Antecedentes da intenção de uso de sistemas de home broker sob a ótica dos
investidores do mercado acionário
1. INTRODUÇÃO
Na pesquisa, o objetivo central é investigar a intenção de uso de sistemas de
home broker, assim como os fatores que a influenciam, pela ótica de seu usuário
final, ou seja, investidores do mercado acionário. Para isso, adota-se o
anteparo teórico de modelos de adoção de tecnologia amplamente empregados em
estudos empíricos sobre os mais variados tipos de sistemas de informação. Na
medida em que sistemas de home broker podem ser vistos como tecnologias
computacionais para habilitar o relacionamento digital de intermediação entre
corretoras e investidores, espera-se que sua adoção possa ser adequadamente
explicada pelos referidos modelos.
Segundo Davis, Bagozzi e Warshaw (1989) e Legris, Ingham e Collerette (2003),
de nada adiantará um sistema de informação de alto desempenho técnico se o
usuário, por alguma razão, não adotar e/ou não aceitar a tecnologia
disponibilizada. É preciso, portanto, entender os motivos pelos quais os
usuários aceitam ou rejeitam determinados sistemas para, posteriormente, prevê-
los, explica-los e modernizá-los. Assim, entender os motivos por trás da
aceitação ou resistência dos usuários a Sistemas de Informação tornou-se um dos
mais desafiadores temas para pesquisas na área de sistemas de informação (Davis
et al.,1989; Venkatesh, Davis & Morris, 2007; Kim & Kankanhalli, 2009).
Por outro lado, durante a última década, as bolsas de valores passaram a
desempenhar um papel de grande importância no sistema financeiro internacional,
segundo a Federação Mundial de Bolsas (2008). Em termos quantitativos, os
mercados que operam por meio de bolsas regulamentadas cresceram em uma escala
muito acelerada, o que lhes atribuiu um papel ativo e uma responsabilidade
ímpar no centro da economia mundial.
Atualmente, as atividades da Bolsa de Valores de São Paulo (Bovespa) são
marcadas por intenso uso de informática em suas operações. Em 1999, com o
lançamento do sistema de home broker, tornou-se viável a participação de
pequenos e médios investidores nesse mercado. O sistema de home broker permite
que o investidor, por meio do site das corretoras na Internet, transmita sua
ordem de compra ou venda diretamente ao sistema de negociação da Bovespa.
Assim, desde o início de 2006, a Bolsa de Valores de São Paulo vem operando
somente em pregão eletrônico.
Além disso, segundo a Companhia Brasileira de Liquidação e Custódia (CBLC), o
número de corretoras que oferece sistemas de home broker no mercado financeiro
brasileiro tem crescido rapidamente, passando de seis corretoras no ano de 1999
para mais de 60 no primeiro semestre de 2011. As dez corretoras com o maior
volume financeiro de negócios movimentaram juntas, no mês de setembro de 2011,
mais de R$ 20 bilhões (Gutman & Joia, 2012).
Esse cenário de crescimento de participantes do mercado financeiro, aliado à
evolução da Internet, transformou o sistema de home broker em um importante
instrumento de intermediação nesse segmento. Looney, Valacich, Todd e Morris
(2006), por exemplo, observaram que as corretoras que operam por meio da
Internet atraíram, no mercado norte-americano, um contingente de milhões de
investidores desde o lançamento desse serviço nos Estados Unidos em 1994. No
entanto, ainda é escasso o número de pesquisas que têm o sistema de home broker
como objeto de estudo (ver, por exemplo, Prabhudev, Menon &
Balasubramanian, 2000; Balasubramanian, Konana & Menon, 2003; Roca, Garcia
e De La Vega, 2009).
Neste trabalho, o objetivo é, portanto, responder à seguinte pergunta de
pesquisa: Quais são os antecedentes da intenção de uso de sistemas de home
broker, sob a ótica dos próprios investidores do mercado acionário? A
relevância de tal estudo justifica-se não apenas pela já mencionada escassez de
pesquisas especificamente sobre sistemas de home broker, mas também pelo
contexto e pela importância das bolsas de valores na economia mundial.
