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BrBRCVHe0034-71672014000500832

BrBRCVHe0034-71672014000500832

variedadeBr
Country of publicationBR
colégioLife Sciences
Great areaHealth Sciences
ISSN0034-7167
ano2014
Issue0005
Article number00832

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Prejuízos nutricionais e distúrbios no padrão de sono de trabalhadores da Enfermagem INTRODUÇÃO O trabalho em turnos surgiu após a organização das sociedades e se intensificou durante a Revolução Industrial e também com o advento da luz artificial, o que permitiu prolongar as atividades cotidianas, inclusive para o período noturno (1). Com o desenvolvimento dos processos tecnológicos, mudanças econômicas e demográficas, bem como com o estreitamento e globalização das relações entre países, o trabalho em turnos se tornou imprescindível numa sociedade com ritmo de trabalho de 24 horas(2).

Existem diferentes tipos de trabalhadores que exercem suas atividades profissionais no esquema de turnos. Entre esses, destacam-se os trabalhadores envolvidos na prestação de serviços de saúde, como os profissionais da área de Enfermagem(1). Nesse caso, o trabalho em horários não convencionais e as longas jornadas são fonte de desgaste físico e emocional, que repercutem negativamente no estilo de vida, comprometendo, entre outros fatores, a qualidade do sono e o comportamento alimentar(3).

Evidências atuais têm postulado que o número, a duração e a irregularidade de horários dos turnos de trabalho afetam de forma importante o padrão de sono (2,4-6). Além disso, esse esquema laboral pode comprometer horários e frequência das refeições e as preferências alimentares destes profissionais(7), deteriorando os hábitos alimentares(8-10). Esses prejuízos no padrão de sono e nos hábitos alimentares, os quais podem estar intimamente interligados(10-11), têm se mostrado capazes de predispor a obesidade e suas comorbidades associadas (10,12). Estudos apontam que estado nutricional dos profissionais da Enfermagem pode sofrer alterações negativas, o que é demonstrado pela elevada prevalência de sobrepeso e obesidade nessa população(2-3,13).

Deste modo, esse artigo tem como objetivo elaborar uma revisão integrativa da literatura, abordando a influência do trabalho em turnos sobre o perfil nutricional e o padrão de sono dos profissionais da área da Enfermagem que atuam no esquema de turnos, com especial ênfase na relação entre a privação do sono e os hábitos alimentares.

METODOLOGIA Trata-se de um estudo do tipo revisão integrativa, um método de pesquisa que possibilita a síntese de estudos publicados e geram conclusões gerais a respeito de uma determinada área de pesquisa. Estudos de revisão integrativa têm como objetivo obter um entendimento relevante sobre um determinado fenômeno com base em estudos realizados anteriormente(14). Esse método consiste em uma ampla análise da literatura o que contribui para discussões acerca de métodos e resultados de pesquisas, além de apontar lacunas do conhecimento que podem ser preenchidas com a realização de novos estudos(14-15).

Este estudo foi baseado no método de Beyae e Nicoll(16)incluindo as seguintes etapas: seleção do tema e da questão da pesquisa; estabelecimento de critérios para inclusão e exclusão de estudos; definição das informações gerais a serem extraídas dos estudos; avaliação dos estudos incluídos na revisão integrativa; interpretação dos resultados e apresentação da revisão.

Nesta revisão, formulou-se a seguinte questão norteadora: "O turno de trabalho pode influenciar a ingestão alimentar e/ ou o estado nutricional e/ou os hábitos de sono de profissionais da área da Enfermagem"? O levantamento bibliográfico foi realizado por meio de consultas nas bases de dados PubMed / MEDLINE (USA National Library of Medicine), Lilacs / SciELO (Scientific Eletronic Library Online) e Google Acadêmico, no período de 2002 a 2014. Na base Pubmed / MEDLINE foi utilizada a associação dos descritores "nursing professional" e "shift work" com o descritor "sleep" e foram encontradas 12 publicações. Ao associar os descritores "nursing professional" e "shift work" com "food intake", "body weight" e "obesity", foi registrada uma ocorrência de publicação indexada. Assim, foi utilizado uma ocorrência de publicação indexada. Assim, foi utilizado o descritor "shift work" associado aos descritores "food intake" e/ou "body weight" e/ou "obesity" e foram selecionadas apenas as publicações relacionadas aos profissionais da área de enfermagem. Nas bases Lilacs / SciELO e Google Acadêmico a busca foi realizada utilizando o descritor "enfermeiro" associado ao descritor "sono", pelo método integrado e foram encontradas seis publicações. Utilizou-se também o descritor "enfermeiro" associado aos descritores "ingestão alimentar" e/ou "peso corporal" e/ou "obesidade" e foram encontradas duas publicações.

