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BrBRCVHe0034-71672013000400014

BrBRCVHe0034-71672013000400014

variedadeBr
Country of publicationBR
colégioLife Sciences
Great areaHealth Sciences
ISSN0034-7167
ano2013
Issue0004
Article number00014

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Liderança do enfermeiro: elemento interveniente na rede de relações do agente comunitário de saúde

INTRODUÇÃO A atenção à saúde no Brasil direciona cada vez mais suas atenções para a saúde da população por base no núcleo familiar. A família foi o eixo base para redirecionamento das estratégias de atenção à saúde, ocorrido em 1994 por meio da implantação do Programa de Saúde da Família (PSF), posteriormente denominado de Estratégia Saúde da Família (ESF) (1). Para isso, foram instituídas as equipes de saúde da família, cuja composição preconizada é de 1 (um) médico, 1 (um) enfermeiro, 1 (um) ou 2 (dois) técnicos de enfermagem e 4 (quatro) a 6 (seis) agentes comunitários de saúde (ACS)(1).

Atualmente, dos 5.564 municípios brasileiros, 5.251 aderiram à ESF, totalizando a implantação de 30.328 equipes de saúde da família, com uma cobertura de 50,7% da população. Em paralelo, os 234.767 ACS estão presentes em 5.349 municípios brasileiros, cobrindo 60,9% da população brasileira(2).

O trabalho do ACS "se caracteriza pelo exercício de atividade de prevenção de doenças e promoção da saúde, mediante ações domiciliares ou comunitárias, individuais ou coletivas, desenvolvidas em conformidade com as diretrizes do SUS"(1). Sua atividade tem relação direta com o enfermeiro da equipe ESF, o qual supervisiona suas atividades de identificação dos marcadores de saúde, bem como de usuários que necessitam de uma atenção diferenciada pelos demais profissionais, acompanhamento de usuários assistidos por determinados agravos de saúde através de visitas domiciliares frequentes, e reconhecimento de inconformidades que devam ser reportadas à equipe(1,3).

Quando bem estruturada, a equipe de saúde estabelece uma relação dialógica e participativa que permite "o desenvolvimento de competências no trabalho do ACS, como maior autonomia, iniciativa e compromisso, o que reflete em suas relações com os moradores e abre maiores possibilidades de participação e compreensão de suas necessidades"(4).

Entretanto, o trabalho em equipe na ESF apresenta desafios que ameaçam a coesão do grupo caracterizados por conflitos interpessoais relacionados às diferentes percepções, crenças e valores dos envolvidos no processo, nem sempre convergentes(5). Em situações de conflito, o exercício de liderança pelo enfermeiro tem apresentado relação positiva com o bem-estar dos profissionais e consequentemente, no cuidado ao usuário de saúde(6).

Compreende-se que líderes em saúde são agentes de mudança que podem criar coesão e influenciar positivamente a cultura organizacional através de seu comportamento e práticas de liderança(7). Em estudo realizado em quatro municípios amazonenses, verificou-se que a intensa relação entre enfermeiro e ACS, e sua interface com a comunidade, fazem com que ocorra desvio dos fluxos de poder para estes trabalhadores, que geram uma liderança inevitável(8).

Destaca-se que no contexto nacional, 81,6% das Unidades Locais de Saúde (ULS) são gerenciadas por enfermeiros(9). Embora existam líderes nos mais diversos espaços organizacionais, na gerência dos serviços se concentra o ponto crítico da liderança, na qual o gerente organiza o grupo para alcance das metas e atividades(10).

Sabendo que a ESF consolida-se, dentre outros elementos, com a complementariedade do trabalho entre enfermeiro e ACS, faz-se necessário entender esta relação visando aprimorar o alcance das ações em saúde e sua qualidade. Assim, questiona-se: Como a equipe de saúde compreende e experiência as contribuições do enfermeiro na rede de relações e interações do ACS? Este estudo tem por objetivo compreender as contribuições do enfermeiro na rede de relações e interações dos agentes comunitários de saúde de um centro de saúde de um município ao sul do Brasil.