O artigo está estruturado da forma que se segue. Após esta introdução,
apresenta-se o referencial teórico usado na pesquisa e, fruto desse
referencial, as hipóteses de pesquisa e o modelo proposto para teste. Em
seguida, os procedimentos metodológicos a que a pesquisa obedeceu são tornados
claros. A partir daí, os dados coletados são analisados e os resultados obtidos
apresentados. Na seção seguinte, discutem-se os resultados obtidos. Finalmente,
na última seção, são elencadas as implicações acadêmicas e gerenciais oriundas
deste trabalho, as limitações desta investigação e uma agenda para pesquisas
futuras.
2. REFERENCIAL TEÓRICO
2.1. E-brokerage
E-brokerage é a intermediação entre compradores e vendedores realizada por meio
da Internet. Para Evans e Wurster (2000), intermediários normalmente obtêm seu
lucro por meio do binômio excelência-alcance. No primeiro caso, o lucro é
obtido por intermédio de um serviço diferenciado com alto nível de excelência,
geralmente superior ao que seria oferecido ao consumidor se não houvesse a
participação do intermediário. No segundo caso, os intermediários exploram sua
capacidade de alcançar um grande número de consumidores para obter seu lucro.
Segundo Evans e Wurster (2000), devem-se entender as mudanças associadas à
difusão da Internet como um caminho em direção a uma nova forma de
intermediário, que consegue obter vantagens sobre a desintermediação. Nessa
desintermediação, a tecnologia torna possível que competidores obtenham alcance
maior, ao mesmo tempo em que oferecem mais facilidades e recursos (Costa &
Joia, 2006).
Na presente pesquisa, é abordado o conceito de e-brokerage aplicado ao mercado
financeiro, para o processo de compra e venda de ações. Conforme descrevem
Dasgupta e Dickinson (1998), o processo de investimento em ações é composto de
quatro etapas: envio da ordem pelo investidor; roteamento da ordem até sua
execução; estabelecimento do preço; e confirmação da ordem.
Especificamente no processo eletrônico, segundo Sharma e Bingi (2000) e Costa e
Joia (2006), o investidor insere sua ordem de compra ou venda diretamente, por
meio de seu computador. A ordem é enviada pela corretora à bolsa de valores,
que procura então combinar o preço de compra e venda e executar a ordem,
utilizando a melhor oferta possível.
O processo de e-brokerage possui menor custo, se comparado ao processo de
compra e venda de ações pela maneira tradicional, por ter menos agentes
intermediários. Voss (2000) lembra que o desenvolvimento da Internet tornou
possível que empresas provessem seus serviços diretamente por meio da rede, com
pouca ou nenhuma intervenção humana. Segundo Sharma e Bingi (2000), essa
redução de custos é repassada para o investidor que, normalmente, paga uma
corretagem menor para operar por meio de sistemas de home broker.
No entanto, como argumentam Bakos et al. (2005) e Roca et al. (2009), o modus
operandi associado à compra e à venda de ações por meio de sistemas baseados na
Internet é extremamente peculiar e específico, justificando investigações
acerca desse tema que não apenas mimetizem resultados advindos de pesquisas
sobre on-line banking. Isso ocorre pela característica dinâmica desse processo
e pelos marcos regulatórios, legal, tributário e de outras naturezas,
associados à compra e venda de ações por investidores individuais. Nessa mesma
linha, Roca et al. (2009, p. 97) afirmam que on-line investing e on-line
banking têm grandes diferenças, o que sugere que os vários modelos já
desenvolvidos para Internet banking não sejam aplicáveis, sem algum tipo de
ajuste, a sistemas de home broker. Por fim, Konana e Balasubramanian (2005)
argumentam que os estudos sobre aceitação de sistemas de on-line investing
devem ser bem mais holísticos do que os estudos acerca de Internet banking, de
modo que alguns fatores constantemente desconsiderados na análise desses
últimos sistemas não o sejam na investigação de sistemas de home broker. Dentre
os fatores desconsiderados citados por esses autores encontra-se, por exemplo,
a satisfação do investidor com o sistema usado.