Para compor a amostra foram utilizados os seguintes critérios: apresentar desfecho relacionado ao turno de trabalho e sua influência sobre a ingestão alimentar e/ou sobre o estado nutricional e/ou sobre os hábitos de sono de profissionais da área de enfermagem. Para análise desses critérios foi necessária a leitura de cada resumo das publicações encontradas visando identificar o panorama geral da pesquisa. Definindo-se os trabalhos selecionados, foram capturados os textos completos e sintetizados os resultados principais acerca do foco deste estudo (ingestão alimentar, estado nutricional e hábitos de sono de enfermeiros, técnicos e auxiliares de enfermagem que trabalham em instituições hospitalares).

Inicialmente, a amostra foi constituída de 42 publicações que atenderam aos critérios de busca. Após a leitura dos textos completos foram excluídos 11 estudos que, apesar de mencionarem as palavras-chave "enfermeiro" associado com "ingestão alimentar" ou "peso corporal" ou "obesidade" e suas devidas traduções para a língua inglesa ou espanhola, não aderiram aos objetivos dessa revisão.

RESULTADOS Foram identificados 31 artigos que preencheram os critérios estabelecidos. As evidências foram provenientes, em sua maioria (29), de estudos de natureza quantitativa com desenho transversal e, também, de dois estudos de coorte. A prática clínica baseada em evidências tem como pilar o uso de resultados de pesquisas(17). A qualidade da evidência é atribuída pela sua validade e relevância, portanto, antes de ser utilizada, deve ser avaliada quanto à acurácia, relevância e aplicabilidade em determinada situação(17).

A literatura tem caracterizado as evidências de forma hierárquica, assim, quanto mais bem delineada é a pesquisa, mais fortes são as evidências(18), o importante é que o desenho das pesquisas utilizadas seja capaz de responder a questão nor-teadora(18-19). Estudos observacionais do tipo coorte possuem níveis de evidencia tipo IV e do tipo transversal, possuem nível de evidência do tipo V(19). O grau de recomendação desses estudos é classificado como B(19).

Perfil nutricional de profissionais de enfermagem É atualmente reconhecido pela literatura que os profissionais da área da Enfermagem constituem uma população de risco para o ganho de peso de forma inadequada e que a prevalência de obesidade neste grupo é elevada. O Quadro_1 mostra estudos da literatura desenvolvidos em diferentes países que analisaram o estado nutricional de profissionais da área de enfermagem.

Quadro 1 Perfil nutricional de profissionais da área de enfermagem  Autor(es), Ano, Delineamento PopulaçãPrincipais resultados País 9.851 (sexo Entre as trabalhadoras do turno rotativo, a prevalência de sobrepeso (18,6%) e Kim et al, 2013 Transversal feminino) de obesidade (7,4%) aumentou proporcionalmente ao tempo de trabalho em turnos Coreia do Sul 5.149 R (p<0,001).

4.702 D

Bogossian et 4996* al. 2012 Coorte (sexo 61,87% da amostra apresentaram sobrepeso ou obesidade de (IMC 25 kg/m2).

Austrália feminino) Han et al. , 2103* 2011 Estados Transversal (sexo 57,3% da amostra apresentavam sobrepeso ou obesidade.

Unidos feminino) 2494 (sexo 31,8% das participantes apresentaram sobrepeso e 26,9%, obesidade.

Zhao et al. , Coorte feminino) Trabalhadores em turnos rotativos tinham 1,15 mais chance de ter excesso de 2011 Austrália 1259 D peso/obesidade que os trabalhadores do turno fixo diurno.

1235 R

378 R (32 sexo Wong et al. , Transversal masculino 20,1% apresentavam IMC superiores a 23kg/m2 o que, de acordo com as faixas de 2010 China e 346 peso preestabelecidas para esta população, indica obesidade.

sexo feminino) Tavares et al. 418* , 2010 Brasil Transversal (ambos os 45,3% dos participantes apresentavam sobrepeso e 32,9%, obesidade (p<0,05).

sexos) 207 A média de IMC foi de 23, 17Kg/m2. 19% apresentaram sobrepeso e 4%, obesidade.

