CALOGÊNESE EM ÓVULOS DE ESPÉCIES E VARIEDADES DE CITRUS
CALOGÊNESE EM ÓVULOS DE ESPÉCIES E VARIEDADES DE CITRUS 1
INTRODUÇÃO
A fusão de protoplastos de variedades comerciais de Citrus com aqueles de
espécies pertencentes a gêneros afins a este, como Microcitrus e Eremocitrus,
de reconhecido valor adaptativo a ambientes sujeitos a estresses, apresenta
grandes perspectivas sob o ponto de vista do melhoramento genético dos citros,
particularmente no tocante à obtenção de novos porta-enxertos.
Por serem alotetraplóides, tais híbridos mantêm as ligações gênicas presentes
nos pais, devido à ausência de segregação meiótica. Desse modo, os genes
deletérios recessivos presentes nas variedades parentais permanecem sem
expressão, escondidos sob uma condição heterozigótica, dando-se o contrário com
as características controladas por genes dominantes ou codominantes, cuja
possibilidade de manifestação nos híbridos é preservada.
Vários autores têm conseguido híbridos somáticos interespecíficos (Grosser et
al., 1989 e 1991; Kobayashi et al., 1988; Oghawara et al., 1989; Tusa et al.,
1990), híbridos somáticos intergenéricos, de espécies sexualmente compatíveis
(Deng et al., 1991; Grosser et al., 1988) e de espécies incompatíveis (Grosser
et al., 1990a ,1990b e 1991).
O limão-'Rugoso' (C. jambhiri Lush.) e o limão-'Volkameriano' (C. volkameriana
Ten. et Pasq.) têm despertado grande interesse por serem altamente produtivos e
tolerantes à tristeza e à seca, porém têm a desvantagem de serem suscetíveis ao
declínio dos citros. A tangerina-'Cleópatra' (C. reshni Hort. ex Tan.), por sua
vez, embora tolerante ao declínio, apresenta o inconveniente de que as copas
nela enxertadas possuem um longo período vegetativo (Castle, 1987). As
laranjeiras-doces [C. sinensis (L.) Osb.] também são tolerantes ao declínio
(Castle et al., 1993), mas sua utilização como porta-enxertos tem sido reduzida
drasticamente devido à alta suscetibilidade à gomose de Phytophthora que
manifestam. Assim, a hibridação somática da tangerina-'Cleópatra' com os
limões-'Rugoso' e 'Volkameriano' ou com laranjas-doces poderá originar porta-
enxertos vigorosos, produtivos e resistentes ao declínio (Louzada et al.,
1992). Outro exemplo poderia incluir a hibridação somática entre a laranja-
'Azeda' (C. aurantium L.) com a tangerina-'Cleópatra', reunindo as
características de alta produtividade e qualidade de frutos, longevidade,
resistência à geada, à seca, ao declínio e à gomose, além de boa adaptação a
uma grande diversidade de solos da primeira, com a tolerância à tristeza
presente na citada tangerina (Louzada et al., 1992).
Os calos nucelares embriogênicos podem ser obtidos a partir do cultivo de
óvulos abortivos, óvulos não fertilizados, óvulos inteiros fertilizados, ou de
nucelos (Gmitter Jr. & Moore, 1986). A esse respeito, dentre os fatores que
mais influenciam a indução de calos nucelares embriogênicos, destacam-se as
condições do ambiente em que a planta se desenvolvem, o genótipo, a idade dos
explantes e os componentes do meio de cultura (Spiegel-Roy & Kochba, 1980 e
Moore, 1985).
Este trabalho faz parte das atividades do Programa de Melhoramento Genético de
Citros da Embrapa Mandioca e Fruticultura, cujos objetivos incluem a obtenção
de novos porta-enxertosmelhor adaptados às condições tropicais de cultivo
brasileiras, enfatizando-se a tolerância à seca e ao alumínio, tolerância/
resistência a doenças, a exemplo da gomose de Phytophthora e tristeza dos
citros, além da adaptação a altas densidades populacionais. Neste contexto,
pretendeu-se, com o estudo aqui apresentado, ajustar e avaliar procedimentos
metodológicos prévios ao isolamento de protoplastos de citros, visando à
obtenção de híbridos somáticos interespecíficos e intergenéricos.
Espera-se que os híbridos obtidos por esse processo apresentem características
complementares provenientes das variedades doadoras de protoplastos, variedades
estas muitas vezes relacionadas a espécies pertencentes a diferentes grupos
(pools) gênicos, entre as quais a troca de genes mediante hibridação
convencional pode ser impedida por barreiras reprodutivas.
MATERIAL E MÉTODOS
A pesquisa foi conduzida no Laboratório de Biotecnologia Vegetal da Embrapa
Mandioca e Fruticultura, em Cruz das Almas - BA, utilizando as seguintes
variedades: tangerina-Cleópatra, Sunki (C. sunki Hort. ex Tan.), e Swatow (C.
reticulata Blanco), limões-Cravo (C. limonia Osb.) seleções Santa Cruz e Santa
Bárbara, Volkameriano e Rugoso Mazoe, laranja-doce Hamlin seleções CNPMF 04 e
20, laranja-Azeda seleções Comum e Narrow Leaf, citrange (C. sinensis x P.
trifoliata) Troyer, C. amblycarpa Ochse e Microcitrus papuana.
