Diabetes gestacional na perspectiva de mulheres grávidas hospitalizadas
INTRODUÇÃO
O diabetes mellitus gestacional (DMG) é o problema metabólico mais comum na
gestação. Tem prevalência entre 3% a 13% das gravidezes, dependendo de cor/
raça, população e critérios diagnósticos utilizados(1). Caracteriza-se por
qualquer nível de intolerância a carboidratos, que resulta em hiperglicemia de
intensidade variável, identificada pela primeira vez no decorrer da gestação(2-
3). O DMG vem crescendo em proporções semelhantes à prevalência do diabetes
mellitus tipo 2 (DM2). Nos últimos 20 anos, aumentou significativamente nos
Estados Unidos, onde foi registrada prevalência de 1,4% a 6,1%, enquanto que,
no Brasil, estima-se estar entre 2,4% e 7,2%(1,3-4).
O controle inadequado do DMG aumenta os riscos, as complicações e os efeitos
adversos para o binômio mãe-filho no período pré-natal e neonatal. Ter diabetes
na gestação eleva a possibilidade de desenvolvimento de DM2 para a mulher após
o parto e, em cada gravidez, aumenta o risco das crianças desenvolverem a
doença(5). Esses aspectos advindos da confirmação do diagnóstico, por sua vez,
desencadeiam sérias repercussões no estado emocional das gestantes acometidas
(6), agravadas pela obrigatoriedade da internação.
Dadas as variadas facetas que envolvem o assunto em pauta, ultimamente o DMG
tem sido amplamente estudado em seus aspectos fisiopatológicos, com destaque
para a busca de evidências fortes que possam ser utilizadas na prática clínica
(1,7-8). Entretanto, pouco se conhece sobre as experiências vivenciadas pelas
gestantes que desenvolvem o DMG, o que evidencia a existência de lacunas na
literatura acerca desse conhecimento específico(5). Particularmente, no que se
refere à cidade de Fortaleza - Ceará, as experiências das mulheres acerca do
diabetes mellitus na gravidez ainda não foram investigadas. Desse modo, o
objetivo da presente pesquisa foi compreender o significado das experiências
vivenciadas por mulheres com DMG.
MÉTODO
Trata-se de um estudo qualitativo. O pesquisador que utiliza essa abordagem
acredita que os seres humanos são únicos e atribuem significados singulares às
suas experiências e que essas derivam do seu contexto de vida, isto é, da
matriz de relações estabelecidas entre os seres humanos versus ambiente, que
constituem o cotidiano(9). O referencial teórico-metodológico adotado foi a
Fenomenologia, que permite descrever em profundidade a experiência humana e
construir seu significado por meio do diálogo intensivo, neste caso, com
mulheres acometidas pelo DMG(10).
A investigação foi desenvolvida na clínica obstétrica de uma maternidade-escola
situada em Fortaleza, no período de abril a outubro de 2007. Foram recrutadas,
por conveniência, 12 mulheres mediante convite feito durante visita às
enfermarias. Estabeleceram-se os critérios de inclusão: ter diagnóstico de DMG
confirmado no prontuário de saúde e estar internada no período da coleta de
dados. Como critérios de exclusão foram considerados: gestantes que tinham
outras condições clínicas associadas, bem como as que estavam impossibilitadas
de participar das sessões de arteterapia.
As participantes assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido e as
entrevistas abertas foram iniciadas com a questão: Conte-me como é, para você,
ter diabetes gestacional e estar internada?
Adicionalmente, para obter dados em profundidade, foram elaboradas questões
complementares: Fale sobre o que você sentiu quando soube que tinha diabetes
gestacional; Fale sobre o que sentiu quando soube que iria ficar internada;
Como tem sido seu relacionamento com a família no período da internação? Como
tem sido seu relacionamento com os profissionais durante a internação? Como tem
sido seu relacionamento com as outras pacientes da enfermaria? Como você está
enfrentando esta situação?
Também foi solicitado que as participantes expressassem, por meio de desenhos,
os sentimentos que emergiram da vivência do fenômeno investigado. O desenho é
uma forma de linguagem que permite à pessoa comunicar-se com os outros,
possibilitando ao ser humano manifestar ideias, crenças e sentimentos ao se
defrontar com determinadas situações(11).
Além disso, utilizou-se um formulário para o registro dos dados
sociodemográficos, do histórico obstétrico e da gestação atual, os quais foram
obtidos por meio da consulta ao prontuário de saúde.
