Estresse ocupacional em enfermeiros intensivistas que prestam cuidados diretos
ao paciente crítico
INTRODUÇÃO
O avanço tecnológico e científico, que tem produzido melhorias nas condições de
vida e de saúde da população, tem também provocado doenças laborais, muitas
vezes causadas pela elevada carga de trabalho e incorporação tecnológica nos
sistemas de produção.
A busca da produtividade a qualquer custo esbarrou nos limites do próprio ser
humano e resultou no aumento do seu sofrimento. Desse modo, houve ambiente
propício ao desenvolvimento da Teoria do Estresse, que surgiu no contexto da
explosão da produção e do consumo e aborda sobre fatores desencadeantes do
adoecimento físico e psicológico(1-2).
Diante da evolução e da globalização tecnológica, os trabalhadores precisam
lidar com o aumento da demanda de aprendizagem de novas habilidades; adaptação
a diferentes formas de trabalho; exigências cada vez maiores à alta
produtividade e máxima qualidade dos produtos/serviços em tempo reduzido; maior
competitividade no mercado de trabalho; condições laborais precárias; menores
benefícios empregatícios; além do menor tempo para o convívio social(3). Num
contexto assim, o ambiente de trabalho pode ser responsável pelo
desenvolvimento de muitas doenças, como por exemplo, o estresse ocupacional.
O termo estresse tem sido utilizado para designar sensações desagradáveis e/ou
de desconforto diante às diferentes situações percebidas pelo próprio indivíduo
que, se utiliza de seu processo psicológico e de sua compreensão para julgar os
fatos, concebendo-os como estressantes(4).
Ao considerar que a interação de condições variadas propicia ambientes de
trabalho mais ou menos favoráveis à saúde(5), o labor pode ser fonte de
estressores que condicionam ao estresse ocupacional, que ocorre entre os
profissionais incapazes de enfrentar as demandas requeridas pela sua ocupação.
O estresse ocupacional, entretanto, não é um fenômeno novo, mas sim um novo
campo de estudo que ganhou destaque em razão do aparecimento de doenças que a
ele foram vinculadas, tais como a hipertensão, a úlcera, entre outras(1).
No contexto da enfermagem, os enfermeiros quase sempre atuam em meio a riscos e
condições desfavoráveis que podem influenciar diretamente na sua saúde física e
mental, resultando em estresse e prejuízos ao trabalho(6). Essa condição ocorre
porque as atividades conferidas legalmente ao enfermeiro demandam muita
atenção, discernimento e responsabilidade, fazendo com que os fatores
psicossociais desencadeados pelas atividades laborais desse profissional
condicionem o aparecimento do estresse no trabalho(7).
Reconhece-se que, no ambiente hospitalar, devido ao convívio diário com a
gravidade da doença, o sofrimento humano e a morte, a enfermagem é considerada
como profissão altamente estressante, se comparada às outras profissões da área
da saúde(8) e isso é mais evidente em setores críticos como a Unidade de
Terapia Intensiva (UTI)(9) em que a expectativa constante de descompensação dos
pacientes graves, associada à complexidade assistencial, inerente à
concentração tecnológica avançada, torna o ambiente e o trabalho nesse Serviço,
mais difícil e desgastante(10).
A literatura aponta que a UTI representa uma área de atuação particularmente
estressante para a enfermagem(11-12), em razão de múltiplos fatores como a alta
mortalidade dos pacientes, o que, mediante a sua ocorrência, gera tensão e
ansiedade nos profissionais que se questionam sobre o seu próprio empenho e
qualidade da assistência prestada(11).
Em estudo realizado com enfermeiros de UTI de cinco hospitais do Estado de São
Paulo, foi verificado que 57,1% avaliaram sua unidade de trabalho como fonte
geradora de estresse e, apenas 9,6% não percebiam a UTI como um local
estressante(4).