Sampedro et al. Transversal 35 F Foi encontrada uma alimentação mais saudável no turno rotatório quando , 2010 Espanha 172 R comparada ao turno fixo.

Botolli, Moraes 80 & (11 sexo O sobrepeso e a obesidade estavam presentes em 56,3% da amostra, além disso, Goldmeier; 2009 Transversal masculino 75% da amostra apresentou a circunferência da cintura acima dos valores Brasil e 69 sexo limítrofes ( 94cm para homens e 80cm para mulheres).

feminino) 760* Miller et al. , (61 sexo 2007 Estados Transversal masculino A média de IMC foi 27,2kg/m2. 54% estavam com sobrepeso ou obesos.

Unidos e 699 sexo feminino) 996D e N (118 sexo Fischer et al. Transversal masculino Prevalência de 21,5% de sobrepeso (25 Kg/m2 IMC 29,9 Kg/m2) e de 35,8% de , 2006 e 878 obesidade (IMC 30 Kg/m2) nos profissionais da área de enfermagem.

sexo feminino) 360 N (134 sexo Ha & Park, Transversal masculino A RCQ crescia proporcionalmente ao número de anos trabalhados a noite 2005 Coreia e 226 (p<0,05).

sexo feminino) 204* (20 sexo Reiners et al. Transversal masculino 36,6% foram classificados com sobrepeso, 25,6%, com obesidade e 2,3%, com , 2004 Brasil e 152 obesidade mórbida.

sexo feminino) 85 (ambos Geliebter et os sexos) Foi verificado que o grupo noturno teve um ganho de peso maior que o grupo al. , 2000 Transversal 36 D diurno (p = 0,02). No entanto, não foram encontradas diferenças significantes Estados Unidos 49 N entre ao valores de IMC de ambos os grupos.

D= Turno diurno; N= Turno noturno; F= Turno fixo; R= Turno rotativo; M= Manhã; T= Tarde; *turno não especificado Fonte: ScieELO e PubMed, 2014.

Em face destes números, algumas discussões são pertinentes, como a comparação da prevalência de sobrepeso e obesidade de profissionais da área da Enfermagem versus prevalência da população em geral, tendo em vista que os números populacionais se mostram muito elevados em todo o mundo. Neste sentido, um estudo de coorte conduzido na Austrália(19)investigou o peso corporal de profissionais de enfermagem e encontrou prevalência de 61,87% de sobrepeso e obesidade (Índice de Massa Corporal (IMC) 25kg/m2). Esse achado representou uma prevalência de sobrepeso e de obesidade até 3,74% maior do que da população australiana.

No Brasil, de acordo com o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE)(20), a prevalência de excesso de peso na população adulta é de, aproximadamente, 60%. Alguns estudos brasileiros identificaram elevadas taxas do excesso de peso corporal nos profissionais da área de enfermagem. Em estudo transversal com profissionais de enfermagem(21)encontrou-se prevalência de sobrepeso e de obesidade (IMC 25kg/m2) em 56,3% da amostra. Outras pesquisas brasileiras (1,22-24) também verificaram a ocorrência de sobrepeso de obesidade em profissionais da área da Enfermagem (p<0,05). Dessa maneira, podemos observar que as taxas verificadas entre profissionais da área da Enfermagem são, muitas vezes, superiores às apresentadas na população, o que sugere que o ganho de peso pode, ao menos em parte, ser influenciado pelas condições impostas pela atividade profissional.

Outro aspecto importante nessa questão é a presença de outros fatores de risco associados à obesidade entre profissionais da Enfermagem. Uma pesquisa conduzida na Coréia do Sul(25) identificou que a relação cintura-quadril (RCQ), um importante preditor das doenças cardiovasculares, crescia proporcionalmente ao aumento do número de anos trabalhados em turnos noturnos entre enfermeiros (p<0,05). Entretanto, nesse estudo, o IMC não foi significativamente relacionado à duração do trabalho em turnos. No Brasil, identificou-se que a circunferência da cintura, que também prevê riscos de doenças cardiovasculares, estava acima dos valores limítrofes em 75% da amostra de profissionais de enfermagem(21). Isso demonstra que esta modalidade laboral pode se relacionar com fatores de risco para outras patologias, como as doenças cardiovasculares.