MÉTODOS Trata-se de uma pesquisa qualitativa, na qual se adotou como referencial metodológico a Teoria Fundamentada nos Dados (TFD), traduzida do termo original inglês Grounded Theory, desenvolvida por sociólogos americanos que intentaram construir uma teoria assentada nos dados a partir da exploração do fenômeno na realidade em que o mesmo se insere, sendo que a construção teórica explica a ação no contexto social. A TFD é um método de pesquisa no qual coleta de dados, análise e teoria mantêm uma relação muito próxima, e tem o objetivo de identificar, desenvolver e relacionar conceitos, sendo iniciada em uma área de estudo ampla, e permitindo que a teoria surja influenciada pelos dados descobertos, e não apenas pelas especulações do pesquisador, configurando um guia importante para a ação(11).

A TFD ocorre em três etapas que acontecem simultaneamente: codificação aberta, axial, e seletiva. A codificação aberta é o primeiro passo para a análise, consistindo em separar, examinar, comparar e conceituar os dados obtidos, sendo os dados analisados linha a linha, e cada fala do entrevistado transformada em um código antes de serem agrupados por semelhanças e diferenças. Os agrupamentos dos códigos constituem as subcategorias, rotuladas de acordo com o tema de que tratam. O segundo passo da análise é a codificação axial, onde os dados são novamente agrupados, formando as categorias. A codificação seletiva é a busca e desenvolvimento do fenômeno ou categoria central, em torno do qual giram todas as demais categorias(11).

A coleta de dados ocorreu entre os meses de fevereiro e abril de 2009, em um centro de saúde localizado ao sul do país, através de entrevista individual, semiestruturada, na própria instituição ou residência dos participantes.

Utilizou-se como questão inicial: "Como você compreende e experiencia as contribuições do enfermeiro nas relações e interações do ACS com equipe de saúde e comunidade?". O encaminhamento das demais questões foi direcionado pelas pesquisadoras, a partir das respostas dos entrevistados.

Participaram do estudo 20 pessoas, distribuídas em 3 grupos amostrais, definidos conforme orienta o método. O primeiro grupo amostral foi constituído por 8 (oito) ACS, a partir dos dados revelados, percebeu-se a necessidade de investigar as percepções do restante da equipe de saúde, configurando o segundo grupo, formado por 3 ACS, 2 (dois) médicos, 2 (dois) enfermeiros e 1 (um) dentista, com o qual foram adotadas as questões norteadoras: "Como você assiste aos usuários/famílias?", "Como é a sua participação nas ações coletivas na equipe de saúde e na comunidade?", e "Como você percebe a atuação do enfermeiro em relação ao trabalho do ACS?". Fortalecendo as categorias anteriores e formando novas, estes dados revelaram a necessidade de formação do terceiro grupo amostral, formado por 4 (quatro) usuários do centro de saúde, indagados pelas questões norteadoras: "Que significado você atribui às ações do ACS?" e "Como o trabalho do enfermeiro e o ACS refletem no seu cuidado?". A partir disso, alcançou-se a saturação dos dados, que são apresentados segundo o Modelo Paradigmático, ou seja, as categorias são organizadas em Fenômeno ou categoria central, Condições Causais, Condições Intervenientes, Contexto, Estratégias de Ação e Interação e Consequências(11).

Devido à importante contribuição das condições intervenientes, representadas pela categoria "Percebendo o Enfermeiro como mediador da relação e interação", optou-se por apresentá-la e discuti-la detalhadamente.

Ressalta-se que a pesquisa atendeu aos aspectos éticos da resolução 196/96 do Conselho Nacional de Saúde(12), sendo o projeto aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa com Seres Humanos da Universidade Federal de Santa Catarina (CEP/ UFSC), sob o Protocolo 397/08. Visando garantir o anonimato dos participantes, utilizaram-se pseudônimos para designação destes, formados pela letra "P", de participante, seguida do número correspondente à sequência em que o sujeito foi entrevistado.

