Polpa congelada de acerola: efeito da temperatura sobre os teores de
antocianinas e flavonóis totais
Polpa congelada de acerola: efeito da temperatura sobre os teores de
antocianinas e flavonóis totais1INTRODUÇÃO
No reino vegetal, as antocianinas são pigmentos responsáveis por uma variedade
de cores que variam do vermelho vivo ao violeta e azul e os flavonóis são
pigmentos de cores branca ou amarela clara. Quimicamente, esses pigmentos são
compostos fenólicos pertencentes ao grupo dos flavonóides (Bobbio & Bobbio,
1995). Os flavonóis são importante por atuarem na copigmentação das
antocianinas através de mecanismo de complexação intermolecular, tornando mais
estável a molécula antociânica. Dentre os compostos que exibem esta ação, os
flavonóis são os mais eficazes (Malien-Aubert et al., 2001). A cor vermelha da
acerola, no estádio maduro, decorre da presença de antocianinas. Silva et al.
(1998) citam a malvidina, pelargonidina e cianidina como as principais
antocianidinas presentes em acerola.
As antocianinas, pigmentos muito instáveis, podem ser degradadas durante o
processamento e a estocagem de alimentos com conseqüente alteração da cor. O
congelamento, um dos principais métodos de conservação de frutos, bastante
utilizado na conservação da acerola, descaracteriza completamente a coloração
natural do fruto (Alves et al., 1997). Em suco de acerola pasteurizado, também
ocorre modificação em sua coloração, que passa de vermelho-brilhante a amarela
(Conceição,1997). Este trabalho teve como objetivo averiguar o comportamento
dos teores de antocianinas e flavonóis totais em polpa de acerola armazenada
sob congelamento.
MATERIAL E MÉTODOS
Acerolas provenientes de dois plantios (seleção conhecida (Barbados) e não
conhecida), foram colhidas de uma única planta de cada seleção, no estádio de
maturação maduro, com coloração vermelha uniforme. Os frutos (2 kg de cada
seleção) foram transportados para o Laboratório de Análises Físico-químicas e
Sensorial de Alimentos do Departamento de Ciências Domésticas/UFRPE e
imediatamente transformados em polpa, utilizando centrífuga doméstica, que foi
acondicionada em potes plástico e armazenada sob congelamento (-18ºC), em
"freezer" doméstico, durante 6 meses. A polpa da seleção conhecida constituiu o
ensaio I, enquanto a da seleção não conhecida o ensaio II. O experimento foi
instalado seguindo um delineamento inteiramente casualizado, em esquema
fatorial 2 x 6de (tipo de seleção x tempo de armazenamento). A intervalos de 30
dias, unidades experimentais de 30g foram coletadas ao acaso e submetidas a
determinação quantitativa de antocianinas e flavonóis totais, utilizando o
método espectrofotométrico descrito por Lees & Francis (1972). Estas
determinações foram efetuadas em triplicata e os resultados submetidos a
Análise de Variância e Teste de Tukey, ao nível de 5%, utilizando o programa
estatístico "Minitab-10 for Windows".
RESULTADOS E DISCUSSÃO
Os teores iniciais de antocianinas totais dos ensaios I e II (26,23 e 14,11
mg.100g-1, respectivamente) apresentados na Tabela_1, encontram-se na faixa dos
teores deste pigmento, relatados por Paiva et al. (1999), para diferentes
seleções de acerola (1,97 a 46,44 mg.100g -1 ). Embora o teor inicial de
antocianinas totais da polpa do ensaio I tenha sido maior do que o do ensaio
II, observou-se que, nos dois ensaios, a variação desses teores apresentou
comportamento semelhante durante o período de estocagem. Ao comparar os valores
encontrados no tempo inicial e final de armazenamento, evidenciou-se uma
redução nos teores de antocianinas totais da ordem de 4,30% para o ensaio I e
de 3,76% para o ensaio II.