Os frutos empregados na extração de óvulos não fertilizados foram obtidos de
plantas do Banco Ativo de Germoplasma de Citros da Embrapa Mandioca e
Fruticultura, sendo coletados imaturos.
Depois de extraídos das sementes dos frutos, sob condições assépticas, os
óvulos não fertilizados foram tratados em solução contendo três partes de água
destilada esterilizada e uma parte de hipoclorito de sódio (2% de cloro ativo),
por 12 minutos. Posteriormente, foram feitas três lavagens com água destilada
esterilizada (Spiegel-Roy & Vardi, 1984), visando a eliminar resíduos de
hipoclorito.
Em seguida, os óvulos foram incubados em meio de cultura, sob condições de
escuro, a 27 ± 1º C, de modo a induzir a formação de calos embriogênicos. O
meio de cultura compreendeu os sais minerais e vitaminas do meio MT (Murashige
& Tucker, 1969), adicionado de 50 g.L-1 de sacarose e 500 mg.L-1 de extrato
de malte, conforme Kochba & Spiegel-Roy (1973), solidificado com 7 g.L-1 de
ágar. O pH foi ajustado para 5,7-5,8 e o meio foi esterilizado em autoclave à
temperatura de 121º C, durante 40 minutos. As avaliações relativas à formação
de calos foram realizadas em intervalos semanais.
RESULTADOS E DISCUSSÃO
Em geral, a indução de calos nas variedades estudadas ocorreu entre a 6a e a 8a
semana de cultivo de óvulos. Resultados semelhantes foram relatados por Kochba
et al. (1972), que obtiveram calos e/ou embrióides utilizando como fonte de
explantes óvulos de laranja-'Valência' (C. sinensis) e pomelo-'Marsh Seedless'
(C. paradisiMacf.). No tocante à laranja-'Hamlin CNPMF 20', entretanto, a
formação de calos aconteceu entre a 3a e a 4a semana após o estabelecimento in
vitro dos explantes no meio de cultura. Segundo Moore (1985), essas diferenças
em relação ao período de cultivo necessário à ocorrência de embriogênese são
devidas ao efeito do genótipo, idade do explante e meio de cultura utilizado.
A porcentagem de óvulos que formaram calos variou bastante entre as 14
variedades estudadas. Dentre as 10 variedades para as quais se obteve
calogênese, a porcentagem de formação de calos foi igual ou superior a 50% em
cinco delas, a saber: tangerina-Cleópatra (66,0%), limão-Cravo Santa Cruz
(60,0%), laranja-Hamlin CNPMF 20 (58,0%), citrange-Troyer (55,5%), laranja-
Hamlin CNPMF 04 (51,6%) e tangerina-Swatow (50,0%), conforme se verifica na
Tabela_1 e Figura_1. Oliveira et al. (1994), trabalhando com diferentes meios
de cultivo, também verificaram que, independentemente do meio utilizado, a
tangerina-'Cleópatra' apresentou elevada formação de calos (48,8%) e menor
formação de embrióides (0%). Esses resultados indicam uma alta porcentagem de
embriogênese, uma vez que este processo normalmente ocorre em apenas 0% a 25%
dos explantes, conforme Vardi et al. (1982), Moore (1985) e Gmither & Moore
(1986).
Em geral, no conjunto de variedades estudadas, as tangerinas e laranjas
apresentaram maior formação de calos. Estes estão sendo subcultivados em meio
MT + BAP acrescido de 500 mg.L-1 de extrato de malte, visando a sua adaptação e
multiplicação, encontrando-se os mesmos, no momento, entre o 2o e o 3o
subcultivo. Nos limões-'Cravo Santa Bárbara', 'Volkameriano' e 'Rugoso Mazoe',
bem como em M. papuana, não se observou a formação de calos, enquanto, em
Citrus amblicarpa e laranja-'Azeda Comum', a quantidade de óvulos que não
formaram calos foi muito pequena: 4,0% e 5,5%, respectivamente (Tabela_1).
Nestas últimas, cabe acrescentar, os calos formados apresentaram pouco
crescimento e oxidaram, sendo, portanto, descartados. De acordo com Moore
(1985), este fato deve ter ocorrido devido a os explantes terem sido coletados
numa fase em que o balanço hormonal endógeno era desfavorável à formação de
calos. Além disso, segundo Kochba & Spiegel-Roy (1977), nas situações em
que a calogênese foi baixa, esse comportamento pode ter sido devido ao uso
desnecessário de reguladores de crescimento, que pode levar à oxidação e
diminuição na velocidade de crescimento dos calos formados.
CONCLUSÕES
Considerando-se o conjunto de variedades cítricas estudadas, as seguintes
conclusões podem ser obtidas:
1- Óvulos das tangerinas-'Cleópatra' e 'Swatow', limão-'Cravo Santa Cruz',
laranja-'Hamlin' (CNPMF 04 e 20) e de citrange-'Troyer' são altamente
favoráveis à calogênese, com porcentuais iguais ou superiores a 50%.
2 - A laranja-'Hamlin CNPMF 20' apresenta grande precocidade com relação ao
início da calogênese.