As representações sociais referentes ao trabalho, elaboradas por enfermeiras de
cinco UTI de dois hospitais de grande porte de Salvador, Bahia, evidenciaram as
palavras estressante, responsabilidade, assistência integral e gratificante,
como elementos do núcleo central. Essa miscelânea de evocações livres de
palavras impede que os gestores se preocupem com intervenções eficazes para a
redução do estresse laboral, uma vez que a assistência integral também é
entendida como gratificante(10).
Para que os gestores atuem em favor da minimização do estresse na enfermagem,
em especial no enfermeiro que atua em UTI, é importante que se detecte e atue
sobre os fatores causadores desse fenômeno, com vistas ao planejamento e
implementação de estratégias que contribuam para a adequação do ambiente ao
desempenho do trabalho.
Um instrumento que possibilita a análise da variação do nível de estresse de
enfermeiros, em qualquer tipo de unidade de atuação, é a Escala Bianchi de
Stress (EBS), composta por seis domínios: (A) Relacionamento com outras
unidades e supervisores; (B) Funcionamento da unidade; (C) Administração de
pessoal; (D) Assistência prestada ao paciente; (E) Coordenação das atividades;
e, (F) Condições de trabalho(13).
Dentre os domínios citados, o domínio D, que se refere à Assistência prestada
ao paciente(13), será o foco deste estudo porque a assistência direta ao
paciente grave e a realização de cuidados diretos de alta complexidade, tão
evidentes em UTI, são de responsabilidade privativa do enfermeiro, conforme
consta no Decreto-Lei no. 94.406/87 que regulamenta o Exercício Profissional da
Enfermagem(14).
No intuito de levantar informações acerca do estresse em enfermeiros questiona-
se: Como se apresenta o nível de estresse em enfermeiros que prestam cuidados
diretos ao paciente crítico? E para responder a essa questão se propõe a
realização do presente estudo cujo objetivo consiste em identificar o nível de
estresse apontado por enfermeiros intensivistas que prestam cuidados diretos
aos pacientes críticos.
MÉTODOS
Estudo analítico, transversal e quantitativo, realizado entre maio e julho de
2010 nas UTI Adulto, Pediátrica e Neonatal, de cinco instituições hospitalares
da região Oeste do estado do Paraná, as quais foram denominadas aleatoriamente
de A, B, C, D e E.
A instituição A é um hospital de ensino público, possui UTI Adulto, Neonatal e
Pediátrica, cada qual composta por nove, cinco e 10 leitos, respectivamente.
Nesse hospital os profissionais de enfermagem trabalham 40 horas semanais e, no
período noturno, atuam sob o regime de 12 horas de trabalho por 60 horas de
descanso.
Tanto na UTI Adulto quanto na UTI Neonatal da instituição A existem em média
cinco Técnicos de Enfermagem (TE) e um Enfermeiro exclusivo para o setor por
turno; enquanto na UTI Pediátrica atuam dois TE e um Enfermeiro. Destaca-se
que, além dos enfermeiros que assistem diretamente o paciente e supervisionam
sua respectiva equipe de trabalho, há ainda, um enfermeiro administrativo para
cada uma destas UTI.
Sobre as instituições B, C, D e E, cabe mencionar que essas são instituições
privadas e totalizam 46 leitos de UTI Adulto, de diversas clínicas, em especial
a oncologia na instituição C e a cardiologia nas instituições D e E.
Quanto ao número de leitos para a UTI Adulto, as instituições B e C dispõem
cada uma de 10 leitos; a instituição D possui 11 leitos; a instituição E tem 15
leitos, dos quais cinco são destinados à especialidade de cardiologia. É
importante ressaltar ainda que, na instituição E, existem também 11 leitos de
UTI Neonatal.
Em cada um dos hospitais privados, a equipe de enfermagem trabalha 40 horas
semanais, mas, diferentemente da instituição A, a equipe do período noturno
atua sob o regime de 12 horas de trabalho por 36 horas de descanso.