Dentre os estudos selecionados na presente revisão, apenas um não relacionou o turno de trabalho ao aumento do peso corporal. Na Espanha, investigaram-se 207 profissionais de enfermagem do turno rotativo e fixo em hospitais(26). Ao contrário dos demais estudos com profissionais dessa área(7,27-29), observou-se que apenas 19% dos participantes apresentavam sobrepeso e 4%, obesidade. A média de IMC observada foi de 23,17kg/m2. De acordo com os autores, os resultados encontrados nos profissionais do turno rotativo noturno estão dentro da faixa recomendada para a população daquele país(26).

Esses resultados sugerem que o trabalho em turnos pode alterar o peso corporal de profissionais da área de enfermagem. Estudos de seguimento, como os de modelo coorte, são fundamentais para avaliar os agentes causadores do excesso de peso entre estes profissionais e isolar possíveis fatores relacionados ao trabalho que levem ao excesso de peso.

Consumo alimentar de profissionais de enfermagem O padrão de consumo alimentar dos trabalhadores em turnos demonstra características peculiares quando se compara trabalhadores dos turnos fixos diurno com turnos fixos noturnos e, de forma geral, pode-se dizer que ambos os turnos apresentam hábitos alimentares inadequados(30). Porém, essa afirmação decorre de evidências limitadas na literatura, que poucos estudos correlacionam o trabalho em turnos com a ingestão alimentar em profissionais de enfermagem(9,31-32). O Quadro_2 mostra estudos da literatura que analisaram o con-sumo alimentar de profissionais da área de enfermagem.

Quadro 2  Consumo alimentar de profissionais da área de enfermagem  Autor(es), Delineamento PopulaçãPrincipais resultados Ano, País 1932 (186 Flo et al. masculino Foi observada uma alta ingestão de alimentos ou bebidas com cafeína no turno da , 2012 Transversal e 1738 noite.

Noruega feminino) 619 D 1313 N Geiger- 80 N Brown et Consumo frequente e em grandes quantidades de cafeína para manter o estado de al. 2012 Transversal Ambos os alerta.

Estados sexos Unidos 75 Profissionais de enfermagem que trabalhavam a noite fizeram um número menor de Sahu & (sexo refeições quentes, apresentaram menor apetite, menor satisfação em comer e Dey, 2011 Transversal feminino) fizeram maior número de lanches do que as trabalhadoras do turno diurno (p< India 40 R 0,0005).

35 D Celik et 110 N Profissionais de enfermagem que trabalhavam muitas horas a noite possuíam al. , 2008 Transversal (sexo hábitos alimentares inadequados.

Turquia feminino) Zererev et 24 R al. , 2005 Transversal 22 D Grupo rotativo relatou fazer mais refeições (p<0,001) além de ter os padrões de Malawi (sexo apetite e satisfação reduzidos (p<0,01) quando comparados ao grupo diurno.

feminino) 204* Reiners et (20 sexo 70,3% dos participantes afirmaram ingerir café, 77,9% alegou preocupar-se com a al. , 2004 Transversal masculino quantidade de gordura na alimentação e 61% afirmou preocupar-se com o sal na Brasil e 152 alimentação regularmente.

sexo feminino) Waterhouse 50 D et al. , Transversal 43 N Os trabalhadores da noite relataram aumento no consumo de refeições frias 2003 Reino (ambos os (p<0,001) e maior consumo de salgadinhos (p = 0,01).

Unido sexos) D= Turno diurno; N= Turno noturno; F= Turno fixo; R= Turno rotativo; M= Manhã; T= Tarde; *turno não especificado.

Fonte: ScieELO e PubMed, 2014.

As mudanças do consumo alimentar parecem se associar fortemente com a prática do trabalho em turnos. Ao estudar 1932 profissionais de enfermagem dos turnos diurno e noturno na Noruega(33), observou-se uma grande ingestão de alimentos ou bebidas com cafeína, com o intuito de manter o estado de alerta. A odds ratio para esse padrão de consumo foi de 1,01 (IC de 95% = 0,97 - 1,04). Foi encontrado um elevado consumo de cafeína entre 80 profissionais de enfermagem do turno noturno nos Estados Unidos(5). No Brasil(23), também se identificou alto consumo de cafeína em amostra de profissionais de enfermagem (70,3% dos participantes bebiam café regularmente).