2.2. Modelos de aceitação de tecnologia da informação
Pesquisadores e profissionais da área de tecnologia da informação vêm buscando
entender os motivos pelos quais indivíduos resistem a utilizar determinado
sistema de informação (Legris et al., 2003; Benbasat & Barki, 2007).
Diversas abordagens têm sido elaboradas para avaliar tecnologias e prever como
os usuários irão responder a elas, de forma a melhorar sua aceitação. Dentre
essas, destacam-se a teoria da ação racionalizada (Theory of Reasoned Action -
TRA), a teoria do comportamento planejado (Theory of Planned Behavior - TPB) e
a teoria de aceitação de tecnologia (Technology Accepentace Model - TAM) e suas
variações, a seguir explicitadas.
2.2.1. Teoria da ação racionalizada (TRA)
Na teoria da ação racionalizada (TRA), que tem suas raízes na Psicologia
Social, busca-se identificar os fatores determinantes do comportamento
consciente e intencional (Fishbein & Ajzen, 1975). Na TRA, considera-se que
as pessoas se comportam de forma racional, avaliando o que têm a perder e a
ganhar, via manifestação de suas atitudes. Dessa forma, suas ideias, metas
pessoais, valores, crenças e atitudes influenciam seu comportamento. Se as
pessoas acreditarem, por exemplo, que compartilhar conhecimento lhes trará
benefícios, elas tenderão a ser favoráveis ao compartilhamento (Fishbein &
Ajzen, 1975). Por outro lado, a intenção de comportar-se de determinada forma é
também influenciada pelas normas subjetivas existentes, ou seja, a percepção do
indivídulo de que pessoas importantes para ele acreditem que ele deva
comportar-se daquela forma. Na Figura_1, apresenta-se um esquema de
relacionamento entre os construtos da teoria da ação racionalizada.
![](/img/revistas/rausp/v49n2/11f01.jpg)
Segundo Davis et al. (1989), por ser tão generalizável e também por integrar
diversas perspectivas teóricas da Psicologia, a TRA seria apropriada para o
estudo dos determinantes do uso de computadores e de sistemas de informação
específicos. Quando aplicada a TRA a esse contexto, sugere-se que a atitude de
uma pessoa em relação ao uso de determinado sistema de informação, juntamente
com a pressão de seus pares, pode influenciar sua intenção de utilizar o
sistema e, assim, o uso em si da tecnologia.
2.2.2. Teoria do comportamento planejado (TPB)
Embora a TRA tenha sido muito utilizada para estudar a aceitação do usuário em
relação aos computadores e sistemas de informação, outras perspectivas teóricas
foram propostas e aplicadas para esse fim. Ajzen (1991) propôs a teoria do
comportamento planejado (TPB), que complementa a TRA, agregando-lhe mais um
antecedente da intenção de uso: o controle comportamental percebido (Perceived
Behavioral Control - PBC). A TPB e seus elementos teóricos vêm sendo aplicados
em estudos empíricos sobre a aceitação dos mais variados tipos de sistemas
computacionais (Taylor & Todd, 1995; Dillon & Morris, 1996; Venkatesh,
Thong & Xin, 2012).
O construto controle comportamental percebido foi introduzido para diminuir as
falhas da TRA nos casos em que os indivíduos não possuíam total consciência de
seu comportamento. O construto é definido como a percepção do indivíduo acerca
das informações, recursos e oportunidades disponíveis, que podem inibir ou
facilitar o comportamento em questão. Assim, ele refere-se tanto ao controle
interno (por exemplo, habilidades pessoais) quanto às restrições externas (por
exemplo, oportunidades), considerados necessários para exercer determinado
comportamento (Taylor & Todd, 1995; Cho & Cheung, 2003).
Como é mostrado nas Figuras_1 e 2, há muitas similaridades entre a TRA e a TPB.
Nos dois modelos, a intenção é um fator-chave na explicação do comportamento.
