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BrBRCVHe0004-28032006000100010

BrBRCVHe0004-28032006000100010

variedadeBr
Country of publicationBR
colégioLife Sciences
Great areaHealth Sciences
ISSN0004-2803
ano2006
Issue0001
Article number00010

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Relação entre o tamanho de hérnia hiatal e tempo de exposição ácida esofágica nas doenças do refluxo erosiva e não-erosiva ARTIGO ORIGINALORIGINAL ARTICLEINTRODUÇÃO A doença do refluxo gastroesofágico (DRGE) se manifesta por uma forma erosiva, uma não-erosiva ou por suas complicações, como estenose e esôfago de Barrett.

Sua fisiopatologia é multifatorial, apresentando uma combinação variável de mecanismos nos diferentes grupos de pacientes. Dentre as alterações descritas destaca-se a disfunção motora do esfíncter inferior, provavelmente associada à disfunção do estômago proximal, levando aos relaxamentos transitórios do esfíncter inferior, principal anormalidade encontrada em pacientes com doença do refluxo não-erosiva(18) A hérnia hiatal ressurgiu nos últimos anos como importante fator patogênico na DRGE, estando associada a maior exposição ácida esofagiana e sempre presente nas formas mais graves e complicadas da doença(7, 26). O mecanismo pelo qual a hérnia hiatal se associa à DRGE mais grave estaria relacionado a maior alteração na função esfincteriana (aumento dos relaxamentos transitórios do esfíncter inferior do esôfago (EIE)(23), à promoção do refluxo ácido(22) e, principalmente, à redução da depuração esofágica(15, 22) observadas sobretudo em hérnias volumosas e não redutíveis.

Embora freqüentemente associada à esofagite, a presença da hérnia hiatal não é condição sine qua non para o desenvolvimento da DRGE. Outros fatores como alterações motoras esofagianas, reflexo esôfago-salivar reduzido, sensibilidade esofagiana a ácido, refluxo não-ácido, retardo do esvaziamento gástrico, predisposição congênita, dentre outros, parecem estar envolvidos em graus variáveis na formação da doença não-erosiva.

O objetivo deste estudo foi avaliar se o tamanho da hérnia hiatal tem relação com a intensidade do refluxo em pacientes com a doença do refluxo erosiva (DRE) e doença do refluxo não-erosiva (DRNE).

PACIENTES E MÉTODOS Foram revistas as pHmetrias prolongadas anormais consecutivas de pacientes que realizaram o exame na investigação de queixa típica de DRGE (pirose como queixa principal). Todos haviam realizado endoscopia digestiva alta (EDA) e esofagomanometria (EMN) previamente. Considerou-se DRE ou DRNE baseado no achado ou não de esofagite à EDA.

Endoscopia digestiva alta Realizada de maneira habitual, após jejum de 6 horas, estudando-se seqüencialmente o esôfago, o estômago e o duodeno. A classificação de SAVARY- MILLER(21) foi adotada para caracterização macroscópica de esofagite. Para o diagnóstico endoscópico da hérnia hiatal, considerou-se elevação da linha Z de 2 cm ou mais acima do pinçamento diafragmático, sendo hérnia hiatal não- volumosa aquelas entre >2 e <5 cm e hérnia hiatal volumosa quando de tamanho >5 cm.

Esofagomanometria A esofagomanometria foi realizada para localização do limite superior do EIE, precedendo a pHmetria prolongada. Empregou-se equipamento computadorizado, cateter de 8 lumens, 4,5 mm de diâmetro, continuamente perfundido com água destilada a 0,6 mL/min por uma bomba pneumohidráulica de baixa complacência, técnica previamente descrita(12). O cateter foi passado por uma das narinas até o estômago. No estudo do EEI foi empregada a técnica da puxada lenta, com tração do cateter de 1 em 1 cm. O limite superior do EIE foi o valor em centímetros, imediatamente antes do padrão de registro do corpo esofagiano, quando o traçado é observado abaixo da linha de base intragástrica.

A hérnia hiatal foi identificada no estudo manométrico quando se obtinha o aspecto de "duplo esfíncter", sendo o primeiro atribuído à impressão diafragmática e o segundo ao esfíncter inferior, separadas por uma zona de platô correspondente ao saco herniário. Naqueles casos de hérnias hiatais volumosas e estômago intratorácico em que não se obtinha traçado intragástrico no início do exame, a linha de base intragástrica era arbitrariamente definida no traçado imediatamente anterior à zona de maior pressão. Nestes casos, a saída do esfíncter inferior era definida não pela queda da pressão abaixo da linha intragástrica, mas também pela ausência de contrações do EIE pós- relaxamentos e/ou presença de peristalse de corpo.

pHmetria esofagiana prolongada Os exames foram realizados em ambulatório, por técnica previamente descrita (11), empregando-se sistema digital portátil (MKII ou MKIII Synectics) e cateter com eletrodo de antimônio e referência externa, posicionado 5 cm acima do limite superior do EIE, previamente definido pela esofagomanometria.

