Satisfação do cliente na avaliação da assistência de enfermagem
REVISÃO
Satisfação do cliente na avaliação da assistência de enfermagem
The costumer's satisfaction in the nursing assistance avaluation
La satisfacción del cliente en la evaluación de la asistencia de enfermería
Regiane PolizerI; Maria D'InnocenzoII
IEnfermeira Graduada pela Fundação de Medicina do ABC, Especialização em Saúde
Pública e Envelhecimento pela Universidade de São Paulo e Especialização em
Gerenciamento dos Serviços de Enfermagem pela Universidade Federal de São
Paulo, São Paulo, SP
IIProfessora Doutora do, Departamento de Enfermagem, Disciplina de Enfermagem
em Saúde Pública e Adm. Aplicada a Enfermagem, da Universidade Federal de São
Paulo, SP
1. INTRODUÇÃO
A busca pela qualidade nos serviços de saúde tornou-se um fenômeno mundial,
conseqüente do aumento da conscientização de que a qualidade é indispensável
para a sobrevivência dos serviços de saúde. Além disso, constitui uma
responsabilidade ética e social(1).
O aumento absoluto e relativo da população adulta e idosa ocasionou um grande
impacto no setor saúde. Crescendo a importância e a necessidade da
quantificação dos recursos de saúde que a população tem que arcar para
satisfazer suas necessidades específicas(2).
No atual mercado cada vez mais competitivo exigindo que as empresas ofereçam
produtos e serviços com padrões cada vez melhores, a qualidade passou a ser
requisito indispensável no processo de produção e na oferta dos serviços. Em
busca da valorização, o mercado tem procurado satisfazer seus clientes. Neste
sentido, faz-se a seguir uma abordagem a respeito do termo qualidade, para
assim compreender a relevância do mesmo no processo de avaliação da assistência
ao paciente.
Na literatura, avaliar consiste em atribuir e/ou conferir valor a algo,
manifestar-se em relação a algo, utilizando para isso procedimentos baseados em
métodos científicos, que podem identificar, obter e proporcionar informações,
além de julgar o mérito e o valor de algo de maneira justa(3).
O referencial teórico mais utilizado por estudiosos no processo de avaliação em
saúde foi estabelecido por Donabedian que aborda estratégias avaliativas nas
áreas de estrutura, possibilitando a avaliação do ambiente onde se desenvolve o
processo de cuidados, processo que disponibiliza avaliação do ponto de vista
técnico e científico, e resultado que evidência o sucesso e qualidade da
assistência oferecida ao paciente, e assim, atingir os objetivos propostos, que
seriam os de promoção, proteção e recuperação da saúde(4).
Sabe-se que a preocupação com a avaliação dos serviços de saúde vem se
manifestando entre outros fatores em conseqüência do aumento da população
brasileira na faixa etária dos 65 anos ou mais(5). Porém, com o aumento dos
custos com a atenção à saúde, e principalmente com aumento de doenças crônico-
degenerativas que acompanham o crescimento da população, torna-se importante
que a avaliação em saúde esteja baseada nas necessidades da população,
permitindo a melhora da qualidade de vida.
A partir, da compreensão do termo avaliação pode-se então partir para definição
do que vem a ser qualidade. Segundo alguns ideólogos como Deming e Juran, a
qualidade consiste nas características do produto e deve visar as necessidades
do consumidor, proporcionando-lhes satisfação em relação ao produto ou serviço
(4).
Em grande parte dos artigos encontrados na literatura, o termo qualidade é
relacionado à expressão "orientada para cliente". O autor Donabedian define
qualidade como algo que é bom para o consumidor, e conseqüentemente definido
por ele e pelo prestador de serviços(3).
Com a evolução industrial e o aumento de clientes cada vez mais exigentes e
cientes de seus direitos como consumidor, exigiu-se maior produtividade,
envolvendo o conceito de qualidade desde o projeto do produto ou serviço
oferecido até a satisfação do consumidor. A qualidade passou então a ser o
objetivo de toda organização, e conseqüentemente da clientela que utiliza os
serviços. Todavia, a preocupação com o cliente vem se intensificando na área da
saúde. Principalmente pela consciência em relação aos direitos do paciente como
cidadão.
No âmbito da enfermagem Florence foi pioneira no processo de avaliação da
assistência, através da iniciativa de separar os enfermos por tipo de
ferimentos durante a Guerra de Crimeía proporcionando a coleta de dados de
mortalidade e morbidade hospitalar. Instituiu princípios básicos de saneamento
e higiene. Apoiando-se na observação sistematizada e em registros estatísticos
que fazia de suas práticas, registros que serviram de suporte para a ciência da
enfermagem(6).
