Residência multiprofissional como experiência de atuação interdisciplinar na
assistência à saúde da família
RELATO DE EXPERIÊNCIA
ENSINO
Residência multiprofissional como experiência de atuação interdisciplinar na
assistência à saúde da família
Gesilda Meira Lessa
Professor Assistente do Departamento de Enfermagem Comunitária da Escola de
Enfermagem da Universidade Federal da Bahia e Consultora para a Área de
Enfermagem do Curso de Especialização em Medicina Preventiva e Social do
Instituto de Saúde Coletiva da mesma Universidade
APRESENTAÇÃO
O Curso de Especialização em Medicina Preventiva e Social sob a forma de
Residência Multiprofissional é oferecido pelo Instituto de Saúde Coletiva da
Universidade Federal da Bahia, através do Pólo de Capacitação e Educação
Permanente de Pessoal para Saúde do Estado. Visa formar especialistas em saúde
coletiva cujo perfil atualmente está voltado, entre outras competências, para a
atuação em gestão de Sistemas Locais de Saúde, equipes multiprofissionais e
para uma compreensão da visão sistêmica da família.
A procura da Residência por egressos do curso de enfermagem chama a atenção
para a importância da formação multiprofissional a nível de especialização e,
ao mesmo tempo, da urgência de uma revisão curricular da graduação em
enfermagem, visando instrumentalizar o aluno para a atuação no mercado de
trabalho emergente, voltado as novas Políticas de Saúde em implementação no
país.
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Conforme o Quadro apresentado, no período de 1997 a 1999, ocorreu uma
predominância de profissionais enfermeiros no corpo discente. No ano em curso,
o número de vagas oferecidas para a residência foi ampliado de 20 para 30, das
quais 20 para médicos e 10 para enfermeiros, odontólogos, farmacêuticos,
nutricionistas, psicólogos e assistentes sociais. Essa mudança na composição
das vagas ocorreu a partir da identificação pela Secretaria de Saúde do Estado
da Bahia da necessidade de uma política de incentivo à formação de médicos para
a assistência à saúde da família e implementação do Programa de Saúde da
Família no Estado.
Considerando a importância desse tipo de experiência para o momento atual do
Sistema Único de Saúde e para a integração ensino-serviço, apresentamos algumas
reflexões sobre a nossa participação como consultora no Curso de Especialização
em Medicina Preventiva e Social. Esse curso tem favorecido a atuação
multiprofissional do enfermeiro, assim como das demais categorias, na
perspectiva da assistência à saúde da família e permitido a cada um de seus
participantes, uma crescente reflexão sobre a necessidade de novas propostas
pedagógicas coerentes com a reformulação do modelo de atenção à saúde do país.
ORGANIZAÇÃO E DESENVOLVIMENTO DO CURSO
O curso tem duração de 2.348 horas, sendo que sua estrutura curricular está
organizada em disciplinas que privilegiam a integração teórico-prática e
atividades obrigatórias (UNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHIA,1997). As disciplinas
são elaboradas por área temática, abrangendo um leque de conteúdos e práticas
em saúde coletiva e atenção primária. As áreas temáticas são: Epidemiologia em
Saúde Coletiva; Educação, Comunicação e Práticas Pedagógicas Aplicadas à Saúde;
Gerência de Sistemas Locais de Saúde; Ciências Sociais em Saúde e Atenção à
Saúde da Família. As atividades obrigatórias apresentam-se organizadas como:
Atividade Integrada; Pesquisa Orientada; Estágio em Serviços I e Estágio em
Serviços II.
As atividades teóricas são articuladas com atividades práticas e com estágios
supervisionados. Estes são realizados em unidades básicas de saúde dos
distritos sanitários de Salvador, municípios onde forem constatadas condições
satisfatórias para o desenvolvimento das práticas, Diretorias Regionais de
Saúde e no nível central de Secretarias Municipais de Saúde. Abrangem
atividades práticas nas áreas de planejamento, programação local, vigilância em
saúde, comunicação e práticas pedagógicas em saúde e atendimento de pacientes
em nível ambulatorial e domiciliar ligados a serviços locais de saúde. Essas
práticas são acompanhadas, supervisionadas e avaliadas pelo grupo de docentes
das disciplinas e profissionais de nível superior dos serviços utilizados como
campo de prática.
Além do grupo de docentes e supervisores, a Residência conta com a participação
de consultores de várias categorias profissionais que colaboram para o estímulo
dos discentes na busca de alternativas aos problemas identificados nos
territórios, famílias e instituições em que atuam nas suas atividades práticas.