Ressalta-se que cada uma das UTI das instituições (B, C, D e E) conta com uma
média de quatro TE e um enfermeiro assistencial em cada turno de trabalho e
esse enfermeiro (que participou deste estudo), por não haver um profissional
específico para exercer o papel de gerente / coordenador do setor, é quem
desempenha concomitantemente as atividades gerenciais de seus respectivos
turnos.
Para seleção dos sujeitos da pesquisa, consideraram-se como critérios de
inclusão: ser enfermeiro(a) intensivista com mais de três meses em exercício na
função no Serviço investigado, e aceitar formalmente participar do estudo.
Foram excluídos da pesquisa, aqueles que desempenhavam exclusivamente
atividades de gerenciamento e coordenação no âmbito setorial (n=2). Com isso,
de um total de 62 enfermeiros, a população do estudo foi composta, por 58
enfermeiros assistenciais.
Quanto aos aspectos éticos e legais vigentes, todos os quesitos foram cumpridos
e essa pesquisa encontra-se registrada no Comitê Permanente de Ética em
Pesquisas com Seres Humanos (COPEP) da Universidade Estadual de Maringá (UEM),
sob o Parecer nº 421/2010.
Para a coleta de dados, utilizou-se a EBS que consiste em uma escala do tipo
Likert, de auto-preenchimento, cujas respostas variam de 1 (Pouco Desgastante)
a 7 (Altamente Desgastante); sendo que a pontuação 4 consiste em valor neutro e
o zero se refere à não realização da atividade avaliada(13).
A EBS é constituída por dados de caracterização sociodemográfica (Parte 1) e 51
itens (Parte 2) referentes às atividades realizadas pelo enfermeiro e/ou
condições de trabalho, denominadas de estressores. Entretanto, para fins desta
pesquisa, foram consideradas apenas as questões referentes à Assistência
prestada ao paciente (Domínio D), formada por 15 itens, do 16 ao 30(13).
Os dados foram compilados e tratados em banco de dados eletrônicos, cuja
análise estatística descritiva e inferencial ocorreu mediante o uso do programa
SPSS 20. Para a estatística descritiva, foram calculadas as frequências, as
porcentagens, a variação mínima e a máxima, a média e o desvio padrão (DP),
tanto das variáveis que compõem a Parte 1 quanto daquelas que compõem a Parte 2
do instrumento de coleta de dados.
A análise dos dados da Parte 2, qualificação do nível de estresse global, foi
realizada de acordo com a categorização de Bianchi, a qual preconiza que um
domínio considera as atividades ou características pertinentes ao trabalho
(estressores) e a sua média, representa o nível de estresse, classificado como:
Baixo nível se o escore for igual ou abaixo de 3,0 pontos; Médio nível se o
escore se situar entre 3,1 e 5,9 pontos; e Alto Nível se o escore for igual ou
superior a 6,0 pontos(13).
O escore médio do Domínio D da EBS foi utilizado ainda para testar associação
do nível de estresse com variáveis sociodemográficas e profissionais,
considerando-se nível de significância de 5%. As variáveis com p-valor <0,20 na
análise univaridada foram incluídas na regressão linear multivariada, para
ajuste do modelo.
RESULTADOS
A população de estudo foi composta por 58 enfermeiros assistenciais, cuja idade
variou de 23 a 43 anos, com média de 31±5,2 anos de idade; 53 (91,4%) deles com
menos de 40 anos. Desses, 39 (68,4%) eram mulheres, 38 (65,5%) eram casados, 34
(60,7%) eram chefes de família e 28 (49,1%) possuíam filhos.
Com relação à formação profissional, 32 (55,2%) eram especialistas e a maior
titulação foi a de mestre (3,4%); com até 15 anos de graduado em Enfermagem.
Ressalta-se que 24 (41,4%) trabalhavam em instituição pública e 34 (58,6%) em
instituição privada; 36 (63,2%) em UTI Adulto e 21 (36,8%) em UTI Infantil; com
até 10 anos de atuação em UTI.
