Aquisição de tempos de vida de fosforescência com resolução de fase e sua
aplicação ao estudo de relaxações em polímeros
onde Ai e ti são o fator pré-exponencial e o tempo de vida da componente i no
estado excitado, respectivamente, e C é uma constante. Assim, a evolução de um
espectro de emissão ao longo do tempo tem um comportamento típico como o
exibido na figura_1.
Tanto a intensidade de emissão quanto o tempo de vida de uma molécula
eletronicamente excitada são afetados por uma série de fatores, tais como:
taxas de decaimento radiativo, taxas de decaimento não radiativo, desativações
colisionais, interações com o meio ou supressores, etc1... Considerando-se os
diversos tipos de processos unimoleculares, radiativos ou não, pode-se
descrever o rendimento quântico de fosforescência como1,2:
(2)
sendo: ksr é a constante de emissão de fluorescência, ksnr é a constante de
conversão interna independente da temperatuta, kst é a constante de cruzamento
intersistema independente da temperatura,<formula/> é
a constante de cruzamento intersistema dependente da temperatura e
é a constante de conversão interna dependente da
temperatura. A intensidade de fluorescência, IF(t), em uma dada temperatura,
pode ainda ser definida pela equação (3):
<formula/> (3)
onde IF(t) é a intensidade de fluorescência na temperatura t, I0 é a
intensidade da luz de excitação e k1 é uma constante de proporcionalidade que
depende de condições instrumentais e da temperatura.
De modo análogo se pode definir equações para o rendimento quântico e
intensidade de fosforescência, segundo as equações (4) e (5):
<formula/> (4)
<formula/> (5)
Deve-se notar que várias das constantes de velocidade dependem da temperatura,
de modo que este é um parâmetro importante na discussão das eficiências
quânticas dos processos radiativos de emissão de fluorescência ou
fosforescência.
Os métodos para a detecção e medida dos tempos de vida de estados excitados são
divididos basicamente em três classes3: 1."Time Correlated Single Photon
Counting" (TCSPC); 2. Integradores "Box Car" e métodos
estroboscópicos; e 3. Métodos de resolução de fase.
O método TCSPC é estatístico e se baseia na probabilidade de que a emissão de
um fóton por uma molécula excitada diminui exponencialmente com o decorrer do
tempo; mede-se assim o tempo decorrido entre a excitação da amostra e a
detecção do primeiro fóton que atinge o detector; este procedimento é repetido
muitas vezes, de forma a se obter um histograma número de fótons X tempo, o
qual reproduz o comportamento temporal da emissão da amostra. Os métodos
baseados no integrador "box car" e estroboscópios obtém a curva de
decaimento de emissão através de amostragens da intensidade de emissão em
diferentes períodos de tempo após a excitação da amostra. Nestes dois casos a
excitação da amostra é realizada por meio de um pulso de luz, de forma que a
resolução temporal do instrumento depende, entre outras coisas, da largura do
pulso de excitação, ou seja, quanto menor a duração do pulso maior será a
capacidade do instrumento resolver eventos de curta duração4 .
Os métodos de resolução de fase se baseiam em um princípio menos óbvio do que
os métodos anteriores: quando um conjunto de moléculas é excitado
eletronicamente por um feixe de radiação com amplitude senoidalmente modulada à
uma freqüência w, a intensidade de emissão dessa amostra também será modulada à
mesma freqüência; porém, devido ao tempo de vida finito do estado excitado, a
emissão da amostra estará defasada em relação à excitação. Portanto, esses
métodos não são capazes de registrar a curva de decaimento de emissão em função
do tempo, porém permitem o cálculo do tempo de vida radiativo de uma espécie
com rapidez e eficiência3,5-8 .
Para isto se considera que a intensidade de emissão experimental I(t) é dada
pela integral6 :
<formula/> (6)
e desde que t>>t,
<formula/> (7)
onde: I0 é a intensidade da luz de excitação, Im é a amplitude da luz de
excitação, wé a frequência angular na qual o feixe de excitação está modulado e
d é a diferença de fase entre os dois feixes.
