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BrBRCVHe0034-71672013000700013

BrBRCVHe0034-71672013000700013

variedadeBr
Country of publicationBR
colégioLife Sciences
Great areaHealth Sciences
ISSN0034-7167
ano2013
Issue0007
Article number00013

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Uma década de Diretrizes Curriculares Nacionais para a Graduação em Enfermagem: avanços e desafios

INTRODUÇÃO Falar de Diretrizes Curriculares Nacionais do Curso de Graduação em Enfermagem (DCN/ENF) requer, necessariamente, falar de mudanças paradigmáticas no contexto acadêmico, que visem à formação de profissionais competentes, críticos e comprometidos com a saúde da população; implica em discutir o processo de formação, em suas múltiplas determinações e apreendê-lo na historicidade da educação em enfermagem no país(1).

Buscando identificar essas mudanças, o estudo tem como objeto as DCN/ENF após uma década da sua aprovação. A análise dos dez anos dessas Diretrizes se torna de real significação para a enfermagem, não pelo sentido coletivo nela implicado, mas, também, pela sua ressonância num momento singular para o nosso país, em que a expansão de cursos de enfermagem vem se dando de forma desordenada e com pouca aderência às demandas regionais de saúde e educação.

Frente a essas considerações, foram levantados os questionamentos: Qual a realidade das escolas/cursos de graduação em enfermagem após dez anos da aprovação das DCN/ENF? As escolas/cursos estão se mobilizando para a implementação das mudanças na Educação em Enfermagem? Quais os avanços conquistados e os desafios encontrados no processo de formação das enfermeiras, após a aprovação/publicação das DCN/ENF? Na busca de respostas a esses questionamentos, o presente estudo teve como objetivo analisar os avanços e desafios de uma década das DCN/ENF.

METODOLOGIA Trata-se de um estudo documental, que possibilita ampliar o entendimento dos avanços e desafios de uma década das DCN/ENF, cuja compreensão necessitou de contextualização histórica e sociocultural. O uso de documentos em pesquisa permite acrescentar a dimensão do tempo à compreensão do social, além de favorecer a observação do processo de análise da evolução de indivíduos, grupos, conceitos, conhecimentos, comportamentos, mentalidades e práticas(2).

Os documentos analisados foram a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (3) e a Resolução CNE/CES 03/2001(4). Foi analisada, também, a produção intelectual brasileira, sobre a temática, na década 2001 a 2011. Essa produção foi buscada em periódicos científicos da área, através da Biblioteca Virtual em Saúde (BVS), Base de Dados da Enfermagem (BDENF), Base de Dados Scientific Eletronic Library Online (SCIELO) e da Literatura Latino-Americana em Ciência e Saúde (LILACS). A coleta de dados foi realizada no período de 2 a 15 de Julho de 2012, utilizando-se os unitermos "diretrizes curriculares enfermagem" e "educação em enfermagem". Como critérios de inclusão, determinou-se: publicações realizadas no período de 2001 a 2011 e que apresentassem texto completo. Foram encontrados inicialmente 119 artigos de onde foram excluídos 24 por não apresentarem texto completo. Em seguida, as publicações foram confrontadas e encontradas 33 repetidas nos três bancos de dados, restando, então, 62 artigos. Vale destacar que, desse total, 51,6% (33) foram publicados na Revista Brasileira de Enfermagem.

Esses documentos foram analisados, buscando-se aspectos relevantes que aparecem e reaparecem em contextos variados, direcionando a codificação da unidade de análise, que reflete os propósitos da pesquisa.

O estudo ancorou-se no referencial metodológico da dialética, que proporcionou a abordagem da realidade estudada, reconhecendo-a e relacionando-a com o processo histórico, no seu peculiar dinamismo, provisoriedade e transformação.

O método dialético é considerado como uma estratégia de apreensão e compreensão de uma dada realidade social, com suas contradições e desdobramentos(5). Nesse entendimento, as DCN/ENF foram analisadas na sua dinamicidade e contradições, bem como na totalidade de sua inserção nas políticas públicas de educação.

