Cooperativas e capital social: caso da Copasul,
Mato Grosso do Sul
1 Introdução
Existe certa dificuldade para o produtor rural,
diante dos atuais mercados globalizados, manter sua
eficiência e possuir maior poder de barganha estando
sozinho, ou seja, trabalhando de forma individual.
Infelizmente, nessa situação individual, o produtor
tende a perder força para realizar suas negociações
a contento.
Na busca para a solução de tal situação, a união de
esforços entre os produtores faz-se necessária, como
uma alternativa de ganhar força e representatividade
no mercado e a forma que muitos produtores têm
encontrado para realizar essa união é por meio da
cooperação. O resultado dessa cooperação, em muitos
casos, converte-se em associações e/ou cooperativas
agrícolas.
Brisola (2010) apresenta essas organizações como
espaços utilizados pelos produtores como forma
de exporem suas realidades e absorverem novos
conhecimentos. Essa ação tem o intuito de adaptar
o produtor nesse novo ambiente globalizado, o que
corrobora com a ideia de Nascimento (2000, p. 2),
que afirma: “[...] as cooperativas nascem para corrigir
relações desiguais na sociedade [...]”.
No entanto, Crúzio (1999), Nilsson et al. (2009) e
Rigo et al. (2008) elencam alguns motivos que têm
levado à falência algumas cooperativas brasileiras,
evidenciando as contradições do modelo cooperativista
atual em relação ao modelo original primitivo. A falta
de cooperação após a formação da cooperativa e
a utilização da organização em benefício próprio
(individual) podem ser considerados fatores de grande
influência para que isso aconteça.
Nota-se então que, enquanto há a cooperação entre
os membros, alguns dos problemas identificados
pelos autores não acontecem ou são minimizados.
Tomando como referência as cooperativas agrícolas
e os problemas comuns trazidos nos trabalhos de
Cruzio (1999), Nilsson et al. (2009) e Rigo et al.
(2008), pergunta-se: quais são os elementos presentes
em uma cooperativa agrícola que podem auxiliar
na manutenção de ações cooperativas por parte dos
associados?
Gulati et al. (2000) reforçam a necessidade de
mudar a forma de ação dos atores, uns contra outros
por lucro, uma vez que a sociedade tende a evoluir
para a postura mais voltada a relacionamentos
ou, como salientada por Granovetter (1985), de
conexões entre pessoas, e as ações dos envolvidos
são condicionadas pelo seu pertencimento a redes
de relações interpessoais.
Nesse sentido, o Capital Social tem sido bastante
usado em discussões relacionadas a desenvolvimento
local, cooperação, redes sociais, entre outros, como
apresentado por Vilpoux & Oliveira (2011, p. 203):
o “[...] termo capital social vem sendo utilizado
com frequência cada vez maior para explicar o
desenvolvimento social e econômico e a cooperação
entre indivíduos”.
Para a realização do estudo sobre o Capital Social,
se faz necessário também analisar a confiança
que está diretamente ligada a ele, segundo Cunha
(2000, p. 50-51) “[...] o conceito de confiança é,
geralmente, definido a partir de suas relações estreitas
com o conceito de capital social”. Outro ponto que
contribui para o estudo sobre o Capital Social está
em identificar a fonte que dá origem a ele, ou seja,
identificar o tipo de interação social existente em uma
cooperativa agrícola que auxilia na sua concepção.
Dessa forma, busca-se atingir o objetivo de
identificar a existência de interações sociais baseadas
na confiança, que dão origem ao Capital Social em
uma cooperativa agrícola.
Discussões com essa temática, no contexto atual,
estão presentes nas diferentes áreas do conhecimento
e perfis de organizações, uma vez que a cooperação
formal ou informal tem possibilidade de produzir
diferencial competitivo.
2 Revisão teórica
2.1 Cooperação
A cooperação é algo natural. Animais cooperam
entre si para atingirem objetivos comuns. Um exemplo
disso acontece com os leões que raramente caçam
sozinhos. Eles realizam, instintivamente, planos
estratégicos de cooperação para abaterem grandes
presas com a finalidade de se alimentarem de forma
satisfatória, garantindo assim sua sobrevivência e de
seu grupo (BBC, 2011). Nesse aspecto, a condição de
cooperação não é uma característica essencialmente
humana, podendo ser observada de forma instintiva
também presente em animais ditos irracionais.
Nessa perspectiva, a cooperação sempre existiu na
sociedade humana. Desde os registros mais antigos
da humanidade, a cooperação esteve presente.
Os membros de tribos da antiguidade desenvolviam
atividades de forma cooperativa. Juntavam forças
para realizar tarefas comuns, como uma caçada.
Registros históricos da antiguidade já mostravam
atividades realizadas por grupos de pessoas de forma
cooperativa (Bialoskorski, 2006).
A cooperação pode ser definida, segundo
Gianezini et al. (2009, p. 6), como “[...] uma relação
de colaboração, auxílio, trabalho mútuo e de trocas
recíprocas entre homens. É um atributo das relações
sociais que precisa ser valorizado tanto quanto é
importante”. Nesta definição, o autor, considera a
cooperação um atributo muito importante das relações
sociais e que deve ser incentivada e valorizada, dada
a sua essência de coletividade.
Segundo Souza et al. (2003, p. 290), “[...] o termo
cooperar vem do latim cum operari, que significa
‘trabalhar com’ ou ‘fazer com’”. O mesmo autor
complementa a ideia dizendo que a cooperação
“[...] é todo ato coletivo (que envolve mais de uma
pessoa) e organizado com vistas à realização de um
objetivo comum”. No entanto, o autor defende que,
nesse sentido, a cooperação não abrange todas as
formas cooperativas, apenas aquelas que possuem
objetivo comum, o que, segundo ele, não condiz
com a realidade.
O autor considera que há formas de cooperação
em que os envolvidos não possuem objetivos comuns
e, dessa forma, ele acaba definindo a cooperação
como “[...] a situação segundo a qual para que
uma pessoa alcance seu objetivo, todas as demais
pessoas envolvidas devem igualmente atingir seus
respectivos objetivos, sejam eles comuns ou não
[...]” (Souza et al., 2003, p. 291). Nesta perspectiva, a
cooperação é construída por interesses mútuos entre
os indivíduos que optam por cooperar, vislumbrando
maiores ganhos numa interação cooperativa do que
em uma interação sem cooperação (Vilpoux, 2014).
Nesse sentido, a cooperação torna-se mais
abrangente, considerando que não restringe a cooperação
apenas para o alcance dos objetivos comuns entre os
envolvidos, estendendo e abarcando outros aspectos
das relações sociais.
A cooperação entre indivíduos pode surgir de
relações familiares, de amizade, profissionais ou
mesmo por meio de catástrofes (naturais ou não).
Ela acontece por meio da interação social. Essa condição
de cooperação está na natureza humana assim como
a competição (Souza et al., 2003).
