Diagnósticos de enfermagem em pacientes submetidos à cirurgia cardíaca
PESQUISA
Diagnósticos de enfermagem em pacientes submetidos à cirurgia cardíaca
Nursing diagnoses in patients outgoing cardiac surgery
Diagnósticos de enfermería en pacientes sometidos a la cirugía cardiaca
Luciana Alves da RochaI; Ticiane Fernandes MaiaII; Lúcia de Fátima da SilvaIII
IEnfermeira.Especialista em Terapia Intensiva. Enfermeira do Hospital de
Messejana - Forlateza - Ceará. Membro do Grupo de Pesquisa: Educação, Saúde e
Sociedade (GRUPESS)
IIEnfermeira .Especialista em Terapia Intensiva. Enfermeira do Hospital de
Messejana - Fortaleza - Ceará
IIIEnfermeira. Doutora em Enfermagem. Professora da Universidade Estadual do
Ceará. Enfermeira do Hospital de Messejana. Membro do Grupo de Pesquisa
Educação, Saúde e Sociedade (GRUPESS). Fortaleza - Ceará
1. INTRODUÇÃO
Em âmbito mundial, as doenças crônicas não transmissíveis são responsáveis
pelas principais causas de morte e incapacidade(1,2). Entre essas, as de maior
importância para a saúde pública são as cardiovasculares, o câncer e o diabetes
mellitus. Nas cardiovasculares sobressaem a doença isquêmica cardíaca, a
cérebro-vascular e a hipertensão arterial sistêmica (HAS)(1-3).
A contribuição das doenças cardiovasculares quanto à mortalidade é
significante, pois um terço do total de óbitos no mundo (16,6 milhões de
pessoas) originam-se das doenças cardiovasculares em suas várias formas. Desses
16,6 milhões, 7,2 milhões são decorrentes da doença isquêmica cardíaca(1,2).
Diante da complexidade da doença, percebe-se a urgência de interromper-lhe o
curso. Há alguns anos, o tratamento dos problemas cardiovasculares vem obtendo
avanços terapêuticos, clínicos e cirúrgicos. Quando a probabilidade de uma vida
melhor após este evento supera o tratamento clínico, realiza-se o tratamento
cirúrgico.
Há três tipos de cirurgias cardíacas: as corretoras, relacionadas aos defeitos
do canal arterial, incluído o do septo atrial e ventricular; as reconstrutoras,
destinadas à revascularização do miocárdio, plastia de valva aórtica, mitral ou
tricúspide; e as substitutivas, que correspondem às trocas valvares e aos
transplantes(4). Os tipos mais comuns de cirurgias cardíacas são as
reconstrutoras, particularmente a revascularização do miocárdio. Por isto,
nesse estudo, optou-se em trabalhar com pacientes no pós-operatório desse tipo
de cirurgia.
Conhecida popularmente como ponte de safena, a revascularização do miocárdio
(RM) consiste em um enxerto arterial coronário usando a veia safena autógena
com o objetivo de isolar o vaso obstruído e, assim, restabelecer a perfusão da
artéria coronária. Esse tipo de cirurgia, cuja maior vantagem é a durabilidade,
tem a finalidade de preservar o miocárdio(4,5).
Suas indicações predominantes são para pacientes sintomáticos e que tenham
intolerância ao tratamento medicamentoso; nos casos de lesões importantes
impossíveis de ser corrigidas com angioplastia; em infarto agudo do miocárdio
(IAM), como prevenção ou correção ou por choque cardiogênico; no tratamento das
complicações do infarto agudo do miocárdio; na angina instável e piora do
quadro clínico(6).
O pós-operatório é o período durante o qual ocorre a recuperação do paciente.
Nele a assistência de enfermagem está relacionada com as intervenções
destinadas a prevenir ou tratar complicações e proporcionar ao paciente o
retorno às atividades do cotidiano. Constantemente a enfermagem aprimora seus
conhecimentos. Desse modo vem desenvolvendo uma metodologia própria de
trabalho, fundamentada em um processo sistematicamente planejado de cuidar. O
processo é constituído de um conjunto de etapas, como: coleta de dados,
diagnóstico de enfermagem, planejamento, implementação e avaliação, nas quais
sobressai a importância do cuidado individual mediante uma abordagem de solução
de problemas fundamentados em teorias e modelos conceituais de enfermagem(4).
