Perfil de usuários atendidos em uma unidade não hospitalar de urgência
INTRODUÇÃO
O Sistema Único de Saúde (SUS) representa um marco na luta pelos direitos de
cidadania, defendidos pela Constituição Federal Brasileira de 1988. Desde sua
implantação, tem como desafio permanente a garantia do acesso universal e
equânime a todos os cidadãos à atenção à saúde integral, humanizada e de
qualidade(1).
Sem dúvida, o SUS alcançou importantes avanços, especialmente a ampliação do
acesso aos serviços da Atenção Básica. Entretanto, ainda enfrenta problemas no
que se refere à oferta desordenada das ações de saúde, o que gera grandes filas
de espera e uma demanda reprimida na atenção ambulatorial e hospitalar(1).
De acordo com a política de saúde vigente, o acesso à rede de serviços tem como
porta de entrada a Atenção Básica, que deve estar apta para acolher, atender e
resolver os principais problemas de saúde da população. Os agravos não
resolvidos nesse nível devem ser referenciados para serviços de maior
complexidade tecnológica(2). Assim, a integração entre os diferentes níveis de
atenção faz-se necessária para garantir a otimização dos recursos e o
atendimento integral e resolutivo à saúde dos usuários.
A assistência à saúde no Brasil passou por mudanças e adequações, de modo a
atender as necessidades de saúde da população, tendo em vista o aumento da
demanda, principalmente na área de urgência e emergência. Cuidar da saúde de
grupos sociais e pessoas em situações de urgência reduz a vulnerabilidade ao
adoecimento, às incapacidades físicas, ao sofrimento crônico e à morte
prematura, o que evidencia a necessidade da organização do atendimento às
urgências e emergências no País, em todos os níveis de atenção(3).
De acordo com a Política Nacional de Urgência e Emergência, esses serviços são
componentes essenciais da atenção à saúde e devem estar organizados estrutural
e funcionalmente para dar respostas às necessidades de saúde da população. No
Brasil, a assistência às urgências e emergências ocorre predominantemente em
serviços que funcionam exclusivamente para esse fim, durante 24 horas por dia.
Tais serviços muitas vezes também funcionam como porta de entrada do sistema de
saúde, acolhendo em situações de urgência indivíduos que estão fora desse
sistema, quer da Atenção Básica ou da especializada(2).
O sistema de saúde brasileiro apresenta importantes avanços no que se refere à
definição de conceitos e incorporação de tecnologias com vistas à organização
do atendimento em rede(4). No que se refere à atenção a urgências e
emergências, recentemente o Ministério da Saúde promulgou a Portaria nº 1.600/
2011, reformulando a Política Nacional de Atenção às Urgências e a Rede de
Atenção às Urgências no SUS. O objetivo é ampliar o acesso e o acolhimento de
casos agudos em todos os pontos de atenção do sistema, mediante a classificação
de risco e a intervenção adequada e necessária aos diferentes agravos(5).
Na composição da rede de atenção às urgências, as unidades não-hospitalares,
conhecidas como Unidades de Pronto Atendimento (UPA), fazem parte dos serviços
disponíveis para a população e devem estar estruturadas para prestar
assistência adequada em situações de urgência e emergência de complexidade
intermediária entre a rede básica de saúde (unidades básicas de saúde ou
unidades de saúde da família) e os serviços hospitalares(5).
Entretanto, as UPA tem atuado como porta de entrada para os usuários com
queixas crônicas e sociais, que procuram esses serviços em busca de
resolubilidade para demandas que deveriam ser atendidas em outros níveis de
atenção à saúde, sobrecarregando assim as equipes multiprofissionais(6).
Há décadas que se observa o crescimento do número de pessoas que buscam
atendimento em serviços de atenção às urgências e emergências. Os motivos são
diversos, tais como a baixa resolutividade das unidades básicas de saúde (pouca
disponibilidade de especialistas, exames e medicamentos), as dificuldades de
acesso (demora na marcação de consultas, com meses de espera, filas longas e
horários restritos de atendimento) e a utilização dos serviços pela população
de municípios menores (por baixo investimento na rede própria ou conveniada)
(7).