A cooperação, também denominada de ações
coletivas, vem sendo estudada, ao longo do tempo,
por muitos autores, tais como Olson (1971, 2000),
que oferece um modelo conceitual para a análise
econômica de ações coletivas, apoiado em conceitos
duplos: valor atribuído pelos indivíduos a um bem
coletivo e parcela do bem coletivo produzido que
cada indivíduo recebe. Ostrom (1990) analisou
várias comunidades e identificou situação comum
para aqueles que conseguiram gerir recursos comuns.
Estas comunidades mantiveram-se estáveis durante
um longo período, compartilharam experiência e os
grupos eram compostos de participantes que variaram
muito em relação ao capital econômico, habilidades,
conhecimento, etnia e raça.
Harsanyi (1969) afirmou que o comportamento
dos indivíduos pode ser explicado considerando
dois interesses dominantes: o ganho econômico e
a aceitação social. Nessa mesma perspectiva, Brito
(2001) considera que as ações coletivas podem
existir em um grupo de atores, ligados entre si, por
diferentes motivos, que podem ser por razão financeira,
tecnológica, cultural, entre outros.
Dessa forma, as ações coletivas podem ser expressas
por formas associativas, podendo ser entidades de
representação política e sindical, ou mesmo ações
como compras conjuntas, prospecção e venda nos
mercados externos, serviços de pós-venda, controle de
qualidade e aval solidário. Dessa forma, organizações
de pequeno porte podem amenizar suas dificuldades
com ações coletivas (Sachs, 2003).
Para Axelrod (2010), a cooperação se refere à
prática de pessoas ou entidades trabalharem em
conjunto para atingir objetivos comuns ou não.
É importante que tal perspectiva na agricultura seja
construída na perspectiva de longo prazo. Para Lusch
& Brown (1996), a diferença nessas relações entre
curto e longo prazo está apoiada na possibilidade
de trocas. As de curto prazo se referem às trocas de
mercado que se formam sob certas condições e as de
longo prazo são formadas como resultado de trocas
baseadas na cooperação, apesar de os atores terem
vivenciado perdas por um curto período de tempo.
Nesta perspectiva, podem ser construídos
sentimentos de confiança, lealdade e o desejo de
permanecer cooperando (Lusch & Brown, 1996),
pois essas relações são sentimentos construídos por
cada um e nenhum tipo de imposição garante que
esse comportamento será adotado. É algo que precisa
ser sentido e cultivado. Silva & Lourenzani (2011)
buscam identificar as relações de causa e efeito
entre as variáveis que favorecem o estabelecimento
e manutenção das ações coletivas. Constatam que há
inter-relação das variáveis que afetam a cooperação,
sendo necessárias ações para que possam atender
às demandas em produtos e processos que de forma
isolada não alcançariam. Isso promoveria ganhos
para os produtores com a inserção nos canais de
distribuição.
Diante do exposto, pode-se considerar que a
cooperação entre indivíduos que comungam de
necessidades comuns ou não, podem dar origem a
cooperativas ou associações constituídas em empresas
formais, regidas por princípios, leis e ideais, levando
em conta o conceito de cooperação apresentado por
Gianezini et al. (2009), que, em outras palavras,
significa realizar uma ação em conjunto. Assim,
torna-se conveniente o estudo dos preceitos da
cooperativa agrícola.
2.2 Cooperativa agrícola
A competitividade surgida por meio da globalização
traz alguns problemas aos produtores rurais que ainda
não perceberam o mercado competitivo em que estão
inseridos. Assim, para grupos que se encontram em
dificuldades devido a esse processo de globalização,
Schneider (2004, p. 2) mostra que uma solução pode
ser encontrada por meio do cooperativismo, afirmando
que “[...] as cooperativas são uma resposta para os
problemas impostos pela globalização”.
As primeiras cooperativas formais surgiram na
Inglaterra. Rochdale Society of Equitable Pioneers
(Sociedade dos Probos Pioneiros de Rochdale) é
considerada como a primeira cooperativa, criada
em 21 de dezembro 1844 no bairro de Manchester,
localizado na cidade de Rochdale, na Inglaterra.
Concebida por 28 tecelões com a finalidade de
enfrentar a crise industrial da época, garantia empregos
e o suprimento de necessidades básicas do grupo.
A cooperativa foi definida, segundo Andrade
& Sicsú (2003, p. 3) no Congresso da Aliança
Cooperativa Internacional (ACI), como “[...] uma
associação autônoma de pessoas que se uniram
voluntariamente para fazer frente às necessidades e
aspirações econômicas, sociais e culturais comuns
por meio de uma empresa”.
Sendo assim, a cooperativa é uma empresa formada
por uma associação de pessoas, que tem como
missão principal a intermediação entre o mercado e
a economia dos cooperados. Conforme Bialoskorski
(2000, p. 236-237), “[...] a missão fundamental
outorgada à economia empresarial cooperativa é servir
como intermediária entre o mercado e as economias
dos cooperados para promover o seu incremento,
podendo promover a integração do produtor à cadeia
produtiva”.
Na estrutura das sociedades cooperativas, o
cooperado exerce, ao mesmo tempo, o papel de
usuário/cliente da empresa e de proprietário, e, em
alguns casos, de gestor dessa cooperativa. Outro
ponto importante das organizações cooperativas são
os princípios doutrinários que regem de forma geral
como deve ser uma organização cooperativa.
Esses princípios pouco mudaram desde a primeira
cooperativa em Rochdale que, conforme Schneider
(1999, p. 50), eram seis: “[...] democracia, livre
adesão, liberdade para sair da cooperativa, compras
e vendas à vista, juro limitado ao capital, retorno
das sobras.” Os princípios listados pela Aliança
Cooperativa Internacional (ACI), foram baseados
nos princípios da cooperativa primitiva de Rochdale:
adesão voluntária e livre; gestão democrática pelos
membros; participação econômica dos membros;
autonomia e independência; educação, formação e
informação; intercooperação; interesse pela comunidade.
Para Gimenes (2007), além de agregar valor aos
produtos agrícolas, a cooperativa permite “[...] aumentar
o poder de barganha do produtor rural em mercados
relativamente imperfeitos [...]”, promovendo também
uma melhoria na renda média do produtor rural.
A cooperativa tem se mostrado a solução para a
correção de desigualdades nas relações da sociedade,
podendo ser utilizada para o fortalecimento de
produtores rurais. Na pesquisa realizada por Martinéz
& Pires (2002), as autoras consideram que as
cooperativas são uma estratégia importante para o
desenvolvimento rural e do local onde estas estão
inseridas, pois auxiliam os produtores associados e
a sociedade local a se desenvolverem.
