Diversidade genética entre genótipos comerciais de maracujazeiro-amarelo
(Passiflora edulis f. flavicarpa) e entre espécies de passifloras nativas
determinada por marcadores rapd
GENÉTICA E MELHORAMENTO DE PLANTAS
Diversidade genética entre genótipos comerciais de maracujazeiro-amarelo
(Passiflora edulis f. flavicarpa) e entre espécies de passifloras nativas
determinada por marcadores rapd1
Genetic diversity among yellow passion fruit commercial genotypes and among
passiflora species using rapd
Alexandre Pio VianaI; Telma Nair Santana PereiraI; Messias Gonzaga PereiraI;
Margarete Magalhães de SouzaII; José Francisco Martinez MaldonadoIII; Antônio
Teixeira do Amaral JúniorI
IProfessor Associado do Laboratório de Melhoramento Genético Vegetal -
Universidade Estadual do Norte Fluminense-Campos dos Goytacazes-RJ-Cep: 28015-
620 -pirapora@uenf.br
IIDoutora em Produção Vegetal do Laboratório de Melhoramento Genético Vegetal -
Universidade Estadual do Norte Fluminense-Campos dos Goytacazes-RJ-Cep: 28015-
620
IIIPesquisador da Empresa de Pesquisa Agropecuária do Estado do Rio de Janeiro
- PESAGRO-Macaé - RJ-Estrada Velha do Glicério- km 03, CX 119-371-Cep: 27901-
970
INTRODUÇÃO
As famílias das Passifloraceae apresentam um número expressivo de espécies,
sendo o gênero Passiflora constituído por cerca de 530 espécies tropicais e
subtropicais, das quais 150 são nativas do Brasil e cerca de 60 podem ser
utilizadas na alimentação humana (Oliveira et al., 1994). O maracujá-amarelo
(Passiflora edulis f. flavicarpa Deg.) e o maracujá roxo (Passiflora edulis)
são as principais espécies cultivadas do gênero, sendo que a diferença entre as
duas reside principalmente na coloração do fruto, sabor, características
foliares e resistência às doenças (Martin & Nakasone, 1970). As principais
espécies do gênero são diplóides (2n=2x=18 cromossomos), alógamas e auto-
incompatíveis (Martin & Nakasone, 1970).
A pesquisa sobre esta espécie é incipiente e a grande maioria refere-se ao
manejo da cultura. Estudos de melhoramento genético normalmente visam ao
desenvolvimento de materiais superiores com relação, principalmente, aos
caracteres de interesse agronômico e tendem a utilizar a hibridação intra-
específica para a transferência de genes de interesse (Bruckner, 1997). A
hibridação interespecífica é também utilizada especialmente em programas que
visam à transferência de genes de resistência a determinadas doenças
encontradas nas espécies silvestres para a cultivada (Bruckner, 1997).
Entretanto, tanto para o melhoramento intraespecífico quanto para o
interespecífico, é necessário o conhecimento da variabilidade genética presente
nas populações base.
Por se tratar de uma espécie semiperene, o estudo de diversidade genética em
Passiflora spp. demanda tempo neste aspecto. Neste caso, o uso de marcadores
moleculares é altamente viável, por permitir um rápido estudo da variabilidade
presente (Stephen et al., 1997).
Alguns trabalhos foram conduzidos na caracterização de diversidade genética no
gênero Passiflora, utilizando marcadores RAPD (Cassiano et al., 1998; Fajardo
et al., 1998; Vieira et al., 1997).
Este trabalho teve como objetivo o estudo da diversidade genética entre
genótipos de maracujazeiro amarelo e entre a espécie cultivada e algumas
espécies silvestres, como forma de verificar as suas potencialidades para fins
de melhoramento genético.
MATERIAL E MÉTODOS
Material genético
No estudo da variabilidade dentro da espécie cultivada utilizou-se um total de
21 genótipos, coletados em populações comerciais de maracujá-amarelo na região
Norte e Noroeste do Estado do Rio de Janeiro, e então propagados via estaquia e
cultivados no campo, utilizando-se os tratos culturais recomendados por
Carvalho (1998).