No desenvolvimento do processo, a etapa do diagnóstico de enfermagem tem se
destacado e estudos a este respeito têm sido aprofundados. Trata-se de uma
etapa complexa, cuja sistemática envolve avaliação clínica das respostas do
paciente ou grupos aos problemas de saúde e fornece a base para a intervenção
de enfermagem no intuito de se atingir os resultados esperados. Por meio do
raciocínio clínico acerca de dados coletados via entrevista clínica e exame
físico, podem ser identificados os diagnósticos classificados como de
enfermagem(7).
No relacionado à classificação dos diagnósticos de enfermagem, a North American
Nursing Diagnosis Association (NANDA) tem contribuído tanto para seu
crescimento e aperfeiçoamento, como para o desenvolvimento de um sistema com
vistas a classificá-los em uma taxonomia(8). Citam-se, também, a Classificação
das Intervenções de Enfermagem (NIC), constituída por uma linguagem padronizada
que descreve os tratamentos realizados pelas enfermeiras, e a Classificação dos
Resultados de Enfermagem (NOC), baseada em uma linguagem padronizada dos
resultados de enfermagem decorrentes das intervenções(9).
A temática do processo de cuidar sempre despertou-me interesse pelo cuidado
sistematizado dispensado a pessoas submetidas as cirurgias cardíacas. Tal
interesse intensificou-se a partir do meu contato como enfermeira assistencial
com pessoas no pós-operatório de cirurgia cardíaca em um hospital de referência
em doenças cardíacas e pulmonares. Então, iniciou-se a pesquisa e leitura sobre
o assunto. Isto fez crescer o envolvimento ao possibilitar perceber a
importância do cuidado de enfermagem e, deste modo, do conhecimento das
necessidades do paciente nessa fase para, a partir daí, planejar intervenções
terapêuticas capazes de prestar assistência de qualidade àquela clientela.
Como no processo de sistematização evidenciam-se algumas lacunas, sentiu-se a
urgência de desenvolver um trabalho que possibilite o norteamento para uma
sistematização mais complexa e ajude no direcionamento do cuidado de
enfermagem. Intencionou-se construir um trabalho voltado para a identificação
dos diagnósticos de enfermagem segundo a taxonomia II da NANDA, mediante uso da
classificação das intervenções de enfermagem e a classificação dos resultados
de enfermagem.
Diante do exposto, percebe-se a relevância do assunto para os profissionais de
enfermagem, pois o cuidado de enfermagem aos pacientes no pós-operatório é de
grande importância para esses profissionais, e merece especial atenção, em
virtude de indicar a necessidade de assistência de enfermagem à pessoa objeto
de cuidado.
A identificação de diagnósticos específicos é fundamental, porquanto a partir
desta, poderá se traçar um plano de intervenções o mais preciso possível. O
objetivo do plano é direcionar o tratamento e, assim atender melhor às
necessidades dos pacientes, contribuindo para a construção do conhecimento e
engrandecimento da enfermagem. A NANDA tem colaborado para o desenvolvimento e
aperfeiçoamento dos diagnósticos de enfermagem e de um sistema para classificá-
los em uma taxonomia(10). Conforme a literatura, a taxonomia da NANDA implica
um arranjo sistemático de fenômenos de enfermagem relacionados em grupos e
baseados nas características que esses fenômenos possuem em comum(10).
Em substituição à classificação pautada nos Padrões de Respostas Humanas
(taxonomia I) surgiu a taxonomia II da NANDA, multiaxial e com flexibilidade da
nomeclatura permitindo modificações e inclusão de novos diagnósticos(10).
