A exenteração pélvica no tratamento do câncer de reto estádio T4: experiência
de 15 casos operados
ARTIGO ORIGINAL ORIGINAL ARTICLE
A exenteração pélvica no tratamento do câncer de reto estádio T4: experiência
de 15 casos operados
Pelvic exenteration for T4 rectal cancer: a series of 15 ressectable cases
Sergio Renato Pais Costa; Ricardo César Pinto Antunes; Raphael Paulo de Paula;
Miguel Ângelo Pedroso; José Francisco de Mattos Farah; Renato Arioni Lupinacci
Serviço de Cirurgia Geral ' Oncocirurgia do Hospital do Servidor Publico
Estadual de São Paulo ' "Francisco Morato de Oliveira", São Paulo, SP
Correspondência
INTRODUÇÃO
A primeira exenteração pélvica foi reportada por Brunschwig no ano de 1948.
Coube a esse autor a descrição da técnica que consistia na remoção de todos os
órgãos pélvicos, tanto do aparelho reprodutor quanto do aparelho urinário, além
do cólon sigmóide e reto com a realização de ureterosigmoidostomia(3). BRICKER
et al.(1) melhoraram esse procedimento por meio do uso de um segmento ileal
para confecção da derivação urinária, assim a ureteroileostomia cutânea era
posicionada no lado direito do abdome, enquanto a colostomia permanecia à
esquerda(1, 2, 8).
Enquanto a exenteração supra-elevadora preserva o assoalho pélvico, a
exenteração infra-elevadora, por sua vez, envolve a ressecção da porção
inferior da vagina, vulva ou períneo, incluindo o ânus e uretra. A exenteração
supra-elevadora tem sua maior indicação para os tumores pélvicos que não
envolvam o aparelho esfincteriano, podendo desta forma, estar associada a
maiores índices de conservação esfincteriana. Em contrapartida, a exenteração
infra-elevadora é habitualmente reservada para os casos em que ocorra o
envolvimento dessas estruturas ou para casos de tumores pélvicos volumosos que
impossibilitem uma abordagem exclusivamente por via abdominal(11).
As exenterações pélvicas têm sido indicadas para o tratamento de diferentes
neoplasias pélvicas, tanto primárias quanto residuais ou ainda mais raramente
recurrentes. Embora historicamente tenham sido descritas para o tratamento do
câncer de colo uterino avançado, essas operações têm sido preconizadas para o
tratamento de tumores localmente avançados de reto, endométrio, vagina, vulva
ou mesmo bexiga urinária. Em situações especiais, pode ser indicada ainda para
o tratamento do câncer recurrente de ovário ou, excepcionalmente, para correção
de fístulas complexas pós-radioterapia(7).
Estima-se que até 5% dos tumores primários do reto apresentem aderências que
envolvam a bexiga urinária, a próstata, os anexos ou a vagina. Em
contrapartida, a própria distinção entre aderência ou invasão pode ser
impossível, mesmo com julgamento intra-operatório minucioso. Desta maneira,
somente a avaliação histológica do espécime ressecado, pode determinar com
certeza, se ocorre ou não a invasão de estruturas contíguas(4, 16). Estudos
prévios têm demonstrado que margens negativas obtidas com uma ressecção
multivisceral fazem com que a recurrência local diminua significantemente de
69% para 18% e os índices de sobrevida por sua vez alcancem até 54,1% em 5 anos
(6, 10). IKE et al.(6) inclusive, observaram sobrevida em 10 anos de 50% para
esse grupo de doentes. Embora neste estudo a morbidade tenha sido significante
(66%), a mortalidade pós-operatória foi de somente 4,2%.
Especificamente para tumores de reto T4 poucas séries de exenteração pélvica
têm sido publicadas(5, 6, 13, 17, 20) e, particularmente em nosso meio, ainda
não foi relatada uma série exclusivamente de tumores de reto T4 cujos pacientes
foram tratados com exenteração pélvica. A maioria das séries reportadas envolve
amostras heterogêneas que reúnem desde recidivas pélvicas de câncer de reto,
até mesmo casuísticas de outros tumores primários que apresentam prognósticos e
resultados divergentes. Tal heterogeneidade da amostra pode acarretar falsas
conclusões em relação aos resultados dessa operação(7, 8, 11, 21).