A coleta de dados ocorreu nas enfermarias e as entrevistas foram audiogravadas,
bem como os relatos verbais produzidos pelas participantes a partir de seus
desenhos. A amostra foi definida a partir da saturação dos discursos(12).
O material empírico foi transcrito na íntegra e, posteriormente, organizado e
analisado pelo método fenomenológico, tal como proposto por Colaizzi(13), que
abrange os passos seguintes: (1) ler todos os dados para visualizar o todo; (2)
revisar cada dado e extrair as afirmações significativas; (3) declarar o
significado de cada afirmação significativa, formular significados; (4)
organizar os significados formulados em grupos de temas; (5) integrar os
resultados em uma descrição exaustiva do fenômeno em estudo; (6) formular uma
descrição exaustiva do fenômeno em estudo, com uma afirmação de identificação
tão inequívoca quanto possível; (7) questionar os participantes sobre os
achados, como um passo final de validação. No presente estudo, os resultados
também foram validados com as enfermeiras do serviço.
Ademais, utilizou-se a literatura pertinente ao tema e os conceitos da
Fenomenologia Existencial de Heidegger(14). Vale destacar que os desenhos foram
interpretados pelas próprias participantes, uma vez que foram utilizados seus
relatos - e não os desenhos em si - como fonte de acesso às vivências,
complementar às entrevistas.
O projeto de pesquisa foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da
Maternidade Escola Assis Chateaubriand, Protocolo n° 03/2007. A pesquisa foi
conduzida em conformidade com os padrões éticos exigidos.
RESULTADOS
As doze participantes tinham entre 19 e 44 anos; onze eram casadas, quatro
haviam cursado o Ensino Médio e três, o Fundamental. Quatro eram empregadas
domésticas e três, do lar. Quatro estavam na primeira gestação; três, na
segunda e outras três, na terceira.
O corpus de pesquisa foi constituído pelo conjunto formado pelas entrevistas e
relatos produzidos sobre os desenhos. Da análise empreendida, emergiram dois
temas: "vivenciando experiências que trazem felicidade e bem-estar" e
"vivenciando experiências que provocam sofrimento".
A. Vivenciando experiências que trazem felicidade e bem-estar
Apesar de se encontrarem em situação de risco e distantes da família e de seus
domicílios, as participantes expressaram sentimentos prazerosos diversificados,
que foram divididos em três subtemas: possibilidade de ser mãe, acesso à
internação hospitalar e convivência com outras mulheres sob condições
idênticas.
Possibilidade de ser mãe
Só de lembrar que estou com uma criança, uma criança que eu desejei
muito [...]. (P1)
Estar grávida para mim é uma realização [...]. (P2)
Algumas mulheres tinham histórico de abortos porque desenvolveram DMG em
gravidezes anteriores. A alegria pela nova oportunidade de ter filhos, bem como
a esperança de levar a gestação a termo e ter uma criança saudável, permeavam
seu cotidiano. Ao complementar a descrição de sua vivência por meio do desenho
(Figura_1), uma das participantes expressou que, apesar de tudo, ainda tinha
muitos motivos para comemorar.
Figura 1 - Nesse desenho tem corações, árvores e flores que, juntos, formam um
bonito quadro representando a minha felicidade [...]. (P3)
Acesso à internação hospitalar
Quase todas as mulheres relataram que tiveram fácil acesso à hospitalização, o
que possibilita um controle rigoroso do DMG em virtude dos cuidados da equipe
de profissionais de saúde. Essa acessibilidade despertou nas gestantes a
esperança da cura após o parto, fortalecendo o sentimento de segurança e a
motivação para o autocuidado. Assim, ao superarem o impacto do diagnóstico,
começaram a lutar, sobretudo pela saúde do bebê.
[...] mas, depois que eu soube que poderia ser tudo recuperado, eu me
conformei, parti para a batalha [...] eu vou ter vitória [...]. (P3)
Eu estar aqui, recebendo todo esse tratamento, está me dando força
[...] eu vou ter minha filha sadia [...]. (P1)
O nascimento de um bebê saudável foi uma preocupação recorrente manifestada
pelas grávidas e, por esse motivo, referiram suportar bem a hospitalização. Uma
das gestantes destacou que se considerava feliz porque, após enfrentar
dificuldades para obter a internação em outras instituições de saúde,
finalmente conseguiu ser hospitalizada para o tratamento do DMG, minimizando
assim seu sofrimento.