A NIC é considerada uma classificação abrangente, pois abarca intervenções da
prática generalista até as áreas de especialidade e padronizada, e pode ser
utilizada por diferentes pessoas, em diversas partes do mundo. Nesse caso, o
foco da atenção é o comportamento do enfermeiro, isso é, o que faz para
auxiliar o paciente na obtenção do resultado desejado9. Conforme se ressalta,
tais intervenções poderão estar relacionadas aos diagnósticos de enfermagem da
NANDA. Portanto, as ligações entre NANDA e NIC facilitam a fundamentação
diagnóstica e a tomada de decisão clínica pelos enfermeiros(11).
Quanto a NOC, é usada para avaliar os resultados nas intervenções de
enfermagem. Tem como objetivos: a identificação, a rotulação, a validação, a
classificação dos resultados e a testagem dos procedimentos de medida para os
resultados e indicadores. Nessa classificação, a enfermagem trabalha com os
resultados mais influenciados pelas intervenções de enfermagem(12). A exemplo
da NIC, na NOC os resultados podem ser utilizados por outras disciplinas. Além
disso, os resultados da NOC podem estar relacionados aos diagnósticos da NANDA.
O presente estudo perseguiu os seguintes objetivos: a identificação dos
diagnósticos de enfermagem, segundo a taxonomia II da NANDA para o planejamento
da assistência de enfermagem em pacientes no pós-operatório de cirurgia
cardíaca de revascularização do miocárdio; a identificação das intervenções de
enfermagem, segundo a NIC, a partir dos diagnósticos encontrados, e a
associação dos resultados de enfermagem, segundo a NOC, com base nas
intervenções planejadas.
2. METODOLOGIA
Trata-se de pesquisa descritiva-exploratória, do tipo transversal, na qual
procurou-se identificar os diagnósticos de enfermagem apresentados pelos
pacientes no pós-operatório de cirurgia cardíaca de RM. A pesquisa foi
realizada em um hospital do município de Fortaleza-CE, pertencente à rede
pública e referência estadual, em nível terciário de atenção à saúde, na área
de Cardiologia e Pneumologia.
A população do estudo compôs-se pacientes no pós-operatório de cirurgia
cardíaca de RM e a escolha da amostra foi feita mediante amostragem
intencional. Nesse tipo de processo de escolha é identificado propositadamente
um grupo que irá fazer parte da amostra(13).
Do presente estudo participaram 22 pacientes após terem ultrapassado 24 horas
de cirurgia cardíaca de RM e que estavam internados na Unidade de Terapia
Intensiva (UTI) pós-operatória, independente de sexo ou idade. Eles foram
escolhidos porque, conforme ressaltado nas literaturas pesquisadas, a maioria
dos trabalhos é com pacientes no pós-operatório imediato. A coleta de dados
ocorreu nos meses de maio e junho.
Na coleta de dados foi aplicado um instrumento segundo os domínios da taxonomia
II da NANDA, além de exame físico e consulta de exames laboratoriais. Houve
pré-teste, e posteriormente foram promovidos ajustes necessários.
Após a coleta de dados, procedeu-se à identificação dos diagnósticos de
enfermagem. Nela utilizou-se o processo de raciocínio diagnóstico, que é
gradual, interativo e intuitivo. O reconhecimento das evidências, a geração
mental dos possíveis diagnósticos, a comparação das evidências com tais
diagnósticos, a coleta focalizada e a validação dos diagnósticos fazem parte do
processo.
Na coleta de dados para a formulação dos diagnósticos de enfermagem, o
profissional deteve-se informações com base em idéias estabelecidas sobre o que
deveria acontecer com os pacientes no pós-operatório de cirurgia cardíaca. Em
seguida, os dados foram caracterizados, organizados e agrupados de maneira
lógica e sistematizada. Alguns diagnósticos foram gerados, mas se evitou fechá-
los. Posteriormente se compararam as evidências com possíveis diagnósticos
encontrados na taxonomia II da NANDA. Concluídas essas etapas, focalizaram-se
os dados para obter os diagnósticos e, em seguida validaram-se os diagnósticos
ao compará-los com a evolução e a sistematização feita pelas enfermeiras que
prestavam cuidados aos pacientes.