Uma pesquisa que avaliou os efeitos do turno rotativo sobre o padrão alimentar de enfermeiros no Malawi(6) encontrou, na comparação com enfermeiros do turno diurno, que profissionais do turno rotativo apresentaram menor consumo de grandes refeições por dia (2,06 grandes refeições por dia para o grupo diurno versus 1,13 para o grupo rotativo noturno, com p<0,001), menor apetite e menor satisfação em comer. Todos os profissionais do turno rotativo apresentaram padrões de alimentação irregulares. Foi encontrada também uma associação significante entre a auto avaliação da saúde e o apetite, a quantidade de refeições completas e o padrão de saciedade (p<0,05).

O consumo alimentar em trabalhadores noturnos também foi verificado em estudo (29) em que os trabalhadores noturnos relataram ter um número menor de refeições diárias (p=0,002), as quais eram consumidas mais tarde entre os trabalhadores, quando comparados àqueles em turnos diurnos (p<0,00005).

Com o objetivo de investigar a relação entre o trabalho noturno e os hábitos de dieta, conduziu-se um estudo(7) com 27 profissionais de enfermagem do turno da noite na Suécia. Os participantes relataram que a fadiga e o estresse causados pelo turno de trabalho influenciaram o abandono da dieta saudável. Os indivíduos que tinham uma dieta pouco saudável à noite declararam que comiam estes alimentos ou para ficarem acordados ou porque apresentavam um desejo particular durante o turno noturno. Os voluntários também relataram um desejo por alimentos doces e por carboidratos no dia seguinte ao trabalho em um turno noturno, e descreveram também que se sentiam especialmente cansados nesse dia e, por isso, frequentemente escolhiam refeições que demandavam um preparo mais fácil e rápido.

Estudo semelhante(8) identificou que trabalhadores do turno noturno preferiam consumir refeições frias em vez de refeições quentes (0,76 versus 0,23, respectivamente com p<0,001). Além disso, o tipo e a frequência das refeições foram influenciados mais significativamente (p<0,005) pelo hábito e pela disponibilidade de tempo do que pelo apetite. Outro achado foi que os trabalhadores do turno diurno consumiam menos salgadinhos que os trabalhadores da noite (0,21 versus 0,42 respectivamente, com p<0,05).

Entre os fatores postulados pela literatura como capazes de influenciar o consumo alimentar desses trabalhadores, destacam-se os fatores ambientais, o débito de sono e a dessincronização do ciclo claro-escuro, aos quais os profissionais da área de enfermagem estão submetidos(8,10,30). Apesar de pouco explorada pela literatura, a relação da modificação dos hábitos alimentares com o trabalho em turnos parece sofrer importante influência do padrão de sono(34- 35).

Sabe-se que a diminuição do tempo de sono modula o ciclo sono-vigília e pode alterar o comportamento alimentar de diferentes maneiras(30). Uma hipótese sugere que um maior tempo acordado implica em mais tempo disponível para comer, teoricamente facilitando as oportunidades para o consumo de lanches ou de refeições adicionais ao longo do dia(11,36). Nesta mesma linha, estudos indicam que a restrição do sono é muito associada a irregularidades da ingestão alimentar, com grande frequência, em individuos privados de sono, de comportamentos como "beliscar" em excesso ao longo do dia e maior consumo de alimentos de alta densidade calórica(10,37-40). Tais alterações podem ser atribuídas à resposta metabólica do organismo à privação do sono, que envolve principalmente os hormônios leptina e grelina hormônios relacionais ao controle central da alimentação. A leptina fornece informações sobre o equilíbrio energético para o centro regulatório do cérebro e a sua liberação está associada com a promoção da saciedade(41-42). a grelina tem seus níveis aumentados em períodos de jejum e atua diretamente na sensação de fome e aumento do apetite(43-44).