[...] eu tive dificuldade de ser recebida nos outros hospitais [...]
fiquei abalada quando me mandaram de volta [...] quando me receberam
aqui foi uma vitória. Eu estou feliz por estar aqui [...]. (P1)
Os sentimentos que emergiram desse discurso também foram manifestados por meio
do desenho (Figura_2), que ilustra a transformação da tristeza em alegria.
[/img/revistas/reben/v66n2/11f02.jpg]
Figura 2 - Os dias de chuva representam a tristeza pela dificuldade de acesso à
hospitalização, e os dias de sol, a alegria de ter iniciado o tratamento. (P1)
A relação com os profissionais da clínica obstétrica também foi descrita como
um recurso importante para obter bons resultados no tratamento. As
participantes destacaram a dedicação da equipe de saúde, o que está retratado
nos trechos seguintes.
A minha médica e outras pessoas que vêm para me acompanhar têm uma
atenção muito grande [...] As enfermeiras gostam de brincar, para
apagar aquela coisa de momento ruim, quando vem aquela furadinha
[...]. (P1)
Aqui me trataram bem, são muito educados [...] Agora estou mais
calma, já consegui controlar a pressão e a glicose [...]. (P4)
Convivência com outras mulheres em condições idênticas
Compartilhar com outras pessoas o mesmo diagnóstico foi percebido pelas
gestantes como uma experiência positiva, configurando uma rede de apoio que se
inicia e consolida-se durante a internação. As novas relações cotidianas,
estabelecidas com as demais gestantes, evidenciam a possibilidade de olhar o
outro que está em situação idêntica ou até mais grave. Assim, a solidariedade
se estabelece na relação de um ser com o outro, dando lugar a uma interação
prazerosa, caracterizada pelo cuidado consigo e com o outro.
Porque a gente vai ouvindo, vai convivendo com as pessoas, e a gente
vê que não é só a gente que está com problemas [...] então, eu estou
procurando encarar que o meu problema, perto de muitas, é até pequeno
[...]. (P5)
E você pode, apesar da sua dificuldade, ajudar alguém, e eu estou
ajudando... é uma lição de vida. (P6)
Os benefícios advindos das relações interpessoais deflagradas a partir da
internação foram ilustrados na Figura_3. No quadrante superior esquerdo da
figura estão representadas as colegas de enfermaria da participante e o bom
relacionamento estabelecido com elas.
[/img/revistas/reben/v66n2/11f03.jpg]
Figura 3 - A boneca sou eu e os cogumelos são para enfeitar. Minha vida depois
do diabetes tem sido aqui no hospital. (P7)
B. Vivenciando experiências que provocam sofrimento
Além dos aspectos positivos vivenciados com o DMG, as participantes expressaram
sentimentos que sugerem sofrimento. Essas vivências foram subdivididas em dois
subtemas: impacto do diagnóstico, afastamento da família e do domicílio.
Impacto do diagnóstico
O impacto do diagnóstico inesperado de DMG ocasionou temores devido a suas
possíveis consequências para as gestantes e os bebês, bem como a necessidade de
internação. Uma das participantes relatou que veio sozinha para a consulta pré-
natal, como fazia todos os meses, e que, tendo sido comunicada sobre a
necessidade da internação imediata, não pôde retornar para casa para se
preparar.
Eu vim sozinha para fazer uma consulta pré-natal [...] foi um choque
[...]. (P2)
[...] a gente corre muito risco [...] tenho medo que alguma coisa
aconteça com a minha filha [...]. (P7)
O temor manifestado também esteve relacionado a experiências anteriores de
perdas de familiares em decorrência de complicações do DM.
Meu pai teve diabetes e faleceu devido a isso. (P8)
A figura_4 representa, segundo a descrição da participante, a reação emocional
frente ao impacto do recebimento abrupto do diagnóstico.
[/img/revistas/reben/v66n2/11f04.jpg]
Figura 4 - [...] Quando eu descobri que estava com diabetes o meu coração ficou
assim, bem apertado, e eu me senti presa, sem saber o que fazer, para onde
correr [...] O rosto é o meu rosto triste, preocupada [...]. (P2)
Afastamento em relação à família e ao domicílio
A ruptura da sensação de continuidade do cotidiano e o distanciamento em
relação aos familiares e o lar provocam, inicialmente, a não aceitação da
situação crítica vivenciada, sobretudo quando estão envolvidos filhos menores,
dependentes de cuidados. Em alguns casos, as participantes contam com uma rede
social de apoio constituída por irmãs, avós e maridos. Em outros, os filhos
ficam sob os cuidados de pessoas que não fazem parte do círculo familiar, o que
as deixa inseguras.