RESULTADOS Do fenômeno ou categoria central "Vislumbrando as relações e interações do Agente Comunitário na melhoria da assistência à saúde, como uma rede complexa", apresentar-se-á a condição interveniente composta pela categoria "Percebendo o Enfermeiro como mediador das relações e interações" e suas duas subcategorias: "Percebendo o enfermeiro como líder" e "Reconhecendo o enfermeiro como 'ponte' de comunicação", como ilustra a Figura_1.

A. Percebendo o enfermeiro como líder São indicados como profissionais fundamentais para o funcionamento da unidade de saúde, pois facilitam o trabalho da equipe, provendo toda a organização necessária para as ações em saúde e seus insumos, bem como, circulam e atuam com qualidade em diversos setores quando na ausência de profissionais, como por exemplo, acolhimento e consulta, sala de vacina, curativo, esterilização, recepção, entre outros.

A liderança exercida pelos enfermeiros também se manifesta no empenho em tornar a equipe de saúde unida. Tal ação é percebida pelos participantes na diminuição da rotatividade de profissionais, tornando o trabalho mais integrado e contínuo. Ainda, consideram que a boa relação promovida pelo enfermeiro aumentam a agilidade e resolutividade, como ilustram as falas: Embora todos tenham seu papel bem definido aqui no centro de saúde, acho que o enfermeiro é o mais versátil, consegue trabalhar desde a criança ao idoso, coordenando a equipe e fazendo curativo... Ele [enfermeiro] traz respostas para vários problemas, tanto os nossos [ACS], quanto os da equipe de saúde e da população. (P4) Sou a funcionária mais antiga do posto, percebi nessa trajetória que os períodos nos quais tivemos uma equipe coesa e com bom relacionamento, diminuímos a rotatividade. Por isso, como coordenadora a minha meta é fazer um trabalho mais integrado, mais contínuo, para manutenção da equipe completa e satisfeita. (P15) Entretanto, o que realmente destaca o enfermeiro dos demais profissionais é sua atuação diferenciada, se posicionando à frente, disposto à responsabilizar-se e tornar seus pares corresponsáveis e cogestores. É ressaltada também a participação ativa do enfermeiro nas reuniões de equipe, muitas vezes organizando da pauta, articulando as opiniões, elaborando as estratégias de ação, incentivando a equipe na implementação e direcionamento das ações. Os participantes vinculam esta atitude às atribuições próprias do enfermeiro na supervisão da equipe de enfermagem e de ACS, segundo relato dos entrevistados: A participação do enfermeiro na organização do serviço é obrigatória, porque o enfermeiro sempre está mais à frente e inserido em todas as equipes. Toda essa parte de organização de serviços, supervisão dos agentes, parte administrativa do posto, da equipe de enfermagem... o enfermeiro está diretamente ligado.(P2) Nas minhas reuniões de equipe, geralmente, sou eu quem faz uma pauta, eu vou tocando, mas todo mundo fala na hora que quiser, todo mundo contribui. Mas o roteiro principal, quem fala sou eu. E nas reuniões da equipe ou do posto sempre são momentos para divulgar as informações, tanto as que vêm da comunidade, como as que vêm da Secretaria Municipal de Saúde, como rotinas, protocolos de atendimento, ou outras novidades. (P7) Em especial, a enfermeira coordenadora é reconhecida como importante influenciadora da rede de relações e interações do ACS, pois na sua ausência, durante o período de férias, por exemplo, os participantes percebem que algumas atividades não funcionam tão bem e se sentem sem orientação e direcionamento nas suas ações diárias, conforme ressalta os depoentes: Ela age no papel dela, de Coordenadora do posto. Tanto que o posto é uma coisa quando ela está. Quando ela não está, a gente percebe a diferença. Aqui ela sabe de tudo, ela quer saber de tudo, aqui não passa uma mosca sem ela ficar sabendo. E quando ela não está, as coisas às vezes não funcionam. (P6) Não, porque o meu foco é ela [enfermeira coordenadora], porque ela que me comanda. Tenho que passar para ela os problemas que observo, porque às vezes tem problemas envolvendo pacientes ou funcionários, temos que passar para ela. A coordenadora faz essa ponte com paciente e com funcionário. Mas, primeiro eu passo para ela, não sei se é meu dever, mas eu faço isso. (P4) Os participantes percebem que empenho na execução das suas atividades, embora a coordenação da unidade não seja uma função com dedicação exclusiva, exigindo que o enfermeiro coordenador, tenha que dividir sua atenção entre demandas clínicas no atendimento direto e a administração do serviço.