De acordo com recentes investigações - em maioria realizada em ambientes laboratoriais controlados - indivíduos submetidos à privação ou restrição do sono podem apresentar dimunição nos níveis de leptina e aumento das concentrações de grelina, o que consequentemente afetaria a ingestão de alimentos(10,12,45-48). Recentemente, encontrou-se que trabalhadores em turnos apresentaram um padrão circadiano diferenciado na liberação desses hormônios, com importante impacto na ingestão alimentar(34). No entanto, ainda são necessários novos estudos para melhor entendimento da ação destes hormônios em situações de déficit de sono e entre profissionais da área da Enfermagem.

Hábitos de sono de profissionais de enfermagem Estudos recentes correlacionaram o trabalho em turnos às alterações nos hábitos de sono em profissionais da área de enfermagem, indicando que o esquema de trabalho noturno prejudica o padrão de sono(4,33,49). O Quadro_3 mostra estudos da literatura que analisaram os hábitos de sono dos profissionais da área de enfermagem.

Quadro 3 Hábitos de sono de profissionais da área de enfermagem  Autor(es), Ano, Delineamento PopulaçãoPrincipais resultados País 2035 N Profissionais de enfermagem com menor tempo de trabalho no turno noturno Øyane et al, 2013 apresentaram maiores chances de insônia (OR = 1.48, 95% CI = 1.10-1.99) e Noruega Transversal (sexo fadiga crônica (OR = 1.78, 95% CI = 1.02-3.11) do que as trabalhadoras que feminino) tinham uma longa experiência de trabalho noturno.

932 (186 sexo masculino Flo et al. , 2012 Transversal e 1738 Alta prevalência (37,6%) de sonolência diurna excessiva e insônia nos Noruega sexo profissionais dos turnos rotativos.

feminino) 619 D 11313 N Geiger-Browm et 80 N 45% apresentaram alto nível de sonolência (KSS>7), fadiga e estavam mais al. 2012 Estados Transversal (ambos os vulneráveis à perda de sono.

Unidos sexos) 1360 (sexo Lin et al. , 2012 Transversal feminino) Os profissionais d enfermagem do turno rotativo noturno apresentaram Taiwan 769 R qualidade do sono comparado aos profissionais do turno diurno (p<0,001).

591 D 483 Zencirci, AD; (sexo Enfermeiros que trabalhavam nos turnos da manhã ou da noite tiveram melhor Arslan S. , 2011 Transversal feminino) qualidade do sono que aqueles que trabalhavam no turno rotativo e diurno Turquia 107 D (p<0,001).

19 N 256 R 661 R Hsieh et al. , (31 sexo 2011 Taiwan Transversal masculino 59% apesentaram sono de qualidade (PSQI>5) e insônia.

e 630 sexo feminino) Hasson, D. ; 2103* Os resultados sugerem uma redução contínua na qualidade do sono dos Gustavsson, P. Transversal (sexo profissionais de enfermagem ao longo dos anos do estudo.

2010 Suécia feminino) 435 F 57% apresentaram sono de qualidade (PSQI >5). Esses escores foram Shao et al. , 2010 Transversal (sexo associados à piora na qualidade de vida (distrofia pré-menstrual, acidentes Taiwan feminino) de trabalho, doenças e uso de medicação).

166 Garde et al. , 27 D Foi observada pior qualidade de sono (p<0,001) nos enfermeiros do turno 2009 Dinamarca Transversal 12 T rotativo noturno comparados à qualidade de sono dos profissionais de 47 N enfermagem dos turnos fixos.

80 R Geliebter et al. , 85 (ambos 2005 Estados Transversal os sexos) Trabalhadores noturnos relataram maior número (p = 0,01) e duração (p = Unidos 36 D 0,05) de cochilos que os trabalhadores do dia.

49 N 59 (25 sexo Martino, 2002 feminino e A duração do sono noturno dos enfermeiros que trabalham a noite foi, em Brasil Transversal 34 sexo media, 2 horas a mais que a dos enfermeiros que trabalham durante o dia masculino) (p<0,004). O sono fracionado foi encontrado apenas no grupo noturno.

45 D 14 N 45 Foram detectadas diferenças significativas entre sono diurno e noturno (p < Fischer et al. , Ambos os 0,001). Foi observada uma pior qualidade de sono diurno após noites de 2002 Brasil Transversal sexos trabalho (p < 0,007). Foram encontradas diferenças significantes na 26 R percepção dos estados de alerta no turno da noite (p <0,001).