O tempo de vida radiativo da molécula no estado excitado pode ser determinado
de duas maneiras: 1. por modulação relativa e 2. pelas medidas de diferença de
fase. Tomando-se como base o esquema mostrado na figura_2, a modulação relativa
(D) pode ser definida pela equação (8):
<formula/> (8)
sendo que H1, H2, H3 e H4 são amplitudes absolutas dos sinais de excitação e de
emissão, e estão representadas graficamente na figura_2.
Por outro lado, a diferença de fase (d) entre a excitação e a emissão em uma
dada freqüência angular w é dada por:
<formula/> (9)
onde t é o tempo de vida da amostra no estado excitado.
Das equações (8) e (9) se pode verificar que a freqüência de modulação w da luz
de excitação é um fator determinante na sensibilidade e na resolução temporal
de um instrumento com resolução de fase; o aumento ou a diminuição excessiva
desta freqüência ocasionam uma diminuição tanto na modulação relativa (D), como
também na diferença de fase (d), conforme ilustrado na figura_33. Além disso, a
equação (9) demonstra que para uma resolução de fase ótima a freqüência de
modulação do sinal de excitação deve ser da mesma ordem de grandeza que o
inverso do tempo de vida da amostra em estudo. Portanto, a freqüência ideal de
modulação deve ser encontrada através de uma série preliminar de experimentos
visando estimar o tempo de vida de fosforescência da amostra.
Para a geração de sinais com amplitude e/ou freqüência moduladas existem
diversos dispositivos disponíveis, tais como: celas de Pockel, celas de Kerr;
moduladores óptico-acústicos; descargas gasosas com modulação de rádio
freqüência. e moduladores mecânicos (choppers)3 . Com estes instrumentos é
possível se obter sinais na faixa de freqüências de mHz à GHz, e com isto se
obter decaimentos de estados eletrônicos excitados em uma ampla escala
temporal, de segundos à nanosegundos.
Para a detecção do sinal de emissão modulado é necessário o uso de detectores
síncronos sensíveis à fase, como os amplificadores lock-in com dois canais7 .
Neste trabalho é descrito um sistema simples para medidas de tempos de vida da
ordem de milissegundos, usando-se uma fonte contínua de emissão, um obturador
eletromecânico para excitação modulada da amostra e um amplificador lock-in
como detector de mudança de fase. As medidas de tempo de vida da benzofenona
(uma molécula fosforescente) dissolvida em poliestireno em diversas
temperaturas foram usadas para estudar a dependência do tempo de vida com a
temperatura do sistema e através desta dependência, os processos de relaxações
do polímero.
2. EXPERIMENTAL
2.1. Materiais utilizados
Poliestireno (PS) da Poliestireno do Sul com Mw = 140.000g/mol foi utilizado
sem prévia purificação. Benzofenona (BZ) (Carlo-Erba) foi recristalizada duas
vezes à partir da solução etanólica saturada. Os cristais foram secos à vácuo e
armazenados ao abrigo da luz. Dicloroetano (Merck), com grau espectroscópico de
pureza, foi utilizado sem prévia purificação.
2.2. Preparação de amostras
Para as medidas de emissão de fosforescência foi utilizada uma amostra de PS,
na forma de filme, contendo 1% em massa de BZ. Para se preparar as amostras se
dissolveu o PS e a BZ em dicloroetano em proporções adequadas; a solução foi
colocada em uma placa de Petri e permitiu-se que o solvente fosse lentamente
evaporado. O filme assim obtido tem 70mm de espessura, é transparente e
homogêneo, sendo armazenado ao abrigo da luz e em dessecador até sua
utilização.
2.3. Equipamentos utilizados
O sistema de instrumentos utilizado é composto por um espectrofluorímetro com
vários módulos (fonte de luz, monocromador/fotomultiplicadora, sistema de
controle de varredura informatizado e eletrômetro), e já foi descrito
anteriormente. O sinal de saída do eletrômetro está conectado a um amplificador
lock-in de dois canais (Stanford Research Systems, modelo SR-530), que controla
um obturador de freqüência variável cuja função é modular a radiação de
excitação. A freqüência de modulação foi selecionada em 150Hz8 . A excitação da
amostra foi realizada com uma lâmpada de Xe de 150W com comprimento de onda
selecionado através de um monocromador de 25cm de caminho óptico em 300nm.