O objetivo do presente estudo foi avaliar os resultados a curto e longo prazo
da exenteração pélvica no tratamento exclusivamente dos tumores de reto
(adenocarcinoma) T4. Desta maneira, os autores conduziram uma análise
retrospectiva dos tumores de reto T4 tratados por meio de exenteração pélvica
no Hospital do Servidor Público Estadual de São Paulo ' "Francisco Morato de
Oliveira", São Paulo, SP. Foram avaliados: o tipo de exenteração, mortalidade,
complicações, sobrevida em longo prazo, sobrevida livre de doença e modo de
recurrência.
MÉTODOS
Foram estudados 15 casos de adenocarcinoma de reto T4 selecionados por meio do
registro institucional de câncer do Hospital do Servidor Público Estadual de
São Paulo, no período entre setembro de 1998 e junho de 2006. Todos os
pacientes do presente estudo foram operados exclusivamente pelo Serviço de
Cirurgia Geral e Oncocirurgia desse hospital. Apenas os tumores T4 que invadiam
órgãos pélvicos contíguos foram considerados nesta casuística.
Dos 15 pacientes estudados, 8 eram do sexo masculino enquanto 7 eram do sexo
feminino. A idade variou de 36 a 77 anos com média etária de 65 anos e mediana
de 66 anos. Em relação à etnia, 11 eram caucasianos enquanto 5 eram da raça
negra. Oito apresentavam alguma doença associada à neoplasia retal. Cinco
apresentavam hipertensão arterial sistêmica (HAS) enquanto três apresentavam
diabetes mellitus tipo II (DM). Apenas um apresentava obesidade.
Todos apresentavam sintomas incapacitantes. Sete apresentavam dois ou mais
sintomas. Foram encontrados: dor pelve-perineal (n = 14), sangramento retal ou
vaginal (n = 6), infecção urinária recurrente (n = 3) e fístulas tanto
retovaginal (n = 1), quanto retovesical (n = 1).
Todos tiveram o tumor diagnosticado por exames clínico, radiológico e
histológico. Em 13 o tumor era localizado no reto médio ou baixo, enquanto em
2, era localizado no reto alto.
Em relação ao grau de diferenciação do tumor, a distribuição foi: bem
diferenciado em seis, moderadamente diferenciado em sete e pouco diferenciado
em dois. As características demográficas, clínicas e histológicas estão
demonstradas na Figura_1.
Na presente casuística, apenas os pacientes que foram submetidos a algum tipo
de exenteração pélvica padronizada foram considerados para estudo. Todos foram
submetidos a colonoscopia com biopsia, tomografia computadorizada de abdome-
pelve e raio-X simples de tórax para estádio. Também foram dosados os níveis
séricos de CEA e CA 19,9. Cinco foram ainda submetidos a ultra-sonografia
anorretal. Somente pacientes com tumor estádio T4 pela avaliação histológica
completa do espécime cirúrgico foram considerados. Pacientes com tumor estádio
T3 ou recidiva pélvica foram excluídos. Foram consideradas também apenas as
ressecções potencialmente curativas nessa amostra.
Toda exenteração pélvica total (EPT) foi realizada conforme a técnica descrita
por MORIYA et al.(13), padronizada no Instituto Nacional do Câncer ' Tókio,
Japão. Os princípios técnicos seguidos foram: linfadenectomia ampliada com
ligadura alta da artéria mesentérica inferior e para os casos de tumores abaixo
da deflexão peritonial, dissecção linfonodal pélvica bilateral ao longo dos
vasos ilíacos externos, incluindo também a fossa obturadora. Além disso, a
remoção completa e em monobloco de todas as estruturas pélvicas como reto,
bexiga, ureteres abaixo da bifurcação dos vasos ilíacos, órgãos genitais
internos e vasos ilíacos internos bilaterais(13). Para as pacientes do sexo
feminino que apresentavam tumores com comprometimento exclusivo do trato
genital interno, a cirurgia preconizada foi a exenteração pélvica posterior
(ressecção anterior do retossigmóide ampliada com uma histerectomia radical em
monobloco associada à linfadenectomia pélvica).
Em relação ao tipo de exenteração pélvica, foram realizados: exenteração infra-
elevadora (n = 5), exenteração infra-elevadora e sacrectomia parcial (n = 1),
exenteração supra-elevadora (n = 4), exenteração posterior (n = 3) e,
finalmente, exenteração pélvica posterior ampliada com cistectomia e
ureterectomia parciais (n = 2). Houve conservação esfincteriana em sete
pacientes (cinco exenterações posteriores e duas supra-elevadoras). Em relação
ao tipo de derivação urinária, foram realizados: ureteroileostomia cutânea à
Bricker (n = 10) e ureteroneocistostomia à Boari (n = 2). O tempo cirúrgico
variou de 280 a 485 minutos, com mediana de 403 minutos. Dez pacientes foram
transfundidos, sendo que o sangramento intra-operatório variou de 300 a 4.800
mL com mediana de 1.620 mL. O tempo mediano de internação foi de 14 dias,
variando de 7 a 28 dias. Em relação ao tratamento multidisciplinar foi
realizada: radioterapia neo-adjuvante (n = 2), radioquimioterapia neo-adjuvante
(n = 9), quimioterapia adjuvante (n = 5) e radioquimioterapia adjuvante (n =
1). Dois doentes foram exclusivamente operados.