A prática de auditoria médica iniciou nos anos 70, na tentativa de avaliar
aspectos técnicos, éticos e administrativos do desempenho da equipe de saúde.
Nesta época, em virtude das propostas formuladas pela Organização Mundial da
Saúde na Conferência Alma Ata em 1978, foi necessária a expansão da cobertura
assistencial para alcançar o objetivo proposto que preconizava "Saúde para
Todos no Ano 2000"(4,7).
O aumento do investimento no campo da saúde e a necessidade de uma assistência
digna, já evidenciavam a necessidade de estabelecer padrões de atendimento que
servissem de instrumentos de monitorização e avaliação do atendimento prestado
ao paciente. Além disso, o aumento do interesse da população e da participação
dos mesmos fez com que melhorias se tornassem essenciais e conseqüentemente a
opinião dos que utilizam tais serviços também se tornassem importantes(8).
Neste sentido, órgãos Governamentais começaram a empenhar-se na criação de
programas e projetos, além da melhoria dos serviços prestados e assim
prevenindo possíveis agravos à saúde.
Segundo o artigo 196º, CF 1988, é dever do Estado garantir o direito à saúde a
todos mediante políticas sociais e econômicas. A legislação que regulamentou a
CF88 promoveu a implementação do Sistema Único de Saúde SUS que objetivava
reduzir o risco de doença e outros agravos, além de acesso universal e
igualitário às ações e serviços(2). Uma vez que todo cidadão tem direito à
vida, com qualidade e aos serviços de saúde com eficácia, a qualidade da
assistência deve ser garantida por todos os profissionais envolvidos.
A partir de 1990, iniciativas relacionadas ao processo de acreditação
hospitalar começaram a ser incorporadas. Instituído pela portaria nº 3.408 de
cinco de agosto de 1998 do Ministério da Saúde, criou-se o Programa Brasileiro
de Acreditação Hospitalar, visando implantar um processo de melhorias da
assistência. O processo de acreditação engloba todos os serviços da
organização, utilizando indicadores de estrutura, processo e resultados(9,10).
O Ministério da Saúde no sentido de melhorar a assistência de saúde oferecida à
população, desenvolveu através do incentivo financeiro, o aprimoramento da
assistência hospitalar à população e a melhoria na gestão das instituições
hospitalares. Além de altos investimentos em reequipamento e reforma dos
hospitais, também criou o prêmio de Qualidade Hospitalar, para unidades melhor
avaliadas por usuários na Pesquisa de Satisfação da Qualidade do Atendimento
(11).
Com aumento do custo da assistência hospitalar e na tentativa de oferecer
serviços dignos à população sejam eles usuários da rede pública ou privada,
impulsionaram a criação de medidas que promovessem a qualidade no sistema de
saúde. Além disso, o aumento dos investimentos nos serviços de saúde resultou
na expansão dos estudos direcionados ao processo de avaliação, também sobre a
qualidade e os custos do atendimento.
A conduta do enfermeiro inserido neste processo e direcionado ao atendimento de
qualidade objetiva não só a humanização do atendimento, mas também otimização
dos recursos. O profissional de enfermagem deve ser preparado para atuar na
promoção, prevenção, proteção e reabilitação atingindo os mais elevados níveis
de qualidade(12).
Diante da necessidade de um atendimento de saúde de qualidade e da importância
do papel do enfermeiro neste processo. A questão norteadora deste estudo é: a
mensuração da satisfação do cliente é critério para avaliar a assistência de
enfermagem? A partir de um levantamento a cerca deste assunto, pretende-se
analisar se através da percepção do cliente externo pode-se avaliar os serviços
de saúde.
2. OBJETIVO
Destacar a importância da percepção do cliente no processo de avaliação da
assistência de enfermagem.
3. METODOLOGIA
Através de um levantamento bibliográfico de artigos indexados na base de dados
da Bireme e Dedalus, além de publicações ministeriais, de secretarias de saúde
e órgãos federais no período compreendido entre 1990 e 2004.
4. RESULTADOS E DISCUSSÃO
A questão da satisfação do cliente nem sempre foi analisada abordando todos
seus aspectos dentro das organizações. Durante muito tempo a qualidade era
baseada apenas nas decisões, habilidades e competências da equipe médica.
Desde os anos 70, passando pelos anos 80 até os anos 90, passou-se a se falar
em qualidade na área de saúde/hospitalar(7). Porém, foi recentemente que o
cliente passou a ter papel fundamental neste processo e sua opinião passou a
ser introduzida no processo de avaliação.
