AVALIAÇÃO DE UM PROTOCOLO PARA MULTIPLICAÇÃO IN VITRO DA BANANEIRA (Musa sp.)
CV. CAIPIRA (AAA)
AVALIAÇÃO DE UM PROTOCOLO PARA MULTIPLICAÇÃO IN VITRO
DA BANANEIRA (Musa sp.) CV. CAIPIRA (AAA)1
INTRODUÇÃO
A banana, Musa spp, é uma das frutas mais consumidas no mundo e na maioria dos
países tropicais. No Brasil, a bananeira é cultivada de norte a sul, numa área
aproximada de 521.200 ha, envolvendo desde a faixa litorânea até os planaltos
interioranos, sendo 99% da produção destinada ao mercado interno (Borges et
al., 1997). No estado de Minas Gerais, a cultura tem se expandido grandemente,
principalmente na região Nordeste, devido aos projetos de irrigação (Cançado
Júnior et al., 1999).
O grande crescimento da bananicultura, ocorrido nos últimos anos, acarretou uma
forte demanda por mudas, muitas vezes de origem duvidosa (Silva et al., 1999),
aumentando a incidência de pragas e doenças e, conseqüentemente, resultando em
baixo rendimento dos cultivos (Pereira et al., 1999).
A micropropagação da banana consiste em isolar ápices vegetativos de filhos de
matrizes vigorosas e produtivas, em condições assépticas, em meio de cultura in
vitro. Em tais condições, proporciona-se uma profícua brotação de gemas
axilares a partir do ápice vegetativo isolado. As principais vantagens deste
método são a alta taxa de multiplicação em comparação aos métodos tradicionais
e à alta qualidade fitossanitária das mudas. Além disso, a micropropagação é
muito utilizada para produção de mudas básicas de novas cultivares de bananeira
desenvolvidos pelos programas de melhoramento genético. Dessa forma, é possível
atender com maior rapidez e eficiência às necessidades dos produtores.
O presente trabalho teve como objetivo avaliar o desempenho de um protocolo de
micropropagação de bananeira, cultivar Caipira (AAA), introduzida da África
Ocidental pela Embrapa Mandioca e Fruticultura, resistente a Sigatoka Amarela,
a Sigatoka Negra e ao Mal-do-Panamá, uma vez que esta cultivar constitui
material de grande importância para as regiões de cultivo da bananeira.
MATERIAIS E MÉTODOS
Rizomas de bananeira cultivar Caipira foram retirados de matrizes em campo, na
EMBRAPA, em Cruz das Almas-BA e enviados para o Laboratório de Biotecnologia da
EPAMIG, em Uberaba-MG. Após três dias de viagem, foi feita uma pré-limpeza do
material, retirada de explantes e desinfestação. Para a desinfestação, foi
utilizada lavagem em água e sabão, em seguida, em câmara de fluxo laminar,
imersão em álcool 70% por 1 min, em hipoclorito de sódio por 20 min e lavagem
em três águas autoclavadas. Foram estabelecidos 300 explantes de bananeira cv.
Caipira, com as seguintes dimensões : 0,5 cm de rizoma, 1 cm de primórdios
foliares e 1 cm de diâmetro. Os explantes permaneceram 30 dias na fase de
estabelecimento.
Nas fases de estabelecimento e multiplicação, cada recipiente conteve 50 ml do
meio de cultura constituído pela mistura de sais e vitaminas de MS (Murashige e
Skoog, 1962), suplementado com 5 mg/l de benzilaminopurina (BAP), 30 g/l de
sacarose e 8 g/l de agar. A fase de multiplicação teve 5 subcultivos, cada um
com duração média de 30 dias. No primeiro subcultivo de multiplicação, cada
explante foi retirado e cortado longitudinalmente ao meio e as duas metades
subcultivadas para novo meio em recipientes diferentes.
A partir do segundo subcultivo de multiplicação, ao final de cada subcultura,
os tufos de brotações sadios tiveram as folhas cortadas e foram divididos
longitudinalmente em partes iguais (2; 3 ou 4 partes, conforme o tamanho do
tufo) para expor seus pontos de crescimento ao meio nutritivo, sendo um
recipiente novo para cada parte dividida. Ao término da subcultura 5, os tufos
foram subcultivados em meio de enraizamento.
Para iniciar a fase de enraizamento, os tufos de brotações obtidos da fase
anterior foram divididos, de forma que os brotos com mais de 1 cm de cartucho
foram individualizados, e os tufos com gemas não desenvolvidas foram divididos
em partes iguais. Os procedimentos para a retirada dos tufos, divisão e
subcultivo foram os mesmos da fase anterior, exceto que não se cortaram as
folhas dos brotos. Todo o material foi subcultivado em recipientes com 80 ml de
meio de cultura constituído de 50% da concentração original de MS, 15g/l de
sacarose e 8g/l de ágar, sem reguladores de crescimento. Cada recipiente
recebeu 4 brotos (ou tufos subdivididos), e a fase de enraizamento teve a
duração de 30 dias. Ao final desta subcultura, de um total de 2.446 frascos,
foram amostrados 818, que tiveram seus brotos (³10 mm) retirados e avaliados
individualmente quanto ao número e comprimento do colo da plântula até a roseta
foliar. O restante dos frascos foi aberto e as plântulas, aclimatadas.
