Avaliação da eficiência de acaricidas isolados e em mistura no controle do
ácaro-da-necrose-do-coqueiro Aceria guerreronis Keifer, 1965 (Prostigmata:
Eriophyidae) no Vale do São Francisco
AVALIAÇÃO DA EFICIÊNCIA DE ACARICIDAS ISOLADOS E EM MISTURA NO CONTROLE DO
ÁCARO-DA-NECROSE-DO-COQUEIRO ACERIA GUERRERONIS Keifer, 1965 (PROSTIGMATA:
ERIOPHYIDAE) NO VALE DO SÃO FRANCISCO1
INTRODUÇÃO
Ocorrem, no Brasil, quatro espécies de ácaros fitófagos em coqueiros (Ferreira
et al., 1998), quais sejam: Aceria (Eriophyes) guerreronis Keifer, 1965,
Tetranychus mexicanus, Retracrus johnstoni e Amerineus cocofolius. Destas,
apenas A. guerreronis é relatada como séria praga do coqueiro, praticamente em
todos os países onde a cocoicultura é importante. A primeira ocorrência deste
ácaro foi registrada no Estado de Guerrero, México, e hoje se encontra
disseminado em vários países da América, África e Ásia (Cabrera 1991). No
Brasil, foi citado pela primeira vez em 1965, no Rio de Janeiro (Robbs &
Peracchi, 1965), podendo hoje ser observado na maioria das áreas onde o
coqueiro é cultivado.
Com base em pesquisas realizadas no México, constatou-se que esse ácaro causa
uma diminuição de até 25% no peso da copra nas colheitas (Rosas et al., 1992),
sem acarretar, no entanto, alterações na sua qualidade (Suarez & Cala,
1992). Fortes ataques podem reduzir acima de 50% o tamanho do fruto e do
albúmen, dependendo da intensidade do dano provocado (Mariau et al., 1981).
O ácaro A. guerreronis constitui-se num dos mais sérios problemas para a
cultura do coqueiro no Vale do São Francisco, especialmente no pólo de
Juazeiro-BA / Petrolina-PE.
Segundo Keifer,A. guerreronis é um ácaro de corpo vermiforme, com coloração
branco-leitosa, e apresenta somente quatro pernas. A abertura anal está situada
na extremidade posterior do corpo enquanto a genitália se localiza logo atrás
das coxas. Caracterizado por apresentar um tipo de garra plumosa com seis
raios, tubérculos dorsais afastados, cerdas divergentes, escudo lateral com
anéis incompletos, abaixo dos tubérculos dorsais. Fêmeas com 205 a 255
micrômetros de comprimento e 36 a 52 micrômetros de diâmetro. Rostro curvado
com 24 micrômetros de comprimento. Escudo cefálico semicircular com linha
mediana quase reta, aos 3/4 posteriores, linhas admedianas completas, paralelas
até o ponto onde desaparece a linha mediana, tornando-se ligeiramente
divergente até à região posterior. Primeira linha submediana originando-se na
margem anterior, de início subparalela à admediana e depois abruptamente
curvada para fora, terminando em posição lateral ao tubérculo dorsal.
Tubérculos dorsais afastados, com cerdas divergentes. Escudo, lateralmente, com
anéis incompletos, abaixo dos tubérculos dorsais (Figura_1).
A disseminação do A. guerreronis é feita pelo vento, que o leva a grandes
distâncias. Entretanto, o principal veículo de disseminação é o próprio homem
em suas atividades agrícolas, através das mudas ou sementes (coco) infestadas.
Nas plantas jovens, até o primeiro ano, a presença de A. guerreronis é
denunciada pelo aparecimento de leve clorose nas folhas centrais.
Posteriormente, há um escurecimento do tecido, pela formação de lesões que se
desenvolvem no sentido longitudinal da nervura. Em seguida, as lesões invadem
todo o limbo foliar e aparece, então, a necrose total das folhas mais novas e
morte do broto terminal. Essa sintomatologia é típica.
Surgem geralmente novas brotações que também são atacadas, culminando com a
morte da planta.
A necrose do "olho" do coqueiro, causada pelo ácaro, verifica-se em
sementeira e em plantio definitivo de até dois anos de idade. Depois, a planta
ganha resistência e fica parcialmente livre da praga.
Nos frutos, a presença do ácaro pode ser notada pelas estrias ou necroses
longitudinais partindo do perianto do coco (Figura_1).
Os danos são produzidos pela introdução dos estiletes quelicerais que servem
para romper o tecido da planta, a fim de provocar estravasamento de suco
celular para sua alimentação. Assim, na maioria dos casos, o prejuízo é o
resultado da ação mecânica das quelíceras.
A reprodução dá-se por oviparidade. Os ovos são grandes em relação ao tamanho
da fêmea. No entanto, especula-se que pode haver partenogênese, podendo um só
exemplar formar grandes colônias (Cabrera,1991). Em todos os estádios de seu
desenvolvimento, vive em colônias densas, sob as peças florais do pequeno
fruto.