Reduzir o uso inapropriado de serviços de emergência requer ampliação do acesso
à Atenção Básica. Entretanto, para que essa substituição ocorra, os usuários
precisam ter garantido acesso rápido ao atendimento de urgência no primeiro
nível de atenção(8).
Reorganizar o modelo de assistência às urgências e emergências requer ainda o
funcionamento adequado das unidades não hospitalares para o acolhimento/
atendimento das urgências de baixa gravidade/complexidade(2). Essa reformulação
implica o atendimento aos usuários com quadros de urgência e emergência,
prestado por todas as portas de entrada do SUS, de maneira a possibilitar a
resolução do problema de saúde ou o encaminhamento para um serviço de maior
complexidade, quando necessário.
O objetivo desse estudo foi avaliar o perfil dos usuários adultos atendidos em
uma unidade não hospitalar de urgência e emergência de um município do interior
paulista.
MÉTODO
Realizou-se um estudo descritivo, com abordagem quantitativa, em uma unidade
distrital de saúde do distrito oeste de saúde de um município do interior
paulista. O município em estudo está organizado em cinco distritos de saúde,
que contam com diversas unidades de saúde da rede básica de saúde (UBS) ou
unidade de saúde da família (USF) e uma unidade distrital de saúde por distrito
(UDS), que funciona 24 horas. Trata-se de uma unidade não hospitalar de
atendimento de urgência e emergência, de complexidade intermediária, que serve
como "ponte" entre as unidades UBS ou USF e as unidades hospitalares de
atendimento às urgências. Atende uma área de abrangência de população estimada
de 151.218 habitantes, que conta com oito UBS e uma USF distribuídas em
diversos bairros da zona oeste do município estudado.
A análise da produção de consultas médicas realizadas na rede municipal apontou
uma produção elevada nas consultas do pronto atendimento, ocasionando uma
demanda excessiva nas UDS, onde casos que deveriam ser atendidos na Atenção
Básica misturavam-se com os de urgência/emergência(9).
A distribuição das unidades de saúde em distritos visa, entre outros, oferecer
pronto-atendimento a urgências e emergências o mais próximo possível do local
de residência do usuário. A unidade atende a população de todas as faixas
etárias, entretanto, neste estudo optou-se por analisar a população adulta
atendida no serviço.
Para a análise dos dados sobre o perfil da população atendida no serviço de
urgência utilizou-se um instrumento desenvolvido com base nos dados disponíveis
nas fichas de atendimento de urgência. Tais fichas são emitidas pelo sistema
Hygia que consiste no principal instrumento de processamento de dados da
Secretaria Municipal de Saúde e contém dados referentes à demanda e os motivos
de procura pelo serviço, meios diagnósticos e terapêuticos, desfechos dos casos
após consulta médica (alta, observação na unidade, encaminhamentos para outros
serviços (UBS e ambulatórios de especialidades), regulação para serviços de
maior complexidade e densidade tecnológica) e os procedimentos realizados.
Embora houvesse os registros do atendimento, estes dados não eram processados
no sistema, por isto a análise das fichas foi manual.
A amostra foi calculada a partir do número de atendimentos realizados no ano de
2011, que foi de 93.283 no total. Considerou-se uma margem de erro de 5% e um
nível de confiança de 95% e 20% de perdas. Para a seleção da amostra utilizou-
se a técnica de amostragem aleatória sistemática, com intervalo de 194
calculado pelo SPSS, iniciando a coleta de dados após o sorteio na ficha 191.
O estudo foi aprovado pela Secretaria Municipal de Saúde, bem como pela direção
da UDS do distrito oeste e também pelo Comitê de Ética da Escola de Enfermagem
de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo, em que recebeu o número de
Protocolo 1.308/2011.
RESULTADOS
Foram analisados 477 boletins de atendimento de urgência referentes ao período
de 1º de janeiro a 31 de dezembro de 2011. Quanto ao sexo, 256 (53,7%) dos
usuários que procuraram o PA no período estudado eram do sexo feminino e 221
(46,3%), do masculino. Quanto à faixa etária, indivíduos jovens com idade entre
20 e 29 anos foram os que mais procuraram o serviço de pronto-atendimento
(n=114; 23,9%), seguidos pelos idosos (n=110; 23,1%), conforme mostra a Tabela
1.