Nas duas teorias, a intenção tem por antecedentes as atitudes e as normas
subjetivas relacionadas ao indivíduo, sendo essas influenciadas por suas
crenças. Além disso, as duas teorias assumem que os indivíduos são racionais e
fazem uso sistemático das informações disponíveis para tomar suas decisões.
[/img/revistas/rausp/v49n2/11f02.jpg]
2.2.3. Modelo de aceitação de tecnologia (TAM) e variações
TAM é o modelo de pesquisa mais utilizado para avaliar a aceitação de
tecnologias de informação (Gefen & Straub, 2000; Lee, Kozar & Larsen,
2003, Legris et al., 2003; Benbasat & Barki, 2007). Ele foi proposto por
Davis et al. (1989), para explicar os motivos pelos quais os usuários aceitavam
ou rejeitavam determinada tecnologia da informação e para melhorar a aceitação
dessa tecnologia. No modelo, explicitam-se os impactos de fatores externos,
relacionados à tecnologia, sobre fatores internos, associados ao indivíduo,
como as crenças, atitudes e intenções de uso (Costa-Filho & Pires, 2005).
Em sua essência, no TAM indica-se que a adoção de TI é afetada por dois
construtos associados ao usuário: utilidade percebida (Perceived Usefulness -
PU) e facilidade de uso percebida (Perceived Ease of Use - PEOU). A utilidade
percebida foi definida por Davis et al. (1989) como o grau em que um indivíduo
acredita que utilizar determinado sistema irá melhorar seu desempenho numa
tarefa. Já a facilidade de uso percebida diz respeito ao grau em que um
indivíduo acredita que utilizar determinado sistema será livre de esforço.
Davis et al. (1989) sugerem que essas duas percepções criam uma disposição
favorável, ou intenção positiva, para utilizar determinada tecnologia de
informação. Assim, no modelo TAM, sugere-se que os indivíduos utilizarão o
sistema se acreditarem que esse uso fornecerá resultados positivos,
considerando a facilidade de uso percebida e a utilidade percebida (Igbaria,
Guimarães & Davis, 1995).
Na Figura_3, ilustra-se o modelo de aceitação de tecnologia proposto por Davis
et al. (1989).
[/img/revistas/rausp/v49n2/11f03.jpg]
A partir do modelo original, vários outros construtos foram sendo adicionados
ao TAM, levando à criação do TAM 2 (Venkatesh, 2000; Venkatesh & Davis,
2000), do TAM 3 (Venkatesh & Bala, 2008) e outras inúmeras variantes
(Venkatesh et al., 2012), no que Benbasat e Barki (2007, p. 212) chamaram de
"TAM ++ research". Não obstante a sofisticação dos atuais modelos de aceitação
de tecnologia derivados do TAM, eles sofrem críticas (por exemplo, Lee et al.,
2003; Benbasat & Barki, 2007), principalmente por não considerarem outras
abordagens teóricas para adoção de tecnologia, como a teoria da difusão da
inovação (Rogers, 2003), e por não levarem em consideração as especificidades
das tecnologias sob análise, considerando-as todas iguais e, portanto,
passíveis de terem seu uso explicado pela mesma abordagem teórica (Orlikowski
& Iacono, 2001). Segundo seus críticos (ver também Lee et al., 2003; Legris
et al., 2003; Benbasat e Barki, 2007), tais deficiências fazem com que o modelo
TAM e seus derivados expliquem, no máximo, 40% da variação da atitude e
intenção de uso de sistemas de informação (Legris et al., 2003), sugerindo que
fatores importantes que influenciam essas variáveis não foram considerados nas
análises empreendidas. Para fazer frente a essas questões, apresentam-se a
seguir outras abordagens teóricas que visam aumentar o poder de explicação do
TAM e suas derivações.
2.2.4. Teoria da difusão da inovação (IDT)
Na teoria de difusão da inovação (Innovation Diffusion Theory - IDT), objetiva-
se explicar o processo pelo qual as inovações em tecnologia são adotadas pelos
usuários e, assim, difundidas. Segundo a definição de Rogers (2003), inovação é
uma ideia, prática ou objeto que é percebido como novo por um indivíduo ou
outra unidade de adoção. O mesmo autor define difusão como o processo pelo qual
uma inovação é comunicada por meio de determinados canais, ao longo do tempo,
para os membros de um sistema social.