Para o estudo da variabilidade interespecífica, utilizou-se as espécies
descritas na Tabela_01, cultivadas em casa de vegetação.
Caracterização molecular via RAPD
A análise da divergência genética entre os genótipos foi feita com base na
caracterização molecular, utilizando-se a técnica RAPD (Randomly Amplified
Polymorphic DNA).
As folhas foram coletadas em plantas individuais, tomadas ao acaso, amostrando-
se cinco plantas de cada genótipo. A extração do DNA total foi efetuada
conforme descrito por Fajardo et al. (1998), com algumas modificações. Para
quantificar o DNA foi retirada uma amostra da solução de extração, e após
diluição na proporção de 2ml/ml, foi realizada a leitura em fluorômetro. Após o
isolamento e quantificação do DNA, foi procedida a amplificação em
termociclador que foi realizada conforme preconizado por Willians et al. (1990)
com modificações, e em seguida as etapas de eletroforese em gel de agarose,
coloração e descoloração com brometo de etídio e visualização e arquivo de
bandas com auxílio do "EAGLE EYE".
Seleção de iniciadores
A seleção de iniciadores realizou-se com três genótipos distintos: Passiflora
edulis f. flavicarpa, Passiflora alata, Passiflora maliformis, de forma prévia,
sendo testados 100 iniciadores da série OPERON Technologies, formando os
seguintes grupos: OPAA 01-20, OPAB 01-20, OPAC 01-20, OPAD 01-20, OPAE 01-20.
Análise dos dados
Foi realizada a análise de agrupamento entre os genótipos, adotando-se
ocomplemento do índice de Jaccard. Foi, também, empregado o método de
agrupamento hierárquico de Ward com base na matriz de distâncias genéticas
obtida do complemento do índice de Jaccard, sendo que os genótipos foram
divididos em dois grupos: um grupo com as populações de maracujá amarelo e um
segundo grupo com as espécies silvestres mais um genótipo médio. Esse genótipo
médio representou os indivíduos de maracujá amarelo e foi obtido por meio da
análise dos padrões de banda dos 21 genótipos de maracujá amarelo, sendo
adotado o seguinte critério: quando a freqüência de presença de bandas foi
maior ou igual a 0,5, recebeu 1 na matriz de dados binários, e quando a
freqüência de bandas foi menor do que 0,5, atribuiu-se 0 na matriz binária. As
análises estatísticas foram realizadas por meio do Programa GENES (Cruz, 2001).
RESULTADOS E DISCUSSÃO
Ensaio de RAPD
Com base nos resultados de polimorfismo, encontrou-se 63 iniciadores com algum
polimorfismo (2-5 bandas) e 36 iniciadores com elevado polimorfismo (8-12
bandas), sendo que, para o estudo de diversidade, foram utilizados os 36
iniciadores com maior potencial. Os resultados foram reproduzidos por duas
vezes utilizando-se os mesmos iniciadores.
Na diversidade interespecífica foi verificado elevado polimorfismo nos
genótipos estudados, uma vez que o ensaio constou de materiais bem divergentes,
visto que contou com várias espécies de maracujazeiro. Dos trinta e seis
iniciadores utilizados, todos apresentaram bandas polimórficas, com média de
4,4 bandas por iniciador. Dos iniciadores utilizados, 22 (68,75%) apresentaram
quatro ou mais bandas. Do total de iniciadores, 31,25% apresentaram mais de
cinco bandas por iniciador. Do total dos iniciadores, 37,5% apresentaram entre
3 e 4 bandas e apenas dois (OPAC-08 e OPAC-10) apresentaram duas bandas.
Dos iniciadores com maior potencial para utilização em análise de marcadores
RAPD no maracujazeiro, podem ser citados: OPAC-15, OPAC-20, OPAD-01, OPAD-11,
OPAD-14, OPAD-16, OPAD-19, OPAE-01, OPAE-08, OPAE-09, OPAE-10, OPAE-14, OPAE-18
e OPAE-19, os quais apresentaram pelo menos cinco ou mais bandas polimórficas.