Tabela 1 - Distribuição dos atendimentos de usuários adultos, segundo sexo,
faixa etária, período de atendimento e dia da semana. UDS Sumarezinho, Ribeirão
Preto-SP, 2012
Variáveis n %
Total 477 100
Sexo
Feminino 256 53,7
Masculino 221 46,3
Total 477 100
Faixa etária em anos
< 20 33 6,9
20-29 114 23,9
30-39 82 17,2
40-49 70 14,7
50-59 68 14,3
> ou = 60 110 23,1
Total 477 100
Período do atendimento
Madrugada 39 8,2
Manhã 182 38,2
Tarde 157 32,9
Noite 99 20,8
Total 477 100
Dia da semana
Dias úteis 348 73,0
Fim de semana 129 27,0
Quanto ao bairro de procedência, verificou-se que o serviço de pronto-
atendimento foi procurado por pessoas da área de abrangência da UDS e que
residiam em bairros próximos (n=379; 79,4%). Entretanto, 80 (16,8%)
atendimentos foram de moradores de bairros pertencentes a outras áreas de
abrangência e em 18 (3,8%) fichas de atendimento essa informação não estava
disponível.
Dados referentes à utilização do Pronto-atendimento
A procura espontânea pelo serviço ocorreu em 466 (97,7%) dos boletins
analisados, em 9 (1,9%) foram encaminhados pelo Serviço Móvel de Urgência
(SAMU) e em apenas 2 (0,4%) dos casos foram encaminhados pela UBS/UFS.
Quanto aos motivos de procura pelo serviço, as principais queixas foram dor
aguda (n=126; 26,4%) que representaram a maior parte dos problemas dos usuários
que procuraram o serviço, seguida por problemas respiratórios (n=68; 14,3%),
trauma (n=53; 11,1%), mal-estar (n=42; 8,8%) e sintomas de dengue (n=39; 8,2%).
As queixas e os diagnósticos médicos dos usuários que procuram o serviço foram
bastante diversificados. Dentre as relacionadas a dor, as mais frequentes foram
lombalgia, mialgia, cefaleia e dor no joelho. A procura por atendimento pelos
usuários com sintomatologia de dengue está relacionada ao período de coleta de
dados em que usualmente casos de dengue são notificados na região.
A maioria dos motivos de procura ocorreu por problemas agudos de baixa
gravidade que poderiam ser resolvidos nas UBS, tais como resfriado comum,
amigdalite, infecção das vias aéreas superiores, infecção do trato urinário e
gastroenterite aguda. Por outro lado, também foram identificadas situações de
emergência que necessitam de intervenção imediata pela equipe de saúde, tais
como parada cardiorrespiratória, síndrome coronariana aguda, intoxicação
exógena, crise convulsiva, abdome agudo e trombose venosa profunda. Tal
situação aponta para a necessidade de organização do serviço no que se refere à
classificação dos usuários que necessitam de tratamento imediato, de acordo com
o potencial de risco e agravos à saúde ou grau de sofrimento.
Tabela 2 - Distribuição das fichas de atendimento de usuários selecionados na
amostra quanto ao motivo de procura pelo Pronto Atendimento. UDS Sumarezinho,
Ribeirão Preto-SP, 2012
Motivos de procura pelo PA N %
Total 477 100
Acidentes escorpiônicos 3 0,6
Complicações pós-cirurgia 1 0,2
Dor 126 26,4
Mal-estar 42 8,8
Problemas psiquiátricos 13 2,7
Problemas cardiovasculares 12 2,5
Problemas dermatológicos 9 1,9
Problemas gastrointestinais 30 6,3
Problemas ginecológicos 7 1,5
Problemas neurológicos 3 0,6
Problemas odontológicos 1 0,2
Problemas oftalmológicos 17 3,6
Problemas otológicos 3 0,6
Problemas renais 4 0,8
Problemas respiratórios 68 14,3
Problemas trato urinário 7 1,5
Problemas urológicos 1 0,2
Sintomatologia de dengue 39 8,2
Trauma 53 11,1
Verificar exames 29 6,1
Outros 7 1,5
Não Informado 2 0,4
Além do contingente de pessoas que não necessitavam de atendimento no serviço
de urgência, 29 (6,0%) haviam retornado ao serviço apenas para verificar
resultados de exames, o que demonstra a inoperância de um sistema de referência
para a rede básica, para a qual o usuário deveria ser referido para
acompanhamento após a ocorrência que o levou ao serviço de urgência.
