III Colóquio «A Nova Lisboa Medieval»: Gentes, Espaços e Poderes(Lisboa, 20-22
de Novembro de 2013)
VARIA
III Colóquio "A Nova Lisboa Medieval": Gentes, Espaços e Poderes
(Lisboa, 20-22 de Novembro de 2013).
Luís Filipe Oliveira* / João Luís Inglês Fontes**
* Universidade do Algarve, Faculdade de Ciências Humanas e Sociais –
Departamento de Artes e Humanidades, 8005-139 Faro, Portugal. E-mail:
lfolivei@ualg.pt
**Instituto de Estudos Medievais, Instituto de Estudos Medievais (FCSH-UNL),
1069-061 Lisboa, Portugal. E-mail: joaolfontes@hotmail.com
Nos passados dias 20 a 22 de Novembro de 2013, realizou-se em Lisboa o III
Colóquio A Nova Lisboa Medieval. A organização foi do Instituto de Estudos
Medievais (IEM), que assim retomou uma iniciativa do seu primeiro Director, o
Professor Luís Krus, responsável pela criação e pela dinamização daquela série
de colóquios. Os organizadores deste III Colóquio, ora subordinado a um triplo
tema — Gentes, Espaços e Poderes —, mantiveram o espírito das edições
anteriores, apostando na abertura às especialidades mais diversas e fomentando
novas abordagens interdisplinares. Tal como se dizia no texto de apresentação
do Colóquio, pretendia-se que dessa conjugação de olhares e de saberes
resultasse uma melhor compreensão “das diferentes dimensões de um núcleo urbano
muito complexo, que era uma das cidades mais dinâmicas do sudoeste peninsular e
que cedo se converteria na própria cabeça do reino português”.
A adesão dos investigadores das áreas mais diversas à convocatória para
comunicações (call for papers) foi particularmente significativa. Das quarenta
e duas propostas recebidas, foram seleccionadas perto de trinta comunicações,
distribuídas pelos três temas do Colóquio e apresentadas por investigadores
nacionais e estrangeiros. A elas, juntaram-se quatro conferências por convite,
destinadas a esclarecer aspectos menos conhecidos e a permitir comparações com
realidades próximas. A primeira serviu de abertura ao colóquio e tratou os
problemas do abastecimento de Lisboa. Foi proferida pela Professora Iria
Gonçalves, que recordou, sempre num tom muito coloquial, a multiplicidade dos
produtos que acorriam à cidade, as diferentes vias utilizadas (por terra, pelo
rio e pela foz) e a centralidade dos espaços da Portagem e da Alfândega
situados na Ribeira de Lisboa. Coube a Mathew Davies, da Universidade de
Londres, a segunda conferência do programa, na qual caracterizou o lugar de
Londres no espaço político e económico do reino inglês. As duas conferências
restantes, com que se abriram os trabalhos na tarde do dia 21 e na manhã do dia
22, foram apresentadas pelas equipas de arqueólogos responsáveis pelas
intervenções no castelo (Ana Gomes e Alexandra Gaspar) e na Casa dos Bicos
(Manuela Leitão e Vítor Filipe), tendo carreado dados importantes e inéditos
sobre a ocupação da alcáçova e da zona ribeirinha da cidade.
Talvez por isso, os testemunhos da arqueologia ocuparam um lugar de relevo
entre as comunicações apresentadas, facto inédito nesta série de colóquios
sobre Lisboa Medieval. Entre elas, cumpre destacar as que lidaram com a
ocupação do claustro da Sé (Ana Gomes e Alexandra Gaspar), com uma interessante
proposta de recuperação do espaço da mesquita, com os vestígios da Judiaria
Pequena (Manuel Fialho e Artur Ferreira), confirmando em parte as propostas de
Vieira da Silva, ou aquelas que analisaram os testemunhos da ocupação da cidade
nos séculos alto-medievais (Sara Prata e Sílvia Casimiro, Banha da Silva e
Adriaan de Man), reveladores dos contactos mantidos com o Norte de África e com
Bizâncio.
As comunicações que procuraram esclarecer a história da cidade em época
islâmica não foram menos importantes. Incluiu-se aqui um inventário parcial das
estruturas de defesa costeira da cidade (Marco Borges), com propostas que
necessitam ser discutidas e afinadas, uma tentativa de definir o lugar da
cidade no maravilhoso árabe (António Rei) e uma recuperação dos contextos das
conquistas de Lisboa e de Santarém (Inês Lourinho). A herança moçárabe de
Lisboa também não ficou esquecida, com comunicações que precisararam a época de
aculturação daquela comunidade lisboeta (Pedro Picoito), ou que reanalisaram, a
partir de dados da musicologia, o ofício da trasladação de S. Vicente (Manuel
Pedro Ferreira) e que situaram a sua produção no contexto da reforma da
cabeceira da Sé promovida por Afonso IV. As obras na Sé de Lisboa foram
objecto, de resto, de um trabalho que esclareceu a organização do estaleiro na
década de vinte do século XIV (José Augusto Oliveira) e que revelou a
importância que nele cabia ao trabalho feminino.
