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BrBRCVHe0004-28032008000300003

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variedadeBr
Country of publicationBR
colégioLife Sciences
Great areaHealth Sciences
ISSN0004-2803
ano2008
Issue0003
Article number00003

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Transplante hepático: repercussões na capacidade pulmonar, condição funcional e qualidade de vida ARTIGO ORIGINAL ORIGINAL ARTICLE

Transplante hepático: repercussões na capacidade pulmonar, condição funcional e qualidade de vida

Liver transplantation: effects in pulmonary capacity, functional condition and quality of life

Sílvia BarcelosI; Alexandre Simões DiasII; Luiz Alberto Forgiarini Jr.III; Mariane Borba MonteiroII,III ICentro Universitário Metodista - IPA IIPrograma de Pós-Graduação em Reabilitação e Inclusão (Mestrado Profissional), Centro Universitário Metodista - IPA IIIPrograma de Pós-Graduação em Pneumologia (Doutorado) da Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, RS Correspondência

INTRODUÇÃO As doenças hepáticas avançadas são responsáveis pelas alterações metabólicas, desnutrição, perda da massa e da função musculares, alterações respiratórias e demais sintomas relacionados com a hepatopatia(1). A associação desses fatores induzem à deficiência motora global e à inatividade física, interferindo negativamente nas atividades de vida diária (AVD) e na qualidade de vida (QV) dos indivíduos que possuem doença hepática em fase avançada e são considerados candidatos ao transplante hepático (TxH)(6, 7, 12, 15, 18).

Os TxH com doadores cadáveres e vivos realizados anualmente no Estado do Rio Grande do Sul, no período de 2002 a 2005, atingiram a média de 117 procedimentos(20). Atualmente as indicações mais comuns para a realização deste procedimento são a hepatite C crônica e a doença hepática alcoólica, o que corresponde a 40% do total de candidatos adultos que aguardam pelo TxH(3).

Estudos sugerem que o TxH proporciona maior sobrevida e significativa melhora da QV para pacientes que possuem doença hepática em estágio terminal(1, 5, 18, 26). No entanto, outros pesquisadores demonstram que a permanência de sintomas físicos pós-transplante, como a baixa funcionalidade física e a redução da tolerância ao exercício(16, 19), além de complicações respiratórias decorrentes da cirurgia abdominal, podem estar presentes(24).

O objetivo do presente estudo foi avaliar e comparar a função pulmonar, a capacidade funcional e a qualidade de vida de pacientes candidatos e submetidos ao Tx no período de 1, 3, 6, 9, e 12 meses de pós-operatório (PO).

METODOLOGIA Este estudo caracteriza-se por ser transversal, observacional com amostra de conveniência, em que foram incluídos 33 pacientes adultos que estavam sob acompanhamento pelo Serviço de Transplante Hepático do Complexo Hospitalar Santa Casa, Porto Alegre, RS, no período de agosto de 2005 a abril de 2006.

Foram incluídos no estudo todos os indivíduos que apresentavam condições clínicas para realizar os procedimentos propostos e que se encontravam no período pré-operatório e 1, 3, 6, 9 meses após a realização do TxH. Todos os pacientes tiveram acompanhamento médico periódico e possuíam condições de realizar os testes e não apresentavam fatores limitantes ao procedimento da coleta de dados (não colaboração, instabilidade hemodinâmica, dificuldade de locomoção e doença neuromuscular). Foram excluídos três pacientes pelos seguintes motivos: dois apresentaram instabilidade hemodinâmica antes da realização dos testes e um dificuldade para locomover-se.

Dos 30 pacientes restantes, 5 encontravam-se em lista de espera para o TxH e os demais foram alocados em cinco grupos de 5 indivíduos (PO de 1, 3, 6, 9 e 12 meses).

O termo de consentimento livre e esclarecido foi obtido de cada paciente e o trabalho foi aprovado pelo Comitês de Ética e Pesquisa do Centro Universitário Metodista - IPA e do Complexo Hospitalar Santa Casa, Porto Alegre, RS.

Os pacientes selecionados foram submetidos, em um único momento, a seguinte avaliação: espirometria, manovacuometria, teste da caminhada dos seis minutos (Tc6) e aplicação do questionário de QV auto-explicativo "Short Form-36" (SF- 36). Previamente à realização dos testes, os dados referentes às características da amostra foram registradas em uma ficha de avaliação específica. As mensurações foram realizadas sempre pelo mesmo avaliador.