Na forma originalmente proposta por Rogers (2003), a IDT considera alguns dos
atributos relacionados à inovação tecnológica para explicar sua adoção em larga
escala: vantagem relativa, compatibilidade, complexidade, experimentabilidade e
observabilidade. No entanto, segundo Chen, Gillenson e Sherrell (2004), desses
atributos, somente vantagem relativa, compatibilidade e complexidade parecem
estar consistentemente associados à adoção de inovação tecnológica.
Para Plouffe, Hulland e Vandenbosch (2001), Carter e Belanger (2005) e Benbasat
e Barki (2007), a IDT pode acrescentar maior poder de explicação ao modelo
original do TAM, devendo, assim, ser considerado em pesquisas associadas à
adoção de tecnologia da informação. Como explicado adiante, o modelo proposto
neste trabalho alinha-se a essa proposta.
•Confiança
Existem muitas definições para confiança, o que revela a natureza complexa
desse construto. Em revisão de literatura em diversas disciplinas, desenvolvida
por Rousseau, Sitkin, Burt e Camerer (1998), revela-se que as expectativas
pessoais e a propensão a estar vulnerável são componentes críticos em todas as
definições de confiança.
A definição citada com mais frequência na literatura é a proposta por Mayer,
Davis e Schoorman (1995), adotada na presente pesquisa. Nessa visão, na
confiança envolvem-se dois agentes - o confiante (sujeito que confia em alguém)
e o confiado (depositário da confiança) - e é definida como "a disposição de
uma parte de ser vulnerável às ações de outra parte, baseada na expectativa de
que a outra parte tomará uma ação particular importante ao confiado,
independentemente da habilidade de monitorar ou controlar essa outra parte"
(Mayer et al., 1995, p. 712). Essa definição baseia-se na ideia de que o
indivíduo que confia se torna vulnerável, o que implica que algo de importante
pode, potencialmente, ser perdido como resultado desse relacionamento de
confiança (Mayer et al., 1995; McKnight, Choudhury & Kacmar, 2002;
Schlosser, White & Lloyd, 2006).
De maneira geral, no ambiente Internet, usuários remotos de qualquer lugar do
mundo podem acessar arquivos em computadores. As informações que trafegam em
sistemas de home broker têm, portanto, um risco inerente, do ponto de vista de
segurança. Nesse contexto, ainda existe outro risco intrínseco de que a ordem
de compra ou venda enviada pelo usuário não seja executada corretamente ou no
prazo necessário. Assim, parece ser imprescindível que o usuário confie no
perfeito funcionamento do sistema para que tenda realmente a utilizá-lo, sempre
que necessário (McKnight et al., 2002). De fato, segundo Bakos et al. (2005) e
Roca et al. (2009), o sucesso de sistemas de compra e venda de ações por meio
de e-brokerage depende bastante da confiança que os investidores têm no uso do
sistema de compra e venda de ações. Vale ressaltar que Hassanein e Head (2004)
asseveram que o tipo de produto/serviço comercializado na Web influencia o grau
de confiança que se tem na transação efetuada e, portanto, o grau de satisfação
do usuário.
•Satisfação do usuário
Wixom e Todd (2005) explicam que há duas vertentes teóricas distintas adotadas
em pesquisas sobre adoção de tecnologia da informação. A primeira, apresentada
anteriormente, envolve os modelos de aceitação tecnológica, com preponderância
para o TAM e seus derivados. Já a segunda, iniciada por Bailey e Pearson
(1983), Ives, Olson e Baroudi (1983), Melone (1990), Seddon (1997), entre
outros, usa a satisfação do usuário com o sistema de informação para explicar
sua adoção. Ambas as abordagens teóricas têm contribuído bastante para o
aumento do entendimento do sucesso/fracasso no uso de sistemas de informação,
permanecendo, no entanto, distanciadas entre si (Wixom & Todd, 2005).