Com relação ao dia da semana, verificou-se que 73,0% procuram o serviço de
pronto-atendimento nos dias da semana, quando as UBS ou a USF estão funcionando
e que a priori deveriam absorver esta demanda. Os dias de maior procura foram
as quintas (15,5%) e as segundas-feiras (14,9%). A procura pelo serviço nos
finais de semana ocorreu apenas em 27,0% dos atendimentos e o domingo (13,2%)
foi o dia de menor utilização do serviço. O mesmo foi observado em relação aos
horários dos atendimentos, pois 38,2% ocorreram no período da manhã e em 32,9%
no período da tarde, sendo que o período noturno recebeu 20,8% dos atendimentos
e a madrugada, apenas 8,2%.
Nos atendimentos realizados por médicos, foram identificadas variadas condutas
(Figura_1), contudo algumas obtiveram um maior destaque, dentre as quais as
medicações endovenosas (22,4%), a soroterapia (12,8%), as medicações por via
oral (10,1%) e os raios X (8%). Exames complementares de maior densidade
tecnológica, como o eletrocardiograma e raios X, que não estão disponíveis nas
UBS ou USF foram pouco utilizados. Verificou-se uma demanda muito grande de
procedimentos de enfermagem relacionados à administração de medicamentos e
soroterapia e pouca ênfase em orientações aos usuários.
Figura 1 - Distribuição das fichas de atendimento de usuários selecionados na
amostra quanto às condutas médicas nos atendimentos realizados no
prontoatendimento. UDS Sumarezinho, Ribeirão Preto- SP, 2012
Quanto ao acesso e acolhimento do usuário no serviço, sabe-se que o sistema de
saúde deste município encontra-se organizado em forma de pirâmide
hierarquizada, sendo que a porta de entrada ao sistema é Atenção Básica e o
serviço de pronto-atendimento tem como objetivo atender a queixa principal e
encaminhar o usuário ao sistema de saúde ou resolver os casos mais graves para
a internação hospitalar.
Identificou-se fragilidade da comunicação entre serviços de saúde, haja vista a
baixa utilização do sistema de referência pelas UBS e contrarreferência
principalmente para os serviços de atenção básica e secundária. Após o
atendimento no PA, o usuário é o responsável pela busca da UBS ou serviço
especializado para agendamento de consulta ou continuidade do seu atendimento.
Além disto, o motivo de procura e a conduta adotada pela equipe de saúde no PA
pode não ser de conhecimento da equipe que acompanha o usuário nos serviços de
Atenção Básica e especializada.
DISCUSSÃO
No período estudado, o perfil dos usuários que procuraram o serviço
caracterizou-se, predominantemente, por mulheres jovens, na faixa etária de 19
a 29 anos, que corresponderam à maior parte da demanda atendida (30,8%). Tal
característica é observada mesmo em serviços de urgência com complexidades
diferentes, pois resultados semelhantes já foram observados em estudos
realizados em outros municípios do interior do estado de São Paulo,
desenvolvidos em um pronto-socorro e um serviço de urgência hospitalar(10-11).
A utilização de serviços de urgência ocorreu por pessoas que residiam nos
bairros mais próximos. Entretanto, 16,8% dos atendimentos foram de moradores de
bairros pertencentes a outras áreas de abrangência. Além disto, a procura
espontânea pelo serviço representou 97,7% dos atendimentos, o que evidencia que
a estrutura organizacional do serviço atende os casos independentemente da sua
gravidade, sem qualquer restrição de entrada, o que acarreta sobrecarga de
atendimentos e assistência fragmentada, baseada apenas na queixa.