Outros autores também detectaram redução dos pigmentos antociânicos em produtos
de acerola. Matsuura (1994), determinou valores de 136,3 a 147,6 de
antocianinas, expressos em mg.L-1 (malvidina 5-G), em suco integral concentrado
de acerola congelado (-18º C) armazenado por 180 dias. Ao final do período de
estocagem a redução no teor desses pigmentos foi da ordem de 2,79%. Silva et
al. (1999), ao armazenarem polpa de acerola sob congelamento por seis meses,
sem tratamento térmico, evidenciaram um percentual de redução bem mais elevado,
da ordem de 21,74%.
Os teores de flavonóis, no tempo zero de armazenamento, foram de 72 e 10,54 mg
de quercetina.100 g -1 para os ensaios I e II, respectivamente, sendo portanto
inferiores aos das antocianinas (Tabela_1). Estes resultados também foram
constatados por Vendramini e Trugo (2000), em acerolas das variedades "Flor
Branca" e "Okinawa", cujos teores de antocianinas totais foram de 14,90 e 12,41
mg.100g -1 e de flavonóis totais de 11,02 e 8,82 mg de quercetina.100g -1,
respectivamente. Ao final do experimento, foi evidenciada uma redução nos
teores destes fitoquímicos da ordem de 13,44% para o ensaio I e 14,90% para o
ensaio II.
No congelamento, as reações metabólicas são reduzidas, porém não totalmente
inibidas (Cheftel et al., 1983). As variações nos teores de antocianinas e
flavonóis totais detectadas ao longo do período de armazenamento poderiam ser
justificadas pela interconversão das quatro formas estruturais de antocianinas
(base quinoidal, cátion flavilium, pseudobase ou carbinol e chalcona) que, em
solução aquosa ácida, se encontram em equilíbrio (Mazza & Brouillard,
1987). Por outro lado, a degradação desses pigmentos pode também ter sido
favorecida por ação enzimática, tendo em vista que a polpa produzida não foi
submetida a nenhum tratamento térmico. Segundo Francis (1989), as glicosidases,
também denominadas de antocianidases, hidrolisam as antocianinas liberando os
açúcares e as antocianidinas as quais são mais instáveis do que as
antocianinas. As fenolases podem reagir com outros compostos fenólicos, a
exemplo dos flavonóis de forma mais pronunciada.
Quanto aos flavonóis, é possível que os teores mais elevados detectados em
alguns meses do período de armazenamento sejam decorrentes da maior
concentração de chalconas existentes na amostra. Estes compostos absorvem luz
entre a região de 365 e 390 nm (Harborne, 1984), que compreende o comprimento
de onda utilizado na quantificação dos flavonóis totais (374 nm).
Ao comparar os teores iniciais e finais de antocianinas, observa-se que a polpa
do ensaio II apresentou uma maior estabilidade, uma vez que os valores foram
estatisticamente iguais. O menor percentual de perda no teor de antocianinas na
polpa desse ensaio, possivelmente, se deve a complexação desse constituinte com
os flavonóis, tendo em vista que essa polpa, no tempo zero de armazenamento,
apresentou um percentual maior de flavonóis em relação ao teor de antocianinas
(74,70%) quando comparado ao da polpa do ensaio I (48,49%). A estabilidade das
antocianinas ao descoramento pode ocorrer através da co-pigmentação,
especialmente com os flavonóis. A associação entre as moléculas de antocianinas
e flavonóis exerce um ação protetora sobre as moléculas de antocianinas (Bobbio
& Bobbio, 1995). A formação deste complexo, ou seja, a co-pigmentação,
aumenta a intensidade da cor, sendo este efeito decorrente da concentração de
antocianinas e do co-pigmento (Timberlake, 1980). Shrinkhande & Francis
(1974), estudando o efeito de flavonóis sobre a estabilidade do ácido ascórbico
e das antocianinas em sistema modelo, verificaram que a presença de flavonóis
reduziu tanto a oxidação do ácido ascórbico como também a degradação das
antocianinas.
CONCLUSÕES
O congelamento promoveu redução nos teores de antocianinas e flavonóis totais
das polpas de acerola dos dois ensaios; entretanto, em função do maior teor de
flavonóis presente na polpa de acerola de seleções não identificadas, o
pigmento antociânico apresentou maior estabilidade.
AGRADECIMENTO
À Profª. Rosimar dos Santos Musse, do Departamento de Agronomia da UFRPE, pelo
fornecimento das acerolas da seleção conhecida.