Entre as comunicações apresentadas, apenas três lidaram com realidades dos
séculos XII e XIII, quer para caracterizar a implantação das ordens militares
no espaço urbano (Luís Filipe Oliveira), quer para definir o papel das casas
monásticas na organização e no povoamento do termo (André Leitão), quer, ainda,
para evocar a relação desenvolvida entre os canonistas e Lisboa (Maria João
Branco), a qual era, por vezes, a sua diocese de origem. Das restantes, muitas
foram as que fixaram a atenção em cronologias já de finais da época medieval,
fosse para caracterizar os problemas do quotidiano com base na chancelaria de
João II (Gracilda Alves) e para evocar o trabalho dos artesãos do couro a
partir de regimentos do século XVI (Franklin Pereira), fosse para caracterizar
o património dos hospitais medievais na Lisboa de Manuel I (Margarida Leme).
Também se podem incluir neste conjunto as comunicações que abordaram os
problemas do urbanismo e da arquitectura na cidade, seja para caracterizar as
suas regulamentações da actividade construtiva (Sandra Pinto), seja para
definir a importância dos edifícios e dos equipamentos do concelho (Carlos
Caetano), seja, ainda, para identificar as intervenções feitas na época de
Manuel I no Paço dos Estaus (Milton Pacheco).
A dimensão mercantil de Lisboa, que havia sido recordada pela conferência da
Professora Iria Gonçalves, foi retomada noutras duas comunicações: uma delas
ensaiou uma definição do lugar da cidade nos circuitos comerciais da Europa dos
séculos XIV e XV (Flávio Miranda e Diogo Faria), propondo a existência de três
fases distintas até que ela se transformasse num entreposto obrigatório para os
mercadores europeus; a outra recuperou a figura de João Vasques de Almada, o
filho de um mercador de Lisboa que faria carreira em Inglaterra, primeiro como
vassalo do rei inglês e depois como embaixador de João I, sem que tivesse
abandonado as lides mercantis (Tiago Faria). Por atenção àquela que foi a
projecção europeia de um dos seus membros, talvez se pudesse incluir aqui o
invulgar estudo da identidade heráldica dos Bulhões (Carlos Carvalho da Fonte),
uma das linhagens de Lisboa.
Os discursos culturais produzidos pelos representantes da cidade, ou pelos
diversos grupos que nela residiam, também tiveram um lugar de destaque. Dos
primeiros, foi analisada a argumentação evocada pelos delegados enviados por
Lisboa às Cortes do século XIV e das primeiras décadas da centúria seguinte
(Adelaide Milán Costa), que atesta o crescente protagonismo da cidade na vida
do Reino, e, talvez, até a construção de uma identidade própria. No que
respeita aos segundos, procedeu-se à recuperação das vivências nas judiarias
por finais da Idade Média (José Tavim), à caracterização dos manuscritos
hebraicos de Lisboa (Tiago Moita) e à tentativa de precisar a singularidade
cultural daqueles códices no contexto peninsular (Luis Urbano Afonso), posto
que a sua cronologia sugira uma conexão íntíma com a expulsão dos judeus do
reino de Castela.
Após o encerrramento dos trabalhos na tarde do dia 22, os participantes no III
Colóquio tiveram a oportunidade de visitar o Castelo de São Jorge e a Casa dos
Bicos. A primeira visita foi guiada por Ana Gomes e Alexandra Gaspar,
arqueólogas da Direcção Geral do Património Cultural (DGPC), responsáveis pela
intervenção arqueológica realizada naquele espaço. A visita à Casa dos Bicos,
onde se procederá à musealização dum troço das muralhas da cidade, foi
conduzida por Manuela Leitão, arqueóloga da C. M. de Lisboa e coordenadora do
projecto de estudo e valorização da Cerca Velha.
COMO CITAR ESTE ARTIGO
Referência electrónica:
OLIVEIRA, Luís Filipe; FONTES, João Luís Inglês – “III Colóquio "A Nova
Lisboa Medieval": Gentes, Espaços e Poderes (Lisboa, 20-22 de Novembro de
2013. Organização de Catarina Tente, João Luís Fontes, Luís Filipe Oliveira,
Mário Farelo e Miguel Gomes Martins.” Medievalista [Em linha]. Nº15, (Janeiro -
Junho 2014). [Consultado dd.mm.aaaa]. Disponível em http://www2.fcsh.unl.pt/
iem/medievalista/MEDIEVALISTA15/oliveira_fontes1511.html.