Esta pesquisa não representa qualquer tipo de risco à saúde ou à integridade físico-moral dos sujeitos, nem, tampouco, implica em qualquer forma de intervenção direta sobre os mesmos. Está estruturada, inicialmente, através de um breve relato do processo de construção das DCN/ENF, como forma de visualizar o seu caráter coletivo de concepção, seguido da explicitação dos elementos que fundamentam essas diretrizes e do resultado de um levantamento da produção intelectual de enfermeiras(os) durante uma década das DCN/ENF. Finalmente, são apresentadas as considerações inconclusas e transitórias sobre os 10 anos das DCN/ENF, seus avanços e desafios.

A CONSTRUÇÃO DAS DIRETRIZES CURRICULARES NACIONAIS DO CURSO DE GRADUAÇÃO EM ENFERMAGEM: SEU CARÁTER COLETIVO A década de 90, no Brasil, caracterizou-se pela mudança do modelo econômico, com o acirramento da política neoliberal e a universalização da exclusão social resultantes da primazia do econômico em detrimento do social, com implicações no setor da educação e da saúde.

É nesse contexto que se a aprovação da Lei n.º 9.394/96, conhecida como a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB), em dezembro de 1996(3).

Essa Lei abriu espaços para a flexibilização dos currículos de graduação e para a superação do modelo de "currículo mínimo" e da "grade curricular"; trouxe novas responsabilidades para as Instituições de Ensino Superior (IES), assegurando autonomia didático-científica, bem como para criar cursos, fixar os currículos dos seus cursos e programas, além de adotar as Diretrizes Curriculares que melhor atendessem ao perfil epidemiológico e social da comunidade.

A partir da aprovação da LDB, a Associação Brasileira de Enfermagem (ABEn) desencadeou encontros e seminários para discutir e estabelecer as diretrizes gerais para a educação em enfermagem, articulando os diversos níveis de formação. Nesse sentido, em 1998 foi realizado o Seminário Nacional de Diretrizes para a Educação em Enfermagem (SENADEn), que teve como principal finalidade discutir o processo ensino-aprendizagem da Enfermagem, em seus diferentes níveis, à luz da LDB, tendo como perspectiva a formulação de propostas de diretrizes curriculares para a formação dos profissionais de enfermagem(6). O documento síntese do Senaden resgatou o Parecer 314/94- CFE e a Portaria 1721/94-MEC, em fase de implantação, e serviu de subsídio para a elaboração das Diretrizes Curriculares.

Vale destacar, também, a mobilização das(os) enfermeiras(os) durante o 51º Congresso Brasileiro de Enfermagem e 10º Congresso Pan-americano de Enfermería, realizados, simultaneamente, em outubro de 1999, na cidade de Florianópolis-SC.

Nessa oportunidade, foi elaborada a "Carta de Florianópolis"(7) com uma proposta para as Diretrizes Curriculares, que emergiu das discussões da categoria.

Em continuidade às discussões, em abril de 2000, realizou-se, em Fortaleza-CE, o SENADEn, com o tema central "Enfermagem: tendências e perspectivas político-pedagógicas", cujas recomendações finais foram agregadas às propostas encaminhadas à Comissão de Especialistas de Ensino de Enfermagem (CEEEnf).

Em agosto de 2001, concretizou-se o Parecer 1133 do CNE/CES(8) que reforçou a necessidade de articulação entre Educação e Saúde, objetivando a formação geral e específica dos egressos/profissionais, com ênfase na promoção, prevenção, recuperação e reabilitação da saúde. Esse Parecer apresenta a concepção de saúde, os princípios e diretrizes do Sistema Único de Saúde (SUS) e o objeto e objetivo das Diretrizes Curriculares dos Cursos de Graduação na área.