2.3 Capital Social, Relações de Confiança e Comunidade de Prática (CoP)
2.3.1 Capita Social
Adler & Kwon (2002, p. 17) afirmam que o
conceito de capital social tem se tornado cada vez
mais popular em um extenso número de disciplinas
das ciências sociais e tem sido crescente o número
de sociólogos, cientistas políticos, economistas que
utilizam o conceito de capital social, na busca de
respostas para uma vasta ampliação de questões que
estão sendo enfrentadas em seus próprios campos.
O conceito não pode ser considerado novo, mas
tem sido frequente nas discussões de autores como
Coleman (1988), Putnam (2006), Fukuyama (2000),
Bourdieu (1980), Lin (1999), Adler & Kwon (2002),
sendo alguns destes autores pioneiros desse termo.
Fukuyama (2000) apresenta a definição de
capital social como sendo uma norma informal que
promove a cooperação entre dois ou mais indivíduos,
podendo essas normas variar de uma reciprocidade
entre dois amigos até as doutrinas complexas como
a do Cristianismo ou do confucionismo. O autor
afirma que não são quaisquer conjuntos de normas
que constituem o capital social, essas devem levar à
colaboração em grupos. Estão relacionadas às virtudes
tradicionais tais como honestidade, comprometimento,
desempenho de funções de confiança, reciprocidade
e outras relacionadas a estas (Fukuyama, 2000).
Da mesma forma, Putnam (2006, p. 181) diz que
as normas fortalecem a confiança social e considera
a reciprocidade a mais importante delas. O autor
divide a reciprocidade em dois tipos: a balanceada ou
específica e a generalizada ou difusa. A reciprocidade
balanceada “[...] diz respeito à permuta simultânea
de itens de igual valor; por exemplo, quando colegas
de trabalho trocam seus dias de folga [...]”, ou seja, a
permuta neste caso ocorre no mesmo instante entre
as partes.
A reciprocidade generalizada “[...] diz respeito a
uma contínua relação de troca que a qualquer momento
apresenta desequilíbrio ou falta de correspondência,
mas que supõe expectativas mútuas de que um favor
concedido hoje venha ser retribuído no futuro [...]”
(Putnam, 2006, p. 181). Ou seja, neste caso, a permuta
não acontece imediatamente entre as partes. Uma
das partes concede um favor sem, naquele momento,
receber algo em troca. Este, portanto, adquire um
“crédito” com a outra parte. Assim, essa reciprocidade
tem relação direta com o capital social, “[...] a regra
da reciprocidade generalizada é um componente
altamente produtivo do capital social [...]” (Putnam,
2006, p. 182).
Em uma perspectiva mais ampla, Coleman (1988)
define capital social pela sua função não sendo uma
entidade única, mas uma variedade de diferentes
entidades, com dois elementos em comum: todas elas
consistem em algum aspecto das estruturas sociais
e elas facilitam certas ações dos atores dentro da
estrutura. Segundo o autor, como outras formas de
capital, o capital social é produtivo, tornando possível
a realização de certos fins que, na sua ausência, não
seriam possíveis.
O mesmo autor afirma que o capital social se dá
por meio de mudanças nas relações entre as pessoas
que facilitam a ação. Se o capital físico é totalmente
palpável, sendo acionado de forma material visível, e
o capital humano é menos palpável, por estar aliado
às habilidades e conhecimentos de um indivíduo, o
capital social é ainda menos palpável, por existir nas
relações entre as pessoas (Coleman, 1988).
Segundo Coleman (1988), assim como o capital
físico e capital humano facilitam a atividade produtiva,
o capital social o faz também e muito bem. Para
o autor, um grupo dentro do qual existem ampla
credibilidade e confiança mútua é capaz de realizar
muito mais do que comparado a um grupo sem que
credibilidade e confiança. O mesmo autor apresenta,
por meio de exemplos práticos, quatro fontes principais
de capital social que incluem: Laços fortes por meio
da comunidade, religião e família; A convivência por
meio da relação na mesma cidade, igreja ou escola;
Origem cultural; Decorrente das relações de mercado
(Coleman, 1988).
Putnam (2006, p. 177) escreve que “[...] o capital
social diz respeito a características da organização social,
como confiança, normas e sistemas, que contribuam
para aumentar a eficiência da sociedade, facilitando
as ações coordenadas”. Ao estudar a experiência
italiana moderna, Putnam (2006) apresenta o capital
social baseado na confiança e na cooperação. Segundo
o autor “[...] o capital social facilita a cooperação
espontânea [...]” (Putnam, 2006, p. 177). Para ele, o
capital social funciona como o capital convencional,
ou seja, os que dispõem dele tendem a acumular cada
vez mais. Para Putnam (2006), normalmente esse
tipo de capital está presente em cadeias de relações
sociais, nas quais é permitido transmitir e difundir
confiança, transformando essas relações sociais em
garantias.
Para Vilpoux & Oliveira (2011), o capital
social tem sido utilizado como forma de explicar
o desenvolvimento econômico e social além da
cooperação entre indivíduos. O capital social pode
surgir de algumas relações sociais tais como família,
vizinhos, amigos, profissionais, entre outras, que
possuem características próprias, em que se pode
destacar as normas e a confiança.
Em outra perspectiva, Bourdieu (1980, p. 2) afirma
que o capital social é o conjunto dos recursos reais
ou potenciais que estão ligados à posse de uma rede
durável de relações mais ou menos institucionalizadas
de conhecimento mútuo e de reconhecimento, ou
seja, a participação em um grupo que não é apenas
equipado com propriedades comuns, mas também
unido por ligações permanentes e úteis. O volume
de capital social possuído por um indivíduo em
particular depende da extensão da rede de conexões
que ele pode efetivamente mobilizar.
Para Lin (1999), o capital social é o investimento
nas relações sociais com retornos esperados. Ou seja,
indivíduos se envolvem em interações sociais e redes,
a fim de produzir lucros. Segundo o autor, existem
explicações sobre a razão pela qual os recursos
incorporados em redes sociais melhoraram os resultados
das ações: Facilita o fluxo de informações; Os laços
sociais podem exercer influência sobre os agentes que
desempenham um papel fundamental nas decisões
envolvendo o ator – exerce certo peso no processo de
tomada de decisões sobre um indivíduo; Os recursos
do laço social, e suas relações reconhecidas para o
indivíduo, podem ser concebidos pela organização ou
seus agentes como certificações de credenciais sociais
do indivíduo, alguns dos quais refletem a acessibilidade
do indivíduo a recursos por meio de redes sociais e
relações - capital social; As relações sociais servem
para reforçar a identidade e o reconhecimento.
Apresentadas as diversas definições e conceitos
sobre o capital social de vários autores, neste trabalho,
se tomará como base o capital social descrito por
Putnam (2006), transitando, por vezes, em algumas
conceituações descritas por autores expostos neste
referencial.
Para o estudo do capital social, com base na
definição dada por Putnam (2006), é necessário
abordar as relações de confiança. Para o autor, a
confiança é a base para o capital social.