Apesar de atuarem como enfermeiros assistenciais, 5 (8,6%) apontaram
desempenhar também a função gerencial; a jornada semanal de trabalho era de 30
a 56 horas. Nesse contexto, 29 (50,9%) enfermeiros cumpriam carga horária de 36
horas semanais e outros 24 (42,1%), de 40 horas semanais; 44 (75,9%) possuíam
vínculo empregatício único e 43 (74,1%) recebiam renda mensal entre três e 10
salários mínimos. Destaca-se que 24 (41,4%) dos entrevistados se sentiam
satisfeitos com a remuneração, seguidos de 18 (31%) que apontaram estar pouco
satisfeitos, 8 (13,8%) pouco insatisfeitos e 4 (6,9%), respectivamente,
referiram estar muito satisfeitos ou muito insatisfeitos.
No tocante ao nível de estresse relacionado à Assistência prestada ao paciente,
38 (65,5%) enfermeiros consideravam se situar em nível médio; 17 (29,3%) em
baixo e apenas 3 (5,2%) em alto. De modo geral, obteve-se nível medianamente
estressante, haja vista que o escore total do domínio variou de 0,8 a 6,6
pontos, com média de 4,0±1,3 pontos.
Na Tabela_1 a seguir, consta a distribuição do nível de estresse e resultados
da análise univariada do escore médio do Domínio D da EBS, de acordo com
variáveis sociodemográficas e profissionais de enfermeiros atuantes em UTI.
Clique_para_aumentar
Na regressão linear multivariada, a associação entre o escore médio do Domínio
D da EBS com a idade perdeu a significância estatística (p=0,071), sendo
ajustada pelo estado civil (p=0,142), quantidade de filhos (p=0,815) e
satisfação com a renda (p=0,176).
Ao avaliar o escore médio de cada item/questão, comparando-os entre si, tem-se
a possibilidade de identificar a intensidade dos estressores para um enfermeiro
ou um grupo particular de enfermeiros(13). Nesse contexto, como consta na
Tabela_2, foram verificadas as pontuações médias de cada item que compõe o
Domínio D, com vistas ao reconhecimento daquele(s) que mais causam estresse no
grupo de enfermeiros.
Apesar de todos os estressores terem sido considerados como sendo de nível
mediano, as questões de número 27, 28, 29 e 30, foram as que obtiveram maior
pontuação média.
DISCUSSÃO
As características sociodemográficas do presente estu-do são congruentes
aos resultados de outros estudos(4,12,15), haja vista a predo-minância do
sexo feminino (68,4%) e a idade média abaixo dos 40 anos. Destarte, o dado da
última variável pode ser considerado uma característica inerente ao trabalho
desenvolvido em UTI porque, em geral, demandam-se altas cargas físicas
compatíveis aos grupos etários mais jovens.
Corrobora a afirmativa anterior o fato de o trabalho em UTI ser marcado pela
escassez de tempo, onde tudo é urgente. Nesse contexto, a alta complexidade e a
tecnologia avançada implicam na necessidade de profissionais mais
especializados e capacitados, sustentando-se um ciclo de rigidez, cobrança e
ritmo acelerado(16).
Embora a Assistência prestada ao paciente internado em UTI seja considerada
altamente estressante(4,15,17), parece haver uma resposta de adaptação à
realização dos itens que compõem este domínio entre os enfermeiros
investigados, visto apenas 3 (5,2%) terem apontado alto nível de estresse. Esse
resultado se assemelha aos de uma pesquisa recente e pautada no Inventário do
Estresse em Enfermeiros(4), a qual detectou que, dentre 21 sujeitos, apenas 5
(23,8%) consideravam a UTI um local de elevado estresse.
Os dados mencionados anteriormente apontam à necessidade de as lideranças se
atentarem à prevenção e/ou manutenção de condições laborais adequadas porque, a
assistência ao paciente crítico, apesar de ser desenvolvida em condições
estressantes, pode ser percebida como um desafio ou ainda, ser considerada como
gratificante(10,17).