Episódio de refluxo foi definido como queda do pH abaixo de 4 por pelo menos 15 segundos. A dieta era regular, evitando-se frutas cítricas e refrigerantes e o paciente orientado a manter suas atividades normais. Inibidores da bomba de prótons, antagonistas H2 e procinéticos/antiácidos eram descontinuados 7-10 dias, 48-72 h e 24 h antes do estudo, respectivamente.

Os pacientes registravam, durante o exame, os horários em que assumissem as posições ereta ou supina, o horário das refeições e os sintomas que porventura apresentassem.

Após um período mínimo de 22 horas, o equipamento era retirado e processado em programa de computador (EsopHogram, versão 5.5), onde eram inseridas as informações do diário e finalmente analisados o gráfico e valores numéricos.

Foram adotados como valores normais os descritos por DeMEESTER et al.(3).

Considerou-se refluxo anormal quando a percentagem de tempo total (%TT) de pH <4 estivesse acima de 4,5%, ou a percentagem de tempo de pH <4 em posição ereta (%TE) fosse maior que 7 ou a percentagem do tempo em posição supina (%TS) estivesse acima de 2,5%.

Migração do sensor de antimônio para o interior do estômago foi identificada quando o pH freqüentemente caia abaixo de 2 por longos períodos e se elevava em resposta à alimentação, sendo os exames repetidos.

Análise estatística A análise estatística utilizou o teste t de student e ANOVA, através do pacote estatístico SPSS para Windows (versão 10) e o valor de P <0,05 para significância.

RESULTADOS Cento e noventa e dois pacientes preencheram os critérios de inclusão, sendo 115 com DRE (68% do sexo masculino, média de idade 49 anos) e 77 com DRNE (66% do sexo feminino, média de idade 48 anos).

No grupo DRE, 94 (81%) pacientes apresentavam hérnia hiatal não-volumosa, enquanto que 21 (19%) pacientes apresentavam hérnia hiatal volumosa. No grupo DRNE, 66 (85%) pacientes apresentavam hérnia hiatal não-volumosa e 11 (15%) hérnia hiatal volumosa. Não houve diferença significativa entre a prevalência dos tamanhos das hérnias nos dois grupos (P = 0,2).

Na DRE, o refluxo foi mais intenso em presença de hérnia hiatal volumosa, expresso pelas maiores %TT e de %TS, quando comparados aos valores observados nos pacientes com hérnia hiatal não-volumosa (P <0,05 para %TT e %TS e não significativo para %TE).

Na DRNE, a %TT de pH <4 e a fração supina foram significativamente maiores no grupo de volumosa hérnia hiatal quando comparados à hérnia hiatal não-volumosa (P <0,05). Para a percentagem de tempo total na posição ereta, não houve diferença estatisticamente significativa (P = 0,861).

Nas Tabelas abaixo estão os resultados observados em pacientes com DRE e DRNE.

DISCUSSÃO Os fatores que determinam o desenvolvimento e a gravidade da esofagite na doença do refluxo permanecem pouco esclarecidos. Pacientes com doença erosiva apresentam, mais freqüentemente, incompetência do EIE(4, 5), esvaziamento gástrico lentificado(14), alterações motoras do esôfago com conseqüente redução da depuração(6), presença de hérnia hiatal(17) e redução dos mecanismos de defesa esofágicos(20).

Estudos recentes têm reafirmado a importância do refluxo ácido na fisiopatologia da DRGE. Na presente série, o percentual de tempo total de pH <4 foi maior no grupo com esofagite erosiva do que na doença não-erosiva. Tem sido demonstrado que a presença e a gravidade da esofagite se correlacionam diretamente ao tempo total de exposição esofagiana ao ácido, o que depende da relação entre o número de episódios de refluxo e o tempo de depuração ácida. O tempo de exposição ácida é crescente, à medida que se progride da doença não- erosiva para a doença erosiva e finalmente para o esôfago de Barrett(2, 13, 24). Resultados contraditórios foram encontrados por AVIDAN et al.(1) que, estudando 644 pacientes com DRGE, encontraram parâmetros de exposição ácida semelhantes entre os grupos sem esofagite, esofagite leve, esofagite confluente, esofagite ulcerada e estenose de esôfago. O único fator associado à severidade da doença mucosa nesse estudo foi a presença de hérnia hiatal, tendo os autores concluído que esta provavelmente influencia o desenvolvimento de esofagite, não através da promoção de refluxo ácido, mas por outros mecanismos diversos.