2.3.2 Relações de confiança
A confiança pode ser definida como “[...] crença
na credibilidade de uma pessoa ou sistema, tendo
em vista um dado conjunto de resultados ou eventos,
em que essa crença expressa uma fé na probidade
ou amor de um outro, ou na correção de príncipios
abstratos (conhecimento técnico)”. A confiança existe
devido a ausência de algo no tempo e no espaço, ou
seja, não existiria a confiança se fosse possível ver
todas as atividades e pensamentos das pessoas, e estes
fossem completamente transparentes, compreendidos
e conhecidos. Dessa forma, a confiança existe como
uma forma de fé, de crença, de credibilidade. Está
relacionada à probidade de um indivíduo ou sistema
(Giddens, 1991, p. 41).
Para o mesmo autor, a confiança também está ligada
aos riscos que algo ou alguém pode proporcionar.
Quando há a confiança, se assume o risco de que
existem alternativas de que as ações do indivíduo ou
sistema podem tanto aumentar a credibilidade, quanto
haver uma decepção e a credibilidade diminuir ou
se tornar nula (Giddens, 1991).
Ainda neste sentido, Vilpoux & Oliveira (2011, p. 202)
relacionam a confiança como a vontade de aceitar uma
situação vulnerável baseada no comportamento de
outro, ligando essa atitude a dois tipos de expectativas:
(1) em “função do julgamento de uma pessoa sobre a
tendência de outra pessoa em se comportar de modo
oportunista”; (2) em “função da possibilidade de
uma pessoa se comportar de modo oportunista em
função dos poderes impeditivos, locais e globais, das
normas e dos controles formais”, ou seja, relacionado
às penalidades que o indivíduo pode sofrer caso atue
de maneira oportunista.
Diante destes conceitos, pode-se considerar que
a confiança tem se tornado um conceito central para
explicar o comportamento das empresas em contextos
organizacionais. A capacidade de criar confiança tem
sido amplamente reconhecida como extremamente
valiosa porque pode reduzir significativamente os
custos de transação e levar à criação de novas idéias
(Bachmann & Inkpen, 2011).
O valor reconhecido e atribuido à confiança acaba
por suscitar a cooperação entre os envolvidos, como
explicitado por Jerônimo (2005, p. 35), que considera
que “[...] a confiança tem sido vista, além de um
resultado e de um meio da interação cooperativa,
como um aspecto do contexto organizacional e um
antecedente da cooperação”. Nesse sentido, a autora
relaciona a disposição dos indivíduos em cooperarem
de forma dependente da confiança. Para cooperar,
os indivíduos de uma organização social devem
ter confiança suficiente para compartilharem seus
recursos, sejam eles tangíveis ou intangíveis, mesmo
correndo o risco de a outra parte ter um comportamento
oportunista, obtendo vantagem desta confiança.
Putnam (2006, p. 180) endossa essa ideia de que a
relação de confiança gera cooperação, e ainda considera
a confiança como componente básico do capital social,
“[...] a confiança promove a cooperação. Quanto
mais elevado o nível de confiança numa comunidade,
maior a probabilidade de haver cooperação. E a
própria cooperação gera confiança”. Nesse sentido,
a relação de confiança apresentada pelo autor gera a
cooperação, que gera confiança e que são base para
o capital social.
De forma a complementar todo o conceito de
confiança já verificado, Oliveira et al. (2009, p. 45)
considera que a “[...] confiança pode ser entendida como
um mecanismo que inibe o oportunismo motivando
pessoas a cooperarem umas com as outras se abstendo
de mecanismos explícitos de salvaguarda [...]”.
Dessa forma, a confiança é geradora de cooperação
assim como inibidora de ações oportunistas, com
base apenas na credibilidade de outrem, sem normas
formais de sanções.
2.3.3 Comunidade de Prática (CoP)
Os estudos etnográficos mostram que as interações
sociais nas organizações têm sido uma forma da criação
de conhecimento em comunidades organizacionais
formadas por meio dessas interações (Gropp &
Tavares, 2006). Assim, considerando a criação do
conhecimento como sendo de forma explícita e de
forma tácita, uma comunidade de prática (CoP)
contribui com a parte do conhecimento tácito e não
formalizado.
Dessa forma, pode-se definir as comunidades de
prática como sendo grupos de pessoas que compartilham
uma preocupação, um conjunto de problemas, ou
uma paixão sobre um tópico e que aprofundam seu
conhecimento e experiência nesta área, interagindo
continuamente (Wenger et al., 2002).
Uma comunidade de prática na visão de Souza-Silva
& Schommer (2008, p. 109) “[...] é um grupo de pessoas
que se aglutinam entre si para se desenvolverem em
um domínio do conhecimento, vinculado a uma prática
específica”. Nessa visão, fica claro que a comunidade
de prática se dá inicialmente pela busca do atendimento
de um objetivo comum de um grupo de pessoas, com
o intuito de desenvolverem conhecimento de uma
prática, também comum ao grupo, e não apenas por
uma interação de amizade pré-existente.
Para se entender a comunidade de prática,
Wenger et al. (2002) citam três elementos bases: o
Domínio, a Comunidade e a Prática. O domínio que
envolve compartilhamento de práticas que detêm um
foco comum. O domínio cria uma base comum e um
sentido de identidade comum. A comunidade que cria
o tecido social da aprendizagem. Uma comunidade
forte promove interações e relações baseadas no
respeito mútuo e confiança. Ela estimula a vontade
de compartilhar ideias, expor a própria ignorância,
fazer perguntas difíceis, e ouvir com atenção.
A prática que é um conjunto de estruturas, ideias,
ferramentas, informações, estilos, linguagem,
histórias e documentos que são compartilhados entre
os membros da comunidade.
As comunidades de prática têm o objetivo de
desenvolver as capacidades de construção e troca de
conhecimentos, de membros autosselecionados, que
se fundem pela paixão, compromisso e identidade
com o tema ou especialidade do grupo, podendo durar
enquanto houver interesse dos membros do grupo.
Para Ipiranga Maria et al. (2008), não é necessário, que
essas pessoas estejam num mesmo espaço geográfico
para que ocorra uma comunidade de prática.
Para que se obtenha o aprendizado por meio da
prática é necessário “[...] tornar-se membro de uma
CoP, não implicando, simplesmente, uma questão de
adquirir informações; requer, sim, disposição, conduta e
perspectiva profissional.” (Binotto, et al., 2007, p. 19).
Boyett & Boyett (1999) consideram que o
desenvolvimento da CoP acontece por meio de redes
informais, de conversas de corredor, de compartilhamento
de informações, de formas de desempenhar o trabalho, da
cooperação, entre outros. É uma comunidade dinâmica,
versátil, que se torna repositório de conhecimento.
As CoPs, dessa forma, “emergem através de redes de
interação, não sendo projetadas. São características
das CoPs a informalidade, a improvisação, o início
do aprendizado real, a reconstrução do significado
do ambiente [...]” (Binotto, 2005, p. 77).
