MARCADORES RAPD PARA MAPEAMENTO GENÉTICO E SELEÇÃO DE HÍBRIDOS DE CITROS
MARCADORES RAPD PARA MAPEAMENTO GENÉTICO E SELEÇÃO DE HÍBRIDOS DE CITROS1
INTRODUÇÃO
Fatores de natureza biótica e abiótica afetam de modo significativo a cultura
dos citros no Brasil. O melhoramento genético apresenta limitações relacionadas
à longa juvenilidade, incompatibilidade, alta heterozigosidade, esterilidade,
depressão por endogamia, apomixia e poliploidia (Gmitter et al., 1996).
Plantas híbridas entre tangerina-'Cravo' (Citrus reticulata Blanco) e laranja-
'Pêra' (C. sinensis (L.) Osbeck) são potencialmente importantes por segregarem
para diversas características de importância agronômica, principalmente para o
caráter resistência/suscetibilidade a doenças, entre as quais a clorose
variegada dos citros (CVC). A laranja-'Pêra' é altamente suscetível à doença e
a tangerina-'Cravo' não tem apresentado sintomas no campo (Machado et al.,
1993).
Diversos marcadores moleculares têm sido utilizados no melhoramento genético de
plantas, permitindo análises mais completas e consistentes de sua genética. No
melhoramento de citros, vêm sendo utilizados na seleção precoce de híbridos e
plantas nucelares (Oliveira et al., 2000), obtenção de 'fingerprints' de
cultivares (Deng et al., 1995), caracterização de germoplasma (Machado et al.,
1996), estudos de relações filogenéticas entre espécies e gêneros (Federici et
al., 1988), construção de mapas genéticos de alta cobertura genômica e na
localização de genes de interesse econômico (Cai et al., 1994; Gmitter et al.,
1996; Simone et al., 1998; Cristofani et al., 1999).
Atualmente, os RAPDs (Random Amplified Polymorphic DNA) consistem em um dos
marcadores moleculares mais usados em estudos genéticos. Os RAPDs são
detectados pela amplificação, de forma arbitrária, de fragmentos de DNA de
diferentes tamanhos pela reação de polimerase em cadeia (PCR), na presença da
enzima termoestável 'DNA polimerase' (Williams et al., 1990).
As principais vantagens do RAPD referem-se à fácil execução, rápida obtenção de
marcadores, necessidade de pequenas quantidades de DNA genômico (10 a 100 ng),
baixo custo, ausência de hibridação, não-utilização de radioisótopos,
polimorfismo ser visualizado na forma de banda amplificada de DNA visível em
gel de agarose corado com brometo de etídio, polimorfismo ser detectado em
regiões altamente repetitivas e um nível elevado de polimorfismo quando se
compara com outros marcadores moleculares. As desvantagens relacionam-se à
reprodutibilidade dos resultados, ambigüidade na interpretação das bandas, co-
migração de fragmentos de igual ou tamanho muito próximo e ao caráter dominante
da maioria dos marcadores obtidos (Cruz & Milach, 1998; Ferreira &
Grattapaglia, 1998).
Este trabalho teve por objetivo estabelecer marcadores RAPDs consistentes que
possam ser utilizados em estudos de mapeamento genético e seleção de híbridos
entre tangerina-'Cravo' e laranja- 'Pêra'.
MATERIAL E MÉTODOS
Folhas frescas e maduras dos parentais tangerina-'Cravo' e laranja-'Pêra', e de
seis híbridos F1 desses genitores, obtidos por cruzamentos controlados, foram
utilizadas para a extração de DNA. As folhas foram lavadas em água corrente,
secas com papel toalha e trituradas em almofariz com nitrogênio líquido. A
extração de DNA foi feita utilizando o protocolo de Murray & Thompson
(1980), adaptado por Cristofani et al. (1999), que utilizam o método CTAB.
A quantificação do DNA foi feita em gel de agarose, corado com brometo de
etídio (0,5 ng mL-1), comparando-se a l-DNA intato nas concentrações de 50;
100; 150 e 200 ng ìL-1 (Sambrook et al., 1989). De acordo com os mesmos
autores, a qualidade do DNA extraído foi avaliada com base na ausência/presença
e intensidade de rastro no gel após corrida eletroforética.