Segundo Mather, Caputi e Jayasuriya (2002) e Wixom e Todd (2005), as duas
abordagens teóricas, se usadas de forma conjunta, poderiam melhor explicar a
adoção de tecnologias da informação. Em particular, Wixom e Todd (2005)
destacam que, diferentemente do modelo TAM e de seus derivados, a literatura de
satisfação do usuário é extremamente centrada nas características do sistema em
uso, atendendo às reivindicações de Orlikowski e Iacono (2001) acerca dessa
problemática.
Mather et al. (2002) ressaltam ainda que o uso da variável dependente intenção
de uso, como feito no modelo TAM e seus derivados, tende a gerar resultados
distorcidos, visto que os respondentes podem apresentar viés cognitivo em suas
respostas sobre sua real intenção de uso do sistema, procurando reportar
resultados positivos ou dizer apenas o que lhes interessa dizer. Some-se a isso
o fato de que a variável dependente original do modelo TAM tem pouca utilidade
em ambientes em que o uso é mandatório (Rawstorne, Jayasuriya & Caputi,
2000). Por fim, a variável dependente usada nos modelos TAM e derivados
continua sendo alvo de controvérsias: alguns autores a entendem como a intenção
de uso do sistema (Chau, 1996; Agarwal & Prasad, 1998), enquanto outros a
entendem como o uso real do sistema (Adams, Nelson & Todd, 1992; Igbaria et
al., 1995).
Por seu potencial de mitigar os problemas acima apresentados, a satisfação do
usuário com o sistema pode ser um antecedente adequado da intenção de uso de
sistemas de informação ou mesmo um proxis da atitude do usuário em relação ao
uso do sistema, conforme afirmam Gatian (1994) e Mather et al. (2002), entre
outros. Assim, optou-se neste estudo por adotar a satisfação do usuário com o
sistema de home broker como um proxis da atitude do usuário em relação ao uso
do sistema.
3. MODELO PROPOSTO E HIPÓTESES DE PESQUISA
Os sistemas de home broker, apesar de compartilharem algumas das
características dos sistemas de on-line banking, são um tipo distinto de
tecnologia utilizada no ambiente da Internet (Roca et al., 2009). Dessa forma,
fatores que tradicionalmente influenciam a adoção de outros tipos de sistemas,
inclusive os de on-line banking, podem não explicar adequadamente a intenção de
uso de sistemas de home broker. Assim, propõe-se no presente estudo um modelo
que integra os principais elementos do modelo TAM e da teoria da difusão da
inovação (IDT), além dos construtos confiança e norma subjetiva, esse último
contemplado nas teorias da ação racionalizada (TRA) e do comportamento
planejado (TPB). Espera-se que a integração de teorias, que normalmente são
utilizadas de forma estanque para explicar a adoção de sistemas de informação,
aumente o poder do modelo proposto de explicar a satisfação do usuário com os
sistemas de home broker e, por conseguinte, sua intenção de utilizá-los.
É importante ressaltar que a combinação do modelo TAM com o construto
confiança, como feito por Gefen, Karahanna e Staub (2003), Carter e Belanger
(2005), Konana e Balasubramanian (2005), Wu e Chen (2005), entre outros, tem se
mostrado útil para explicar as variações no grau de adoção de sistemas
disponibilizados on-line para seus usuários. Além disso, segundo Rogers (2003),
na medida em que a oferta de serviços financeiros na Internet pode ser vista
como uma inovação tecnológica, sua difusão pode estar sujeita às influências
previstas na teoria da difusão da informação.
O modelo de pesquisa deste estudo foi elaborado a partir do referencial teórico
anteriormente apresentado. Ele está ilustrado na Figura_4. Em seguida, são
listadas e discutidas as hipóteses correspondentes.
H1 - A satisfação do usuário com o sistema de home broker tem efeito positivo
na intenção de uso do sistema de home broker.
H2 - As normas subjetivas têm efeito positivo na intenção de uso do sistema de
home broker.
H3 - A utilidade percebida tem impacto positivo na intenção de uso do sistema
de home broker.
