Enraizamento ex vitro e aclimatização do porta-enxerto de macieira marubakaido
micropropagado
INTRODUÇÃO
A cultura da macieira ocupa uma posição de destaque na economia do Estado de
Santa Catarina, que é responsável por 60 % da maçã produzida no Brasil (ICEPA,
2000). A grande quantidade de mudas é produzida através de porta-enxertos
produzidos pelo sistema de mergulhia de cepa. Esta técnica, no entanto, pode
apresentar problemas ligados à transmissão de pragas e doenças.
A micropropagação é uma das técnicas que possibilita a produção em massa de
genótipos superiores livres de pragas (Zimmermann e Fordham, 1985).Através
dela, alguns protocolos regenerativos foram estabelecidos para vários porta-
enxertos de macieira por Bolar et al. (1998) e Harbage et al. (1998). Apesar
dos avanços nos protocolos, poucos trabalhos foram realizados no sentido de
elucidar problemas ligados ao enraizamento e à aclimatização (Avanzato e
Cherubini, 1993). Para Ziv (1995), o enraizamento e a aclimatização podem
comprometer o processo de micropropagação por envolverem a neoformação de um
sistema radicular e a passagem para condições ex vitro. Quando transferidas
para condições ex vitro, as mudas normalmente apresentam altas taxas de
transpiração, em função da alta condutividade hidráulica de suas folhas
(Brainerd e Fuchigami, 1981), o que, na maioria das situações, provoca elevado
déficit hídrico, podendo provocar a morte das mudas (Díaz-Pérez et al., 1995).
A indução ao enraizamento pode ser realizada in vitro, em meios com maior
porosidade (Jay-Allemand et al., 1992), ou ex vitro, em substratos porosos
(Pedrotti e Voltolini, 1997). Em substratos porosos, a planta produz maior
número de raízes secundárias, possibilitando um maior suprimento de água e
nutrientes para a planta (McClelland et al., 1990). Para a utilização
comercial, o sistema de micropropagação deve possibilitar altas taxas de
proliferação, enraizamento, aclimatização, sobrevivência e crescimento inicial
das mudas em casa de vegetação (Lê e Collet, 1991; Ziv, 1995).
O objetivo deste trabalho foi avaliar o efeito de dois substratos e de cinco
combinações de períodos de exposição das microestacas em sala de aclimatização
e em câmara de nebulização sobre o enraizamento e sobrevivência do porta-
enxerto de macieira Marubakaido, enraizado ex vitro.
MATERIAL E MÉTODOS
O trabalho foi conduzido no Laboratório de Morfogênese Vegetal do Departamento
de Fitotecnia da Universidade Federal de Santa Catarina. O porta-enxerto de
macieira Marubakaido (Malus prunifolia) foi mantido in vitro através de
repicagens sucessivas, a cada 45 dias, em meio MS (Murashige e Skoog, 1962), em
sala de crescimento com temperatura de 27±2ºC, fotoperíodo de 16h de luz, com
intensidade luminosa de 30 mmol.m-2.s-1, conforme metodologia utilizada por
Nunes et al. (1999).
Para a indução ao enraizamento, foram usadas microestacas com 4 cm de altura e
4 folhas. A indução foi realizada ex vitro, submergindo 1,0 cm da base de cada
microestaca em solução de ácido indolbutírico (AIB) (Sygma), na concentração de
1 g.L-1, durante 10 segundos. Posteriormente, elas foram transplantadas para
bandejas com alvéolos de 50 mL de capacidade, contendo um dos seguintes
substratos: 1- Terra Roxa Estruturada e Casca de Arroz Carbonizada (TRE:CAC); e
2- Terra Roxa Estruturada e Vermicomposto de esterco bovino (TRE:V), ambos na
proporção 1:1(v:v).
As bandejas foram colocadas em caixas plásticas cobertas com uma placa de vidro
transparente, conforme metodologia utilizada por Pedrotti e Voltolini (1997).
Esta condição permitiu a manutenção da umidade relativa em 100%. As bandejas
foram transferidas para sala de aclimatização com temperatura de 27±2ºC,
intensidade luminosa de 30 mmol.m-2.s -1 e fotoperíodo de 16h de luz, onde
permaneceram durante 10; 15; 20 ou 30 dias, sendo que, num dos tratamentos, as
bandejas foram transferidas diretamente para a câmara de nebulização. Após cada
período de permanência na sala de aclimatização, as mudas foram transferidas
para a câmara de nebulização, onde permaneceram até que cada tratamento
completasse 30 dias, a partir da indução ao enraizamento.
Após o período de 30 dias, as mudas foram avaliadas nos seguintes parâmetros:
a) porcentagem de enraizamento; b) número de raízes; c) comprimento médio das
raízes; d) biomassa seca das raízes; e) número de folhas; e f) altura média da
parte aérea. Após a avaliação, as raízes foram podadas a 1cm da base das
microestacas, e as mudas foram imediatamente transferidas para bandejas com
alvéolos de 100 mL de capacidade, sem alteração da composição dos substratos.
As bandejas permaneceram mais 10 dias na câmara de nebulização, sendo então
transferidas para casa de vegetação. Depois de 60 dias de cultivo em casa de
vegetação, foram avaliados a sobrevivência das mudas, o número de folhas e a
altura da parte aérea, e aos 90 dias, foram avaliados os mesmos parâmetros que
haviam sido avaliados aos 30 dias.