As reações de amplificação foram preparadas em um volume final de 13 uL, com
1,3 uL de tampão 10x (200 mM Tris-HCl pH 8,4; 500 mM KCl - GIBCO BRL); soluções
1,54 mM de MgCl2 (GIBCO BRL) e 0,2 mM de cada dNTP (dATP, dCTP, dTTP, dGTP -
GIBCO BRL); 15 ng de cada 'primer'; 1,5 unidade de 'Taq DNA Polymerase' (GIBCO
BRL); e 15 ng de DNA genômico. Adicionou-se 20 uL de óleo mineral (Sigma) por
reação. As amplificações foram realizadas em termocicladores MJ Research Inc.,
programados para 36 ciclos de 1 min a 92oC, 1 min a 36oC, 2 min a 72oC e 10 min
de extensão a 72oC. Foram avaliados 'primers' decâmeros de seqüência arbitrária
dos 'kits' A, AB, AT, AV, B, C, D, E, G, H, M, N, P, Q, R e U da Operon
Technologies Inc., Alameda, CA, USA.
Os produtos de amplificação foram separados por eletroforese em tampão TAE 1X
(0,04 M Tris-acetato + 1 mM EDTA), utilizando géis de agarose a 1,4%, contendo
5 ug mL-1 de brometo de etídio. A corrida foi realizada a 94 V, sendo aplicados
5 uL da solução de reação com 1 uL de tampão de carregamento (0,25% de azul de
bromofenol + 40% de sacarose) por canaleta do gel. O marcador 'DNA Ladder' de 1
kb (GIBCO BRL) foi utilizado como padrão. A visualização das bandas foi
realizada sob luz ultravioleta.
Os 'primers' testados foram avaliados quanto ao número total de bandas geradas,
número de marcadores encontrados e intensidade das bandas polimórficas. As
bandas polimórficas foram classificadas em 'fortes' para amplificações de
grande intensidade e nitidez, e 'moderadas' para amplificações de intensidade
média. As amplificações polimórficas visíveis de pouca intensidade e nitidez
não foram consideradas.
Os produtos polimórficos de amplificação foram designados de acordo com o
'primer' e tamanho da banda amplificada.
RESULTADOS E DISCUSSÃO
O protocolo utilizado para a extração de DNA das amostras de citros apresentou
uma eficiência média de 4 mg de DNA/200 mg de folha fresca, com valores
variando de 2,5 a 10 mg. O DNA extraído foi de boa qualidade, pois,
praticamente, não houve rastro nos géis de quantificação, indicando baixo nível
de degradação.
As reações de amplificação apresentaram elevada reprodutibilidade, não havendo
diferenças entre os termocicladores. Segundo Cruz & Milach (1998) e
Ferreira & Grattapaglia (1998), a reprodutibilidade está fortemente
associada à qualidade do DNA e à padronização das condições de reação. Keil
& Griffin (1994) também obtiveram padrões de bandas RAPDs bastante
consistentes, ao trabalharem com Eucalyptus, verificando pequena ou nenhuma
variação durante as repetições.Foram amplificadas, em média, 7,8 bandas por
'primer', com valores variando de 1 a 16. Machado et al. (1996) e Coletta Filho
et al. (1998) obtiveram, respectivamente, médias de 5,3 e 4,7 bandas por
'primer', ao trabalharem com tangerinas e mexericas. O número de bandas
amplificadas normalmente é função da espécie, do 'primer' e das condições da
amplificação (Ferreira & Grattapaglia, 1998).
Para os parentais estudados, foram selecionados 113 'primers' que produziram
fragmentos polimórficos, com número de marcadores variando de 1 a 6 por
'primer'. Esses 'primers' amplificaram 869 bandas, sendo 201 (23,13%)
polimórficas, com tamanho variando de 261 a 2961 pb (Figura_1). O número médio
de marcadores por 'primer' foi de 1,78. A freqüência de 'primers' polimórficos
com 1; 2; 3; 4; 5 e 6 marcadores foi de 49,5%, 33,6%, 9,7%, 4,4%, 1,8% e 1,0%,
respectivamente (Tabela_1).