A função pulmonar (capacidade vital forçada - CVF; volume expiratório forçado no primeiro segundo - VEF1) foi mensurada através da espirometria (utilizou-se um microespirômetro Micromedical/ Microplus), seguindo as Diretrizes para Testes de Função Pulmonar, descrita pela Sociedade Brasileira de Pneumologia e Tisiologia(25).O teste de espirometria foi realizado de maneira a obter-se três manobras aceitáveis, sendo duas delas reprodutíveis. Os critérios de reprodutibilidade envolveram a diferença entre os dois maiores valores de VEF1 e CVF abaixo de 0,2 litros, o que significa que o valor máximo foi provavelmente obtido.

Em relação às pressões respiratórias máximas (pressão inspiratória máxima - PIMax e pressão expiratória máxima - PEMax), os sujeitos realizaram a manovacuometria (utilizou-se o manovauômetro digital MVD 500/ GlobalMed), igualmente seguindo as recomendações das Diretrizes dos Testes de Função Pulmonar(25).

O resultado da manovacuometria foi obtido após a realização de cinco manobras para cada valor desejado, obtendo-se três deles aceitáveis. Durante as manobras não houve escape aéreo no bocal do aparelho e a duração foi de pelo menos 2 segundos. Os valores não diferiram entre si por mais de 10% do maior valor, onde se registrou a pressão mais elevada em centímetros de água (cmH2O).

A capacidade funcional, ou seja, o nível funcional para as atividades físicas diárias dos pacientes, foi observada através do Tc6. Este teste exige que o paciente percorra uma distância máxima em 6 minutos, com ritmo próprio, procurando caminhar o mais rápido possível. O teste foi realizado em um corredor sem obstáculos, reto, plano, com 30 m de comprimento. O paciente foi instruído previamente pelo avaliador, que utilizou estímulo verbal padronizado a cada minuto de caminhada, incentivando-o a percorrer maior distância possível, e no final anotou-se o tempo gasto durante o teste.

O paciente notificava a sensação de dispnéia e a fadiga de membros inferiores, sendo utilizada para a classificação a Escala de Borg modificada (escala 0-10), antes, durante e após a execução do teste. Nesses mesmos momentos foram registradas a freqüência cardíaca e respiratória e a saturação periférica de oxigênio (SpO2).

A QV dos pacientes no período pré e PO foram avaliados pelo questionário de qualidade de vida SF-36, que descreve e avalia o estado de saúde dos indivíduos através de vários domínios (capacidade funcional (CF) - SF-361; limitação por aspectos físicos - SF-362; dor - SF-363; estado geral da saúde - SF-364; vitalidade - SF-365; aspectos sociais - SF-366; limitação por aspectos emocionais - SF-367; saúde mental - SF-368). Os escores em cada domínio são obtidos através da soma das respostas daquele item, transformando-se estes escores brutos em uma escala, em que 0 representa saúde deficitária e 100 bom estado de saúde(18).

As análises estatísticas foram realizadas no programa SPSS (Statistical Package for the Social Sciences) versão 10.0, onde as variáveis quantitativas foram descritas através de média e desvio-padrão, ao passo que as categóricas foram expressas através de freqüências absolutas e relativas.

Para comparar os grupos em relação à função pulmonar, manovacuometria, teste da caminhada de 6 minutos e questionário de qualidade de vida SF-36, foi aplicada a análise de variância (ANOVA) "one-way". Como teste complementar foi utilizado o Least Significance Difference (LSD). Para avaliar a associação entre as variáveis qualitativas, foi aplicado o teste de correlação de Pearson.

O nível de significância adotado foi de 5%, sendo considerados significativos valores de P <0,05.

RESULTADOS As características antropométricas e clínicas da população estudada encontram- se dispostas na Tabela_1. Observaram-se resultados semelhantes nos diferentes grupos avaliados, exceto nos valores referentes à altura, onde houve diferença estatisticamente significante ao comparar os grupos pré-transplante (pré-TxH) e 12 meses pós-transplante (pós-TxH) com os indivíduos de 1, 3 e 9 meses pós-TxH (P = 0,037).