Fajardo et al. (1998), trabalhando com espécies de Passiflora, utilizaram 50
iniciadores em 52 genótipos, que propiciaram um elevado polimorfismo entre as
espécies e genótipos avaliados, gerando um total de 626 fragmentos
polimórficos.
No estudo intra-específico pela análise de bandas no gel de agarose, observou-
se baixo polimorfismo entre os indivíduos das populações de maracujá amarelo.
Para os vinte e um genótipos, e, em todos os iniciadores utilizados, a
amplificação foi muito semelhante (fenótipo eletroforético), tendo todos, um
padrão de bandas semelhante e consistente. Esse tipo de resultado sugere que a
grande variação morfológica observada em plantios comerciais de maracujá
amarelo podem estar tendo uma grande influência ambiental.
Análise de Divergência Genética
No estudo intra-específico observou-se a formação de três grandes grupos
(Figura_1) utilizando o método de agrupamento hierárquico de Ward. O grupo I
conteve os genótipos 1, 3, 10, 11, 6 e 8, sendo observado subgrupos onde
ficaram alocados os genótipos 1 e 3, 10 e 11 e 6 e 8. Todos esses genótipos
foram coletados em São Francisco de Itabapoana e advêm de populações
desenvolvidas para cultivo em condições adversas, com utilização de baixo nível
tecnológico, sendo, dessa forma, em geral, pouco produtivos.
No grupo II, verificou-se a inclusão dos genótipos 5, 7, 12, 14, 16, 18 e 20,
reunindo portanto, genótipos coletados em São Francisco de Itabapoana, em
Itaperuna e em Campos dos Goytacazes, denotando tratarem-se de genomas
pertencentes a um mesmo grupo gênico. Quanto à produtividade, os indivíduos
coletados em Campos dos Goytacazes e em Itaperuna são, em sua maioria, de
melhor performance, dada às condições de cultivo. No primeiro caso, são
indivíduos que passaram por um processo de melhoramento genético, podendo,
dessa forma, apresentar um rendimento superior. No segundo caso, os indivíduos
coletados em Itaperuna provêm de seleções feitas por produtores e cultivados em
condições de bom nível de tecnologia, o que, de certa forma, favorece o
predomínio de indivíduos que apresentem um elevado rendimento para algumas
características. Por esta lógica, os genótipos 5 e 7, apesar de serem
originários de São Francisco do Itabapoana, podem ser considerados materiais
promissores já que estão agrupados junto com materiais submetidos a algum
processo de melhoramento. Para o terceiro grupo, verificou-se a alocação dos
genótipos 2, 4, 9, 13, 15, 17, 19 e 21. Nesse agrupamento há genótipos
coletados em São Francisco de Itabapoana (2 e 4), Itaperuna (13 e 15) e Campos
dos Goytacazes (17, 19 e 21), sendo que mais uma vez os genótipos de São
Francisco de Itabapoana formaram um subgrupo distinto dos demais, possivelmente
por seu frágil potencial produtivo.
No estudo interespecífico observou-se uma maior discriminação dos genótipos
(Figura_2). Nota-se que os grupos começam a ser formados com uma elevada
distância genética, o que caracteriza a expressiva diversidade existente entre
os genótipos estudados (Vanderplank, 1991). As espécies do subgênero Passiflora
foram divididas em dois grupos: o grupo I foi constituído pelo genótipo
representativo das populações de maracujazeiro amarelo e pelas espécies P.
malacophylla, P. maliformis, P. mucronata; o segundo agrupou as espécies P.
alata, P. cincinatta e P. edulis f. edulis. O terceiro grupo reuniu as espécies
P. foetida, P. suberosa e P. giberti que pertencem ao subgênero Dysomia,
Plectostemma e Passiflora, respectivamente (Vanderplank, 1991).