Vários trabalhos visando a selecionar 'primers' e marcadores RAPDs foram feitos
com outras espécies de Cítrus e gêneros correlacionados. Simone et al. (1998)
trabalharam com C. aurantium e C. latipes, e Cristofani et al. (1999) com C.
sunki e Poncirus trifoliata obtendo, respectivamente, 1,42 e 2,18 marcadores
RAPDs por 'primer' selecionado. Nesses trabalhos, as diferenças ocorreram,
principalmente, em função da composição genética das espécies estudadas.
Em reações RAPDs, normalmente, são amplificados fragmentos entre 500 e 2500 pb
(Ferreira & Grattapaglia, 1998). Neste trabalho, 90,5% dos marcadores
ocorreram nesse intervalo. Cai et al. (1994), Coletta Filho et al. (1998) e
Cristofani et al. (1999) obtiveram fragmentos polimórficos de tamanho entre 200
e 3000 pb, ao trabalharem com mais de uma centena de marcadores RAPDs em
citros.
Do total de marcadores selecionados, 85,1% (171) apresentaram intensidade e
nitidez acentuadas nos géis de agarose e 14,9% (30), moderadas; todos sendo
recomendados para análises do genoma de tangerina-'Cravo', laranja-'Pêra' e
seus híbridos (Tabela_2). As bandas polimórficas de intensidade e nitidez
fracas não foram consideradas para evitar interpretações ambíguas. Segundo
Ferreira & Grattapaglia (1998), bandas pouco consistentes ocorrem com todos
os tipos de marcadores moleculares, sendo atribuídas, em ensaios RAPDs, ao
baixo poder de o 'primer' discriminar sítios de amplificação distintos, à
competição entre diferentes sítios de amplificação por substrato e enzima, e à
problemas na padronização das condições de amplificação.
Os marcadores RAPDs descritos nas Tabelas_1 e 2 podem ser utilizados para a
seleção precoce de híbridos, obtenção de 'fingerprints', estudos de diversidade
genética e construção de mapas genéticos. Os 'primers' que apresentaram quatro
(OPG13, OPM07, OPN14, OPN15 e OPP09), cinco (OPA08 e OPG17) e seis (OPA07)
bandas polimórficas apresentam grande aplicabilidade na seleção precoce de
híbridos entre tangerina-'Cravo' e laranja-'Pêra', pois permitem a seleção mais
eficiente da maior parte dos híbridos com apenas uma única reação de
amplificação, contornando as limitações relacionadas à natureza dominante dos
marcadores RAPDs. Uma vez que Simone et al. (1998) e Cristofani et al. (1999)
construíram mapas moleculares de espécies de citros, respectivamente, com 157 e
169 marcadores RAPDs e conseguiram localizar genes de interesse agronômico
nesses mapas, espera-se que os 201 marcadores selecionados possam ser
suficientes para a mesma finalidade.
CONCLUSÕES
1. A utilização de DNA de boa qualidade, extraído por método CTAB, e a
padronização das condições da PCR possibilitam a obtenção de reações de RAPD
com elevada reprodutibilidade, mesmo em diferentes termocicladores.
2. Marcadores RAPDs consistentes foram obtidos entre os parentais tangerina-
'Cravo' e laranja-'Pêra' utilizando diferentes 'primers', que estão sendo
utilizados para a seleção precoce de híbridos zigóticos, estudos de diversidade
genética e construção de mapas genéticos de ligação.
3. Os 'primers' que amplificam um maior número de marcadores RAPDs são os menos
freqüentes; existem 'primers' que amplificam até seis bandas polimórficas entre
os parentais tangerina-'Cravo' e laranja-'Pêra'.
4. Nas reações de amplificação do DNA de tangerina- 'Cravo' e laranja - 'Pêra',
a proporção de bandas polimórficas em relação às monomórficas é de,
aproximadamente, 1:4 para os 'primers' selecionados.