O software de controle da instrumentação e aquisição de dados descrito
anteriormente8 foi modificado de forma a incluir uma rotina para a aquisição de
sinais de emissão com resolução de fase; esta rotina torna o instrumento capaz
de adquirir um espectro de emissão com diferentes fases, resultando em uma
superfície Intensidade X Comprimento de onda X Ângulo de fase; e de controlar a
temperatura entre 15 e 405K, com monitoramento da emissão em um único
comprimento de onda e em várias fases de aquisição. Todos os dados gerados pelo
instrumento são armazenados na forma de matrizes (para a superfície) e de
tabelas Intensidade X Ângulo (para as varreduras de temperatura) em caracteres
ASCII.
Neste trabalho foram realizados três tipos de experimentos, obtendo-se dados
com a amostra de PS/BZ nas seguintes opções:
1. Obtenção dos espectros de fosforescência da BZ em diversas temperaturas (15
a 320K) sendo este experimento realizado com o amplificador lock-in ajustado
para insensibilidade à fase do sinal.
2. Obtenção do sinal de fosforescência em 448nm com controle da temperatura, e
36 fases de aquisição, de forma que a cada temperatura se adquira a intensidade
de emissão de 0 a 360 graus, com uma variação de 10 graus.
3. Aquisição de um espectro completo de fosforescência (400 a 550nm) da amostra
PS/BZ à 75K com resolução de fase de 0 a 360 graus. Neste caso, a cada
comprimento de onda adquirido o monocromador é parado e a fase do amplificador
é variada de 0 a 360 graus, sendo realizada uma aquisição de intensidade de
fosforescência a cada 10 graus.
Para se obter os espectros nas diversas temperaturas a amostra foi
termostatizada em um criostato, sendo que uma descrição detalhada do arranjo
experimental foi feita anteriormente8.
Todo o procedimento necessário para a varredura da grade do monocromador,
controle da freqüência de modulação, ajuste da fase do amplificador lock-in,
controle da temperatura, armazenamento e tratamento dos resultados é realizado
por um programa escrito em QuickBasic 4.5 rodando em um microcomputador PC-XT.
3. RESULTADOS E DISCUSSÃO
3.1. Efeito da temperatura sobre o espectro de fosforescência
A obtenção de espectros de fluorescência e de fosforescência de moléculas sonda
em matrizes poliméricas em diversas temperaturas é um procedimento rotineiro em
nosso laboratório, de forma que a interpretação dos dados gerados por este
processo já é bem conhecida11,12 . Pode-se desta forma, obter os espectros de
excitação e de emissão de fosforescência da benzofenona em qualquer temperatura
(entre 15 e 400K) e em quaisquer intervalos entre duas medidas. O tratamento
posterior dos dados, realizado automaticamente pelo programa de controle do
instrumento, pode fornecer dados de saída com diversas alternativas, entre
elas: área total do espectro de emissão X temperatura(Figura_4a), intensidade
em comprimentos de onda específicos X temperatura (Figura_4b) e relações entre
intensidades de emissão em diferentes comprimentos de onda X temperatura. A
análise de tais curvas permite correlacionar as modificações dos processos
fotofísicos de desativação de fosforescência nas diversas temperaturas com os
processos cooperativos de relaxação da matriz polimérica, no caso o PS9,10 .
A figura_4 mostra as variações da área integrada de fosforescência e da
intensidade de fosforescência em 448nm em função da temperatura da amostra de
PS/BZ. Conforme se pode notar, existe uma pequena modificação no comportamento
fotofísico por volta de 100K, porém o resultado é parcialmente obscurecido pelo
ruído no sinal. Esta modificação no processo de desativação da benzofenona em
poliestireno já foi reportada por outros autores11,12e é atribuída aos
movimentos dos anéis fenílicos do polímero que passam a ter energia térmica
suficiente para a rotação em torno da ligação covalente com a cadeia
polimérica. Esta rotação aumenta a probabilidade de desativações não radiativas
da BZ excitada, através de transferência da energia de excitação da BZ para os
anéis fenílicos da cadeia de PS.