É preciso atenção aos aspectos enunciados, que podem impedir que gerentes e
gestores percebam e valorizem a seriedade da representação do trabalho do
enfermeiro em UTI - o qual se realiza norteado pelo estresse, responsabilidade,
assistência integral e gratificação - e, por conseguinte, a necessidade de
intervenções eficazes para redução do estresse laboral(10).
À análise estatística univariada, apenas a idade se associou ao nível de
estresse médio do Domínio D da EBS. Apesar de essa variável perder o poder
explicativo à regressão linear multivariada, é importante lembrar que o
declínio natural das funções fisiológicas, que ocorre com o envelhecimento,
pode resultar em menor capacidade para responder às exigências do trabalho em
UTI e, consequentemente, em maior nível de estresse ocupacional.
Estudo referente ao absenteísmo-doença realizado com profissionais de
enfermagem de uma UTI constatou que a idade igual ou superior a 40 anos foi o
grupo de profissionais que perde mais dias de trabalho por motivos de doença,
quando comparados aos mais jovens(18).
Há carência de pesquisas acerca da prevenção e/ou minimização do estresse no
grupo de trabalhadores que se enquadram na faixa etária referida, seja em UTI
ou na área da saúde e enfermagem. Contudo, a exemplo de outros campos de
atuação - que não se voltam à prestação de cuidados à saúde - pode-se seguir as
recomendações de priorização institucional, pela valorização da mão-de-obra
madura, com programas de treinamento que contemplem o desenvolvimento de
habilidades pró-ativas de enfrentamento do estresse, tais como as habilidades
de autorregulação; de análise e resolução de problemas; de tomada de decisões;
e competências socioemocionais(19). Associado a isso, em UTI, é preciso ainda
considerar aspectos infraestruturais, com adoção de estratégias e dispositivos
que diminuam a sobrecarga física e melhorem a ergonomia do trabalho, os quais
também pressupõem a penosidade na realização da assistência de enfermagem.
Reconhece-se que o grupo de enfermeiros com 40 anos ou mais é pequeno em UTI,
possivelmente porque devido à sua respectiva experiência, estes ocupam cargos
administrativos ou atuam em outras áreas que demandam menor capacidade física
para o desempenho do trabalho como a de ensino(15); como uma estratégia de fuga
ou esquiva pessoal diante à exposição prolongada às condições altamente
estressantes em UTI. Destarte, é preciso atenção de gerentes e gestores
hospitalares para aqueles que continuam a trabalhar neste setor, visto que, nem
sempre, a maturidade possibilita o desenvolvimento de estratégias ativas/
pessoais para o enfrentamento do estresse ocupacional(19).
Estudo de revisão de literatura revelou que, tanto o envelhecimento orgânico
natural, quanto o estresse decorrente da organização e do ambiente psicossocial
do trabalho têm efeitos importantes sobre a capacidade para o trabalho, em
especial para o sexo feminino que além de exercer a dupla jornada de trabalho,
apresenta piores condições laborais e de salário, em relação aos homens(20).
Independentemente se consequência ou causa para a menor capacidade para o
trabalho, o estresse contribui para o adoecimento dos enfermeiros(21) e com
isso, para o aumento do absenteísmo por doença.
Ao se analisar a distribuição do nível de estresse relacionado ao Domínio D da
EBS com as demais variáveis sociodemográficas e laborais, chama-se a atenção
para o fato de que os 3 (7,5%) enfermeiros que apresentaram alto nível de
estresse possuíam companheiro seja em regime marital ou em matrimonial,
trabalhavam em um único emprego, à noite, exclusivamente para prestação de
assistência, e sentiam-se satisfeitos com a sua respectiva renda (Tabela_1).
Numa população predominantemente feminina como a deste estudo, o matrimônio ou
o convívio marital compreendem, muitas vezes, a responsabilidade pelas tarefas
domésticas e educação/criação dos filhos, que ocasionam sobrecarga de
atividades, frustração e, consequente nível elevado de estresse. Acresça-se a
isso o fato de que a jornada de trabalho em regime de plantão subtrai o tempo
livre do enfermeiro e dificulta o convívio social, principalmente no que diz
respeito à interação com seus familiares e atividades de lazer, que poderiam
ser adotados como estratégias simples para minimizar o estresse(17).