[...] eu não estava esperando ficar longe do meu filho, e me pegou de
surpresa [...]. (P9)
[...] Eu tenho um neném de três anos e ele fica com minha filha de
12, aí fica ruim é a primeira vez que eu fico longe dele [...]. (P10)
[...] Eu tenho que deixar a minha filha com alguém, esta tem sido
minha maior preocupação até hoje [...]. (P9)
DISCUSSÃO
O rigor de um estudo qualitativo pode ser estimado de várias maneiras. Na
presente investigação utilizou-se o critério da credibilidade ao se proceder a
validação dos dados com as participantes e as enfermeiras que prestavam
cuidados na clínica obstétrica. Para tanto, as colocações feitas por ocasião
das entrevistas foram lidas pelas gestantes para que pudessem confirmar ou
modificar o conteúdo obtido, bem como pelas enfermeiras que, baseadas na
experiência prática, opinaram sobre a pertinência dos discursos. Além disso, o
critério de confirmabilidade também foi considerado, visto que a enfermeira
responsável pela coleta de dados tinha experiência na assistência de enfermagem
a mulheres internadas com DMG. Assim, os achados puderam ser trabalhados
criteriosamente, de modo que fossem posteriormente confirmados(15).
As mulheres expressaram suas percepções e sentimentos acerca do DMG por meio de
linguagem verbal e de desenhos. O desejo de ser mãe sobrepôs-se à gestação de
risco, apesar do potencial ameaçador da gravidez com DMG. A vontade de ter um
filho muitas vezes supera o medo de enfrentar complicações no desenrolar da
gravidez(6,16). Contudo, é necessário considerar fatores tais como história
pessoal da gestante, idade, seu passado obstétrico, contexto da gravidez e a
qualidade do vínculo com o parceiro, para compreender as reações dessas
mulheres e suas vivências do ciclo gravídico-puerperal, considerando sua
complexidade(16). A experiência vivida em uma gravidez com DMG pode resultar em
mudança de atitude, do estilo de vida e em motivação para realizar o
autocuidado na tentativa de preservar a saúde e a vida do binômio mãe-filho
(17).
Embora a hospitalização seja necessária para o controle do DMG, nem sempre as
mulheres conseguem ter acesso a um serviço especializado, com os recursos
humanos e o suporte material necessários. Sobre esse fato, estudiosos
evidenciam que adoecer não é uma experiência fácil, ainda mais quando incide na
gravidez e é preciso utilizar um serviço de saúde pública no Brasil. A
desorganização da rede de serviços de saúde contribui para a produção de
doença, gerando outros sofrimentos, além daqueles que a enfermidade
inevitavelmente determina(18).
Durante a hospitalização as gestantes compartilharam entre si - e com os
profissionais - ansiedades, medos, expectativas e alegrias. Perceberam que
ouvindo e convivendo com as demais pacientes da enfermaria, a experiência do
DMG torna-se menos caótica e ameaçadora(19). Esse achado mostra que a
existência humana é sempre ser-com-o-outro. Na perspectiva fenomenológica, o
relacionamento evidenciado com os pares e com a equipe de saúde representa um
encontro de subjetividades, que promove a intersubjetividade.
O mundo no qual o homem existe não está restrito ao espaço geográfico, mas à
construção humana que ele realiza para viver junto aos outros, referindo-se
sempre a uma rede de relações significativas. É preciso compreender que ser-no-
mundo é ser-com-os-outros, isto é, que o que somos decorre do modo como nos
relacionamos e vivemos com os nossos semelhantes. O ser humano não é sozinho no
seu pensar, sentir e existir; ele co-habita um mundo que passa a ser
significativo para ele(14). "O que é vivido pelos outros nos aproxima, nos
torna parceiros e, por isso, para compreendermos a experiência do outro, é
necessário estarmos-com-ele, juntos-dele, para descobrirmos o ser que se
oculta"(20).
A prática clínica mostra que comunicar o diagnóstico de DMG constitui uma
situação delicada para os profissionais de saúde e, sobretudo, para as
gestantes, por acarretar choque e desestabilização emocional. Dados obtidos em
estudo anterior mostraram que, diante do diagnóstico de DMG, as mulheres
relatam medo, choque e ansiedade(17).