Na sala de incubação, a temperatura média foi de 25ºC, iluminação artificial
com lâmpadas fluorescentes luz do dia, num total de 3.000 lux, com fotoperíodo
de 16 horas.
O controle de qualidade envolveu basicamente procedimentos para evitar
variações somaclonais e presença de pragas e doenças. Para controle de
variações somaclonais, durante as subculturas, os tecidos com calos foram
descartados e na aclimatação foi feito exame visual para detecção de possíveis
plantas fora-do-padrão.
Durante a fase de crescimento in vitro, as contaminações verificadas eram
anotadas e descartadas. Ao final de cada subcultura, os frascos foram
amostrados e avaliados, por fora, sem retirada das culturas, quanto ao número
de brotos maiores ou iguais a 10 mm e o comprimento destes brotos, da base do
pseudocaule até a roseta foliar. Durante a operação de subcultivo, foi anotado
o rendimento de cada frasco subcultivado, ou seja, quantos frascos da
subcultura seguinte cada frasco subcultivado rendeu.
As avaliações de número e comprimento de brotos da subcultura 5 foram perdidas.
RESULTADOS E DISCUSSÃO
. Pelos dados apresentados na Figura_1, pode-se verificar que o número de
brotos ( ³ 10 mm) por frasco (NB) cai significativamente ao longo das
subculturas. Isto não significa que o número de gemas esteja, também,
decrescendo, uma vez que, pela Tabela_1, se observa que o rendimento de frascos
se mantém em torno de 3 na fase de multiplicação. Alguns autores relatam médias
de número de brotos superiores às apresentadas, embora não informem se foram
incluídos na contagem os brotos abaixo de 10 mm de comprimento (Damasco &
Barba, 1984; Lameira et al., 1991; Domingues et al., 1995). Taxas de
multiplicação aproximadas foram obtidas por diversos autores sob condições
semelhantes a este trabalho, porém com diferentes genótipos (Lameira et al.,
1991; Oliveira & Silva, 1997; Oliveira et al., 1999).
No fator comprimento médio dos brotos por frasco (MME), pode ser observado, na
Figura_1, que o tamanho dos brotos permanece praticamente o mesmo nas
subculturas de 1 a 3, havendo, então, queda na subcultura 4. Provavelmente, o
efeito cumulativo do BAP de uma subcultura para outra tenha dificultado o
alongamento dos brotos (Grattapaglia & Machado, 1990).
A Figura_2 mostra mais claramente o comportamento do número de brotos e suas
classes de tamanho ao longo das subculturas. A tendência geral é de queda,
sendo que a classe de brotos menores (x<20) tende a predominar cada vez mais,
mostrando que, além de diminuir o número de brotos, reduz também sua capacidade
de crescimento.
A taxa de multiplicação foi avaliada através do rendimento de frascos de uma
subcultura para outra (Tabela_1), cujos valores se encontram próximos de 3,0
nos subcultivos de 1 a 4. De um modo geral, a literatura tem relatado valores
aproximados a esta taxa nos subcultivos 2 a 4 (Oliveira & Silva, 1997;
Oliveira et al., 1999). Com relação à menor taxa de multiplicação observada no
subcultivo 5, deve-se levar em consideração que, no estabelecimento da
subcultura seguinte (enraizamento), foram colocados 4 brotos (ou tufos) para
cada frasco estabelecido, ao contrário das fases anteriores, nas quais cada
recipiente recebeu apenas um explante. Desta forma, o rendimento da subcultura
5 não pode ser considerado para fins de comparação de rendimento de frascos com
outras subculturas.
A avaliação geral da eficiência de todo o processo in vitro (Tabela_1) indica
que, se todos os explantes estabelecidos chegassem ao final de cada subcultura
sem contaminação, teríamos uma taxa de rendimento total de 1.077,75 vezes o
número de rizomas que entraram no processo, ou seja, 300x1.077,75 ~ 322.727
mudas. Entretanto, o rendimento real foi de 70,9 mudas/rizoma; iniciando-se com
300 rizomas, obtiveram-se 21.257 mudas. Por estes números, chegamos à conclusão
de que o rendimento potencial seria 15,3 vezes maior que o rendimento real,
mostrando que as perdas por contaminação representam um grande problema que
precisa ser imediatamente controlado, sob pena de inviabilizar comercialmente a
técnica. A relação entre o número de mudas produzidas e o número de explantes
viáveis introduzidos foi de apenas 77 vezes (21.257/277), ao passo que Mendes
et al. (1996) obtiveram 676 plantas/explante (variando de 143 a 1850) para a
variedade Nanicão, após seis subcultivos, enquanto Oliveira & Silva (1997)
obtiveram uma eficiência de 190 plântulas/explante viável, após o mesmo período
e utilizando a mesma variedade.