Com o surgimento do Código de Defesa do Consumidor, criado a partir da Lei
8.078 de 11/09/1990, a relação entre instituição hospitalar e paciente se
estabeleceu, exigindo segurança, qualidade, efetividade e eficácia,
impulsionando um avanço, e estabelecendo normas de proteção e defesa do
consumidor. Além disso, prevê aspectos observados em relação à qualidade de
produtos e serviços, bem como a prevenção e reparação de danos ao usuário,
através da responsabilização do profissional e/ou da instituição(2,4,13) .
Assim empresas mais modernas começaram a estabelecer canais de comunicação com
seus clientes trazendo mais informações, a cerca do que ele deseja.
A expressão "cliente" ou "usuário" caracteriza-se como aquele que recebe o
serviço, ou o benefício de determinado trabalho, ou seja, para quem alguém
efetua/oferece um serviço e sua satisfação tornou-se fator de sucesso(9).
A relação entre um produto ou serviço de qualidade e a opinião do cliente tem
sido repetidamente abordada. O cliente satisfeito pode representar cerca de
mais de 25% do total em uma avaliação(14). No sistema atual de atenção à saúde
os pacientes não querem mais ser tratados como meros dependentes, exigindo
envolvimento no processo de tomada decisão em relação ao tratamento(15).
A percepção do cliente e sua satisfação estão ligadas ao serviço de qualidade.
A performance do serviço e os seus resultados na maioria das vezes está focada
nas necessidades dos clientes e em suas expectativas, demonstrando que a
satisfação do cliente é de fundamental importância como medida de qualidade,
além de um grande instrumento no gerenciamento do serviço.
A qualidade em serviços depende de quanto o mesmo corresponde às expectativas
dos clientes. Entretanto, tais expectativas podem ser influenciadas por
diversos fatores, assim, reconhece-las é de fundamental importância para os que
gerenciam a prestação de serviços. Dentre os fatores que contribuem para a
qualidade nos serviços de saúde, encontram-se: competência profissional,
satisfação dos usuários em relação ao tratamento oferecido, acessibilidade,
eficácia e eficiência(3).
O autor Donabedian atribuiu ao termo qualidade como aquilo que é bom para o
consumidor, definido por ele e pelo prestador de serviços(7).A análise da
satisfação dos usuários é citada como um indicador o qual se obtêm a opinião a
respeito dos aspectos estruturais, o processo e o resultado(16).
A satisfação é definida como a reação do cliente à experiência de utilizar um
serviço ou adquirir um produto de acordo com a sua expectativa. É o sentimento
de prazer ou desapontamento através da comparação do desempenho esperado em
relação às expectativas do individuo. È percebida como uma função de desempenho
e expectativa percebidos(4,17,18).
A busca pela satisfação do cliente está presente durante todo o processo de
aquisição ou utilização dos produtos/serviços. Os clientes, usuários e aqueles
que detêm o poder de influenciá-los determinam a última palavra e até que ponto
um produto atende ou não as suas necessidades e é capaz de satisfazer suas
expectativas.
As expectativas do cliente constituem padrões de qualidade, pois os clientes
avaliam a qualidade do serviço comparando o que desejam ou esperam. Quando os
serviços recebidos atendem as expectativas do cliente, bons resultados são
obtidos. Assim, pode-se dizer que quanto mais se conhece o cliente, mais é
possível conhecer quais suas expectativas, criando a possibilidade de
estratégias de melhoria.
A interação entre o cliente e o prestador, reflete a qualidade em serviços,
pois quem consome está constantemente observando e avaliando o processo. Sendo
assim a percepção do cliente, ou seja, como percebe o serviço oferecido, é um
dos grandes componentes de qualidade na prestação de serviço em saúde(11).
A qualidade e a satisfação podem então mostrar o quanto o serviço e seus
resultados, vão ao encontro às expectativas. Visto que em qualquer serviço, o
que importa é como o cliente vê o serviço(19).
O serviço completo é aquele moldado segundo os padrões técnicos de qualidade, e
que é percebido pelos que o consomem. Quando o cliente não percebe valor algum,
de pouco valem os esforços empreendidos para produzir algo de qualidade. Neste
sentido, pode-se afirmar que a qualidade percebida pelo cliente é a que mais
agrega valor ao produto(4).
O trecho de autoria de Donabedian afirma que a satisfação do paciente é de
fundamental importância na medida de qualidade da assistência, pois proporciona
informações sobre os resultados do provedor da assistência em relação aos
valores e expectativas do paciente, além de constituir um instrumento valioso
de investigação, administração e planejamento(3).