Após a elaboração dos diagnósticos, os dados foram compilados em um banco de
dados criados no Programa Epi Info, revisão 2 e organizados como exposto no
quadro. Em seguida foi feita a análise a partir da leitura das freqüências
numéricas, consolidando-as na literatura pertinente.
Nesta pesquisa foram respeitados os preceitos éticos e legais a serem seguidos
nas investigações envolvendo seres humanos, conforme preconiza a Resolução 196/
1996, do Conselho Nacional de Saúde(14). Para tanto, o projeto em pauta foi
apreciado pelo Comitê de Ética em Pesquisa do hospital destinado ao estudo.
3. RESULTADOS E DISCUSSÃO
3.1 Diagnósticos de Enfermagem
Os dados foram organizados no relacionado à caracterização dos participantes
quanto a identificação, diagnósticos de médicos, diagnósticos de enfermagem e
fatores de risco à ocorrência de doença coronariana.
A faixa etária dos participantes submetidos a cirurgia de RM variou de 37 a 87
anos. Prevaleceu a faixa entre 67 e 77 anos (31,8%). Quanto ao sexo, a
prevalência de homens (63,6%) foi maior do que a de mulheres (36,4%). A maioria
dos participantes residiam na capital (54,5%), 41,0% eram oriundos do interior
do Estado e apenas 4,5% provinham de outro Estado. Como mostrou a escolaridade,
nenhum participante possuía nível superior, a maioria não deles não haviam
completado o ensino fundamental (45,5%) e outros não sabiam ler e escrever
(31,8%).
Entre os diagnósticos médicos encontrados que conduziram à cirurgia cardíaca de
RM, os de maior evidência foram a insuficiência coronariana -ICO (72,8%) e o
IAM (72,8%). Estava presente, também, angina instável (36,4%), porém com
freqüência menor.
Dos fatores de risco evidenciados, os mais prevalentes foram a HAS (86,4%), o
tabagismo (63,6%) e o diabetes melitus (45,5%). Foram encontrados, ainda,
dislipidemia -DLP (40,9%) e doença pulmonar obstrutiva crônica- DPOC (4,5%).
No Quadro_1 constam os diagnósticos de enfermagem identificados. No entanto,
serão comentados apenas os de freqüência maior que 50%.
Foram encontrados 19 diagnósticos de enfermagem. Destes, 15 apresentaram
freqüência maior que 50%. Os de maior prevalência foram Risco para infecção,
Risco para constipação, Déficit no autocuidado para higiene íntima, Integridade
da pele prejudicada, todos com a mesma freqüência (100%). Outros diagnósticos
também tiveram freqüência elevada, quais sejam: Mobilidade física prejudicada e
Integridade tissular prejudicada (90,9%); Déficit no autocuidado para
alimentação, Padrão de sono perturbado, Padrão respiratório ineficaz, Ansiedade
(68,2%); Desobstrução ineficaz das vias aéreas (63,6%); Dor aguda (59,1%);
Nutrição desequilibrada: menos que as necessidades corporais, juntamente com
Ventilação espontânea prejudicada e Risco para intolerância à atividade
(50,0%).
Define-se Risco para infecção como o aumento do risco de invasão de patógenos
(10). Este diagnóstico é comumente identificado em pessoas submetidas a
cirurgia cardíaca de RM. No estudo, estava presente em todos os participantes e
possuía forte relação com os procedimentos invasivos, como o cateterismo
vesical, o acesso central, os drenos de tórax e mediastino, o acesso para
pressão arterial média, além da destruição dos tecidos e das defesas primárias
inadequadas (pele rompida) devido a cirurgia cardíaca. Todos os procedimentos
invasivos constituem risco para a presença de patógenos como as bactérias. O
ambiente hospitalar também favorece o surgimento dos patógenos. Portanto,
quanto maior o número de procedimentos invasivos, maior o risco de infecção.
Conforme evidenciado em estudo realizado por Galdeano e Rossi(15), o risco para
infecção esteve presente em 100% dos participantes da pesquisa ora
desenvolvida. De acordo com esses autores, a cirurgia rompe a barreira
epitelial, impedindo a chegada de glicose, aminoácido e oxigênio ao tecido.