Após o tratamento cirúrgico, todos pacientes foram seguidos com intervalos de 3
meses (até 2 anos), de 6 meses (entre 2 e 5 anos) e finalmente cada 12 meses
(após 5 anos). A cada retorno, foram realizadas, além do exame físico completo,
as dosagens de CEA e CA 19,9, ultra-sonografia total de abdome, tomografia
computadorizada de abdome-pelve e raios-X simples de tórax. Também foi
realizada uma colonoscopia por ano, a partir do primeiro ano de cirurgia.
Recurrência tumoral foi considerada somente em casos de documentação
radiológica inequívoca e, se possível, com confirmação histológica.
RESULTADOS
Um paciente faleceu no período pós-operatório, o que acarretou uma mortalidade
global de 6,66%. Esse paciente, um indivíduo do sexo masculino com idade de 65
anos foi submetido a uma exenteração infra-elevadora com sacrectomia parcial.
Evoluiu sem complicações até o 7° dia pós-operatório, quando finalmente
apresentou embolia pulmonar.
A morbidade global da presente série foi de 53,3%. Oito pacientes apresentaram
nove complicações. Somente um paciente foi submetido a reoperação, evoluindo
com abcesso pélvico, drenado por laparotomia. As complicações pós-operatórias
estão demonstradas na Tabela_1.
Todas as ressecções foram R0 à avaliação histológica do espécime cirúrgico. Os
órgãos mais comumente invadidos foram: bexiga (n = 12), próstata (n = 7),
vesículas seminais (n = 3), ureter (n = 2), útero (n = 7), vagina (n = 3) e
sacro (n = 1). A mediana de linfonodos dissecados foi de 34, variando entre 25
e 45. Houve comprometimento linfonodal em quatro pacientes (26,6%). Dois deles
apresentaram comprometimento de linfonodos regionais (mesoreto), enquanto dois
apresentaram comprometimento das cadeias da fossa obturadora (um paciente) e da
ilíaca externa (um paciente), respectivamente.
Em relação aos sintomas pré-operatórios, apenas um paciente não atingiu o
controle total após o procedimento cirúrgico e continuou utilizando derivados
opiáceos para controle da dor; embora em menor dosagem e freqüência. Todos os
demais voltaram a suas atividades diárias e com controle total de seus sintomas
após procedimento cirúrgico. O índice de sucesso de controle dos sintomas foi
de 94,4 % (n = 14).
A mediana de seguimento foi de 48 meses (2-84 meses), com média de 43 meses. A
sobrevida global em 5 anos foi de 35,7%. A sobrevida em 5 anos dos pacientes
sem envolvimento linfonodal em 5 anos foi de 45,45%. Nesse grupo, oito
pacientes sobreviveram pelo menos 36 meses (sobrevida máxima de 80 meses). Em
contrapartida, nenhum paciente do grupo com envolvimento linfonodal sobreviveu
5 anos (sobrevida entre 13 a 28 meses). A sobrevida mediana do subgrupo sem
envolvimento linfonodal foi de 48 meses, enquanto com envolvimento linfonodal
foi de apenas 20 meses. Esses resultados estão demonstrados na Tabela_2.
Ao todo seis pacientes apresentaram recidivas (40%). Em relação a sua
localização, os órgãos comprometidos foram: fígado (n = 1), pelve (n = 1),
peritônio e fígado (n = 2), peritônio e pelve (n = 1) e pulmão (n = 1). O
intervalo livre de doença variou de 9 a 30 meses, com mediana de 20 meses. A
sobrevida após recidiva variou de 3 a 7 meses, com mediana de 5 meses. Todos os
pacientes com comprometimento linfonodal apresentaram algum tipo de recidiva e
acabaram falecendo em decorrência da doença (a sobrevida variou de 13 a 28
meses). Em contrapartida, dos 11 pacientes sem comprometimento linfonodal
apenas dois apresentaram recidivas (um paciente no fígado e outro no fígado e
peritônio) em período que variou entre 20 e 30 meses. O paciente com recidiva
hepática e peritonial permaneceu vivo até os 20 meses de seguimento (final do
estudo), enquanto o paciente com recidiva hepática exclusiva faleceu em sua
decorrência aos 36 meses de seguimento (realizou hepatectomia de resgate aos 18
meses após exenteração). Esses números estão demonstrados na Tabela_3.