H4 - A utilidade percebida tem impacto positivo na satisfação do usuário com o
sistema de home broker.
H5 - A facilidade de uso percebida influencia positivamente a satisfação do
usuário com o sistema de home broker.
H6 - A facilidade de uso percebida tem impacto positivo na utilidade percebida.
H7 - A complexidade influencia negativamente a satisfação do usuário com o
sistema de home broker.
H8 - A compatibilidade tem impacto positivo na satisfação do usuário com o
sistema de home broker.
H9 - A vantagem relativa tem efeito positivo na satisfação do usuário com o
sistema de home broker.
H10 - A confiança tem efeito positivo na satisfação do usuário com o sistema de
home broker.
As hipóteses 1, 3, 4, 5 e 6 foram formuladas com base no modelo TAM e abarcam
os construtos utilidade e facilidade de uso percebidas, presentes na maioria
dos modelos de aceitação de tecnologia (Lee et al., 2003; Legris et al., 2003),
e a variável satisfação de uso, como um adequado proxis para atitude em relação
ao uso do sistema (Ajzen & Fishbein, 1980; Gatian, 1994; Mather et al.,
2002; Wixom & Todd, 2005).
A hipótese 2 tem por base os modelosTRA e TPB, cuja combinação com o modelo TAM
é encontrada em vários artigos sobre aceitação de sistemas (Wu & Chen,
2005; Lee, 2009). Em tais casos, o construto norma subjetiva é visto como um
antecedente à intenção de uso do sistema.
As hipóteses 7, 8 e 9 são fundamentadas pela teoria de difusão da tecnologia.
Como já foi dito, vários autores sugerem a combinação do IDT com o TAM (por
exemplo, Plouffe et al., 2001; Carter & Belanger, 2005; Banbasat &
Barki, 2007), com o objetivo de acrescentar poder de explicação aos modelos
originais.
A hipótese 10 diz respeito ao construto confiança, que tem sido amplamente
combinado com os modelos clássicos de aceitação de tecnologia, mormente em
sistemas acessados via Web e em operações que denotem compra e venda de bens e
serviços, como no caso do on-line investing (Konana & Balasubramanian,
2005; Wu & Chen, 2005; Roca et al., 2009).
4. PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS
4.1. Operacionalização dos construtos
A mensuração dos construtos incluídos no modelo da pesquisa ocorreu por meio de
escalas previamentes testadas disponíveis na literatura. Os construtos que
compõem o modelo TAM e o IDT, assim como normas subjetivas e confiança, vêm
sendo amplamente estudados e avaliados já há algumas décadas. Há considerável
consenso, portanto, em relação à forma como são mensurados. Na Figura_5,
apresentam-se esses construtos, suas definições, as fontes das escalas adotadas
no estudo para mensurá-los e algumas referências em que essas escalas foram
empregadas.
Ao contrário do que foi observado para os construtos expostos, ainda há certa
discordância em relação à mensuração da satisfação com um sistema de
informação. Segundo Ajzen e Fishbein (1980, p. 80) e Wixom e Todd (2005), a
satisfação do usuário pode ser entendida como uma atitude em relação a um
objeto - no caso, um dado sistema computacional. Doll e Torkzadeh (1988)
desenvolveram, então, uma escala específica para mensuração da satisfação de
usuários de sistemas de informação. Entretanto, Chin e Lee (2000) a
questionaram posteriormente, por entenderem que a satisfação é derivada da
diferença entre o desempenho obtido e o desempenho esperado do sistema. Dado
que ainda não há consenso em relação a uma forma de mensuração adequada, optou-
se nesta pesquisa por avaliar a satisfação do usuário com o sistema de home
broker por meio de uma escala de 0 a 10, em que 10 significa que o usuário está
totalmente satisfeito, e 0, totalmente insatisfeito com o sistema. Essa
abordagem é a mesma adotada por Albuquerque, Sousa e Martins (2010), em
trabalho desenvolvido para avaliação da satisfação de idosos rurais com as
próprias vidas.