Desse modo, ocorre o desencadeamento de uma série de reações sistêmicas que
facilitam a ocorrência de infecção. Entretanto, além dos procedimentos
invasivos e da defesa primária insuficiente causada pelo trauma cirúrgico,
outros fatores influenciam na incidência da infecção na ferida operatória, como
idade, estado nutricional, doenças crônicas, permanência hospitalar e fatores
relacionados à circulação extracorpórea.
O diagnóstico de enfermagem Risco para constipação é definido como o risco para
uma diminuição da freqüência normal de evacuação, acrescida da dificuldade
decorrente da passagem de fezes duras e secas(10). Todos os participantes
apresentaram risco para constipação e tinham como fatores de risco os
funcionais (atividade física insufuciente) e os fisiológicos (mudanças nos
padrões habituais de comida e alimentação, além da motilidade diminuída no
trato gastrintestinal). O diagnóstico risco para constipação apareceu em
trabalho desenvolvido(16) com pacientes internados na UTI e com IAM, porém a
freqüencia desse diagnóstico foi de 5%, diferente do presente estudo, no qual a
freqüencia foi de 100%.
Déficit no autocuidado para vestir-se compreende a capacidade prejudicada de
realizar as atividades de arrumar-se(10). No estudo, todos evidenciaram este
déficit. Os pacientes não conseguiam realizar algumas atividades sozinhos, como
tomar banho, vestir-se, cuidar da higiene íntima. No grupo participante, este
diagnóstico mostrou forte relação com a dor na incisão cirurgica e drenos, além
da presença dos acessos. A fraqueza/cansaço também se revelou como fator de
risco, ligado ao procedimento cirúrgico, no qual se perde grande quantidade de
líquidos e eletrólitos e componentes sangüineos. As características definidoras
encontradas entre os participantes foram a incapacidade para retirar ou colocar
itens para o vestuário, vestir roupas, calçar sapatos. Assim como no presente
estudo, em pesquisa sobre pacientes com infarto agudo do miocárdio, Martins e
Garcia(16)identificaram o diagnóstico de Déficit do autocuidado para vestir-se,
com freqüencia de 60%
O banho no leito, a ação de vestir-se e realizar a higiene íntima tornam-se uma
necessidade humana essencial para os pacientes, que precisam de repouso
absoluto, ou cuja mobilidade e locomoção estejam afetadas. Cabe à enfermagem
prestar assistência direta a estes pacientes. Todavia, muitas vezes, o grau de
dependência desses pacientes não é determinado. Alguns deles, ao serem banhados
e arrumados, recebem ajuda maior do que necessitam enquanto outros não têm o
devido auxílio. Na UTI muitos pacientes não possuem capacidade de autocuidado.
Apesar disso, a enfermeira deve avaliar e atentar para a participação dos
paciente no próprio cuidado, como pentear os cabelos e fazer a higiene íntima.
Já o diagnóstico Integridade da pele prejudicada é definido como a alteração da
derme e/ou epiderme(10). Todos os participantes tinham a integridade da pele
prejudicada em decorrência da incisão da cirurgia, pois com a incisão a derme e
a epiderme sofreram alteração. Algumas características definidoras foram
encontradas entre os participantes, a exemplo da destruição da camada da pele
(derme), além do rompimento da pele (epiderme). Outro forte fator relacionado
foi o estado metabólico alterado, pois a cirurgia de RM produz mudanças no
metabolismo dos participantes.
No estudo de Galdeano e Rossi(15), o diagnóstico Integridade da pele
prejudicada também foi comum aos pacientes. Assim, como na presente
investigação, aquele diagnóstico estava relacionado a fatores mecânicos,
secundários aos procedimentos. O paciente submetido a cirurgia cardíaca
permanece imóvel por longo período. Conseqüentemente, aumenta a
susceptibilidade em adquirir uma lesão perioperatória de posicionamento. Além
disso, os agentes anestésicos interferem na vasodilatação e constricção normal,
reduz, portanto, a perfusão para as proeminências ósseas e para as regiões sob
pressão(17).