Entretanto, no relato da enfermeira coordenadora um descontentamento em relação ao seu desempenho, pois percebe que sua equipe de ESF fica sobrecarregada com sua ausência no atendimento clínico, tornando o acesso e resolutividade um processo mais lento do que poderia ser, como é destacado na seguinte fala: Como enfermeira eu não consigo fazer muita coisa sendo coordenadora.

Eu tenho que fazer uma coisa ou outra, fazer as duas bem feitas é impossível. Então, na verdade eu me foco mais na coordenação, mas também participo da demanda assistencial. Sei como as coisas acontecem, sei sobre os pacientes, sobre as visitas... faz tempo que eu não faço visitas, quando eu faço, mas geralmente é difícil até de programar porque tenho muitas reuniões, cursos, ... (P15) Para superar essa fragilidade, a enfermeira coordenadora compartilha parte do seu atendimento assistencial com os outros enfermeiros das duas equipes de ESF existentes. Os participantes concordam que essa conduta não vai ao encontro do que preconiza a Política de Atenção Básica. Entretanto, reconhecem que gerir a unidade de saúde é um desafio e tal função exige a participação em reuniões em nível regional e central, planejamento e avaliação das atividades realizadas pela equipe, além de um investimento na gestão pessoas, como ilustram os depoimentos: Então, nessa parte assistencial os dois enfermeiros ficam diretamente ligados. (P15) Trabalhamos com usuários de outras áreas, uma vez que a coordenação exige que uma das enfermeiras fique fora por conta das atividades gerenciais (P12).

Na multidimensionalidade das ações da enfermeira coordenadora, verifica-se uma lacuna percebida por ela própria e os demais enfermeiros. Esta situação não repercute de forma significativa nas ações dos ACS, como ilustra a fala: O fato da enfermeira da minha equipe ser coordenadora prejudica somente a divisão dos pacientes por área na hora do atendimento. Os médicos e os enfermeiros da nossa unidade são referência para todos os pacientes pertencentes ao nosso posto. Para minha atividade, não vejo diferença. Considerando que tenho três enfermeiros, quando um está ocupado, falo com o outro. [...] Acho que para o paciente seja positivo, pois podem escolher com quem vão fazer uma consulta ou exame (P3).

Verifica-se que a equipe de saúde encontrou estratégias no processo de trabalho para superar este obstáculo, sendo considerada pelo ACS como uma oportunidade, uma vez que permite opção de escolha pelo usuário.

B. Reconhecendo o enfermeiro como "ponte" de comunicação Segundo os participantes os enfermeiros têm ciência de tudo o que acontece no posto, em especial a enfermeira coordenadora. Esta afirma que faz questão de participar e saber as atividades dos demais membros da equipe, pois responde pela unidade de saúde e seus profissionais.

Nesse sentido, é possível verificar no relato dos ACS a comparação do enfermeiro com uma ponte, na qual transitam as informações necessárias para mediação de conflitos e interlocução ativa entre os usuários, equipe de saúde e nível central de gestão.