O delineamento experimental utilizado foi um bifatorial e um trifatorial, com 4
repetições e 10 mudas por repetição. A análise dos dados foi efetuada segundo
Sokal & Rohlf (1995), através do programa de computador STATGRAFICS. Quando
foram detectados efeitos significativos, a comparação de médias foi realizada
pelo teste de SNK, a 5% de probabilidade.
RESULTADOS E DISCUSSÃO
Enraizamento - As altas percentagens de enraizamento obtidas em mudas tratadas
com AIB e posteriormente transferidas para o substrato TRE:CAC (Tabela_1)
indicam que esta metodologia é adequada para a indução de raízes neste porta-
enxerto e confirmam a hipótese de Lê e Collet (1991), segundo a qual, o tempo
necessário para a indução de raízes pode ser pequeno, dependendo da condição
fisiológica do genótipo utilizado. Provavelmente, as condições fisiológicas
deste porta-enxerto, aliadas às condições experimentais utilizadas, favoreceram
a indução de raízes, como foi observado por Lane e McDougald (1982) em outros
porta-enxertos de macieira. Além disto, o tipo, a concentração e o tempo de
exposição à auxina, utilizados neste trabalho, não induziram à formação de
calos.
Aos 30 dias após a transferência ex vitro, a percentagem de enraizamento foi
maior nas mudas que foram aclimatadas no substrato TRE:CAC (Tabela_1),
provavelmente devido às suas características físicas, já que a casca de arroz
carbonizada aumenta o espaço poroso, como foi observado por Lê e Collet (1991)
e por Avanzato e Cherubini (1993). O substrato TRE:V apresenta menor porosidade
e maior retenção de água, o que certamente diminui o espaço de aeração e, por
conseguinte, a percentagem de enraizamento. No substrato TRE:CAC, as raízes
mostraram uma tendência em aumentar seu comprimento (Tabela_1). Este substrato
contém menos nutrientes do que o TRE:V, visto que a casca de arroz contribuiu
menos do que o vermicomposto de esterco de bovinos no aporte de nutrientes aos
substratos utilizados. Esses resultados são semelhantes aos obtidos por Lê e
Collet (1991), que observaram maior comprimento das raízes em substratos com
menores teores de nutrientes. Provavelmente, esta condição obriga a planta a
mudar sua estratégia e deslocar maiores quantidades de carboidratos para o
crescimento das raízes, a fim de garantir um maior suprimento de água e
nutrientes. Díaz-Pérez et al. (1995) também obtiveram raízes maiores e com
maior número de raízes secundárias quando utilizaram substratos porosos, pois
estes possibilitam maior exploração de água e nutrientes. Neste sentido,
Wraigth e Wraight (1998) salientam que a porosidade, a capacidade de retenção
de água e o fornecimento de nutrientes, além da aeração, determinam a
arquitetura do sistema radicular, o crescimento da planta e sua adaptação às
condições mesológicas.
As raízes retomaram o crescimento após a poda radicular realizada aos 30 dias.
Isto ocorreu a partir da emissão de raízes laterais, o que garantiu a
sobrevivência das mudas segundo o substrato e o tempo de permanência nos dois
ambientes (Tabela_2). A retomada de crescimento das raízes, observada neste
trabalho, confirma as observações de Gribaudo et al. (1995), segundo os quais,
os danos são os responsáveis pela morte das raízes e não sua transferência para
a casa de vegetação, como foi preconizado por McClelland et al. (1990).
Aclimatização - As altas percentagens de enraizamento, que coincidem com as de
sobrevivência, pois todas as plantas que enraizaram, sobreviveram, e as de
crescimento das mudas (Tabelas_1 e 2) sugerem que a umidade relativa nos
ambientes estudados garantiu as condições adequadas para a aclimatização e
retomada de crescimento após a aclimatização das mudas. Esta hipótese é
corroborada por Campostrini e Otoni (1996), pois plântulas produzidas in vitro
não estão adaptadas ao novo ambiente, pois não possuem mecanismos de proteção
contra a desidratação, já que seus estômatos geralmente se encontram abertos
(Schackel et al., 1990). No entanto, segundo Pospíslová et al.(1997) e Bolar et
al. (1998), durante a aclimatização, as mudas ativam os mecanismos que permitem
sua sobrevivência após a transferência para a casa de vegetação. Possivelmente,
as condições de aclimatização utilizadas neste trabalho possibilitaram a
sobrevivência da planta até a entrada em funcionamento dos estômatos, o que
permitiu um maior controle sobre as perdas de água, o que está de acordo com
Sutter (1988).
CONCLUSÃO
O enraizamento ex vitro do porta-enxerto de macieira em substrato composto por
Terra Roxa Estruturada e Casca de Arroz Carbonizada, simultâneo com a
aclimatização, mostrou-se eficiente comparado com o enraizamento in vitro. Os
resultados obtidos revelaram que as mudas podem ser repicadas para o substrato
contendo casca de arroz carbonizada, serem transferidas por um período de 20
dias na sala de aclimatização e mais 10 dias na câmara de nebulização, antes de
serem colocadas em casa de vegetação. Nestas condições, é possível reduzir o
tempo e os custos de produção de mudas micropropagadas, pois não são
necessários meios de cultura e instalações de laboratório para a indução ao
enraizamento, podendo viabilizar economicamente o uso comercial desta
tecnologia.