A CEEEnf, designada pela Portaria SESu/MEC 1518 de 14/6/2000, assumiu, em parceria com a ABEn, um trabalho coletivo com profissionais da área, para a construção da proposta das DCN/ENF. Essa proposta foi enviada ao Conselho Nacional de Educação, através do Ofício 11876 MEC/SESu/DEPES de 17 de outubro de 2000 e aprovada por esse Conselho em 7 de novembro de 2001, através da Resolução CNE/CES 3 de 7/11/2001(4).

A formulação das DCN/ENF resultou de uma construção coletiva que envolveu debates nacionais de diferentes segmentos da área da saúde e da educação, tais como: a CEEEnf da Secretaria de Educação do Ensino Superior do Ministério da Educação, IES, ABEn, Rede Unida, Movimento Estudantil e a categoria de enfermeiras(os) reunida em eventos científicos da área.

As DCN/ENF tiveram, pois, sua materialidade concretizada a partir de propostas que emergiram da mobilização das(os) enfermeiras(os), através da sua associação de classe, de entidades educacionais e de setores da sociedade civil interessados em defender as mudanças da formação na área da saúde.

RESULTADOS E DISCUSSÃO Os resultados apresentam os elementos que fundamentam as DCN/ENF através da análise do seu conteúdo, bem como a realidade das escolas/cursos na mobilização para implantação dessas diretrizes, além da produção intelectual das(os) enfermeiras(os) sobre a temática durante a década de 2001 a 2011, com seus avanços e desafios.

DCN/ENF: elementos que as fundamentam As DCN/ENF se constituem num instrumento norteador do processo de construção de Projetos Pedagógicos, trazendo como parâmetros: eixo orientador dos conteúdos mínimos para a formação do profissional; flexibilidade na organização do curso; princípio da formação integral; adoção de metodologias ativas; incorporação de atividades complementares; princípio da interdisciplinaridade; predominância da formação sobre a informação; articulação entre teoria e prática; indissociabilidade entre ensino, pesquisa e extensão(4).

O perfil profissional, delineado no Art. das DCN/ENF, está voltado para a formação generalista, humanista, crítica e reflexiva; para o exercício de enfermagem, com base no rigor científico e intelectual e pautado em princípios éticos; para conhecer e intervir sobre os problemas/situações de saúde-doença mais prevalentes no perfil epidemiológico nacional, com ênfase na sua região de atuação para atuar, com senso de responsabilidade social e compromisso com a cidadania, como promotor da saúde integral do ser humano(4).

As competências e habilidades gerais, explicitadas no Art , apontam para a promoção de conhecimentos requeridos para a atenção à saúde, no âmbito individual e coletivo, com terminalidade e resolutividade em todos os níveis de complexidade; a tomada de decisões para avaliar, sistematizar e decidir condutas adequadas baseadas em evidências científicas; a comunicação propiciadora da interatividade com pacientes, grupos e comunidades; a liderança no trabalho em equipe multiprofissional, pautada no compromisso, responsabilidade e empatia; a administração e gerenciamento da força de trabalho, bem como dos recursos físicos, materiais e de informação; a educação permanente favorecendo o aprender continuamente(4).

As 33 competências e habilidades específicas estão pautadas nas concepções do aluno como sujeito de seu processo de formação, articulação entre teoria e prática, diversificação dos campos de aprendizagem, metodologias ativas, articulação da pesquisa com o ensino e a extensão, flexibilidade curricular, interdisciplinaridade, incorporação de atividades complementares e avaliação da aprendizagem(4).

As competências gerais e específicas são alcançadas através das metodologias ativas tendo a(o) aluna(o) como sujeito de sua aprendizagem, capaz de "aprender a aprender", e o professor como facilitador dessa aprendizagem(4).

Os Conteúdos Essenciais,explicitados no Art.6º, estão indicados através de eixos temáticos que devem contemplar as: Ciências Biológicas e da Saúde, Ciências Humanas e Sociais e Ciências da Enfermagem, onde se incluem Fundamentos de Enfermagem, Assistência de Enfermagem, Administração de Enfermagem e Ensino de Enfermagem(4).

