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BrBRCVHe0034-71672010000100023

BrBRCVHe0034-71672010000100023

variedadeBr
Country of publicationBR
colégioLife Sciences
Great areaHealth Sciences
ISSN0034-7167
ano2010
Issue0001
Article number00023

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Polifarmácia: interações e reações adversas no uso de medicamentos por idosos

INTRODUÇÃO O uso de medicamentos constitui-se hoje uma epidemia entre idosos, cuja ocorrência tem como cenário o aumento exponencial da prevalência de doenças crônicas e das seqüelas que acompanham o avançar da idade, o poder da industria farmacêutica e do marketing dos medicamentos e a medicalização presente na formação de parte expressiva dos profissionais da saúde.

As consequências do amplo uso de medicamentos têm impacto no âmbito clínico e econômico repercutindo na segurança do paciente. E, a despeito dos efeitos dramáticos que as mudanças orgânicas decorrentes do envelhecimento ocasionam na resposta aos medicamentos, a intervenção farmacológica é, ainda, a mais utilizada para o cuidado à pessoa idosa(1).

No Reino Unido, cerca de dois terços dos idosos utilizam medicamentos prescritos ou não, e um terço de todas as prescrições é feito para estas pessoas(2-3) . Nos Estados Unidos os idosos foram responsáveis pela aquisição de um terço das prescrições médicas emitidas, e por 40% dos medicamentos vendidos sem receita médica(4). No Brasil estima-se que 23% da população consome 60% da produção nacional de medicamentos, especialmente as pessoas acima de 60 anos(5). O Estudo Saúde, Bem-estar e Envelhecimento (SABE) realizado com 2.143 idosos da cidade de São Paulo apontou que 84,3% deles usaram medicamentos(6). Em outras cidades brasileiras de diferentes estados, observou-se que 69,1% a 85% dos idosos usava um medicamento prescrito, demonstrando a alta prevalência de consumo nesta faixa etária(7-9) Os prejuízos e desfechos negativos do uso de medicamentos por idosos são bem reconhecidos e estudados(1-4,10). A freqüência de eventos adversos relacionados aos medicamentos é maior nesta faixa etária, aumentando expressivamente de acordo com a complexidade da terapia. O risco de ocorrência aumenta em 13% com o uso de dois agentes, de 58% quando este número aumenta para cinco, elevando- se para 82% nos casos em que são consumidos sete ou mais medicamentos(10).

As repercussões potenciais desse uso podem ser consideradas um importante problema de saúde pública, pois estão relacionadas ao aumento da morbimortalidade. Nos Estados Unidos, para cada dólar gasto em medicamento são gastos US$ 1,33 para tratar adversidades relacionadas à toxicidade(1). No Brasil, a despeito da importância econômica dos problemas decorrentes do uso de medicamentos, ainda não existem estudos que tenham avaliado tal repercussão no sistema de saúde.

Tendo em vista que entre os idosos, os eventos adversos associados aos medicamentos têm a polifarmácia como principal protagonista e que as reações adversas a medicamentos (RAM), bem como as interações medicamentosas (IM) representam as conseqüências mais diretamente relacionadas, buscou-se refletir o impacto desses elementos na saúde do idoso.

POLIFARMÁCIA A polifarmácia definida como o uso de cinco ou mais medicamentos, aumentou de modo importante nos últimos anos, apesar de não ser uma questão contemporânea.A magnitude deste fenômeno evidenciou-se nos Estados Unidos, quando esta prática passou a configurar como um dos problemas de segurança relacionado ao uso de medicamento(1,3). Sua etiologia é multifatorial. Todavia, as doenças crônicas e as manifestações clínicas decorrentes do envelhecimento, apresentam-se como os principais elementos.

Nos países desenvolvidos, estima-se que 20% a 40% dos idosos utilizem múltiplos agentes associados e no mínimo 90% das pessoas neste grupo recebem pelo menos um agente, sendo estimada uma média de quatro por individuo(3,10). No Brasil, cujo numero de medicamentos disponíveis no mercado aumentou em 500% nos últimos anos, apresentando cerca de 17.000 nomes genéricos/comercias o consumo de múltiplos medicamentos ocorre em distintas cidades(11). No Estudo SABE verificou-se a polifarmácia em 31,5% da amostra(6). Na cidade de Fortaleza observou-se que 13,6% dos idosos usava cinco ou mais medicamentos prescritos (9).