19 D D= Turno diurno; N= Turno noturno; F= Turno fixo; R= Turno rotativo; M= manhã; T= Tarde; *turno não especificado.

Fonte: ScieELO e PubMed, 2014.

Um estudo transversal conduzido na Noruega(33) encontrou que os profissionais do turno rotativo noturno apresentaram uma elevada prevalência (37,6%) de sonolência diurna excessiva e de insônia quando comparados aos profissionais do turno diurno. Os autores ainda encontraram que a cada 50 noites trabalhadas, aumentavam em 50% as chances de se desenvolver problemas relacionados ao sono.

Estes achados também foram revelados por Hadsson & Gustavsson(50)que demonstraram que a qualidade do sono de indivíduos suecos reduzia à medida que os anos de trabalho noturno aumentavam. Além disso, Geiger-Brow et al.(5) identificaram alto nível de sonolência diurna (Karolinska Sleepiness Scale (KSS) >7), escores indicando alto nível de sonolência), em 47% da amostra de 80 profissionais da área de enfermagem do turno noturno nos Estados Unidos. Um terço destes profissionais também apresentou fadiga e insônia.

Lin et al.(49), ao avaliarem a qualidade do sono de profissionais da área de enfermagem dos turnos diurno e noturno, verificaram que os profissionais do turno noturno apresentaram uma qualidade de sono pior que a dos trabalhadores diurnos (p<0,001). Os resultados deste e de outros estudos semelhantes sugerem que o trabalho noturno promove uma piora na qualidade do sono de profissionais da área de enfermagem (Índice de Qualidade do Sono de Pittsburgh (PSQI) >5, com escores indicando uma qualidade do sono)(51-53).

Uma investigação brasileira(4)verificou que a duração do sono dos trabalhadores de enfermagem do turno noturno era, em média, 2 horas inferior à duração do sono dos enfermeiros do turno diurno (p<0,004). Neste estudo foi também encontrado que o sono fracionado foi encontrado apenas nos profissionais do turno da noite. Um estudo semelhante(54) também detectou diferenças significativas na duração do sono de profissionais de enfermagem dos turnos noturno e diurno (p<0,001). Foi observado que, após uma noite de trabalho, a qualidade do sono ruim (p<0,007), além de diferenças significantes na percepção dos estados de alerta no grupo noturno (p<0,001).

Uma pesquisa realizada com profissionais de enfermagem do turno fixo noturno em Taiwan(55)revelou que 57% da amostra apresentou qualidade do sono ruim (PSQI>5) e que este resultado pode ser associado a uma piora na qualidade de vida destes profissionais como a ocorrência de distrofia pré-menstrual, acidentes de trabalho, doenças e uso de medicamentos. Analisando o nível de sonolência entre trabalhadores de enfermagem dos turnos diurno e noturno(29), identificou-se que os trabalhadores noturnos cochilavam mais vezes (p=0,01) e durante mais tempo (p=0,05) durante a semana de trabalho que os trabalhadores diurnos. Outro estudo(56)também verificou que as profissionais da área da Enfermagem que trabalhavam no turno noturno apresentaram maiores chances de insônia (OR = 1.48, 95% CI = 1.10–1.99 e fadiga crônica (OR = 1.78, 95% CI = 1.02–3.11).

Relação entre sobrepeso, obesidade e hábitos de sono Atualmente, é amplamente postulado pela literatura que a alteração no tempo de sono está relacionada a um descontrole no consumo alimentar e à obesidade(30).

Simultaneamente ao aumento da obesidade divulgada em inquéritos epidemiológicos (20,57) tem sido observado em uma redução do tempo total de sono, principalmente entre a população dos países industrializados. A duração média do sono nos Estados Unidos passou de 8-9 horas por noite em 1960(58), para sete horas em 1995(59). No Japão, no mesmo período a média passou de 8 horas e 13 minutos para sete horas e 32 minutos(38). No Brasil, um estudo realizado com uma amostra representativa populacional, identificou uma redução no tempo de sono entre os anos de 1987 e 1995, de 7.82 horas para 7,60 horas, respectivamente durante a semana; e de 9 para 8.39 horas, respectivamente nos fins de semana(60).

Uma série de estudos transversais e prospectivos tem revelado uma correlação negativa entre a duração do sono e o índice de massa corporal (IMC)(24,57).