Para este estudo, o conceito de CoP a ser utilizado
é o de Wenger et al. (2002), considerando que tal autor
foi quem cunhou inicialmente o termo “Comunidade
de Prática”. O mesmo autor esclarece que o fenômeno
a que se refere a CoP é antigo, apenas a nomenclatura
é recente.
3 Metodologia
A natureza desta pesquisa foi exploratória e descritiva
com estudo de caso. O instrumento utilizado foram as
entrevistas semiestruturadas. A pesquisa foi pautada
principalmente no método qualitativo, já que se buscou
identificar a existência de interações sociais, baseadas
na confiança que dão origem ao Capital Social em uma
cooperativa agrícola. No entanto, foram utilizados
também dados socioeconômicos para a caracterização
e contextualização dos cooperados. Assim, a pesquisa
utilizou também dados quantitativos para esse fim.
Os sujeitos da pesquisa foram identificados dentro
do corpo de associados da COPASUL – Cooperativa
Agrícola Sul Matogrossense que, há mais de 34 anos,
está constituída formalmente, com sede na cidade de
Naviraí/MS. Os cooperados entrevistados deveriam ser
atuantes, realizar suas movimentações nas unidades
estabelecidas na cidade de Naviraí/MS e que também
fossem residentes nessa cidade, independentemente
de possuírem terras em outros municípios.
Portanto, a escolha dos produtores seguiu as
seguintes exigências: a) o produtor escolhido deveria
ser cooperado ativo da Copasul; b) o cooperado deveria
ser atuante nas unidades da sede da Copasul na cidade
de Naviraí/MS; e c) deveria ser representante de um
grupo de mais de dois produtores.
Estabelecidos os padrões para a escolha dos
produtores, se chegou a uma amostra de 11 grupos,
representados por 11 produtores. Esses representavam
56 cooperados conforme as informações obtidas no
departamento técnico da Copasul, uma média de pouco
mais de cinco produtores para cada representante.
Dos 11 produtores selecionados, foi possível realizar
a pesquisa com 10 deles que representam o total de
47 cooperados.
Quanto ao quadro de dirigentes da cooperativa,
a Copasul conta com quatro diretores: Diretor
Presidente; Diretor Vice-Presidente; Diretor Secretário;
e Superintendente. E com oito gestores. Assim, todos
os líderes participaram, totalizando 12 pessoas.
Para manter o anonimato dos entrevistados, foram
utilizadas siglas: Diretor: D1, D2, D3, D4; Gestor: G1,
G2, G3, G4, G5, G6, G7, G8; Produtor Cooperado:
P1, P2, P3, P4, P5, P6, P7, P8, P9, P10.
A coleta de dados foi realizada entre os meses de
outubro e dezembro de 2012 por meio da realização
das entrevistas semiestruturadas. As pesquisas
foram realizadas no município de Naviraí/MS, onde
encontra-se a sede da Copasul.
Os dados provenientes das entrevistas e que
trataram de dados quantitativos relacionados às
informações socioeconômicas foram analisados
utilizando a tabulação em planilha eletrônica. Para a
análise dos dados qualitativos coletados por meio das
entrevistas, além de outras percepções identificadas
pelo pesquisador – que estão além da fala ou da escrita
do entrevistado –, foi utilizada a análise temática de
texto ou imagem, apresentada por Creswell (2010).
Dessa forma, as transcrições fidedignas de algumas
falas foram feitas, enquanto outras foram interpretadas
de acordo com as categorias de análise.
4 Resultados e discussão
4.1 Perfil dos entrevistados
No que se refere aos diretores, participaram: o
Presidente, o Vice-Presidente, o Diretor Secretário e
o Superintendente. Os entrevistados, nessa categoria,
são todos do sexo masculino e casados. Três possuem
idade entre 51 e 60 anos, e apenas um com mais de
60 anos. O que possui mais de 60 anos é o presidente,
que no período da pesquisa estava com 82 anos e que
desde a fundação da cooperativa ocupa esse cargo.
O tempo de atuação no cargo varia entre seis
e 34 anos, estabelecendo uma média de 15 anos
de permanência nos cargos de direção. Deve ser
considerado, nesse aspecto, que o presidente, como
já explicitado, atua desde o início da fundação da
cooperativa, e que o cargo de superintendência foi
criado há 10 anos e desde então é ocupado pela mesma
pessoa. Dessa forma, em todo o período de existência
da Copasul, apenas os cargos de Vice-Presidente e de
Diretor Secretário foram ocupados por mais de uma
pessoa e, ainda assim, os ocupantes destes cargos,
atualmente, já faziam parte do conselho fiscal da
cooperativa.
A média de tempo de cooperação na organização
entre os diretores é de aproximadamente 27 anos,
que varia entre 13 e 34 anos. Quanto ao grau de
escolaridade dos diretores, três possuem nível superior
com graduação em Agronomia, e um possui o ensino
fundamental completo.
Por meio desses dados, pode-se perceber a
continuidade de atuação nos cargos de direção da
cooperativa. Não há assim, uma rotatividade elevada.
Além de visualizar que o tempo de cooperação,
independente de atuação no cargo, é também elevado.
Possuem de forma geral um bom nível de escolaridade
e, há aqueles que a graduação de nível superior está
relacionada à atividade de atuação da cooperativa.
Quanto aos gestores, 87,5% são do sexo masculino
e 12,5%, do sexo feminino, ou seja, em números
absolutos, sete e um, respectivamente. Todos os
gestores são casados. Este quadro é composto por
profissionais relativamente jovens, e a maioria, 62,5%,
possui idade entre 31 e 40 anos, o que representa cinco
dos oito gestores; 25,0% possuem entre 41 e 50 anos;
e 12,5%, de 51 a 60 anos.
Quanto ao grau de escolaridade dos gestores,
87,5% apresentam ensino superior completo e 12,5%,
ensino médio completo. A formação acadêmica dos
profissionais com ensino superior completo está
dividida entre Agronomia, com 57%, e Administração,
com 43%; ambos valores aproximados.
Todos os gestores são profissionais contratados e
não são cooperados. Exercem a função de gerência
como profissionais de mercado capacitados e com
experiência para atuarem em tais funções, seja por
formação acadêmica ou por experiência profissional
adquirida pelo desempenho da atividade. A média
de ocupação do cargo atual é de oito anos, variando
entre dois e 32 anos.
Os dados coletados demonstram que 50,0% dos
cargos foram ocupados por meio de promoção, ou
seja, profissionais que já eram colaboradores da
cooperativa e que passaram por um processo de
promoção interna. Essa informação fica mais clara
quando apresentada a média do tempo de trabalho
dentro da cooperativa, que é de aproximadamente
16 anos, ou seja, o dobro da média temporal de
atuação no cargo. Essas informações indicam que a
cooperativa buscou valorizar profissionais formados
dentro da sua estrutura de recursos humanos, com
visões e valores alinhados aos da Copasul.