Ressalta-se que nesse tocante, que a relação com os ACS é muito próxima, uma vez que todas as suas ações são direcionadas pelos enfermeiros, exigindo sutileza na forma de solicitar pedidos, ao considerar que as pessoas têm alterações no humor, como apresentam os entrevistados: Quando a gente tem alguma dúvida, a equipe de saúde ajuda muito. A nossa coordenadora gosta que passe tudo por ela primeiro, se tem algum problema, se tem algum problema pessoal, ou um problema entre a relação da equipe. (P8) Acho que a equipe do posto tem muito jeito para lidar com a população e uns com os outros. Todos aqui se esforçam para ser educados e solicitar ajuda na hora certa e do jeito certo, pois todos passam por problemas e nem sempre estão tão bem humorados. (P1) Embora existam alguns entraves superados com cuidado na forma de comunicação, os enfermeiros atuam com justiça diante de atritos na equipe, permitindo que os envolvidos se manifestem, sejam ouvidos e esclareçam o problema. Desta forma, é evidenciada que a comunicação é realizada com clareza e na busca da sinceridade e responsabilidade. Reforçam, ainda, que a enfermeira coordenadora e os enfermeiros da ESF organizam o serviço de saúde para resolução de problemas e esclarecimentos abordando diretamente os envolvidos quando acontecem conflitos, promovendo a cobrança mútua das atividades delegadas e a exigência pelo melhor atendimento à comunidade, como apresentam os relatos: Acho que facilita a difusão da comunicação no formato que está sendo feita, ou seja, através das reuniões, murais, pessoa-pessoa, sem ter a necessidade de repetir toda a informação sobre o protocolo, ou esperar que ele buscar a informação para validar o que eu disse.

Se a gente não tivesse um bom relacionamento e se ele [o funcionário] não tivesse obtido essa informação na reunião, nosso contato iria ser totalmente desencontrado. (P7) Na maioria das vezes, em 99% dos casos ela [a enfermeira coordenadora] ouve os dois lados. Às vezes, é até com a gente, vem um paciente reclamar, então ela ouve os dois lados. Se eu estou errada ela me chama atenção, se é o paciente ela diz: "não , tem que seguir as normas da casa". Assim, ela faz a ponte e sempre foi justa, sempre ouve os dois lados. (P4) Os participantes afirmam que quando o trabalho não é executado corretamente pelo ACS, a coordenadora consegue resolver, atuando diretamente com as pessoas relacionadas à situação-problema ou organizando uma ação conjunta com os demais ACS, como ilustra a fala: Nossa coordenadora consegue resolver muitos problemas, porque ela busca saber o motivo da não realização das visitas, o porquê não foi entregue o medicamento, o motivo que o paciente não consultou...

Então, o primeiro passo é dado e na sequência investirmos na busca.

(P16) Assim, ressalta-se a atuação da enfermeira como mediadora nas relações, comunicando-se de maneira dialógica com usuários e equipe, constitui-se como importante elo nas relações e na liderança na ESF.

DISCUSSÃO A atuação do enfermeiro constitui-se de diferentes dimensões, consideradas complementares, dentre as quais se destacam a dimensão assistencial e a gerencial. Na primeira, o profissional enfermeiro possui como foco de intervenção as necessidades de cuidado de enfermagem e tem por finalidade o cuidado integral. Na segunda dimensão, o enfermeiro assume como foco a organização do trabalho e os recursos humanos em enfermagem, visando criar e implementar condições adequadas de cuidado aos pacientes e de desempenho para os trabalhadores(13).

Em especial, na Atenção Básica observa-se que o enfermeiro tem exercido a liderança em suas ações na ESF, e que este, por acúmulo de funções e responsabilidade, tem apresentado dificuldade em exercer de forma horizontal sua liderança entre os demais envolvidos no processo, como os gestores, profissionais e usuários(14). Em estudo realizado na região norte do país, evidencia-se que o enfermeiro exerce a função de gerente de unidade e que o acúmulo de atividades administrativas sobre este ocorre por imposição dos gestores locais. Por não ser escolhido pelos membros da equipe de saúde, em alguns casos o enfermeiro não é reconhecido como uma liderança, especialmente pelos profissionais de nível superior. Como consequência, percebe-se um fluxo verticalizado de informações e inúmeros conflitos(15).