Esta correlação foi estabelecida em estudos com populações em diferentes estágios de vida e em diversos países da Europa, Ásia e nos Estados Unidos (46,57,61-72).

Os mecanismos pelos quais a restrição de sono pode afetar o balanço energético e levar ao excesso de peso não estão totalmente esclarecidos. No entanto, algumas hipóteses são propostas na literatura científica. Estes aspectos tratam do nível de atividade física, homeostase energética e ingestão alimentar (10,30,73-74).

O sono está diretamente relacionado com a conservação e restauração da energia (75). Desta forma, a diminuição do tempo de sono pode resultar na diminuição do nível de atividade física, provavelmente devido ao cansaço, em consequência do sono insuficente em termos quantitativos e qualitativos(61,76). Assim, individuos privados do sono podem apresentar um estilo de vida mais sedentário quando comparados àqueles que possuem padrão de sono adequado(11,77). A diminuição dos níveis de atividade física somados as alterações no controle da ingestão alimentar, como o aumento do apetipe e diminuição da saciedade (fato anteriormente apresentado) podem favorecer o balanço energético positivo e favorecer o ganho de peso de forma inadequada, aumentando a prevalência de sobrepeso e obesidade(34).

Os profissionais da Enfermagem são constantemente submetidos a rotinas de trabalho que podem prejudicar a dinâmica de sono(33,49-54). Nesse sentido, a privação do sono, como comumente ocorre nos profissionais do turno noturno, pode ter efeitos importantes sobre o estado nutricional e a ingestão alimentar desta população(72,78).

Apesar de algumas evidências apontando os prejuízos ao padrão de sono causado pelo trabalho noturno em profissionais da área de enfermagem, não foi localizado nesta revisão nenhum estudo que relacionasse o trabalho noturno ou a privação do sono à prevalência de sobrepeso e de obesidade observada nesta população. No entanto, foram encontradas algumas evidências que sugeriram que a privação do sono parece aumentar não somente o apetite, mas também as preferências por determinados alimentos(30). Investigação previamente citada(7) mostrou que o apetite por alimentos ricos em gorduras e carboidratos, principalmente doces, era maior nestes profissionais após uma noite de trabalho. De forma semelhante, foi verificada uma preferência por alimentos frios e salgadinhos no horário de trabalho dos profissionais do turno noturno (8).

Alguns estudos também observaram um elevado consumo de cafeína durante o turno de trabalho da noite(5,23,33). Estas evidências são bastante preocupantes, pois além dos profissionais de enfermagem com sono privado apresentarem um padrão hormonal predisponente para consumo calórico aumentado(30,45-48), o preenchimento destas calorias tende a ser feito com alimentos de baixa qualidade nutricional(7-8,30).

Estudos investigando a relação entre o sono e o estado nutricional, bem como o sono e o consumo alimentar destes profissionais são escassos. E, além disso, não foi encontrada nenhuma investigação que abrangesse simultaneamente a provável relação entre o sono, o consumo alimentar e o estado nutricional de profissionais da área de enfermagem.

DISCUSSÃO A análise realizada constatou que a prevalência de sobrepeso e obesidade encontra-se elevada entre os profissionais da área da Enfermagem, o que provavelmente ocorre devido a exposição destes indivíduos a diversos fatores de risco para desordens nutricionais, como uma pior qualidade do sono. Além disso, os estudos relacionados aos hábitos de ingestão alimentar dos profissionais da Enfermagem mostraram, em geral, que este tópico merece atenção especial, pois o trabalho noturno faz com que os hábitos alimentares dos profissionais em questão sejam modificados de forma negativa com a finalidade de uma adaptação a esta rotina de trabalho.

De acordo com os estudos recentes que investigaram o padrão de sono das equipes de enfermagem, é possível julgar que os prejuízos na dinâmica do sono podem estar relacionados com a alta prevalência de sobrepeso e obesidade. Por meio destas pesquisas é possível supor que a interrupção ou diminuição do padrão de sono noturno pode influenciar de modo negativo a ingestão alimentar e, consequentemente, estado nutricional destes indivíduos.

Sugere-se, portanto, estudos futuros que possam investigar melhor a amplitude da influência dos hábitos de sono sobre a ingestão alimentar e o estado nutricional nos profissionais da área de enfermagem, assim como suas causas e consequências na saúde em curto e em longo prazo.


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