DISCUSSÃO
Um câncer retal é definido como T4 quando invade diretamente outros órgãos ou
estruturas, e/ou perfura o peritônio(18). Essa definição por sua vez, não
condiz com a prática clínica diária em que a maioria dos autores considera que
os verdadeiros tumores T4 são aqueles que invadem diretamente os outros órgãos
pélvicos(13). O tratamento desse grupo de pacientes é complexo e controverso.
Para os tumores localmente avançados T4, diversos estudos têm demonstrado que
tanto a radioquimioterapia quanto a radioterapia neo-adjuvantes podem conferir,
respectivamente, aumento da ressecabilidade e maior sobrevida. Além disso, o
tratamento neo-adjuvante também pode colaborar significantemente para a
diminuição dos índices de recidiva pélvica. Desta maneira, para esse grupo de
enfermos (T4/N+) muitos autores têm preconizado algum tipo de neo-adjuvância.
Embora essa tendência seja uma constante na literatura, em determinadas
circunstâncias essa estratégia ou simplesmente não funciona ou não é factível.
Diante dessas situações especiais, somente por meio de uma ressecção
multivisceral, o paciente pode alcançar maior sobrevida ou até mesmo cura. Em
contrapartida, apenas margens livres podem conferir esses objetivos e para que
isso ocorra, a ressecção em monobloco deve ser priorizada. Além disso, a
própria distinção entre aderências tumorais ou inflamatórias tanto no pré
quanto no intra-operatório pode ser de difícil avaliação, restando assim, como
alternativa tática, a ressecção multivisceral que permanece plausível e
justificável nessa situação. Apesar do benefício, essas operações carregam
altos índices de morbidade e deve-se, portanto, reservá-las tão somente a
situações potencialmente curativas(13, 14).
Os índices de sobrevida em 5 anos dos pacientes com adenocarcinoma de reto
localmente avançado (T4/N+) e que são submetidos a algum tipo de exenteração
pélvica, têm se situado em torno de 20% até 70%. No entanto, a simples
comparação dessas taxas pode ser equivocada, haja vista que devido a sua
indicação restrita poucos serviços as têm realizado em grande número e,
paralelamente, as próprias indicações têm sido diferentes dentro das diversas
instituições(6). IKE et al.(6) observaram taxas de sobrevida em 5 e 10 anos de
respectivamente 54,1% e 50%, resultado similar ao observado por MORIYA et al.
(13), que também no Japão reportaram índice de sobrevida em 5 anos de 57%. No
ocidente, poucos estudos foram realizados, todos inclusive com amostras
pequenas como a da presente série. Dentre esses estudos, LASSER et al.(9)
observaram uma sobrevida em 5 anos de 18% de 10 pacientes, enquanto LAW et al.
(10) observaram sobrevida em 5 anos de 54% em 5 anos, em casuística de 15
pacientes. Mais recentemente, VERMASS et al.(19) na Holanda, relataram
sobrevida estimada em 5 anos de 52% para 23 pacientes com tumores de reto T4
submetidos a exenteração pélvica. Embora a presente casuística seja pequena,
pelo menos cinco pacientes (35,7%) sobreviveram por no mínimo 5 anos,
reforçando assim, a tese de que mesmo com indicação restrita, a exenteração
pélvica pode prolongar a sobrevida de doentes com câncer de reto T4 em casos
selecionados.
Não obstante avanço, tanto da parte técnica quanto do suporte intra e pós-
operatório, tenha ocorrido nas últimas décadas, a mortalidade pós-operatória
ainda permanece considerável. Segundo IKE et al.(6), os índices de mortalidade
têm se situado entre 0% e 20,8%. Esses índices têm variado principalmente em
função do tipo de exenteração e da experiência do serviço. Em grandes centros,
mais recentemente, tem se observado diminuição significativa da mortalidade,
que tem se situado entre 1,6% a 4,2%(6, 13, 19). Embora a presente amostra seja
pequena e o hospital não especializado em oncologia, um único paciente faleceu,
justamente o que foi submetido a exenteração infra-elevadora com ressecção
óssea (sacrectomia parcial). Sendo assim, a mortalidade global de 6,66% se
situa dentro do reportado na literatura e condizente com esse tipo de cirurgia
ultra-radical.