As duas espécies cultivadas, maracujá amarelo e roxo, foram agrupadas
separadamente, sugerindo a existência de considerável diversidade genética
entre as mesmas, contrariando a hipótese de que o maracujá amarelo seria uma
mutação do maracujá roxo ou um híbrido interespecífico natural entre o maracujá
roxo e P. ligularis (Vanderplank, 1991). Estudos cromossômicos têm mostrado que
apesar de haver um padrão consistente e característico para o gênero
Passiflora, é possível detectar diferenças significativas entre as diferentes
taxas analisadas; no caso das espécies cultivadas, maracujá roxo e amarelo, as
características físicas dos cromossomos permitiram a distinção entre as duas
(Mayeda, 1997).
Fajardo et al. (1998), utilizando marcadores RAPD, observaram uma grande
variação intraespecífica em P. ligularis e P. adenopoda, enquanto que em P.
edulis e P. maliformis houve pouca variação intraespecífica. Através desses
marcadores eles obtiveram resultados que diferiram das classificações baseadas
nos caracteres morfológicos, concluíram também que há uma elevada similaridade
genética dentro entre P. vitifolia, P. spinosa e P. coriacea e entre P. xrosea
e P. cumbalensis, P. pinnatitistipula e P. antioquiensis. Estes estudos servem
de base para futuro estabelecimento de estratégias de melhoramento em espécies
do gênero Passiflora.
Muschner et al. (1998) caracterizaram duas formas morfológicas de P. suberosa
(normal e roxa) através de seqüências ITS1 e ITS2 ('internal transcribed
spacers') do DNA ribossomal, sendo que os resultados revelaram a existência de
grande variabilidade dentro da própria espécie, sugerindo uma tendência de
agrupamento preferencial de indivíduos de uma mesma forma morfológica. Dos
indivíduos estudados, três da forma normal não se relacionaram com nenhum dos
grupos formados, não tendo sido detectados agrupamentos preferenciais por
origem geográfica.
Vieira et al. (1997), pesquisando a variabilidade intraespecífica em
Passifloras, via marcadores RAPD, encontraram bandas do tipo gênero-específicas
e espécie-específicas. Foi obtida a freqüência de locos polimórficos e estimada
a diversidade genética média com base em freqüências alélicas.
Cassiano et al. (1998) analisaram as espécies P. edulis, P. edulis f.
flavicarp, P. amethystina, P. caerulea, P. cincinnata, P. coccínea, P. serrato-
digitata, P. foetida, P. maliformis, P. alata, P. giberti, P. laurifólia, P.
macrocarpa, P. nítida, P. setacea, P. suberosa, P. ligularis, P. capsularis e
P. coriacea, através de marcadores tipo RAPD. Esses autores conseguiram
caracterizar as espécies e relacionar a similaridade entre as mesmas. Os
marcadores geraram informações sobre a diversidade genética e as relações
filogenéticas no germoplasma usado, além de confirmarem a possibilidade da
caracterização de híbridos.
A variabilidade é uma característica do gênero, considerando que algumas das
espécies são alógamas, auto-incompatíveis e se cruzam com facilidade. A
importância do estudo da variabilidade em Passiflora está em monitorar a
hibridação interespecífica, visando a introgressão de genes das espécies
silvestres para as cultivadas, além de definir quais as populações e espécies
que poderão ser utilizadas em programas de melhoramento no Norte Fluminense.
CONCLUSÕES
Os genótipos de maracujazeiro amarelo seguiram um padrão de divergência
consistente com o observado nos trabalhos de campo, mostrando a baixa
variabilidade existente entre os indivíduos estudados, indicando que, para um
programa de melhoramento com bons índices e ganhos satisfatórios, variabilidade
adicional deve ser introduzida nas populações de estudo. Para as espécies
estudadas, observou-se uma grande variabilidade, sendo que seu uso para
programas de melhoramento deve ser explorado, principalmente em hibridações
visando resistência às doenças da cultura.