A satisfação está ligada à qualidade do serviço ou do produto que se oferece. E
quem consome é quem percebe a qualidade. Assim, não é o bastante oferecer
produtos ou serviços de qualidade do ponto de vista técnico, se, o cliente não
percebe a qualidade(18).
Em um estudo realizado a satisfação do paciente com o serviço de saúde esteve
associada com a capacidade resolutiva do serviço. A percepção dos pacientes em
relação a resolutividade alcançada 15 dias após o contato com o serviço de
saúde, foi de 87,9%. Cerca de 90% dos pacientes, ou seus responsáveis se
disseram satisfeitos com o atendimento recebido no Posto(20).
Os clientes tendem a ter maiores expectativas em relação ao resultado do
serviço. Assim o desempenho do serviço pode gerar frustração no cliente ou
surpreender o cliente de forma agradável, podendo haver variação segundo
cliente e a ocasião devido a uma série de fatores pessoais e externos.
O usuário dos sistemas de saúde tem a expectativa de ser atendido por
profissionais qualificados. Para garantir a sobrevivência dos hospitais, é
necessário garantir clientela. Neste sentido, o poder público tem começado a
ouvir a população e estimular o desenvolvimento de programas de qualidade nos
seus serviços próprios. No município de São Paulo, durante o ano 2000, quase
todos os hospitais considerado de alto custo alto preço e boa qualidade
apresentaram taxa de ocupação próxima a 90%(7).
A satisfação com o serviço de saúde associada à resolução do problema que
motivou o cliente a procurar o serviço, avaliando e comparando o que deseja com
aquilo que experimenta, reflete o que ele espera e o que acha aceitável(21,22).
O sistema de qualidade descentralizado envolve a participação de todos estando
voltado à satisfação dos clientes externos. Neste sentido acredita-se que a
mobilização de todos os que integram a equipe de enfermagem devem estar
orientados ao aprimoramento da qualidade de seus serviços e assim conquistar a
satisfação de seus clientes.
O enfermeiro tem a responsabilidade de garantir e estabelecer um processo de
comunicação favorável à interação e compartilhar expectativas, valores e
sentimentos entre ele e os clientes(16). Além disso, o enfermeiro atua como
elemento chave no atendimento de qualidade. À medida que o enfermeiro interage
com o paciente é estabelecido um canal de comunicação e conseqüentemente
auxiliando no atendimento das necessidades, desejos e decisões do paciente,
facilitando e promovendo eficazmente a cooperação do paciente em relação às
observações prescritas. O diálogo entre o prestador e o cliente oferece
benefícios à Instituição, pois informa o que está errado e orienta como tornar
o serviço melhor(19).
O cliente auxilia na detecção problemas, desta forma, a equipe deve reconhecer
o impacto que suas atividades exercem em seus clientes. A falta de compromisso
e liderança tanto na definição de metas da qualidade quanto na alocação de
recursos é decisiva para um programa efetivo de gestão da qualidade total
podendo prejudicar o andamento do processo.
O cliente merece ser contemplado com ações que tornem a sua passagem pelo
hospital a mais agradável e resolúvel possível(11). Receber tratamentos sem
efeitos colaterais não significa para eles bom atendimento. Resultados clínicos
não são equivalentes a ganhos em bem estar nem a beneficio social pela
sobrevida ou até pela cura. Assim, atitudes de cuidado, comunicação entre
outras estratégias diminuem a ansiedade e os riscos de insatisfação(7).
5. CONSIDERAÇÕES FINAIS
A satisfação do cliente é um dos elementos fundamentais da qualidade. Inserido
no processo de avaliação dos serviços de saúde, o paciente ou cliente tem papel
fundamental no processo de avaliação da assistência. Caracterizando-se como
fonte de opiniões e sugestões, que conseqüentemente auxiliam na mensuração da
satisfação e desta forma contribuindo no processo de melhoria dos serviços
oferecidos.
O enfermeiro deve garantir ao cliente, uma assistência livre de danos, sejam
estes físicos ou morais, devendo atuar como ponte facilitadora, sendo capaz de
perceber as necessidades do cliente. Reconhecer valores e esclarecer dúvidas
estabelecendo uma relação de confiança entre ambos os lados. O cliente/paciente
deve sentir-se valorizado e confiante, capaz de manifestar suas próprias
críticas e sugestões com clareza e sem medos, transmitindo sua real opinião em
relação ao serviço oferecido.