Há autores que defendem a proposta de múltiplas portas entradas ao sistema de
saúde, por ser mais inclusiva. Nessa proposta, o usuário tem acesso aos
serviços no tempo e no espaço que lhe são mais adequados, utilizando a
tecnologia apropriada a sua necessidade, seja na UBS, no pronto-socorro ou no
hospital. A definição inflexível da Atenção Básica como porta de entrada do
sistema, com referência territorial, não promove a inclusão e dificulta o
acesso dos usuários(12).
A preferência da população pela procura pelo atendimento em serviços de pronto-
atendimento também foi constatada em um estudo que avaliou o perfil de usuários
de serviços de urgência de média complexidade(13), bem como de serviços de
urgência hospitalares tanto para adultos(14), como pediátrico(15).
Observou-se também fragilidade na comunicação entre o PA e os serviços de
saúde, com baixa utilização da referência e contrarreferência para a Atenção
Básica e ambulatórios de especialidades, pois, apenas 1% da demanda atendida
foi reconduzida a procurar a UBS de origem, denotando a dificuldades para a
efetivação da integralidade da atenção à saúde. O encaminhamento com a guia de
referência para a Atenção Básica deveria ser feito para todos os usuários, e
especialmente para aqueles usuários que não tem nenhum acompanhamento e que,
portanto, estão fora do sistema e também os casos agudos que necessitam de uma
reavaliação em curto espaço de tempo, ampliando assim o foco do atendimento
prestado para além da queixa. O tipo de funcionamento observado no serviço
caracteriza um sistema fragmentado de atenção à saúde, em que a unidade de
saúde permanece isolada, sem comunicação com outros serviços e incapaz de
prestar assistência integral à população(16).
Outro aspecto importante é quanto ao dia da semana, pois se verificou que 73,0%
das pessoas procuram o serviço de pronto-atendimento nos dias da semana, quando
as UBS ou USF estão funcionando e que a priori deveriam absorver esta demanda,
sendo a quinta-feira (15,5%) e a segunda-feira (14,9%) os dias mais procurados.
Esperava-se que a procura fosse maior nos finais de semana, pelo fato do
serviço funcionar como retaguarda para todas as UBS e USF do Distrito Oeste.
Entretanto, apenas 27,0% dos atendimentos foram realizados no final de semana e
o domingo foi o dia de menor utilização do serviço (13,2%).
O mesmo pode ser observado quanto ao horário de funcionamento, pois 38,2% dos
atendimentos ocorreram no período da manhã, 32,9% no período da tarde, 20,8% no
período noturno e 8,2%, de madrugada apenas Fica claro com estes resultados que
a população prefere buscar o serviço de porta aberta para resolução das suas
necessidades de saúde, evidenciando que o modelo de pirâmide de atenção à saúde
não conseguiu um resultado satisfatório às necessidades da população(17).
A procura por um serviço de pronto-atendimento pode ser atribuída ao fato de
que a lógica do serviço nem sempre é a mesma da população(17). A demora no
agendamento das consultas da UBS, os horários de funcionamento coincidindo com
os turnos de trabalho e a obtenção de medicações facilitadas no PA resultam em
procura por este tipo de atendimento(18).
Na perspectiva de redes de atenção, com vistas ao cuidado integral, o
funcionamento dos serviços de saúde deveria ocorrer de modo articulado e
complementar(5). Entretanto, para formação da rede assistencial é necessário
que os serviços de saúde reconheçam-se como parte integrante do sistema de
urgência, atendendo o usuário adequadamente de acordo com sua capacidade
resolutiva(4). Para tal, a rede básica de saúde também pode e deve estar mais
bem estruturada para ampliar a resolutividade/capacidade de cuidado diante da
demanda espontânea, constituindo-se assim em grande articuladora da rede
atenção à saúde, desenvolvendo-se como importante porta de entrada e ordenadora
da rede(5). É necessário reformular a Atenção Básica para que ela possa cumprir
seus três papeis essenciais: resolução (capacidade de solucionar mais de 85%
dos problemas de saúde), coordenação (orientando os fluxos e contra-fluxos de
pessoas, informações e produtos entre os componentes das redes) e
responsabilização (capacidade de acolher e responsabilizar-se, sanitária e
economicamente, por sua população)(16).