O Perfil dos Cooperados, ou seja, dos produtores
rurais entrevistados, cooperados da Copasul são líderes
em seus grupos de atuação, ou seja, representam mais
de um associado, como explicitado na metodologia
do presente trabalho. Os dados informados, portanto,
representam somente os entrevistados e não o perfil
geral dos associados da Copasul. Outro fator a ser
lembrado é que estes são produtores que atuam
especificamente na região de Naviraí/MS.
Os entrevistados são todos do sexo masculino
e, destes, 90% são casados e 10% solteiros e
estão distribuídos na seguinte faixa etária: 10%,
de 21 a 30 anos; 10%, de 31 a 40 anos; 20%, de
41 a 50 anos; 50%, de 51 a 60 anos; e 10% com mais
de 60 anos. Destes, 60% dos que hoje são líderes dos
seus grupos, possuem mais de 50 anos e apenas 20%
estão em uma faixa até 40 anos, mostrando que os
mais experientes estão à frente dos negócios como
referência e liderança do grupo.
O grau de escolaridade apresentado pelos cooperados
entrevistados está assim distribuído: 20% possuem o
ensino fundamental incompleto; 10%, o fundamental
completo; 10%, o ensino médio incompleto; e 60%
possuem o ensino superior completo. Os dados
sobre o grau de escolaridade mostram que, apesar
de os líderes possuírem faixa etária elevada, a
maioria deles possui ensino superior completo, ou
seja, 60% possuem um nível relevante de formação
acadêmica. Os produtores que estão nessa condição,
83%, cursaram o curso de Agronomia e 17% o curso
de Administração.
Os cooperados pesquisados possuem, como tempo
médio de cooperação na Copasul, um período de
17,4 anos, variando entre 10 e 30 anos. Alguns destes
são produtores, filhos de cooperados pioneiros e que,
por conta disso, deram continuidade, mesmo após a
sucessão, à cooperação com a Copasul.
4.2 Análise do Capital Social: caso da Copasul
Tomando como base as definições de Putnam
(2006) e Fukuyama (2000), analisa-se a presença do
Capital Social na Copasul por meio das entrevistas
e pesquisas realizadas.
Inicialmente, por meio das respostas obtidas,
pode ser percebida a presença das características
da CoP entre os produtores da Copasul. O domínio
por meio do desenvolvimento da mesma atividade
e ainda a relação com a cooperativa. A comunidade
marcada por meio dos grupos informais formados
para gestão de propriedades em conjunto, além de
relações comerciais e de amizade proporcionadas
pela Copasul. E, por fim, a prática por meio de
reuniões para compartilhamento de informações e
confraternizações. Essa interação social se torna
importante para a criação de Capital Social.
Outro aspecto identificado nesse estudo está
pautado nas ações realizadas pela Copasul no
sentido de manter a cooperação. As estratégias
abordadas pela cooperativa, para a manutenção da
cooperação, na visão dos gestores e diretores são os
serviços oferecidos pela Copasul. Ações realizadas
no sentido de melhorar o atendimento ao produtor,
com boas compras, boas vendas, investimento em
infraestrutura, assistência técnica, prazos na compra
de insumos, ou seja, faz a gerência de seus recursos
visando o melhor para o produtor. Além das ações
comerciais, a cooperativa busca manter um elo social
com o associado por meio de confraternizações e
eventos, na busca pela fidelização e continuidade
da cooperação com a Copasul.
Com base nos dados da pesquisa, percebe-se
que a política da Copasul, pautada em valorizar o
cooperado, trabalhar para o produtor, visando melhores
oportunidades para eles, no intuito de manter o produtor
ativo no seu ramo de atuação, tem dado certo até o
momento. Os produtores permanecem cooperando e
cada vez mais próximos e envolvidos nas atividades
da cooperativa, situação evidenciada pelos dados,
falas e depoimentos de todos os entrevistados.
As ações realizadas pela cooperativa, mesmo
não formalizadas por meio de documentos, gera nos
produtores uma sensação de segurança, o que natividade que desenvolvem, ou seja, na agricultura,
tem sido cada vez menor a presença desse sentimento.
Esse sentimento de segurança está baseado na confiança
adquirida pelo produtor na cooperativa, pelos anos
de atuação na região.
Essa sensação de segurança é elucidada quando
se pergunta sobre a relação de confiança existente
no ambiente da cooperativa. Para Putnam (2006),
além da cooperação, a confiança é a base para o
Capital Social.
Os diretores acreditam que a confiança está pautada
nas atitudes da cooperativa para com os cooperados.
Para um dos diretores, “[...] é a transparência
em todas as relações comerciais e o livre acesso
que ele (o produtor) tem desde a diretoria até os
colaboradores [...]” (D3). Na visão dos dirigentes
da cooperativa, a confiança está ligada à realização
de ações transparentes, à prática diária de ações que
levam o produtor a confiar. Conforme explicitado
por alguns gestores, não é algo conquistado do dia
para a noite, demanda tempo. As ações realizadas
pela cooperativa visam aumentar sua credibilidade
com o cooperado por meio da transparência, das
ações acertadas, do livre acesso do produtor a toda a
cooperativa, ou seja, têm buscado conquistar e manter
a confiança do associado por meio da probidade
individual e do sistema.
Para os cooperados, a confiança está relacionada
também a relações e ações realizadas ao longo do tempo,
“[...] é a honestidade, administração correta, diretoria
honesta e séria [...]” (P4). Ou ainda, conforme outro
produtor: “[...] é a transparência em todas relações
comerciais e o livre acesso que a gente tem desde a
diretoria até os colaboradores [...]”(P5).
As perguntas elaboradas buscaram identificar
o nível de confiança do cooperado nos diretores,
gerentes e na Copasul. Os produtores tinham que
responder conforme uma escala de nível de confiança.
Essa escala apresentou-se com os níveis de confiança:
Muito Alto; Alto; Regular; Baixo; Muito Baixo; e
Não Confio.
A aplicação dessa pergunta aos produtores foi
relacionada ao Presidente; Vice-Presidente; Diretor
Secretário; Superintendente; Gerentes; Outros
Cooperados e, por fim, à Copasul como empresa.
O resultado está apresentado conforme o Gráfico 1.
O gráfico mostra que 80% dos entrevistados têm
um nível muito alto de confiança no Presidente, e
20% demonstram um nível alto de confiança nele. Já
no Vice-Presidente 77,8% possuem um nível muito
alto de confiança e 22,2% um nível de confiança alto.
O mesmo percentual acontece com o Superintendente.
Para o diretor secretário, 66,7% possuem um nível
muito alto de confiança, enquanto 33,3% um nível alto.
Com os gerentes, as opiniões se dividem em 50%
para nível de confiança muito alto e alto. Como são
oito gerentes, não foram especificadas as divisões
ou departamentos das gerências. Buscou-se apenas
uma ideia geral da confiança nesses profissionais
como um todo.