Embora os participantes deste estudo não tenham sofrido imposições da gestão para escolha do gerente, observa-se nos discursos dos trabalhadores indicações de uma atuação mais centralizadora do enfermeiro, evidenciada pelas falas: "Mas o roteiro principal, quem fala sou eu", "ela sabe de tudo, ela quer saber de tudo" e "porque ela que me comanda". Verifica-se que a supervisão realizada pelos enfermeiros da ESF está fortemente relacionada ao controle e a educação.

No que tange o controle, este se manifesta, predominantemente, para o cumprimento de atividades, horários e jornadas de trabalho(16).

A liderança autoritária está vinculada à verticalização/centralização da tomada de decisão e hierarquização, podendo o líder desfrutar do prestígio e status social, resultantes da sua administração, bem como responder sozinho pelo insucesso de suas ações(17). Embora o estilo gerencial tradicional seja predominante na prática dos serviços, vislumbra-se na literatura científica uma tendência para liderança autêntica e democrática(17-18).

O exercício de liderança pelo enfermeiro fortalece o exercício da gerência, principalmente, no que se refere ao gerenciamento de sua equipe, facilitando a integração dos envolvidos e a articulação das dimensões do trabalho da enfermagem(19).

Sabendo da importância da cooperação/confiança em um trabalho como o da equipe de saúde da família, relacionam-se os problemas na efetividade e resolutividade com os frágeis relacionamentos de confiança. Assim, corroborando os achados deste estudo, verifica-se que o enfermeiro é mediador das relações entre os trabalhadores da equipe, como também, articula interesses destes com a coordenação municipal. Ainda, a coordenação municipal, reforça essa posição: as correspondências e os telefonemas são em sua maioria direcionadas a esse profissional, mesmo quando o assunto diz respeito a outro profissional da equipe(14).

Embora o enfermeiro esteja no centro do fluxo de informação da unidade, a comunicação entre os vários níveis do sistema de saúde ainda é apontado como fator limitante na atuação sua gerencial, fato caracterizado principalmente pela duplicidade ou falta de informações entre profissionais da unidade, coordenador e população(20). Parte deste problema pode estar associado ao deslocamento do enfermeiro da equipe ESF para atividade de gestão e/ou sua sobrecarga de trabalho. Aponta-se que parte da sobrecarga de trabalho está relacionada principalmente à estrutura física e à falta de mais profissionais de saúde, haja vista que na ausência de alguns membros da equipe o enfermeiro realiza outras atividades, deixando de cumprir com excelência suas ações(21).

Entretanto, novas práticas de reorganização dos serviços tem ganhado destaque na pauta em saúde, como: adscrição de clientela às equipes interdisciplinares; e, reorganização da dinâmica da gestão das equipes, introduzindo-se mecanismos de cogestão/ gestão compartilhada. Entende-se que o segundo item visa à democratização das relações de poder, através de dispositivos de gerenciamento coletivos, como por exemplo, o Colegiado Gestor, o Contrato de Gestão, o Programa de Formação em Saúde do Trabalhador e a Comunidade Ampliada de Pesquisa(22).

Assim, o que se almeja é ampliar o poder de ação do trabalhador, torná-lo corresponsável pelos resultados alcançados com o trabalho coletivo. Entretanto, hoje, no município elegido como cenário do estudo não um processo seletivo formal para escolher os coordenadores das unidades de saúde e o gerenciamento das equipes de ESF tem contado com grande colaboração dos enfermeiros que supervisionam os ACS e a equipe de técnicos de enfermagem. Embora, a Política Nacional de Humanização esteja buscando o compartilhamento de poder entre os trabalhadores, é necessário levar em consideração a liderança enquanto habilidade e ferramenta gerencial(22)que emerge da prática do enfermeiro, o qual tem oportunidade de se relacionar com muitas dimensões do serviço de saúde e possui grandes responsabilidades no gerenciamento de pessoas na Atenção Básica em Saúde.