O principal diagnóstico clínico apresentado pelos pacientes nos seis grupos foi de cirrose hepática causada pelo vírus C (VHC), seguido de cirrose hepática por vírus B (VHB), carcinoma hepatocelular e cirrose alcoólica. No entanto, também nestes grupos encontravam-se ainda outros diagnósticos como a cirrose auto- imune, doença hepática policística, colangite esclerosante primária, insuficiência hepática fulminante, cirrose criptogênica e cirrose biliar primária (Tabela_1).

Os resultados referentes as variáveis da CVF, VEF1, PIMáx, PEMáx, distância percorrida (DP) e domínios do questionário de qualidade de vida SF-36 encontram-se na Tabela_2. Em relação aos dados espirométricos, não houve diferença significante entre os grupos avaliados.

O maior valor da PIMáx. foi encontrado no grupo com 9 meses pós-TxH, o qual apresentou diferença significativa com os grupos pré-TxH (P = 0,004), 3 meses (P = 0,005) e 12 meses pós-TxH (P = 0,005) (Figura_1). Em relação à PEMáx, não foi verificada diferença significante entre os grupos avaliados (P = 0,95).

Na análise da capacidade funcional (CF), obteve-se maior valor na distância percorrida no Tc6 no grupo com 9 meses de PO, o qual apresentou diferença estatisticamente significante ao ser comparado aos grupos pré-TxH (P = 0,002), 1 mês (P = 0,036), 3 meses (P = 0,019) e 12 meses pós-TxH (P = 0,017) (Figura 2).

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Em relação aos domínios do questionário de QV SF-36, o mais relevante para o estudo foi a capacidade funcional, que apresentou diferença estatisticamente significante entre o grupo pré-TxH e os indivíduos com 6 (P = 0,009), 9 (P = 0,001) e 12 meses pós-TxH (P = 0,007). O grupo pré-TxH também apresentou diferença significante ao ser comparado com os indivíduos com 3 e 9 meses de PO (P = 0,022). Os escores referentes à saúde mental apresentaram diferença estatisticamente significante entre o grupo pré-TxH e os indivíduos com 1 mês (P = 0,022), 3 (P= 0,006), 6 (P = 0,002), 9 (P = 0,003) e 12 meses (P = 0,003) de PO. Na análise dos demais domínios do questionário, não se constatou diferença estatisticamente significante entre os diferentes grupos.

DISCUSSÃO Muitos pacientes com doença hepática avançada apresentam redução na complacência pulmonar devido à presença de diversas situações como a hepatomegalia, ascite, atelectasia basal ou derrame pleural(1, 6, 8); entretanto, essas anormalidades não interferem no curso pré-operatório da doença hepática(1).

As alterações fisiopatológicas registradas no PO (volumes e capacidades pulmonares reduzidos, alterações do padrão ventilatório e trocas gasosas)(12, 13, 17, 19) são decorrentes das cicatrizes operatórias(22) e da disfunção diafragmática(17). O ápice da disfunção ocorre no período entre 2 e 8 horas após a cirurgia, retornando aos valores pré-cirúrgicos em 7 a 10 dias, aproximadamente(12, 13, 17, 24), fato esse apresentado no presente estudo pelos pacientes no mês após a realização da cirurgia.

As alterações pulmonares determinam um padrão ventilatório restritivo, acompanhadas de significante redução da capacidade vital(7, 12), no volume de ar corrente, VEF1 e capacidade residual funcional(18).Os grupos analisados na presente série não apresentaram essa característica, diferindo dos relatos encontrados na literatura(18, 21).

GARCIA et al.(8) e STEPHENSONet al.(26) identificaram, a partir dos testes de função pulmonar, valores médios normais na CVF e no VEF1, nos pacientes submetidos ao TxH. Em concordância com a literatura, os achados desta casuística foram semelhantes nos grupos de 1, 3, 6, 9 e 12 meses pós-TxH, mas apresentou melhora da capacidade pulmonar quando comparada ao grupo pré-TxH, apesar de não ser estatisticamente significante. Os valores de CVF e VEF1 apresentados por esses grupos não sofreram variações significativas, o que demonstra tendência à melhora progressiva da capacidade pulmonar no período pós-TxH.