Gráfico 1. Nível de confiança. Fonte: Elaborado pelos autores com base nas entrevistas (2012).
Em relação a outros cooperados, o nível de confiança
ficou com 10% muito alto, 70% alto e 20% regular.
Analisando o gráfico, pode-se notar que, no geral,
nenhuma das opções teve nível de confiança abaixo
de regular e apenas uma foi classificada nesse nível.
Vale lembrar que, por se tratar de uma cooperativa
com um número de cooperados relativamente grande,
nem todos os cooperados têm contato direto um com
o outro. Dessa forma, pediu-se ao entrevistado que
fizesse uma média geral.
Para a Copasul como empresa, 60% possuem
nível muito alto de confiança e 40% um nível alto.
Essa confiança, segundo os entrevistados, está baseada
na transparência da cooperativa.
Os autores Putnam (2006) e Fukuyama (2000)
apoiam seus conceitos de capital social na cooperação,
confiança e em normas e sistemas estabelecidos entre
indivíduos de uma relação social.
Neste sentido, as normas e sistemas estabelecidos
pela cooperativa não dizem respeito a regras formais
regidas pelo estatuto ou qualquer outro tipo de
documento formal. No estatuto da cooperativa,
descrevem-se apenas normas básicas de uma
organização cooperativa, com direitos e deveres de
ambas as partes. As normas que estão relacionadas à
cooperação e à relação de confiança estão presentes
em regras sociais e morais, conforme evidenciado
por Putnam (2006).
Aos dirigentes foi perguntado como a cooperativa
lida com cooperados oportunistas, aqueles que se
valem da cooperativa apenas em benefício próprio.
Para os entrevistados, esse tipo de cooperado não
exerce o papel fundamental do cooperativismo que é
a cooperação, ou seja, ajuda mútua. Ele apenas busca
satisfazer seus interesses pessoais e, neste caso, são
considerados transicionais.
A política da cooperativa, segundo os dirigentes,
é buscar a fidelização desse cooperado, mostrando
transparência nas ações e apresentando os ideais da
cooperativa. A cooperativa busca sempre a recuperação
desse associado. Caso não se enquadre nos padrões
e ideais da cooperativa, o próprio oportunista acaba
se afastando. Acontece uma seleção natural, apontam
os gestores.
Mesmo com a possibilidade de haver produtores
oportunistas buscando se aproveitar da livre adesão
à cooperativa, segundo os dirigentes entrevistados,
a Copasul não faz exigências para a inserção de
novos associados. Todos os produtores cooperados
entrevistados declararam não ter sido exigido nada
além do que consta no estatuto da cooperativa.
Dessa forma, a cooperativa não possui normas rígidas
que possam levar à exclusão ou sanções disciplinares
que possam gerar algum receio do produtor em ser
oportunista ou infiel. A forma como a cooperativa
trabalha acaba, como já dito, inibindo tais ações. Como
apresentado por Putnam (2006), as normas sociais
e morais ligadas a honestidade, comprometimento,
seriedade, credibilidade, imparcialidade entre outros
atributos considerados de boa índole, são a base para
a confiabilidade existente nas estruturas sociais.
Segundo os dirigentes, outra forma de se manifestar
positivamente ou negativamente a confiança e a
cooperação nos produtores é por meio das vantagens
e desvantagens proporcionadas pela cooperativa.
Contemplando esse aspecto nas entrevistas, as
vantagens citadas por todos os cooperados foram:
compras em grupo com bons produtos e bons preços;
venda da produção em grupo, alcançando bons preços
independentemente de ser grande ou pequeno produtor;
suporte financeiro em anos de produção ruins; apoio
técnico; influência da cooperativa como balizadora
de preços na região, principalmente no que se refere
a preços de insumos.
Dos produtores pesquisados apenas um relatou
uma desvantagem em ser associado da Copasul:
Mas se tem uma desvantagem que eu posso dizer é
você... Vamos supor, eu não compro semente aqui.
Eu compro no Paraná. Comprei um ano e eu não
fiquei contente. Por que? Porque na cooperativa
eu não tenho como eu chegar aqui na Copasul e
exigir aqui: olha eu quero melhor lote de semente
pra mim eu vou pagar trinta centavos, quarenta
centavos, cinquenta centavos a mais por quilo
de semente, mas eu quero o melhor lote pra mim.
Eu não posso fazer isso. É uma cooperativa de
todos os cooperados! Não importa eu que planto
9.000 hectares ou o que planta 100 hectares todo
mundo tem direitos iguais e isso que eu acho
bom na cooperativa. Por isso que eu tenho essa
confiança que eu tenho nela. Então essa eu acho
uma desvantagem eu vou em Maringá que é uma
empresa particular [...] eu quero o melhor lote que
vocês têm. [...] Essa é uma desvantagem porque
eu não posso exigir o melhor pra mim. Tudo é em
coletivo, e nem sempre o coletivo é vantagem...
então essa é a desvantagem que eu digo. Por isso
a confiança que eu tenho nela (Copasul), quem
garante que se fizerem pra mim, daqui a pouco
não estão fazendo contra mim? (P1).
Isso mostra que mesmo em desvantagem comercial o
produtor passa a confiar na cooperativa. Essa declaração
mostra a seriedade com a qual a Copasul trabalha.
Trabalha para o cooperado, mas sem privilegiar um
ou outro devido à capacidade de produção, de compra
ou entrega de produção. Valoriza o cooperado por
ser produtor rural, e não pelo potencial produtivo,
poder de compra ou bens que possui. Todos possuem
os mesmos direitos e deveres.
O Capital Social, portanto, se mostra presente na
Copasul, por meio da cooperação evidenciada dentro
e fora do ambiente da cooperativa, das relações de
confiança existentes entre os produtores e com os
produtores, e também por meio das normas morais
e sociais estabelecidas, que são fortes e visíveis em
ações tanto dos produtores quanto da cooperativa.
A comunidade de prática, neste contexto, surge
como uma das principais fontes do capital social
na cooperativa. Conforme Coleman (1988), uma
das fontes para o Capital Social são laços fortes por
meio da comunidade, religião e família. No caso dos
cooperados da Copasul, não se trata de uma relação
étnica, religiosa ou cultural, pois as pesquisas mostraram
que os produtores são de etnias e culturas variadas e
não estão dentro da mesma prática religiosa. O que
se mostra na Copasul são laços fortes por meio da
relação social representada pelos grupos de produtores
fora da cooperativa e também dos grupos surgidos
devido à cooperação no ambiente da cooperativa.
Essas relações sociais sólidas apresentadas na
cooperativa fazem com que haja a manutenção das
posturas cooperativas na Copasul. Mesmo após
34 anos de existência, a Copasul permanece ativa e
em pleno crescimento.