A hérnia hiatal tem sido identificada como fator importante na promoção de episódios de refluxo e potencialização da exposição ácida no esôfago, estando relacionada com maior freqüência à doença erosiva e complicada. O mecanismo pelo qual a hérnia hiatal se correlaciona à DRGE mais grave, se explicaria em parte pelo deslocamento cranial do EIE, que resulta na perda do componente diafragmático e conseqüente redução na pressão basal(9). Estudo recente também demonstrou que pacientes com hérnia hiatal apresentam maior distensibilidade da junção esôfago-gástrica com pressão de abertura menor e comprimento em média 23% menor que indivíduos normais, o que explica a maior intensidade de refluxo observada nestes pacientes(16).

Outro mecanismo descrito em pacientes com hérnia hiatal seria o maior número de relaxamentos transitórios do EIE em resposta à distensão do fundo gástrico, quando comparados a pacientes com DRGE sem hérnia e controles(10). Pacientes com hérnia hiatal também apresentam maior número de episódios de refluxo durante relaxamentos deglutitivos do EIE, principalmente em situações em que redução da pressão basal ou durante o esforço, o que confirma a incompetência mecânica da junção esôfago-gástrica provocada pela presença da hérnia hiatal (25).

A lentificação da depuração esofágica também constitui anormalidade freqüentemente encontrada em pacientes com hérnia hiatal. JONES et al.(8) compararam o tempo de depuração esofágica em pacientes com DRGE com (n = 19) e sem (n = 19) hérnia hiatal e controles (n = 9), tendo encontrado maior tempo de exposição ácida e de depuração esofágica em pacientes com hérnia hiatal (8,5% ± 1,4% e 105 ± 16 segundos) do que naqueles sem hérnia hiatal (4,2% ± 0,9% e 48 ± 8 segundos). Nesse estudo, os autores não encontraram diferença no número de episódios de refluxo entre os dois grupos, o que reforça a importância da lentificação da depuração esofágica como fator determinante do maior tempo de exposição ácida e gravidade da esofagite nos pacientes com hérnia hiatal. Tal fato seria explicado pelo mecanismo de re-refluxo, ou seja, o material retido no saco herniário retornaria para o esôfago durante o relaxamento deglutitivo antes do bolo alimentar atingir o esôfago distal e a quantidade de bicarbonato deglutida não seria suficiente para tamponar o volume de ácido final, resultante deste processo(8).

Esta lentificação na depuração esofágica seria mais acentuada em hérnias volumosas e não redutíveis(23), o que está de acordo com os resultados encontrados no presente estudo. Na doença erosiva em que é freqüente o refluxo biposicional, ou seja, ocorrendo tanto em posição ereta, como em posição supina, a redução dos mecanismos de depuração, principalmente durante a noite (redução de peristalse, saliva, deglutição), poderiam se associar ao fenômeno do re-refluxo, havendo sinergismo tanto maior, quanto maior o tamanho da hérnia hiatal, resultando em aumento na intensidade do refluxo. Na doença não erosiva, os resultados do presente estudo mostram que a hérnia volumosa aumentou a intensidade do refluxo apenas na posição supina, o que se refletiu no aumento do tempo total em que o esôfago esteve com pH abaixo de 4. A doença não-erosiva cursa com refluxo predominantemente em posição ortostática, uma vez que nesses pacientes o refluxo ocorre, principalmente, por aumento dos relaxamentos transitórios do EEI e não são infreqüentes os sintomas dispépticos, sugerindo defeito de acomodação gástrica(19). O aumento da fração supina na presença de hérnia hiatal volumosa, sugere que o mecanismo de retardo da depuração esofágica em presença de hérnia hiatal e que se acentua com o seu tamanho, pode ter papel preponderante.

Finalmente, é preciso considerar que a DRGE é multifatorial e que, embora a presença de hérnia hiatal se correlacione à maior exposição ácida, seja mais prevalente em pacientes com esofagite e nestas, esteja presente na quase totalidade das esofagites graves ou complicadas, porém não é suficiente para explicar tais achados como fator isolado. Outros fatores parecem estar envolvidos tais como redução do reflexo esôfago-salivar, sensibilidade esofágica ao ácido, alteração motora esofágica, resistência mucosa dentre outros, que podem contribuir para o desenvolvimento de esofagite(18).

Concluindo, a associação entre maior tempo de exposição ácida e a presença de hérnias hiatais volumosas, tanto na DRE como na DRNE, deve alertar para a importância de se promover seu tratamento adequado, evitando assim, complicações futuras.


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