Durante a ontogenia, os Eriophyidae passam pelo estádio de ovo, dois estádios
ninfais e adulto. Seu ciclo biológico é simples: do ovo eclode a forma jovem
que é designada de ninfa, apresentando quatro pernas semelhantes às do adulto.
Ocorrem dois estádios ninfais, havendo em seguida um período de repouso,
chamado pseudopupa, durante o qual se forma a genitália. Finalmente, atinge o
estádio adulto.
Há dimorfismo sexual e distingue-se pela presença da genitália da fêmea,
localizada atrás das coxas do segundo par de pernas.
Segundo Sternlicht & Goldenberg (1971), os machos têm papel na fecundação.
Nos Eriophyidae estudados, ela ocorre da seguinte maneira: o macho solta o
espermatóforo sobre a superfície vegetal, no local onde vive. A fêmea, ao
passar pelo espermatóforo apanha-o com a genitália. E fica, assim, fecundada,
para reprodução. Essa deve ser também a forma de fecundação do A. guerreronis.
Os fatores climáticos, umidade, temperatura, ventos e chuva, são muito
importantes no desenvolvimento e proliferação dos ácaros.
A população de A. guerreronis, segundo as observações realizadas, atinge o pico
no fim da estação seca e início da chuvosa. A estação chuvosa prolongada, com
elevado índice de precipitação, constitui-se em barreira para a atuação do
eriofiídeo nas plantas novas. Nessa época, as populações ficam reduzidas,
chegando, às vezes, a desaparecer. Os ventos são um dos mais importantes
fatores ligados à dinâmica da população.
Quanto ao habitat, pode ser em diferentes partes do coqueiro. O tecido do
"olho" da planta nova constitui ambiente ideal à proliferação,
oferecendo alimento e proteção ao ácaro; não obstante, já foi constatada sua
presença em cocos novos, desenvolvidos e nas inflorescências.
O ataque do A. guerreronis, nas plantas novas, verifica-se por todo o período
de verão (estação seca). Durante o inverno (estação chuvosa), o ácaro tende a
desaparecer das mudas de coqueiros. Nas plantas onde havia sido constatada
anteriormente alta infestação de eriofídeos, no período das chuvas, eles quase
não são encontrados; entretanto, na estação das águas, eles são observados nos
cocos pequenos e grandes.
Esse ácaro foi registrado em Cocos nucifera, em diversos países. No Brasil, foi
recentemente encontrado em Cocos weddelliana (Flechtmann, 1989).
Essa espécie desenvolve-se sob as brácteas dos cocos novos, sugando a seiva da
epiderme e causando cloroses (manchas claras) no fruto. As cloroses têm,
inicialmente, um formato triangular, com a base do triângulo nas brácteas. À
medida que se desenvolvem, tornam-se marrons, juntam-se e vão aumentando de
tamanho, sempre em direção à extremidade final do fruto. Com o crescimento dos
frutos, a área lesada torna-se cada vez mais necrosada, com rachaduras
superficiais e longitudinais de cor marrom-escura e aspecto áspero (Figura_1).
A extensão da lesão no fruto varia de acordo com a intensidade do dano.
Muitas vezes, encontram-se pequenas formações de goma na superfície necrosada,
ocasionadas pela exsudação de seiva através das rachaduras. Observam-se danos
de ácaros, tanto em frutos que caem prematuramente, como em frutos que
completam sua maturação, mesmo tendo grande parte de sua superfície necrosada.
Em casos de fortes ataques, os frutos chegam a se deformar, perdem peso e, às
vezes, caem sem completar o amadurecimento.
No Brasil, esse ácaro, além de afetar os frutos (Robbs & Peracchi, 1965;
Flechtmann, 1979; Ferreira, 1987) causa também necrose do broto ou gema
terminal e conseqüente deformação ou morte de plantas jovens.
Vários pesquisadores, em todo o mundo, têm investigado medidas de controle com
produtos sistêmicos (quinomethionate, monocrotophos, dicrotophos, vamidothion),
para combater o ataque de A. guerreronisem frutos (Mariau & Tchibozo, 1973;
Moore & Alexander, 1987; Cabrera, 1991). Apesar de eficiente, o controle
químico tem-se mostrado muito difícil, pois os ácaros estão bem protegidos sob
as peças florais e sua elevada taxa de reprodução propicia a possibilidade de
infestações permanentes. Assim que as aplicações são suspensas, ocorre sempre
grande incremento nos danos. Os intervalos dos tratamentos são curtos, o que
eleva o seu custo. Além desses problemas, os produtos sistêmicos deixam
resíduos nos frutos, poluem o ambiente, e aplicações contínuas podem induzir
resistência aos ácaros, tornando os produtos ineficazes (Mariau, 1977).
O objetivo do presente trabalho foi avaliar a eficiência e praticabilidade
agronômica de acaricidas isolados e em mistura no controle de A. guerreronis na
cultura do coqueiro-anão verde irrigada.