Um dos motivos identificados para tal sucesso,
até o momento, é a existência de um capital social
elevado, o que possibilita à cooperativa realizar ações
comerciais baseadas na confiança que possui nos
produtores, assim como os produtores mantêm suas
ações de fidelidade diante da cooperativa. Um dos
exemplos mais citados pelos produtores e pelos
dirigentes é a fidelidade na entrega dos produtos à
cooperativa.
O capital social possibilita que a cooperativa realize
transações comerciais com produtores que possuem
apenas arrendamentos, disponibilizando a quantidade
total necessária de insumos para a produção desse
produtor, com pagamento pós-safra. Tal ação não é
realizada por empresas de insumos particulares da
região, que não disponibilizam crédito a produtores
arrendatários, pois estes não possuem a propriedade
para ser dada como garantia.
Este fato é tratado por Putnam (2006) ao exemplificar
por meio do caso das associações de crédito rotativo,
que os membros da associação, por não disporem de
garantias físicas, empenham suas relações sociais.
Para o autor “[...] o capital social serve como uma
espécie de garantia [...]” (Putnam, 2006, p. 178).
Da mesma forma, a cooperativa corre riscos
ao realizar compras de insumos em um volume
considerável, realiza investimentos em infraestrutura
contando com a fidelidade do produtor, que, por
sua vez, reflete na oferta de melhores serviços e na
continuidade da confiança e cooperação do produtor
com a cooperativa.
Essas práticas tanto da Copasul quanto dos cooperados
viabilizam a manutenção das posturas cooperativas
na estrutura social da cooperativa. Por meio dos
elementos analisados como a CoP, a cooperação,
as relações de confiança e as normas estabelecidas
por meio dos seus relacionamentos contínuos, dão
origem ao capital social. Esse capital social auxilia
diretamente na manutenção das posturas cooperativas
da Copasul, e a mantém atuante e em crescimento.
Para Putnam (2006, p. 180), “[...] a progressiva
acumulação de capital social é uma das principais
responsáveis pelos círculos virtuosos [...]”. Então, a
prática inicial de cooperação, confiança, respeito às
normas, estabelecidos em algum momento por meio
da CoP, geram o capital social. Com a manutenção
dessas relações assim estabelecidas, o capital social
tende a aumentar assim como as virtudes relacionadas
ao comportamento da sociedade.
Com base na pesquisa com dirigentes e associados,
verificou-se uma figura importante no contexto de
capital social na cooperativa: o atual presidente.
A figura do presidente da cooperativa, que desde a
fundação da Copasul ocupa esse cargo, se mostrou
basilar para a constituição da cooperativa como ela
é hoje.
Neste sentido, ao se perguntar sobre a percepção
do entrevistado sobre a figura do líder principal da
cooperativa, algumas respostas obtidas foram: “[...]
uma pessoa extremamente honesta. [...] e extremamente
de confiança, e capaz com uma visão extraordinária.
Tem uma visão que é... empreendedorismo [...]”(P1).
Alguns depoimentos de produtores chegaram a ser
emocionados ao se falar da pessoa e do que ele representa
não só para a cooperativa, mas para a sociedade local
“Ele é um ser humano fantástico. Exemplo de vida,
de honestidade, de seriedade [...]” (P4).
Outra fala que se torna importante evidenciar é
que o presidente “[...] é uma pessoa assim, bastante
carismática, formadora de opinião, de grande
liderança, personalidade, credibilidade e fez com que
a cooperativa tivesse somente um presidente desde
sua fundação [...]” (D2). Pode ser percebido, nesta
fala, que o presidente é influenciador. Sua figura
virtuosa acaba por constranger, de forma positiva,
os agentes que se relacionam com ele a possuírem
condutas também virtuosas.
O capital social individual do presidente da
cooperativa reflete no capital social coletivo da
Copasul, e influencia o capital social individual de
outros associados e dirigentes. Como apresentado
por Recuero (2005), o capital social é alocado no
indivíduo, mas existe apenas enquanto recurso coletivo,
ou seja, o capital social só é aproveitado enquanto
estiver relacionado a estruturas sociais. Fica mais
evidente essa afirmação ao perguntar sobre quais
fatores fariam os produtores pararem de cooperar.
Apesar do nível de confiança no presidente, como
apresentado anteriormente, ser muito alto, a troca
do presidente não influenciaria na continuidade da
cooperação por parte dos associados. As entrevistas
mostraram que essa opção possui uma influência
pequena na decisão dos produtores de deixarem de
cooperar. De uma escala de um a cinco, em que um
é o mais importante, a troca de presidente ficou com
30% na classificação quatro e 70% na classificação
cinco, ou seja, a troca de presidente não seria um
motivo forte para que o produtor associado deixasse
de cooperar ou se desligar da cooperativa.
5 Considerações finais
O objetivo foi identificar a existência de interações
sociais, baseadas na confiança que dão origem ao
Capital Social em uma cooperativa agrícola. Para
isso, foi realizado um estudo de caso na Copasul –
Cooperativa Agrícola Sul Matogrossense, localizada
no município de Naviraí/MS.
Foi identificado que essas interações sociais
existem dentro da cooperativa e que realmente
podem dar origem a um tipo de capital que não é
financeiro, é social. Ou seja, está ligado às relações
sociais constituídas por meio da cooperação, da
confiança e dos relacionamentos. Nesse sentido, o
objetivo geral do trabalho foi atingido com êxito, ou
seja, essas interações sociais baseadas na confiança
deram origem ao Capital Social na organização
cooperativa estudada.
Assim, o cooperativismo, quando bem realizado com
base nos princípios cooperativos, se apresenta como
um modelo que permite criar um grande volume de
capital social, com base no estudo de caso realizado.
Ao considerar os fracassos apresentados pelos autores
Crúzio (1999), Nilsson et al. (2009) e Rigo et al. (2008),
das cooperativas por eles estudadas, pode-se concluir
que o capital social criado por meio da manutenção
das posturas cooperativas, da transparência nas ações
da cooperativa e dos cooperados, assim como das
relações de confiança fortes, pode levar a organização
cooperativa ao sucesso.
Por meio das análises realizadas na cooperativa,
vislumbra-se que este estudo poderá ser útil em
replicações com outros objetos de pesquisas, assim
como para utilização de parâmetro para outros grupos
cooperativos iniciantes ou mesmo já estabelecidos,
respeitando as particularidades e individualidades
de cada um.
Dessa forma, em momento algum se tentou esgotar
o assunto relacionado ao capital social, à cooperação,
às comunidades de prática, às relações de confiança,
ou mesmo sobre o modelo cooperativista. De modo
inverso, este estudo procura estabelecer uma relação
entre os temas tratados, dando opção a novos estudos,
com perspectivas, e advindos de áreas diferentes,
desde as engenharias até as ciências humanas, que
corroborem ou mesmo refutem as ideias aqui tratadas.
Os temas trazidos no estudo possuem incontáveis
possibilidades e campos ainda não explorados.