O Art.7º indica a obrigatoriedade do Estágio Curricular Supervisionado não na rede hospitalar e ambulatorial, mas, também, na rede básica de serviços de saúde e comunidades, nos dois últimos semestres do curso, assumindo o caráter de atividade terminal, síntese da formação, além de buscar a integração teoria- prática, atribuindo à última o caráter de terminalidade e validação do processo formativo(4).

O Parágrafo , do artigo traz, também, a necessidade da efetiva participação de enfermeiras(os) na programação e no processo de supervisão da (o) aluna(o) nos serviços de saúde onde se desenvolve o estágio(4).

Quanto ao aproveitamento das Atividades Complementares, o Art. explicita que deve estar contemplado no Projeto Pedagógico, devendo-se criar mecanismos de aproveitamento de conhecimentos adquiridos pela(o) aluna(o) através de estudos e práticas independentes, presenciais e/ou a distância(4).

Quanto à organização dos cursos, as DCN/ENF apontam para a necessidade de definição de estratégias que articulem o saber (os conteúdos), o saber fazer (atitudes/habilidades) e o saber conviver (competências). Esses parâmetros, por sua vez, oferecem os elementos para as bases filosóficas, conceituais e metodológicas que irão definir um perfil acadêmico e profissional com competências, habilidades e conteúdos, dentro de perspectivas e abordagens contemporâneas de formação, pertinentes e compatíveis com referencias nacionais e internacionais, capazes de atuar com qualidade, eficiência e resolutividade, no SUS(6).

As Diretrizes Curriculares tratam também do processo de avaliação do aluno esclarecendo que as avaliações "deverão basear-se nas competências, habilidades e conteúdos curriculares"(4).

Dez anos após a aprovação das DCN/ENF: a produção intelectual Na década estudada, o período em que mais se publicou sobre a temática das DCN/ ENF foi de 2003 a 2004, sendo que, nos três últimos anos, da década, essa produção vem decrescendo.

A análise da produção indicou que as escolas/cursos, durante a década estudada, se mobilizaram para a implantação das mudanças no processo de formação das(os) enfermeiras(os); os PPC sofreram mudanças pontuais relacionadas à LDB e DCN/ ENF. As principais temáticas abordadas estiveram voltadas para: a construção e implementação de Projetos Pedagógicos de Curso (PPC) inovadores, adoção de metodologias ativas, implementação de currículos integrados, desenvolvimento de ações de integração teoria/prática, implementação de estágio curricular supervisionado, de atividades interdisciplinares e de integração ensino/ serviço, evidenciando como as DCN/ENF se expressam nos PPC(1,6,9-22).

Essas temáticas registraram avanços na busca de um processo formativo mais aderente às necessidades de saúde da população, voltado para uma lógica interdisciplinar; para a adoção de metodologias ativas, tendo o aluno como sujeito do seu processo formativo; para a reorganização dos componentes curriculares; para o fortalecimento da articulação teoria/prática; para a indissociabilidade pesquisa/ensino/extensão; para a diversificação dos cenários de aprendizagem numa contínua aproximação do mundo do ensino com o mundo do trabalho; flexibilidade curricular com a adoção de medidas que contraponham a rigidez dos pré-requisitos e dos conteúdos obrigatórios; avaliação formativa voltada para as competências, traduzida no desempenho de habilidades, deixando de ser pontual, punitiva e discriminatória, para transformar-se num instrumento de acompanhamento de todo o processo ensino-aprendizagem; terminalidade do curso garantindo a formação generalista, instrumentalizando o profissional a atuar em variados contextos, opondo-se à especialização precoce e evitando visões parciais da realidade.