Quanto aos motivos de procura pelo serviço, os resultados deste estudo
revelaram um perfil de demanda espontânea com quadros variados, a maioria
problemas agudos de baixa gravidade. O serviço de urgência e emergência,
entretanto, destina-se a pessoas cujas condições de saúde requerem assistência
imediata, adequada e com nível de qualidade elevado. Esse tipo de demanda tem
características de imprevisibilidade e graus variados de gravidade, o que torna
esses serviços de grande complexidade e um desafio(6) para os gestores, assim
como para a equipe de saúde que atende a população.
O grande volume de procedimentos de enfermagem realizados no serviço estudado
revela que o modelo de atenção à saúde é procedimento-centrado, com predomínio
de tecnologias duras. A mudança desse modelo de atenção para o cuidado integral
usuário-centrado é um desafio para os serviços de urgência não hospitalar, que
ainda reproduzem o modelo hegemônico médico-procedimento-centrado(19).
O enfermeiro, como integrante da equipe de saúde, tem papel importante na
gestão do cuidado nos serviços de saúde. Conhecer o perfil dos usuários
atendidos permite a organização do processo de trabalho, a educação permanente
em saúde e constitui em ferramenta importante para o planejamento e a gestão em
saúde.
CONCLUSÕES
Este estudo buscou identificar o perfil dos usuários que utilizam um serviço
não hospitalar de urgência e emergência, estrutura importante para a
implantação da rede de atenção às urgências no município estudado. Verificou
que a população atendida em sua maioria era de jovens na faixa etária de 20 a
29 anos e pertencente à área de abrangência da unidade e no período de
funcionamento da rede básica de saúde. As mulheres foram as que mais procuraram
este serviço. Os motivos de procura foram queixas agudas de baixa gravidade,
entretanto, o serviço também atende situações de urgência de média e alta
complexidade que implicam a necessidade da implantação do acolhimento com
classificação de risco com vistas de melhorar organização e a qualidade da
assistência prestada à população.
Os resultados indicam que o tipo de atendimento oferecido à população no
serviço de pronto-atendimento centrado na queixa e com grande demanda de
procedimentos de enfermagem revela o foco das tecnologias duras no serviço e
fragilidade no sistema de referência e contrarreferência, o que configura um
sistema fragmentado de atenção à saúde, incapaz de prestar atenção integral à
população.
A caracterização do perfil dos usuários atendidos em serviços não hospitalares
de urgência e emergência traz subsídios para a reorganização da gestão do
sistema de saúde, tanto na rede básica de saúde, quanto dos serviços
hospitalares, e evidencia o desafio de implantar a rede de atenção às urgências
no Brasil. Apesar de sua relevância no que se refere ao seu papel assistencial
na rede de serviços disponíveis, poucos são os estudos sobre a utilização
desses serviços pela população e a maior parte dos estudos sobre o perfil da
demanda refere-se a serviços de urgência hospitalares.
Muitos são os desafios para a implantação da rede de atenção às urgências,
especialmente no que se refere à mudança nos modelos de gestão e atenção à
saúde à saúde. Mudanças são necessárias para a articulação dos serviços de
saúde de maneira complementar e muitos esforços devem ser empreendidos para
ampliar o atendimento de urgência e emergência de baixa gravidade nos serviços
da Atenção Básica, de acordo com sua capacidade tecnológica. Para isso, há
necessidade de reestruração das estruturas físicas e investimentos nos recursos
humanos e materiais nesses serviços. As unidades não hospitalares de urgência e
emergência devem utilizar o acolhimento com classificação de risco, visando
garantir a escuta qualificada das necessidades de saúde e maior resolutividade
dos problemas de saúde da população atendida.
Há necessidade de novos estudos com o enfoque no usuário, para melhor
compreensão de suas necessidades e demandas aos serviços de saúde, com o
objetivo de contribuir para a implementação da rede de atenção às urgências e
emergências no País.