Dada a somatória de estressores vivenciados no trabalho, o enfermeiro pode
experimentar conflitos e sentimentos junto a seus familiares que se desdobram
em solidão, angústia, incompreensão, irritação e cansaço, dentre outros.
Afinal, o cotidiano desse profissional é marcado pelo trabalho solitário e
descompasso com o ritmo da família, em que a fadiga limita atividades
prazerosas junto aos entes e os afastam pelo descontrole emocional, sob a forma
de agressividade, no estabelecimento de suas relações(1).
O trabalho noturno, por sua vez, está associado a níveis de estresse elevados
entre profissionais de enfermagem e isso, potencializa a ocorrência de
complicações à saúde, uma vez que o desequilíbrio do ritmo biológico, provoca
maiores níveis de estresse e pior qualidade do sono(7). Esse fato,
provavelmente, influencia a forma como o enfermeiro avalia outros aspectos
relacionados à sua atividade laboral, inclusive àqueles que se remetem à
Assistência prestada ao paciente.
As condições de trabalho em UTI quando atreladas à atuação noturna, consistem
em riscos à saúde dos profissionais de enfermagem. Este dado foi abordado em
estudos acerca do estresse e da qualidade do sono entre enfermeiros de
diferentes turnos(7,22) os quais constataram que as características dos setores
críticos e da atuação noturna geram distúrbios físicos e psíquicos como:
alterações hormonais e gástricas causadas pelos ruídos excessivos do setor,
pelo ambiente fechado e pela privação do sono.
Dentre os 3 (7,5%) enfermeiros que apontaram alto nível de estresse, no
entanto, o trabalho noturno, ao possibilitar incremento salarial com adicionais
específicos, pode estar relacionado à satisfação com a renda e consequente
manutenção de um único vínculo empregatício. Desse modo, cada uma das
atividades que compõem a Assistência prestada ao paciente parece ser o
principal motivo que define o nível de estresse dos enfermeiros em UTI.
Conforme consta na Tabela_2, apesar de o nível de estresse ter sido
classificado como médio em todos os estressores que compõem a Assistência
prestada ao paciente, aqueles que obtiveram pontuação média mais elevada foram:
Enfrentar a morte (item 29; 5,6 pontos); Atender às emergências na unidade
(item 27; 5,1 pontos); e Atender aos familiares de pacientes críticos ou
Orientar familiares de pacientes críticos (itens 28 e 30, respectivamente;
ambos com 4,8 pontos).
No tocante ao nível de estresse laboral devido ao enfrentamento da morte (5,6
pontos) e às emergências da unidade (5,1 pontos), vale ressaltar que esses
itens foram apontados como os mais estressantes entre os enfermeiros
intensivistas, corroborando com outros estudos brasileiros(22-23) que também
constaram que o óbito dos pacientes e as situações de emergência são os
principais responsáveis pelo desenvolvimento de estresse entre os profissionais
de enfermagem.
Ao considerar que a morte de pacientes e a necessidade de atendimentos
emergenciais são constantes em UTI, pressupõe-se que haja internalização e
aceitação desses eventos como naturais ao processo de trabalho ali realizado.
Isso pode ser explicado pela alta sofisticação tecnológica existente neste
setor, contexto em que se prevalece, muitas vezes, um trabalho extremamente
tecnicista, aliado ao fato de que o ser humano, de modo geral, não é preparado
para conviver e/ou aceitar qualquer tipo de perda.
A premissa anterior se remete às formas de adaptação e defesa ao estresse
decorrente de situações críticas como a morte e atendimentos emergenciais, que
podem resultar em sofrimento psíquico e desgaste emocional nos profissionais de
enfermagem que atuam em UTI, pois mediante a proximidade e o envolvimento
mantidos durante o período de internação, com o paciente e seus familiares, o
óbito daquele tende a exacerbar os sentimentos de impotência, frustração e até
mesmo de projeção do sofrimento no enfermeiro(11,17,24).