O diagnóstico Mobilidade física prejudicada esteve presente em grande parte das
pessoas submetidas ao procedimento cirurgico de RM. Entende-se este diagnóstico
como a limitação no movimento físico do corpo ou de uma ou mais extremidades
(10), sendo o fator de risco mais importante a dor relacionada ao movimento do
tórax. O outro fator relacionado e de relevância foi a intolerância à
atividade, diagnóstico comum nos primeiros dias de pós-operatório.
Por Déficit no autocuidado para alimentação entende-se a capacidade prejudicada
para desempenhar ou completar atividades relacionadas à alimentação. Na maioria
dos participantes, este diagnóstico esteve presente. Assim como no Déficit do
autocuidado para vestir-se, este diagnóstico também possuía forte relação com a
dor (esternotomia) e fraqueza. Em estudo semelhante(16), esse diagnóstico está
presente, porém com freqüencia diminuída, apenas 5%.
O diagnóstico Padrão de sono perturbado é definido como distúrbio com tempo
limitado na quantidade ou qualidade do sono(10). Apresenta a insatisfação com o
sono como uma característica definidora. Conforme se acredita, a iluminação do
ambiente, a preocupação com a saúde, a mudança de ambiente e o hábito de sono e
posição estão relacionados com o diagnóstico. Esse diagnóstico também está
presente em outro estudo(16), no qual, a iluminação, o ruído e a temperatura
ambiental comprometiam o sono dos pacientes.
Tais achados contradizem os princípios defendidos por Florence Nightingale,
para quem o ambiente do paciente deve ser terapêutico e restaurador, de modo a
não desperdiçar energia desnecessária, particularmente em virtude de o sono
representar um dos processos restauradores da saúde(17).
Entende-se o diagnóstico Padrão respiratório ineficaz como a não proporção da
ventilação adequada da inspiração e expiração(10) tal como encontrado em boa
parte dos participantes. Identificou-se como característica definidora a
presença de dispnéia e o uso da musculatura acessória para respirar. Alguns
participantes evidenciavam padrão respiratório anormal, como dispnéia e
taquipnéia, e estavam em uso de suporte de oxigênio. A dor, ansiedade e fadiga
da musculatura respiratória estiveram relacionadas ao Padrão respiratório
ineficaz.
Em alguns participantes, percebeu-se o diagnóstico Ansiedade, definido como
preocupação ou medo relacionados à morte(10). Este diagnóstico mostrou-se
evidente devido a mudança no ambiente, a UTI, como um lugar desconhecido e
assustador, além da distância da família, e preocupações financeiras e
familiares. Em estudo já realizado(9), o diagnóstico Ansiedade estava presente
no período pré-operatório mas não no pós-operatório. A ansiedade desses
pacientes estava relacionada ao procedimento cirúrgico e ao medo da morte.
A Desobstrução ineficaz das vias aéreas é definida como a incapacidade do
organismo de eliminar secreções ou obstruções para manter pérvias as vias
aéreas(10). Quando o pulmão possui volume de sangue aumentado nos espaços
intersticiais e alveolares provoca reação e produz secreções. Se essas
secreções estiverem retidas ou forem execessivas dificultam a desobstrução das
vias aéreas. No grupo, o fumo apareceu como fator relacionado. O tabagismo
desencadeia tosse matinal e intensa que pode acumular secreções se não houver
condições de expelir. Alguns pacientes, embora com intensidade diminuída,
estavam com via aérea artificial. As caracteristicas definidoras foram
dispnéia, taquipnéia e tosse ineficaz.
Por Dor aguda entende-se experiência sensorial e emocional desagradável,
podendo ser de início súbito ou lento, com intensidade de leve a grave(10).
Este diagnóstico indicou como característica definidora a expressão facial de
dor, ao tossir e movimentar. Ele justifica-se pela presença da "quebra" da
barreira epitelial e é provocado pela lesão tecidual. Em estudo(18) com
pacientes no pós-operatório, foi encontrado esse diagnóstico, presente em 100%
dos pacientes.