3.2. Determinação do tempo de vida de fosforescência
A fim de se verificar se a resolução de fases poderia gerar bons resultados
espectrais com a presente amostra, foi realizado um experimento com a subrotina
de aquisição de espectro de fosforescência com resolução de fase, o espectro
resultante é mostrado na figura_5, para a temperatura de 75K. Nessa figura se
observa que o sinal de intensidade de fosforescência apresenta valores
negativos em alguns ângulos de fase, o que ocorre porque a magnitude dos sinais
medidos pelo amplificador depende do cosseno do ângulo de fase, de maneira que
os valores negativos não devem ser interpretados como uma "emissão
negativa", mas sim como um artifício matemático gerado pela
instrumentação. A partir da superfície mostrada na figura_5 foi escolhido o
comprimento de onda fixo de emissão em 448nm para a realização da varredura de
temperatura com aquisição de tempos de vida. Este comprimento de onda foi
escolhido pois é nesta região que acontece a maior variação na intensidade do
sinal com a variação da fase.
O experimento de varredura de temperatura com resolução de fase consiste no
seguinte procedimento: a amostra é refrigerada no interior do criostato até
15K; excita-se a mesma com o feixe modulado em 150Hz; focaliza-se o sinal de
espalhamento de excitação na fenda do detector e mede-se a fase deste sinal de
espalhamento; um comando é enviado ao amplificador de forma a tornar a fase
medida como um "ângulo de referência"; a seguir o monocromador de
detecção é sintonizado para 448nm, quando então realiza-se a medida da
intensidade de emissão neste comprimento de onda em 36 ângulos diferentes de
aquisição (0 a 360 graus, em intervalos de 10 graus); a temperatura é então
aumentada para 25K e o processo é repetido até que a temperatura final (320K)
seja alcançada.
A cada temperatura é gerada uma curva intensidade X ângulo; essa curva tem a
forma cossenoide, pois o ângulo de espalhamento é considerado como zero, de
forma que a regressão cossenoidal da curva nos fornece o ângulo de defasagem da
emissão em relação ao ângulo de excitação. A equação cossenoidal utilizada para
se ajustar as curvas é dada por:
<formula/> (10)
onde I0 e C são parâmetros de ajuste, e a é o ângulo de defasagem.
Na figura_6 está representada a curva cossenoide da emissão em 448nm e a 15K, e
também a curva obtida com a regressão cossenoidal. Nesse caso, o ângulo de
defasagem foi determinado como sendo de 311,9 graus e usando-se este valor e o
valor da freqüência utilizada no modulador de 150Hz na equação 9, obtém-se um
tempo de vida t = 7,4ms. Destaca-se, ainda, que a freqüência do modulador não
foi escolhida ao acaso; note-se que 1/150Hz " 0,007s, ou seja, a
freqüência de modulação é muito próxima do inverso do tempo de vida esperado
para a amostra, de acordo com a figura_3.
A repetição do cálculo do tempo de vida para todas as outras medidas em
temperaturas diferentes permite a construção de uma curva tempo de vida X
temperatura(Figura_7). Como se pode ver na curva de tempos de vida em função da
temperatura tem-se que até 100K o tempo de vida de fosforescência é
aproximadamente constante (7,4ms), e após esta temperatura existe uma
diminuição monotônica do tempo de vida, evidenciando que a desativação das
moléculas de BZ excitadas eletronicamente se torna mais eficiente.
O tempo de vida da benzofenona em matrizes sólidas já foi determinado por
outros autores13-15 e se encontra na faixa de 5-10 milissegundos9, sendo,
portanto, o valor determinado neste trabalho coerente com os reportados. Estes
autores têm demonstrado também que o tempo de vida sofre modificações com a
temperatura e é grandemente influenciado pelos processos de relaxações da
matriz.
4. CONCLUSÕES
A espectroscopia de luminescência com resolução de fases mostrou-se um método
simples para o estudo dos processos de emissão de luminescência de sondas
dissolvidas em matrizes poliméricas, permitindo, no caso de sua dependência com
a temperatura, que estudos de processos de relaxações de polímeros possam ser
realizados. No sistema implantado em nosso laboratório o controle do
experimento é feito com um amplificador lock-in, de modo que os limites de
detecção de tempos de vida estão na faixa de mili-segundos. Um programa de
controle de todos os instrumentos foi especialmente escrito, permitindo a
realização de experimentos diferentes com o mesmo conjunto de aparelhos,
tornando, pois, o arranjo experimental muito flexível. Os dados são gerados em
caracteres ASCII de modo que programas usuais de tratamento de dados podem ser
utilizados.