A polifarmácia esta associada ao aumento do risco e da gravidade das RAM, de precipitar IM, de causar toxicidade cumulativa, de ocasionar erros de medicação, de reduzir a adesão ao tratamento e elevar a morbimortalidade.

Assim, essa prática relaciona-se diretamente aos custos assistenciais, que incluem medicamentos e as repercussões advindas desse uso. Neste são incorporados os custos de consulta a especialistas, atendimento de emergência e de internação hospitalar. Em paises desenvolvidos o custo anual foi de 76,6 bilhões de dólares(10).

O risco de RAM aumenta de três a quatro vezes em pacientes submetidos a polifarmácia, podendo imitar síndromes geriátricas ou precipitar quadros de confusão, incontinências e quedas(4,12-13. É frequente o idoso apresentar de duas a seis receitas médicas e utilizar a automedicação com dois ou mais medicamentos, especialmente para aliviar sintomas como dor e constipação intestinal. Esta situação pode ocasionar eventos adversos, uma vez que o uso simultâneo de seis medicamentos ou mais pode elevar o risco de IM graves em até 100%(11). Uma revisão sobre os óbitos mostrou que 18,2% das mortes foram diretamente associadas ao uso de mais de um medicamento(14).

A incidência de erros de medicação, como conseqüência da polifarmácia, foi de 15% quando o idoso utilizou um medicamento, elevando-se para 35% quando o número foi igual ou superior a quatro(3).

REAÇÕES ADVERSAS A MEDICAMENTOS A RAM é a resposta a um medicamento que seja prejudicial, não intencional e que ocorre em doses normalmente utilizadas no ser humano(15).

Em idosos as RAM representam um importante problema de saúde pública, cuja relação de risco é bem estabelecida(16). Estima-se que o risco para RAM e de hospitalização decorrente seja, respectivamente sete e quatro vezes maior em idosos do que em jovens(1). Na Europa 20% dos idosos procuraram serviço ambulatorial devido a RAM, e cerca de 10-20% das internações em hospitais geriátricos foram relacionadas a elas(17). Em idosos que utilizaram agentes impróprios, a prevalência foi de 30,4%(14,17).

Embora entre os idosos as RAM apresentem-se com maior gravidade que entre os jovens, não são, muitas vezes, identificadas ou relatadas. A idade por si não representa um fator de risco, mas um indicador para co-morbidade, pois neste grupo a farmacocinética alterada e a polifarmácia são as variáveis mais diretamente associadas as RAM(1-3).

De modo geral, as RAM são associadas a desfechos negativos da terapia. Elas podem influenciar a relação médico-paciente, uma vez que a confiança no profissional pode ser abalada; retardar o tratamento, pois muitas por assemelhar-se a manifestações clínicas típicas de doenças, demoram a serem identificadas, limitar a autonomia do idoso e afetar a qualidade de vida.

Em muitos casos o tratamento da RAM inclui a inclusão de novos medicamentos a terapêutica, elevando o risco da cascata iatrogênica. O ideal, quando possível, é realizar a suspensão ou redução da dose do medicamento.

Alguns dos medicamentos ou classes terapêuticas envolvidas em RAM, que apresentam conseqüências graves nos idosos são ilustradas no Quadro_1(12-14,16- 18).

INTERAÇÕES MEDICAMENTOSAS Uma interação ocorre quando um medicamento influencia a ação de outro(19). A gravidade, prevalência e possíveis conseqüências das IM estão relacionadas a variáveis como condições clínicas dos indivíduos, número e características dos medicamentos. Esses fatores são agravados pelo mau uso não intencional que ocorre devido a problemas visuais, auditivos e de memória. Deste modo, idosos representam o grupo mais vulnerável, visto que a maioria das IM ocorre através de processos que envolvem a farmacocinética e/ou farmacodinâmica do medicamento.

Quadro_2

Estima-se que o risco de apresentar IM seja de 13% para idosos que usam dois medicamentos, de 58% para aqueles que recebem cinco. Nos casos em que o uso desses agentes é igual ou superior a sete, a incidência eleva-se para 82%(12).