É importante atentar-se para a queixa de dor do paciente, pois, à falta de
cuidados necessários, poderá haver um desencadeamento de ansiedade, com
alterações de sinais vitais e dispêndio de energia.
Em Nutrição desequilibrada: menos que as necessidades corporais, a ingestão de
alimentos insuficientes para satisfazer às necessidades metabólicas é a
definição(10). Os pacientes no pós-operatorio relataram falta de apetite,
provavelmente relacionado à mudança de alimentos, além da ansiedade de
recuperação da saúde. Tal diagnóstico também já foi encontrado(13), esteve
presente em 15% dos participantes.
A Ventilação espontânea prejudicada é definida como a inacapacidade da pessoa
em manter padrão respiratório adequado. Como características definidoras
evidenciadas mencionam-se a dispnéia, o uso da musculatura acessória e a
freqüência cardíaca aumentada. A fadiga da musculatura acessória, também,
estava relacionada a esse diagnóstico. O Risco para intolerância à atividade é
o risco que alguém possui para apresentar insuficiente energia para suportar ou
completar as atividades requeridas. Nesta investigação, os problemas
circulatórios estavam associados a situação na qual a sobrecarga cardíaca
prejudica o dispêndio de energia, e, conseqüentemente, o coração fica com seu
trabalho de bombeamento reduzido.
Os fatores de risco são aqueles que aumentam a vulnerabilidade para a
ocorrência de um evento, enquanto os fatores relacionados apresentam relação
padronizada com o diagnóstico de enfermagem(10). Embora a maioria dos
diagnósticos de enfermagem possuam fatores de risco ou fatores relacionados,
alguns não possuem nenhum dos dois. Entre os fatores relacionados
identificados, os mais comuns foram: mobilidade prejudicada, dor, fraqueza,
ansiedade, fumo, agentes lesivos, fadiga da musculatura respiratória.
A dor é um fator relacionado a alguns diagnósticos, e sua presença causa vários
problemas, como mobilidade, ansiedade, privação do sono e mudança na
alimentação. A mobilidade prejudicada decorre da dor ao movimento, da
existência de drenos, acessos, fraqueza. A ansiedade estava presente em
decorrência da ausência da familia, do ambiente desconhecido, da preocupação
com a saúde, com a família.
Como fatores de risco presentes identificaram-se: procedimentos invasivos,
atividade física insuficiente, mudança nos padrões de alimentação e problemas
circulatórios. A mudança na alimentação provocou diminuição da ingesta das
necessidades nutricionais. Tal fato pode acarretar problemas na recuperação,
cicatrização. Os procedimentos invasivos são risco para infecção, já que a
integridade da pele está prejudicada e, portanto, facilita a entrada de
patógenos. A presença de problemas circulatórios conduziu a risco para
intolerância à atividade, isto é, tais problemas propiciaram intolerância na
mobilização.
3.2 Intervenções e Resultados Sugeridos
A partir dos principais diagnósticos encontrados no estudo. Foram identificadas
as principais intervenções e resultados de acordo com a ligação entre NANDA,
NIC e NOC.
Risco para infecção
- Intervenções: realizar banho; supervisionar a pele durante o banho, os locais
de acesso, a inserção dos drenos, as suturas; cuidar do local da incisão:
realizar curativos esternotomia, safenectomia; cuidar da manipulação de sonda
vesical e drenos; controlar nutrição.
- Resultados esperados: controle de riscos, detectação de riscos, integridade
tissular, cicatrização de feridas por primeira intenção.
Risco para constipação
- Intervenções: proporcionar ambiente reservado; oferecer líquidos, se não
houver restrição hídrica; planejar a dieta; administrar medicamentos quando
prescritos; promover exercício quando possível.
- Resultados esperados: eliminação intestinal, hidratação.
Déficit no autocuidado para vestir-se
- Intervenções: dar banho no leito; assistir no autocuidado para vestir-se/
arrumar-se.
- Resultados esperados: autocuidado para as atividades diárias; vestir-se,
arrumar-se, higiene.