Diversos são os fatores que contribuem para as complicações no PO, como a própria abordagem abdominal. Estudos demonstraram que tal abordagem cirúrgica leva ao desenvolvimento de complicações pós-operatórias, mais freqüentes que as das cirurgias torácica e cardíaca(27). Esse procedimento também é responsável por período de internação hospitalar prolongado(4, 10, 11).

Da mesma forma, McALISTER et al.(14)demonstraram redução no VEF1 e na CVF após a realização de cirurgia não-torácica e que a associação desses fatores aumenta a incidência de complicação pós-operatória(16). Segundo McALISTER et al.(14), essa redução no VEF1 seria responsável pelo aumento do risco de complicações pulmonares pós-operatórias em 6,5 vezes, quando comparado ao de pacientes submetidos a cirurgia abdominal sem alteração na função pulmonar.

No presente estudo verificou-se melhora da PIMáx em todos os períodos de PO quando comparada ao grupo pré-TxH. A queda da PIMáx apresentada no 12º mês pode estar relacionada com o surgimento da hipertensão pulmonar refratária, pois o estudo de SHIROUZU et al.(23) demonstrou que existe relação da doença hepática com a força muscular respiratória e CF, pois os indivíduos com hipertensão pulmonar apresentaram diminuição da PIMáx e da distância percorrida no teste da caminhada dos 6 minutos.

Ao se realizar a avaliação funcional no período pré-TxH, o grupo apresentou uma DP de 462,8 ± 70,0 m, o que não demonstra comprometimento funcional. No estudo realizado por LEITÃO et al.(12), os indivíduos apresentaram uma DP de 383,8 ± 115,4 m, o que demonstra deterioração da CF em candidatos ao TxH(2).

Indivíduos que realizam o TxH apresentam limitações e alguns sintomas diversos (astenia, fadiga física, entre outros) após alguns anos do procedimento(1, 9, 16, 21, 26). Tal constatação, contudo, não foi verificada nos grupos pré e pós- TxH da presente pesquisa, pois houve melhora da tolerância ao exercício nos pacientes transplantados, ainda que não de forma progressiva.

De acordo com van den BERG-EMONS et al.(28), a fadiga muscular pode permanecer pelo período de 1 ano após o TxH, podendo ser este o fator responsável pela baixa na capacidade funcional apresentadas pelos indivíduos no 12º mês pós- transplante. AADAHL et al.(1) relatam que transplantados hepáticos após a experiência da fadiga física, reduzem seus níveis de atividade física em conjunto com a fadiga mental, reduzindo a motivação, tornando-os sedentários.

Embora os testes de função pulmonar não tenham apresentado diferença estatisticamente significante entre os períodos pré e pós-TxH, provavelmente o aumento da tolerância ao exercício no período pós-TxH, possa ser causado pela melhora clínica desses pacientes.

É provável que outros aspectos (nutricionais e metabólicos), não avaliados no presente estudo, contribuam para a evolução do TxH. Isto foi evidenciado através do estudo de KRASNOFF et al.(10), em que o grupo que realizou programa de exercício e acompanhamento da dieta pelo período de 1 ano, teve aumento no consumo de oxigênio VO2 e na QV em geral, quando comparado ao grupo com tratamento usual.

Muitos estudos demonstram que o TxH prolonga a sobrevida e melhora a QV de doentes com moléstia hepática avançada(1, 10, 15, 17). Em concordância com os estudos publicados, na presente pesquisa verificou-se melhora da QV relacionada à saúde, quando comparado o período PO com o pré-TxH. Houve diferença estatisticamente significante no domínio "capacidade funcional" do SF-36 nos indivíduos com 6, 9 e 12 meses de TxH, quando comparados ao grupo pré-TxH.

Esses achados, entretanto, não se apresentaram de forma linear, sofrendo oscilações nos períodos subseqüentes ao transplante.

Uma limitação da presente pesquisa encontra-se no fato de a população estudada ser heterogênea em relação à doença de base apresentada, além de cada grupo possuir número amostral reduzido (cinco pacientes em cada grupo), o que gera fator limitante para validação externa dos dados.

O TxH proporciona benefícios aos pacientes com doença hepática avançada e interfere nas condições pulmonares, funcionais e QV, causando melhora dessas variáveis após a realização da cirurgia.


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