A produção bibliográfica estudada registrou, destarte, avanços, como a incorporação de conceitos provenientes da pedagogia crítica, dentre eles, a autonomia, a problematização da realidade, e a necessidade de formar profissionais aptos a aprender a aprender e comprometidos com o enfrentamento dos problemas de saúde da nossa sociedade.

Alguns estudos(23), no entanto, problematizam as DCN/ENF, suscitando inúmeras correlações com dificuldades, necessidades, possibilidades e impossibilidades que envolvem a complexidade do processo de formação de enfermeiras(os).

A formação por competências, legalmente sustentada pela LDB e oficialmente incentivada pelas DCN/ENF, tem suscitado críticas na sua compreensão, particularmente no que se refere à sua concepção tecnicista, assim como na sua subjetividade favorecendo múltiplas interpretações e criando dificuldades na sua implementação, além de minimizar o trabalho coletivo e favorecer o processo de individualização da sociedade e sua aproximação epistemológica com as perspectivas neoliberais. A formação por competência transfere para o indivíduo a responsabilidade pelo seu sucesso e pelo seu fracasso(23).

Outro aspecto problematizado é o da interdisciplinaridade. Mesmo reconhecendo- se a importância da formação interdisciplinar, a interdisciplinaridade tem sido questionada pela forma como se deposita nela a solução para muitos dos males que acometem o ensino, particularmente quando se trata de justificar mudanças curriculares(23). Considera-se que, mesmo que se possa imaginar um saber que não seja organizado pelas disciplinas, certamente haverá um saber dividido em algum eixo, elemento ou categoria; considera-se, ainda, a existência de um equívoco conceitual em torno da interdisciplinaridade.

Alguns estudos(13,24-27) vêm levantando dificuldades na implementação das DCN/ ENF, destacando-se as contradições entre a formação teórico-prática e a práxis profissional, entendendo-se que as estratégias pedagógicas necessitam ser mais bem exploradas pelo corpo docente dos cursos. Esses estudos, além da explicitação das dificuldades, trazem também as possibilidades de enfrentamentos e superação dessas dificuldades.

Outros estudos(10,13,24) estão direcionados para a questão da terminalidade da formação através do Estágio Curricular Supervisionado, nos dois últimos semestres do curso, subseqüentes à teoria, frente à insuficiente integração academia-serviço intra e extra-muros, além de evidenciar uma dissociação entre teoria e prática, onde primeiro o aluno é informado, em sala de aula, de todos os conceitos teóricos acerca do tema e posteriormente é levado à pratica para aplicação desses conceitos.

Outros(1,9,28) expõem sua opinião favorável ao modo como foram construídas as DCN/ENF, destacando o contexto político em que devem ser interpretadas e que se supõe que serão implementadas; fornecem elementos para a reflexão acerca da formação em Enfermagem, considerando a necessidade da elaboração de PPC, tomando como referência alguns fatores constituintes do fazer pedagógico, oportunizando a reflexão crítica sobre a relação teórico-prática e os papéis dos sujeitos envolvidos no processo ensino-aprendizagem.

Na avaliação feita acerca da aderência dos cursos de graduação de enfermagem às DCN/ENF, registro de fortalezas e fraquezas dos cursos nas três dimensões dos relatórios de avaliação, e da necessidade das escolas/cursos buscarem melhor vinculação entre a adoção das bases epistemológicas presentes nas DCN/ ENF e as propostas nos PPC/ENF(18).

Dez anos após a aprovação das DCN/ENF: desafios, lutas e avanços A busca da implementação de uma mudança para adequar a formação da(o) enfermeira(o) à diversidade e complexidade do mundo contemporâneo implica no enfrentamento a desafios, assim como nas lutas e conquistas da categoria de enfermagem.