Integridade da pele prejudicada
- Intervenções: cuidar do local de incisão e lesões; proteger contra infecção;
prevenir úlcera de pressão; supervisionar a pele.
- Resultados esperados: integridade tissular: pele e mucosas, cicatrização das
feridas por primeira intenção, autocuidado, estado nuticional.
Mobilidade física prejudicada
- Intervenções: cuidar do repouso no leito; assistir no autocuidado; promover
exercício.
- Resultados esperados: nível de mobilidade, locomoção.
Integridade tissular prejudicada
- Intervenções: cuidar das lesões, suturas; proteger contra infecção; prevenir
úlceras de pressão.
- Resultados esperados: integridade tissular: pele e mucosas, cicatrização de
feridas por primeira intenção.
Déficit no autocuidado para alimentação
- Intervenções: auxiliar durante a alimentação; administrar dieta por sonda
nasogástrica/nasoenteral.
- Resultados esperados: estado nutricional, autocuidado com a alimentação.
Padrão de sono perturbado
- Intervenções: proporcionar ambiente tranqüilo; reduzir ansiedade.
- Resultado esperado: sono.
Padrão respiratório ineficaz
- Intervenções: oferecer e/ou manter oxigenoterapia; monitorizar a função
respiratória.
- Resultados esperados: ventilação, nível de conforto.
Ansiedade
- Intervenções: reduzir a ansiedade, mediante diálogos com o paciente,
informações sobre o estado de saúde.
- Resultados esperados: controle da ansiedade, enfrentamento.
Desobstrução ineficaz das vias aéreas
- Intervenções: oferecer assistência ventilatória; monitorizar a função
respiratória; posicionar o paciente; precauções contra aspiração.
- Resultados esperados: troca de gases, ventilação.
Dor aguda
- Intervenções: administrar análgesicos prescritos; aplicar calor/frio.
- Resultados esperados: controle da dor, nível de conforto, cntrole dos
sintomas.
Nutrição desquilibrada: menos que as necessidades corporais
- Intervenção: auxiliar na alimentação.
- Resultados esperados: estado nutricional: ingestão de alimentos e líquidos.
Ventilação espontânea prejudicada
- Intervenções: monitorizar a função respiratória; posicionar o paciente
adequadamente; oferecer e/ou manter oxigenoterapia.
- Resultados esperados: ventilação espontânea adequada.
Risco para intolerância à atividade
- Intervenções: promover exercício; oxigenoterapia.
- Resultados esperados: controle da dor, ventilação.
Ao fazer a ligação entre os diagnósticos de enfermagem e a classificação das
intervenções de enfermagem e dos resultados, percebeu-se que muitas das
intervenções se repetem, isto é, os diagnósticos estão interligados e,
portanto, as intervenções também aparecem interligadas.
Entretanto, deve-se salientar, as ligações são apenas guias, pois a enfermeira
precisa estar sempre avaliando a situação tanto para ajustar aos diagnósticos
as intervenções como os resultados a fim de adaptá-los à realidade de cada
paciente. As ligações, portanto, não são prescritivas e não substituem o
julgamento clínico da enfermeira.
4. CONSIDERAÇÕES FINAIS
Os resultados deste estudo possibilitaram a elaboração de intervenções de
enfermagem segundo a NIC, para os pacientes no pós-operatório de cirurgia
cardíaca. Este trabalho pode vir a ser o início de um estudo de validação por
meio da prática clínica, ou, ainda, constituir subsídio para as enfermeiras no
cuidado de pacientes no pós-operatório de cirurgia cardíaca.
É fundamental desenvolver pesquisas relacionadas à identificação dos
diagnósticos de enfermagem com o objetivo de direcioná-las à análise de
problemas dos pacientes que demandam ações específicas de enfermagem. Dessa
forma, pode-se contribuir para o desenvolvimento científico da profissão.
Conhecer os problemas de saúde de um grupo de pessoas com características
comuns poderá também direcionar a assistência de enfermagem, ao fornecer
subsídios para a elaboração de planos de cuidados, implementação das
intervenções e avaliação de acordo com as necessidades do paciente.