No que tange às situações emergenciais, o estresse, provavelmente, advém da
luta contra o tempo - afinal, a tomada de decisão rápida e precisa associada à
disponibilidade de recursos e agilidade da equipe pressupõe a diferença entre a
vida e a morte das pessoas. Um estudo descritivo realizado em uma UTI de um
hospital universitário brasileiro(25), constatou que a prevalência de estresse
ocupacional entre profissionais de enfermagem que mencionaram como causas, a
gravidade dos pacientes e a instabilidade do quadro clínico, era de 59,4%.
Orientar e/ou atender os familiares de pacientes críticos também não é tarefa
fácil haja vista que, independentemente do nível de escolaridade ou do grau de
compreensão, a família vivencia um momento ímpar em que sentimentos
relacionados ao adoecimento de um ente querido, associada à negação da
gravidade da doença, à ansiedade e o medo da morte, podem representar empecilho
ao entendimento e à interação com a equipe da UTI e, por conseguinte, causar
estresse ocupacional. O momento da orientação e atendimento aos familiares,
portanto, podem ser considerados como estressantes pelos enfermeiros que devido
à aproximação com a família do paciente, desencadeia um processo de
identificação de sentimentos, com envolvimento para além do paciente(24).
É importante lembrar que, como dito anteriormente, o estresse se relaciona à
percepção e compreensão individual da situação que cada qual vivencia. Com
isso, o profissional, ao identificar quais são os fatores que o estressa, de
alguma forma, precisa desenvolver estratégias para lidar com o que lhe incomoda
e assim, melhorar a sua qualidade de vida e de trabalho(4).
Apesar de presente em toda e qualquer situação, além de ser uma atividade
corriqueira do ser humano, cada sujeito tem a possibilidade de reagir de forma
diferenciada aos diversos estímulos aos quais estão expostos. Desse modo, a
forma como o indivíduo reage determina o nível de estresse que ele foi
submetido e que mudanças serão implementadas para superá-lo(6).
É preciso, entretanto, que as estratégias individuais e em grupo sejam
implantadas e/ou intermediadas por gerentes e gestores porque, o estresse
profissional tende a afetar a vida pessoal e também, o desempenho profissional
dos enfermeiros.
CONCLUSÕES
Os enfermeiros investigados, que atuam em UTI, são predominantemente do sexo
feminino (68,4%), com média de idade abaixo dos 40 anos (91,4%).
Apenas 3 (5,2%) enfermeiros apontaram que a Assistência prestada ao paciente
redunda em alto nível de estresse. Esse dado indica que essa categoria
profissional se adapta ao ambiente de trabalho reconhecido pela literatura como
altamente estressante.
O modelo de regressão linear multivariada não apresentou associação
significativa entre variáveis sociodemográficas e profissionais com o nível
médio de estresse do Domínio D da EBS.
Todos os estressores que compõem o domínio Assistência prestada ao paciente
foram considerados como medianamente estressantes. Especial atenção deve ser
dada, entretanto, àqueles que obtiveram pontuações mais elevadas e que
representam potenciais agravantes à saúde dos enfermeiros, dentre os quais
constam: Enfrentar a morte (5,6 pontos); Atender às emergências na unidade (5,1
pontos); e, Atender aos familiares de pacientes críticos ou Orientar familiares
de pacientes críticos (respectivamente com 4,8 pontos).
Os dados deste estudo indicam que o estresse entre os enfermeiros das UTI
investigadas não é elevado, mas se encontra presente nos diferentes momentos em
que presta assistência ao paciente. Para minimizar esse quadro, sugere-se que
as instituições e seus trabalhadores adotem estratégias voltadas à sua
prevenção e/ou redução, sem que os profissionais deixem de exercer as
atividades previstas em Lei.