O enfrentamento aos desafios encontrados na implementação das DCN/ENF versaram, fundamentalmente, em: sair do pólo de ensino centrado no professor, para o pólo da aprendizagem centrada no aluno como sujeito do seu processo de formação; enfatizar a predominância da formação sobre a informação; sair da fragmentação do modelo disciplinar para a construção de um modelo integrado, onde o eixo da formação passa a ser a prática/trabalho/cuidado; sair da teoria antecedendo a prática para a articulação teoria/prática; romper com as barreiras institucionais que favorecem a rigidez curricular; permitir a construção de modelos pedagógicos criativos e inovadores que busquem um processo formativo que expresse compromissos éticos e políticos com o exercício da cidadania e com qualidade de vida da população; romper com o modelo de ensino voltado apenas para a absorção de conhecimento, para um modelo voltado para o aprender a pensar, saber comunicar-se e pesquisar, ter raciocínio lógico, fazer sínteses e elaborações teóricas; sair do pólo da rigidez dos pré-requisitos e conteúdos obrigatórios para o pólo do incremento da flexibilidade curricular; romper com rigidez curricular que dificulta a incorporação de atividades complementares para a criação de mecanismos de aproveitamento de conhecimentos, adquiridos pelo estudante, através de estudos e práticas independentes; sair do pólo da avaliação somativa para o pólo do processo formativo, deixando de ser pontual, punitiva e discriminatória para ser uma avaliação que respeite a individualidade do aluno; romper com a dicotomia ensino/pesquisa/extensão aprofundando a articulação da pesquisa com o ensino e a extensão, desenvolvendo a habilidade de produzir conhecimento próprio e inovador mediante a inserção em realidades concretas, ou seja, formação centrada na práxis.

Essas ações de enfrentamento aos desafios encontraram apoio nas lutas travadas pela ABEn, tais como estímulo, retomada e fortalecimento dos Fóruns Estaduais de Escolas/Cursos de Enfermagem, promovendo a socialização das experiências e levantando subsídios para uma política de formação do enfermeiro, integrada à realidade epidemiológica e profissional e à integralidade das ações do cuidar.

Destaca-se, também, na década estudada, o papel a ABEn na construção de um movimento em defesa da qualidade da formação dos profissionais da Enfermagem, com elaboração de uma agenda propositiva, aprovada em agosto de 2010, durante o 12º SENADEn, onde se ressalta a necessidade de: "reivindicar ao Ministério da Educação agilidade na alteração do Decreto 5.773 de 2006, para que os pedidos de criação de Cursos de Graduação em Enfermagem sejam encaminhados para apreciação do Conselho Nacional de Saúde", a exemplo do que ocorre com os cursos de Medicina, Odontologia e Psicologia. Nesse direcionamento, o Conselho Nacional de Saúde acatou a inclusão no Decreto 5.773 da Enfermagem e a Secretaria de Regulação e Supervisão aponta para uma substituição do curso de Psicologia pela Enfermagem, no Decreto 5.773. A Comissão Intersetorial de Recursos Humanos (CIRH) se manifestou a favor da inclusão dos 14 cursos da área da saúde no Decreto 5.773, de forma gradativa, começando pela Enfermagem.

Outra conquista da categoria liderada pela ABEn, foi a aprovação da Resolução CNE/CES . 04, de 6 de Abril de 2009 que dispõe sobre Carga Horária Mínima e procedimentos relativos à integralização na modalidade presencial: curso de graduação em enfermagem com a carga horária mínima de 4000 horas e integralização em 5 (cinco) anos e 10 (dez) semestres letivos.

CONSIDERAÇÕES INCONCLUSAS E TRANSITÓRIAS SOBRE OS 10 ANOS DAS DCN/ENF Muitos têm sido os avanços no fortalecimento da mudança na área da educação em enfermagem, tendo como referência as DCN/ENF como eixos estruturantes do processo de formação profissional.