A exenteração pélvica, mesmo em centros especializados, tem envolvido
treinamento intenso e exaustivo da equipe cirúrgica. Conhecimentos tanto das
reconstruções complexas do sistema digestório (anastomoses baixas, bolsas)
quanto do trato urinário (anastomoses, derivações e reservatórios urinários),
têm sido peças fundamentais para o seu êxito. O tempo cirúrgico é geralmente
extenso e quase sempre associado à hemorragia de grande monta, seja durante a
operação ou mesmo durante o período pós-operatório, tornando assim, freqüente a
necessidade de transfusões. Destarte, apenas pacientes altamente selecionados
(hígidos) e com oportunidade real de cura devem ser eleitos para essa cirurgia.
Pacientes com múltiplas doenças associadas, metástases à distância ou mesmo
invasão de estruturas ósseas (coluna lombar, parede pélvica) e nervosas (nervo
ciático, raízes sacrais) não têm sido considerados candidatos a essa operação.
Paralelamente, envolvimento de vasos ilíacos internos ou mesmo obstrução
ureteral bilateral, também têm sido considerados contra-indicações(16, 17).
Conquanto uma diminuição da mortalidade tenha ocorrido, o mesmo não tem sido
observado em relação à morbidade que ainda permanece alta. Estudos recentes têm
apontado morbidade entre 20% e 70% nas diferentes séries, com média em torno de
50%(4, 5, 6, 10, 14, 16, 17, 18, 20, 21). A morbidade de 53,3% observada na
presente casuística, mesmo que oriunda de um hospital geral e de treinamento,
encontra-se dentro do previsto. Essa morbidade, inclusive, é menor do que a
relatada em estudos prévios de grandes centros especializados em oncologia(6,
21). Dentre as principais complicações relatadas, as deiscências de anastomoses
tanto do trato digestivo quanto urinário e as infecciosas (do trato urinário,
pneumonias), têm sido as mais comumente encontradas. Além disso, mais
raramente, complicações circulatórias como tromboembolismo ou mesmo infarto
agudo do miocárdio também têm sido relatadas. Ainda que a morbidade seja
elevada e reflita em aumento do tempo de internação e dos custos de tratamento,
ela não tem acarretado aumento do índice de reoperação, que permanece baixo(5,
6, 10, 13, 14, 15, 18, 21).
Diversos fatores prognósticos têm sido associados a um impacto negativo na
sobrevida dos pacientes com tumor de reto localmente avançado. Dentre os mais
comumente citados, o envolvimento linfonodal parece ser dos mais importantes(6,
17). Embora um teste estatístico específico não tenha sido realizado na
presente amostra, todos pacientes que apresentaram envolvimento linfonodal
acabaram por falecer de recidiva em um período máximo de 28 meses após a
cirurgia. Em contrapartida, dentre os 11 pacientes sem linfonodos
comprometidos, cinco deles (45%) sobreviveram mais que 60 meses.
A maioria dos tumores de reto T4 condena os doentes a sofrimento atroz e
debilitante, influenciando negativamente na sua qualidade de vida. A
exenteração pélvica promove controle de maneira eficiente da maioria desses
sintomas. Tanto as fístulas (retovaginais ou retovesicais) quanto o sangramento
(vaginal ou retal) são os sintomas mais freqüentemente controlados pela
cirurgia. No presente estudo houve melhora considerável dos sintomas em relação
à condição pré-operatória. Embora não tenha sido utilizado um questionário
específico para a avaliação da qualidade de vida, a maioria desses pacientes
voltou a sua rotina diária, sem quaisquer dos sintomas incapacitantes
observados no período pré-operatório. O controle da dor foi possível na maioria
dos pacientes, contudo apenas dois experimentaram recidiva pélvica; assim não
se pode concluir que a resolutividade a longo prazo da dor possa ser alcançada
por meio dessa operação(4, 7, 17).
CONCLUSÃO
A exenteração pélvica nas suas diferentes variações técnicas é procedimento
cirúrgico de mortalidade considerável e alta morbidade. Em contrapartida, pode
conferir maior sobrevida aos doentes com adenocarcinoma de reto localmente
avançado (T4). Essa opção terapêutica deve ser considerada com reserva e deve
ter sua indicação restrita a uma população altamente selecionada com intuito
curativo. Além disso, pode oferecer melhoria da qualidade de vida desses
enfermos que, freqüentemente, apresentam sintomas debilitantes e de difícil
manejo clínico.