MATERIAL E MÉTODOS
A cultura utilizada foi coqueiro variedade anão verde irrigado por infiltração
em sulcos com 9 anos de idade, plantado com espaçamento de 8 m entre linhas por
6 m entre plantas, totalizando 208 plantas por hectare, cultivado sobre
latossolo de textura média.
A pesquisa foi conduzida no Lote nº 378 do Perímetro Irrigado Curaçá, no
município de Juazeiro - BA, pertencente ao Sr. Luiz Augusto Gonçalves Ferreira.
O trabalho foi instalado em 25 de agosto de 1999, sendo conduzido até o dia 25
de novembro de 1999, data da última avaliação. Iniciaram-se os tratamentos
quando a cultura se encontrava na fase de pós-colheita de frutos maduros,
apresentando também cachos nas fases de floração e frutos com aproximadamente
30 dias de desenvolvimento. No período de condução da pesquisa, foram efetuadas
3 aplicações com intervalo de 30 dias, sendo a 1ª em 25-08, a 2ª em 25-09 e a
3ª em 25-10-1999.
O delineamento foi em blocos casualizados, com 9 tratamentos e 3 repetições. A
parcela foi constituída por 2 plantas, ocupando uma área total de 12 m de
comprimento por 8 m de largura, que corresponde a 96 m2.
Os tratamentos foram aplicados com pulverizador costal-manual, equipado com
regulador de pressão de 40 libras e bico leque 110.02, em jato direcionado para
as flores e frutos, utilizando-se 3 litros de calda por planta, num total de
625 litros de calda por hectare.
As avaliações foram efetuadas 30 dias após as aplicações, constando de
levantamento sob microscópio estereoscópico, da presença e registro do número
de ácaros em amostras de 03 frutos / planta, portanto, 06 frutos / parcela, o
que totalizou 18 frutos / tratamento por semana. Os ácaros foram detectados e
avaliados na parte inferior interna das brácteas que protegem o pecíolo do
fruto. Os seis frutos avaliados por parcela foram colhidos ao acaso, sendo dois
deles com 30 dias, dois com 60 dias e dois com mais de 60 dias de idade. Foram
efetuadas 4 avaliações.
RESULTADOS E DISCUSSÃO
A infestação na área em que foi instalado o experimento, era muito elevada,
pois, em sete dos nove tratamentos, 100% dos frutos estavam danificados,
conforme se observa nos dados da avaliação prévia (Tabela_1). O tratamento
hexythiazox (Savey PM) mais fenpyroximate (Ortus 50 SC) apresentou maior
eficiência, passando de um total de frutos infestados para 100% de frutos
livres de ácaros (Tabela_2). O hexythiazox (Savey PM) associado ao abamectin
(Vertimec 18 CE) apresentou 96% de eficiência de controle, sendo seguido pelo
tratamento hexythiazox (Savey PM) mais enxofre (Defende) com 86% de eficiência,
dentre os tratamentos em que foram utilizadas associações do hexythiazox (Savey
PM) com produtos adulticidas.
O produto hexythiazox (Savey PM) apresenta, segundo testes preliminares em
laboratório, excelente efeito ovicida, bem como controle sobre as formas jovens
dos ácaros. Porém, sobre os adultos, o seu efeito restringe-se a provocar a
esterilização das fêmeas. Portanto, na maioria dos tratamentos, procurou-se
associá-lo a um princípio ativo com ação adulticida. A descrição detalhada dos
tratamentos utilizados na presente pesquisa encontra-se na Tabela_3.
Em função dos resultados obtidos na presente pesquisa, pode-se concluir que o
produto hexythiazox (Savey PM), na dose de 3 g / 100 l de água, associado
individualmente aos produtos adulticidas: fenpyroximate (Ortus 50 SC), na dose
de 100 ml para 100 de água (100 % de eficiência); ao abamectin (Vertimec 18
CE), na dose de 30 ml / 100 l de água (96 % de eficiência); e ao enxofre
(Defende), na dose de 500 g / 100 l de água (86,3 % de eficiência). Estes foram
os tratamentos mais eficientes no controle do ácaro da necrose do coqueiro
Aceria guerreronisquando aplicados em coqueiro-anão verde, no Vale do São
Francisco, a partir da abertura da inflorescência e comparados com carbosulfan
(Marshal 200 SC), na dose de 50 ml / 100 l de água (77 % de eficiência) e não
produziram efeitos fitotóxicos à cultura. O hexythiazox (Savey PM), quando
aplicado individualmente na dose de 3 g / 100 l de água, apresentou 94,3 % de
eficiência de controle; porém, na nossa opinião, deve ser recomendada a sua
aplicação sempre associado a um produto adulticida para evitar o surgimento de
indivíduos resistentes (Omoto & Guedes, 2000) e a reinfestação através de
adultos oriundos de culturas próximas.