COMPREENDENDO AS HABILIDADES PROPOSTAS
Como forma de subsídio para a intervenção multidisciplinar da equipe de saúde,
a Residência tem investido em áreas ainda pouco exploradas nos cursos de
graduação da área de saúde (UNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHIA, 1997):
- Utilização dos indicadores de saúde na análise de situação de saúde de grupos
populacionais específicos, diagnóstico de saúde da comunidade, planejamento e
avaliação dos serviços de saúde, medidas de promoção à saúde, prevenção de
doenças e agravos, assim como de monitoramento dos grupos de maior risco;
- Compreensão do processo educativo e da comunicação social em saúde,
facilitando as mudanças nas práticas de promoção e elevação da qualidade dos
serviços de saúde prestados à população;
- Aplicação de técnicas e instrumentos de gestão estratégica para o trabalho
dos profissionais, na perspectiva da integralidade e da intersetorialidade das
intervenções, com ênfase no planejamento e programação, na condução de
processos de trabalho, na negociação dos distintos interesses representados no
nível local e nas técnicas de administração de recursos;
- Explicitação dos condicionantes econômicos, políticos, culturais e
psicossociais do processo saúde-doença, assim como as implicações de adotar-se
a família como objeto de intervenção;
- Adoção da família como objeto de intervenção em saúde, considerando-
a enquanto contexto diversificado de desenvolvimento humano;
- Compreensão da família como um grupo social com peculiaridades próprias que
demandam alternativas de intervenção baseadas na cooperação, co-
responsabilização e respeito mútuo; estabelecer inter-relações entre estrutura
familiar, redes de apoio à família e adesão à programas e ações de saúde;
identificar práticas e estratégias assistenciais mais sensíveis às
características do ambiente social, perfil sociocultural, necessidades sociais
e sanitárias da comunidade e das famílias que nela vivem;
A construção dessa prática profissional está centrada na intervenção da equipe
multidisciplinar, a partir de estratégias assistenciais centradas na vigilância
à saúde e assistência à saúde da família.
MÉTODOS E INSTRUMENTOS DE INTERVENÇÃO FAMILIAR COMO FORMA DE REVER CONCEI-TOS,
VALORES E PRÁTICAS NA EQUIPE MULTIPROFISSIOONAL
Abordaremos, nesse artigo, alguns aspectos que consideramos diferenciados e
enriquecedores do processo de consultoria experienciado e que englobam dois
momentos: Técnico e de Discussão de Casos (UNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHIA,1997).
O Momento Técnico foi realizado através da leitura de textos e aprofundamento
de temas em subgrupos. O Momento de Discussão de Casos, selecionados a partir
das atividades práticas desenvolvidas em determinada micro área da comunidade,
através da demanda expontânea ou por seleção dos residentes em visitas
domiciliares, envolve a utilização de instrumentos como a "História de Vida" e
o "Protocolo de Intervenção Familiar", facilitadores de uma abordagem sistêmica
voltada para os indivíduos, família e comunidade.
A coleta da "História de Vida" apresenta-se como instrumento de aprofundamento
da relação entre o profissional de saúde e os indivíduos que procuram os
serviços, além de facilitar a aproximação desse profissional ao contexto
familiar, assim como a intervenção da equipe multidisciplinar frente aos
problemas relatados.
O "Protocolo de Intervenção Familiar" inclui a realização pela equipe
multidisciplinar de um conjunto de procedimentos como o diagnóstico
biopsicossocial, construção do familiograma, classificação da família e
dinâmica familiar, através do gráfico das relações familiares observadas,
levantamento dos problemas por indivíduo e família, além do planejamento,
desenvolvimento e avaliação das ações propostas, segundo os problemas
individuais, da família e coletivos da micro área onde residem.
A apresentação e discussão desses instrumentos mostrou a importância da
intervenção interdisciplinar (Patrício, 1996) que embora ainda em
desenvolvimento, viabiliza a intervenção sobre os problemas levantados,
trabalhando a família como um sistema aberto (Linhchin; Fishman, 1990) em
interação com sistemas extrafamiliares (meio ambiente - comunidade).
CONCLUSÃO
Nossa experiência pessoal de consultoria no Curso de Especialização em Medicina
Preventiva e Social, oferecido pelo Pólo de Capacitação e Educação Permanente
de Pessoal para Saúde da Família (Instituto de Saúde Coletiva da Universidade
Federal da Bahia), apesar de limitada em relação a globalidade do curso, tem
indicado alguns pontos demarcadores de uma nova prática profissional,
diferenciada da ainda hegemônica nos serviços de saúde.
Essa prática tem sido propiciada através do estímulo à atuação interdisciplinar
da equipe multiprofissional, da capacitação dos profissionais na utilização do
instrumental da clínica, da epidemiologia e do planejamento no enfrentamento
dos problemas de saúde em um território delimitado. Destacamos, principalmente,
a construção no cotidiano, através da relação entre teoria e prática nos
serviços de saúde e nas comunidades, de uma postura profissional que favorece a
assistência integral, a comunicação com a comunidade e estimula o controle e a
participação social.
Consideramos que esse tipo de prática profissional necessita ser
institucionalmente fortalecida, através do estabelecimento pelo governo de
políticas setoriais, intersetoriais e de recursos humanos que realmente
propiciem a reorganização e uma nova estruturação dos serviços de saúde.
Apresentamos, também, a expectiva de maior investimento na adequação desse
perfil profissional em formação e na construção do conhecimento
interdisciplinar, identificação de competências gerais e específicas por
categoria nesse novo contexto.
Nesse contexto, identificamos a necessidade de estudos posteriores sobre a
intervenção multiprofissional do enfermeiro de forma integral, contínua e de
qualidade à população no nível domiciliar eambulatorial,.