A descrição das experiências das mulheres com DMG trouxe à luz repercussões
relativas ao distanciamento do ambiente familiar, à necessidade de
redistribuição de papéis e funções na família, além de preocupações relativas
aos cuidados com outros familiares. O adoecer gera impactos na vida prática e
promove mudanças na rotina, levando à ruptura da realidade cotidiana. Planos
são adiados e atividades são sumariamente interrompidas, exigindo um esforço
adaptativo para o qual a pessoa tem de mobilizar uma parcela substancial de
suas reservas de energia(18).
Devido a essas repercussões, é importante que os profissionais de saúde,
sobretudo os enfermeiros, estejam genuinamente abertos para potencializar o
diálogo com as pacientes no cotidiano hospitalar. É preciso acolher os
sentimentos contraditórios despertados pelo diagnóstico, que também se misturam
às histórias de vida e aos resultados de experiências anteriores de lidar com
adversidades. Experiências compartilhadas com outras gestantes que vivenciam
condições similares permitem apreender que as situações adversas que as
pacientes necessitam enfrentar tornam-se mais tranquilas e aceitáveis diante do
encontro autêntico com outro ser, que esteja aberto e presente para auxiliá-
las.
Este estudo fenomenológico, ao possibilitar apreender a experiência das
mulheres com DMG, contribui para o planejamento e a implementação de programas
de intervenção baseados em um modelo de saúde participativo e que priorize a
escuta da voz do outro e até mesmo seu silêncio, gestos e outras expressões da
linguagem não verbal, com vistas a valorizar os aspectos subjetivos envolvidos
na gravidez de risco.
A presente investigação apresenta algumas limitações, como o fato de os dados
não serem passíveis de generalização. Recomenda-se que esse desenho de estudo
seja reproduzido em outras regiões e países com culturas diferentes, a fim de
conhecer os significados que permeiam a experiência do DMG, para ampliar a
compreensão do fenômeno pesquisado.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Compreender o significado do DMG no cotidiano das mulheres estudadas permitiu
explorar, descobrir e entender suas ideias e sentimentos. Dar voz às pessoas
que vivenciam de maneira singular essa doença é importante para a organização
do cuidado. O conhecimento produzido favorece a redução da ansiedade e a
melhoria da qualidade de vida dessas mulheres, humanizando os espaços de saúde.
Na perspectiva das pacientes, ter DMG significa vivenciar experiências que
trazem felicidade e sofrimento. Esse dualismo perpassa todos os discursos
produzidos e constitui a essência do fenômeno investigado no presente estudo.
No primeiro caso, predominam o prazer de gestar e de ser mãe, a sensação de
felicidade conquistada com a oportunidade de realizar o tratamento e a
esperança de obter a cura da doença após o parto, bem como a possibilidade de
ser-com-o-outro durante a hospitalização. No segundo caso, o sofrimento é
suscitado pelo impacto do diagnóstico, resultando em tristeza e preocupação,
além da segregação dos familiares e afastamento do cotidiano doméstico. Essa
polaridade de significados atribuídos à experiência do adoecer emergiu, no
presente estudo, das formas de linguagem utilizadas pelas participantes, que
permitiram alcançar a essência do fenômeno, desvelando toda riqueza,
ambiguidade e complexidade de ser gestante com DMG.
No contexto do cuidado, torna-se imprescindível considerar essas mulheres em
sua totalidade, e não apenas supervisionar os riscos associados à condição.
Trata-se de uma situação extremamente complexa, tanto do ponto de vista
individual como social, que se estende à esfera familiar e do casal. A mulher,
ao atravessar essa experiência, enfrenta uma vivência paradoxal, pois, de um
lado, está preparando e sustentando uma nova vida e, de outro, sente-se
ameaçada por forças que põem em risco o ser que está gestando em seu ventre.
Nessa situação crítica, vários fatores combinam-se e interagem de forma
complexa, como a história pessoal, os antecedentes gineco-obstétricos da
mulher, a aceitação da gravidez e do DMG, as condições socioeconômicas,
culturais e emocionais, além do acesso a serviços especializados e a qualidade
do cuidado prestado. Os profissionais de enfermagem precisam estar
sensibilizados e preparados para a delicada tarefa de cuidar dessas gestantes e
suas famílias, criando possibilidades de acolhimento que contemplem a
totalidade do ser humano, de modo a favorecer a integralidade do cuidado.