein escreve na sua excelente biografia:
A carreira de Mary Shelley traça toda a trajetória de uma vida
Romântica e o seu significado especial está no seu papel tanto de
protagonista da era gloriosa como no de um seu sobrevivente. A sua
vida proporciona também um estudo aturado da condição superior de
ser mulher', da criatividade literária e da problemática do feminismo
Romântico. Durante o processo de estudo, esta biografia tornou-se um
labor de respeito e convicção de que Mary Shelley constitui a sua
própria reivindicação (Sunstein, 1991: 8).
Mary Shelley deixou-nos sete romances: Frankenstein: Or, The Modern Prometheus
(1818 e 1831), Matilda (escrito em 1819-20, publicado pela primeira vez em
1959), Valperga; or, The Life and Adventures of Castruccio, Prince of Lucca
(1823), The Last Man (1826), The Fortunes of Perkin Warbeck, A Romance (1830),
Lodore (1835), Falkner. A Novel (1837). A sua carreira literária publicada em
vida teve início e final com dois livros de viagens: History of a Six Weeks'
Tour through a Part of France, Switzerland, Germany, and Holland; with Letters
Descriptive of a Sail round the Lake of Geneva, and of the Glaciers of Chamouni
(1817), escrito em colaboração com Percy Bysshe Shelley, e Rambles in Germany
and Italy, in 1840, 1842, and 1843 (1844). A sua obra inclui ainda um vasto
número de contos, ensaios, críticas literárias e a coordenação de vários textos
literários, com particular destaque para a organização e notas da obra de Percy
Shelley.
A sua obra é inovadora. Com originalidade, «redefiniu a noção de mistura de
géneros', desde uma amálgama de poema e prosa até a um estilo de prosa
intercalada por longas reflexões poéticas, pelas quais foi quer aplaudida, quer
recriminada» (Bennett, 2003: 211). As suas cartas privadas são muitas vezes
transformadas em cartas ficcionadas para exprimir as suas convicções políticas
e posições filosóficas (v.g. Rambles). Mary Shelley quebrava regras e
convenções; a política e o poder, assuntos destinados aos homens, são
frequentemente o foco principal dos seus romances; são também motivo para as
ferozes críticas de que foi alvo. De modos muito diferentes dos de alguns
escritores do Romantismo inglês, usou o género epistolar para associar questões
públicas com privadas. As suas heroínas (v.g. Valperga e The Last Man) não
estão exclusivamente encerradas na esfera doméstica, elas anseiam por liberdade
e reconhecimento, defendem formas sociopolíticas democráticas, criticam abusos
de poder, a descriminação das mulheres. As suas ficções são «arrojadas,
heterodoxas e experimentais» (Schor, 2003: 3).
Frankenstein representa a antecipação dos perigos que a tão aclamada revolução
científica do Romantismo encerra; dos riscos que provêm da intervenção
tecnológica no mundo natural, motivada pela ambição (seja ela da fama, do poder
político ou económico), na ausência de ética e de respeito pelo equilíbrio
terrestre, na ausência do princípio de precaução'. Hoje os resultados estão à
vista. A noção de que a espécie humana e a Natureza se opõem e a de que o
domínio da Natureza serve o bem da humanidade, como Francis Bacon anunciou no
século XVII, está implícita na ambição do Dr. Frankenstein ao querer penetrar
«nos mistérios da Natureza e mostrar como ela funciona nos seus recessos mais
secretos», de «adquirir novos poderes quase ilimitados», de ter «domínio sobre
os raios do céu, imitar o tremor de terra», de «zombar do mundo invisível»
(Shelley, 2003: 38). É irónico que Mary Shelley tenha morrido no ano da Grande
Exposição Industrial, no Crystal Palace de Londres: 1851. O olhar crítico de
Mary Shelley sobre os benefícios dessa ciência sem fronteiras, considerada
inquestionavelmente o triunfo da humanidade, não foi, contudo, inteiramente
partilhado por Percy Shelley. «Uma pena na mão e os meus pensamentos afluem
depressa» (Cit. in Bennett, 1995: xxix), disse uma vez Mary Shelley. Mary não
foi, na verdade, Shelley's Mary.