Estudo realizado com 44 enfermeiros gerentes de unidades de saúde da rede básica de Goiânia (GO) aponta que o enfermeiro desenvolve atividades de assistência e gerência simultaneamente, sendo esta última vinculada em sua maioria à atividades burocráticas e operacionais. Entretanto, a ação gerencial de maior importância indicada pelos enfermeiros foi a promoção de integração e bom relacionamento com as equipes sob sua responsabilidade. Enfatiza-se ainda, que investimentos no relacionamento interpessoal e a valorização do trabalho realizado contribuem para manutenção e aumento da qualidade do cuidado prestado (20).

Como exemplo, ressalta-se que o número reduzido de profissionais predispõe ao risco de acidentes de trabalho e de doenças ocupacionais, bem como, aumento na incidência de erros e de eventos adversos(23). Além de afetar negativamente os outros membros da equipe, gerando sobrecarga de trabalho, desgaste do trabalhador, o aumento do número de licenças médicas e afastamentos do trabalho.

Neste estudo, também se evidenciou uma organização do processo de trabalho diferente daquela preconiza nas políticas de saúde, na qual os usuários não são atendidos exclusivamente pelos profissionais que são referência para sua área territorial. Na maioria das vezes, inovações no modelo de assistência, nem sempre são plenamente incorporadas, por exigirem muito investimento dos profissionais nas fases iniciais de implantação(24). Assim, ressalta-se que as estratégias de adaptação e de superação aos problemas enfrentados foram consideradas positivas de forma geral até o momento pela equipe. Compreende-se a auto-organização como o produto da interação entre múltiplos processos, como por exemplo, a comunicação, que potencializa a qualidade das relações entre as pessoas e estimula a diversidade de saberes(25). Desta forma, aponta-se a necessidade de ajustes nos problemas vigentes na ESF com o emprego de auto- organização pela equipe de saúde para construção de equipes integradas e coesas, mesmo quando se observam relações assimétricas entre os diferentes profissionais da saúde(26).

Destaca-se que para além de uma ação pontual, a liderança do enfermeiro e seu investimento na manutenção de boas relações são a primeira etapa de uma prática interdisciplinar, na qual a continuidade do cuidado ao usuário se torna responsabilidade de todos os membros da equipe. Para efetivação de uma assistência integral, onde cada profissional contribui com sua especificidade, faz-se necessário o diálogo na busca de consensos, para o consequente desenvolvimento eficaz do trabalho em equipe(27).

CONSIDERAÇÕES FINAIS A categoria "Percebendo o Enfermeiro como mediador das relações e interações", que foi a condição interveniente do fenômeno "Vislumbrando as relações e interações do Agente Comunitário na melhoria da assistência à saúde, como uma rede complexa", revela significados que modificam/interferem na rede de relações do ACS, fornecendo base teórica para a atuação da equipe de saúde na ESF, em especial para o enfermeiro e ACS, bem como para fortalecimento da ESF enquanto estratégia de reorganização do atendimento no SUS.

Conclui-se que a equipe de saúde compreende o profissional enfermeiro como um elemento significativo na rede de relações e interações do ACS com a comunidade, sendo visualizado como mediador e como uma liderança. Embora apresente sinais de uma liderança autoritária, promove a interlocução e age como um facilitador do trabalho em equipe na promoção da saúde da comunidade.

Ainda, os enfermeiros da ESF possuem uma atuação relevante junto à equipe de saúde, fornecendo suporte clínico na organização do cuidado e gerencial da unidade de saúde ao fomentar boas relações, direcionar as atividades da equipe e conduzir o fluxo de informações. O enfermeiro atua responsabilizando-se e visando a corresponsabilização da equipe, com participação ativa nas reuniões, articulando as opiniões, elaborando as estratégias de ação, incentivando a equipe na implementação e direcionamento das ações, numa constante interação/ ação, demarcando a sua liderança na equipe.


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