Através dos dados da Tabela_2, observa-se que a maior porcentagem de
contaminação ocorreu durante a fase de estabelecimento in vitro dos explantes
(74,7%), uma vez que o material foi diretamente proveniente do campo. Este
nível foi decrescendo, até que, na subcultura 3, houve um acréscimo em relação
a subcultura 2. Segundo Grattapaglia & Machado (1990), este acréscimo pode
ser atribuído a bactérias endógenas de crescimento lento, que representam um
problema para a maioria dos laboratórios, gerando grandes perdas nas culturas
em estágio avançado de multiplicação. Algumas contaminações bacterianas
ocorridas foram identificadas como : Pseudomonas maltophila, Bacillussp,
Klebsiella pneumonia e Hafnia alvei.
A ocorrência de variações somaclonais é um dos fatores limitantes na expansão
da utilização de plantas in vitro (Israeli et al., 1991). Na bananeira, os
principais os fatores que podem induzir as variações somaclonais são a
instabilidade genética dos tecidos somáticos, a presença de gemas adventícias
formadas nos tecidos do rizoma (independentemente da presença de calos), a taxa
de repicagens in vitro e os componentes do meio de cultura, como o uso dos
reguladores de crescimento em elevadas concentrações, por exemplo, acima de 5,0
mg/L de BAP (Domingues et al., 1995). No presente trabalho, o controle da sua
ocorrência foi efetuado pelo descarte de tecidos com calos, durante os
subcultivos, e pela eliminação de possíveis plantas fora-do-padrão durante a
aclimatação. Neste caso, não foi identificada nenhuma planta com variação
somaclonal, durante a fase de aclimatação.
Na subcultura de enraizamento, 63% dos brotos estiveram na faixa de tamanho
entre 30 e 60 mm (Figura_3), obtendo-se assim 4,6 brotos por frasco, com
tamanho entre 30 e 60 mm (Figura_4). Isto representa um resultado razoável,
considerando que houve um bom rendimento de brotos por frasco, e o tamanho está
adequado para a fase de aclimatação. Para classes menores, há dificuldade de
sobrevivência na aclimatação, e nas classes maiores há grande desuniformidade e
deformação das primeiras folhas que se enrolam ao crescer mais que a capacidade
do recipiente, causando mau aspecto e dificuldade de crescimento.
A não-utilização de regulador de crescimento e a redução dos nutrientes pela
metade foram eficientes para aumentar o vigor vegetativo das culturas, uma vez
que os brotos obtidos durante a fase de enraizamento (tamanho médio de 45 mm)
apresentaram quase o dobro do tamanho dos brotos das fases de multiplicação
(Figura_1). Isto já era esperado, pois, uma vez enraizados, os brotos têm maior
capacidade de absorção dos nutrientes. Esta eficácia também foi comprovada por
Domingues et al. (1995) e Oliveira & Silva (1997). Inclusive, Souza &
Gonçalves (1996) sugeriram que a melhor adequação dos nutrientes favoreceria a
rizogênese das plantas. Analisando diversos trabalhos, Grattapaglia &
Machado (1990) verificaram que diversas espécies, principalmente herbáceas,
enraízam na presença de níveis muito reduzidos de auxina, ou, simplesmente, em
meio básico sem hormônio. A concentração de sacarose reduzida pela metade
também foi benéfica, pois isto facilita a passagem das plantas para o estado
autotrófico durante o transplantio (Debergh, 1988).
CONCLUSÃO
1 - Os níveis de contaminações atingidos podem inviabilizar a produção
comercial de mudas, num ambiente mais competitivo, sendo este o principal fator
que onera o rendimento da cultura. Apenas melhorar as condições de assepsia não
é suficiente, sendo necessário identificar melhor os contaminantes e formular
estratégias para sua prevenção e controle, sobretudo para as contaminações com
bactérias.
2 - Ainda há necessidade de estudo das concentrações de BAP. Uma dosagem
constante durante todas as subculturas parece não ser o ideal, já que se
suspeita de que haja um efeito cumulativo negativo do BAP ao longo das
subculturas. O decréscimo de dosagens ou mesmo a alternância do uso do
regulador, ao longo das subculturas, parece ser um ótimo caminho para aumentar
o vigor das subculturas.
3 - O tamanho final das plântulas ao final do enraizamento/início da
aclimatação ainda é muito desuniforme.
4 - O protocolo produziu mudas de alta qualidade genética e fitossanitária, com
eficiência maior que os sistemas tradicionais de produção de mudas a campo.