Em pacientes clínicos observou-se que a média de medicamentos prescritos na alta foi maior (6) do que na admissão (4.5), e que em 47,8% da amostra, o número de IM potenciais identificadas na admissão hospitalar foi igual ao da alta, demonstrando que nem sempre o idoso no domicilio é menos susceptível ao evento(19). No Brasil estudo realizado em hospital público mostrou que 61,8% dos idosos apresentaram pelo menos uma RAM, sendo que 15% foram relacionadas à IM potenciais(20).

Muitos medicamentos comumente usados por idosos como, por exemplo, antiinflamatórios não esteroidais (AINE), beta-bloqueadores, inibidores da enzima conversora de angiotensina (IECA), diuréticos, digoxina, antilipidêmicos, depressores do sistema nervoso central são potencialmente interativos. , ainda, os indutores (fenitoina, carbamazepina) e inibidores enzimáticos como, por exemplo, cimetidina, omeprazol que, freqüentemente, encontram-se envolvidos nas IM, que ameaçam a saúde do idoso(10,12,16,18-20).

Apesar do difícil estabelecimento de relação causal, é possível predizer algumas IM. Deste modo, é fundamental que os profissionais conheçam esses medicamentos potencialmente interativos, no intuito de prevenir eventos adversos decorrentes da combinação terapêutica.

A amiodarona e a digoxina usadas por muitos idosos que apresentam doenças cardiovasculares são implicadas em IM graves que podem causar, respectivamente cardiotoxicidade e intoxicação digitálica. Muitas das IM apresentam grande magnitude podendo resultar em morte, hospitalização, injúria permanente do paciente ou insucesso terapêutico. Todavia, IM que não causam dano aparente no idoso, porém o impacto é silencioso, tardio e, às vezes, irreversível. A terapia combinada dos AINE e diuréticos tiazidicos, bem como dos IECA e AINE podem causar alteração da função renal, desequilíbrio eletrolítico, além de afetar a eficácia da terapia antihipertensiva. Alguns dos medicamentos, que apresentam características potencialmente interativas foram ilustrados no Qauadrio 2 com as respectivas interações potenciais e desfechos clínicos(3- 4,10,12,16,18-20).

Os riscos estimados nos estudos provenientes principalmente de paises desenvolvidos podem, inicialmente, parecer elevados e não fornecer uma analise risco-benefício para terapia individual. Todavia, RAM e IM são subestimadas no mundo inteiro. Muitos desses eventos não são reconhecidos pelo paciente, familiar, tampouco pelos profissionais, especialmente quando a polifármacia é demasiadamente complexa. Além disso, muitos profissionais imaginam as RAM e IM em termos de desfechos catastróficos como arritmias, convulsões, morte, que embora sejam respostas possíveis, representam somente a ponta do iceberg. No dia-a-dia, as conseqüências desses eventos como tontura, sedação, hipotensão postural, quedas, confusão, frequentes em idosos e aparentemente menos dramáticas, podem aumentar o perfil de morbimortalidade deste grupo etário.

CONSIDERAÇÕES FINAIS A vulnerabilidade dos idosos aos eventos adversos relacionados a medicamentos é bastante alta, o que se deve a complexidade dos problemas clínicos, à necessidade de múltiplos agentes, e às alterações farmacocinéticas e farmacodinâmicas inerentes ao envelhecimento.

Neste cenário, o grande desafio dos enfermeiros no Brasil que esta envelhecendo é contribuir na promoção do uso racional dos medicamentos. A educação dos usuários, especialmente no que concerne à prática da automedicação, inclusive de fitoterápicos; a orientação acerca dos riscos da interrupção, troca, substituição ou inclusão de medicamentos sem conhecimento dos profissionais da saúde; o aprazamento criterioso dos horários da prescrição/receita médica, de modo a evitar a administração simultânea de medicamentos que podem interagir entre si ou com alimentos; o monitoramento das RAM implicadas em desfechos negativos são algumas estratégias que podem ajudar a prevenir e minimizar os eventos adversos.

Além disso, esforços coletivos podem otimizar essas iniciativas. Os programas específicos de atenção ao idoso como os existentes nos centros de referencia e nas universidades da terceira idade podem funcionar como ancoras para realização de cursos ou programas educativos, que ofereçam subsídios para que cuidadores, familiares e o próprio idoso possam utilizar os medicamentos de maneira mais segura.


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