Esses avanços se constituem em fruto da mudança paradigmática na contemporaneidade, envolvendo o reconhecimento da multidimensionalidade da prática profissional (técnica/científica, ética, social, política) como forma de superar o pensar simplificado e fragmentado da realidade; a adoção da ótica pluralista das concepções de ensino, integrando a diversidade dos campos do conhecimento e uma visão global da realidade; estímulo à indissociabilidade entre as bases biológicas e sociais da atenção à saúde/enfermagem; fomento à articulação da pesquisa com o ensino e a extensão contemplando a integração teoria e prática; fomento à produção do conhecimento próprio e inovador, voltado para uma assistência de qualidade; diversificação de cenários de práticas de saúde/enfermagem; adoção de metodologias ativas de ensino- aprendizagem, tendo o aluno como sujeito do seu processo de formação; adoção da flexibilidade curricular evitando a rigidez dos pré-requisitos e dos conteúdos obrigatórios.

Registra-se, portanto, que houve mudanças no processo de formação a partir da incorporação, pelas IES, dos elementos fundantes das DCN/ENF, em sintonia com as novas políticas de educação e saúde, não como mudanças radicais ou impositivas, mas como transformações construídas coletivamente e com resultados concretos.

Ao lado desses avanços ficou o reconhecimento de que às DCN/ENF não deve ser atribuído o poder de, por si , viabilizar as condições e os processos necessários à materialidade da mudança no processo de formação. Apesar da sua relevância no trabalho educativo e no direcionamento de esforços coletivos, não houve registro de que as DCN/ENF, isoladamente, possam concretizar as condições para a qualidade da formação. Esta não pode responder apenas às dimensões do aprender a aprender, do aprender a fazer, do aprender a ser e do aprender a conviver, pois está atrelada ao papel social e político do trabalho em saúde/ enfermagem e inserida nas políticas públicas de educação e saúde.

Ficou evidenciado, também, que o texto das DCN/ENF, em alguns pontos, traz aspectos subjetivos, favorecendo múltiplas interpretações e reforçando uma adesão a conceitos e concepções equivocadas sem um adequado aprofundamento.

As constatações aqui apresentadas permitiram reconhecer o dinamismo e a provisoriedade das DCN/ENF em sua totalidade e desdobramentos. Permitiram, também, o reconhecimento da superação da visão reducionista que supõe que a formação de um profissional resulta apenas de um processo de aquisições cognitivas e comprovação de habilidades de discernimento intelectual. Essa superação leva ao alcance da visão contemporânea que considera a formação profissional como resultante de um processo que envolve as políticas de ensino, políticas do exercício profissional e as do trabalho em saúde/enfermagem e que considera a formação profissional construída em novas bases, com características criativas e inovadoras, sintonizados com uma nova visão de mundo.

Essas constatações requerem, destarte, a promoção da interface entre saúde, educação e trabalho, sob a orientação estrutural do SUS, da ética e da cidadania, não se limitando a questões técnicas, de conteúdos de ensino, procedimentos didáticos e técnicas pedagógicas, mas pautando-se, fundamentalmente, na adoção de um referencial teórico-pedagógico que sustente uma aprendizagem significativa, transformadora e adequada às demandas sociais e profissionais que se apresentam na contemporaneidade.

Finalmente, reconhecendo a importância e complexidade do processo de formação, torna-se de fundamental importância a continuidade de estudos para o aprofundamento das imprecisões teóricas inquietantes, assim como para a superação das dificuldades em transpor as concepções propostas nas DCN/ENF para os cenários do processo de formação como uma estratégia de apreensão e compreensão da prática social empírica de uma dada realidade social, com suas contradições e desdobramentos. Estudos, enfim, que possam clarear os pressupostos teóricos, filosóficos e metodológicos que direcionam a construção do PPC voltado para o SUS, a Ética, a Cidadania, a Epidemiologia e o Processo Saúde/Doença/Cuidado.

O presente estudo não se completa por si . Ele faz parte de um processo maior que perpassa o processo de trabalho em saúde/enfermagem. A análise de uma década das DCN/ENF é muito mais do que conseguimos apresentar, necessitando de mais estudos em busca do fortalecimento da qualidade do processo de formação da (o) enfermeira(o) em nosso país.


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