4.2. Coleta de dados e amostra
A amostra de respondentes da pesquisa foi obtida a partir da base de dados de
uma das maiores corretoras de compra e venda de ações do Brasil, à época da
realização da pesquisa. A base de dados continha 1.545 indivíduos que, entre
2008 e 2011, haviam efetuado transações com ações, seja pelo método
tradicional, seja por meio de sistema de home broker. Pouco antes da coleta de
dados, a corretora havia apresentado seu sistema de home broker a todos os seus
investidores do mercado acionário, dando-lhes a opção de migrar para essa
plataforma.
Os dados foram coletados por meio de um questionário eletrônico, elaborado com
base nas escalas apresentadas na seção anterior. O questionário era composto de
duas partes. Na primeira, coletavam-se dados demográficos do respondente, como
idade, renda, gênero, nível educacional e estado civil. Além disso, perguntava-
se ao participante se ele já era usuário de sistemas de home broker. A segunda
parte era composta pelas escalas dos construtos incluídos no modelo proposto.
Todos os construtos, exceto a satisfação com o sistema de home broker, foram
medidos por meio de uma escala Likert de cinco pontos, variando de "discordo
totalmente" a "concordo totalmente". Conforme já mencionado, a escala do
construto satisfação variava entre 0 e 10.
Antes da disponibilização do questionário para todos os investidores
cadastrados no banco de dados da corretora, foi realizado um pré-teste com dez
indivíduos, selecionados aleatoriamente entre os usuários do sistema de home
broker da empresa. Os participantes foram incentivados a criticar o formato do
questionário e a apontar questões que considerassem vagas ou de difícil
compreensão. Seus comentários foram utilizados para refinar o instrumento, não
havendo necessidade de efetuar modificações substanciais.
Os investidores cadastrados na corretora foram convidados por e-mail (enviado
pela própria empresa) para participar da pesquisa. Na mensagem, apresentavam-se
de forma breve os objetivos do estudo e deixava-se claro que a participação era
voluntária e que a confidencialidade das respostas seria protegida. O e-mail
incluía também o link para acesso ao questionário eletrônico.
O questionário esteve disponível para os investidores entre junho e julho de
2011. Ao final desse período, foram obtidos 152 questionários preenchidos
completamente, considerados válidos para os propósitos da pesquisa. A taxa de
resposta correspondente foi de 9,8%.
A expressiva maioria dos respondentes que compunham a amostra obtida é do sexo
masculino (90,8% do total). Esse resultado reflete a realidade no mercado de
ações, em que a quantidade de investidores do sexo feminino ainda é muito
baixa. Cerca de 80% dos participantes informaram, à época, já terem utilizado o
sistema de home broker da corretora. No que tange ao seu estado civil, mais da
metade deles era casada (57,2%), e pouco mais de um terço, solteiro (37,5%). Os
investidores estavam relativamente bem distribuídos entre as sete faixas de
renda mensal definidas no questionário, com 59,2% reportando uma renda de pelo
menos R$ 5.500,00. As idades variaram entre 20 e 66 anos, com uma média de 34,8
anos e um desvio padrão de 9,2 anos. Quanto ao nível educacional, 98,0% dos
respondentes informaram ter pelo menos o nível superior completo. Desses, 63,8%
já haviam concluído algum tipo de pós-graduação.
4.3. Método de análise
Os dados coletados foram analisados com técnicas de equações estruturais
baseadas no método de Partial Least Squares (PLS), que vem sendo apontado como
uma alternativa interessante para os métodos tradicionais de equações
estruturais baseados em covariância, conhecidos por Structural Equation
Modeling (SEM) e implementados em aplicativos tais como LISREL, AMOS e R.
Dentre as vantagens do método PLS, destacam-se: sua robustez em relação a
violações da premissa de normalidade multivariada requerida pelo SEM, à
multicolinearidade entre e em blocos de variáveis manifestas, e a problemas de
especificação do modelo de equações estruturais; a possibilidade de trabalhar-
se com amostras menores do que as tipicamente exigidas em SEM; a maior
facilidade de tratar as moderações; e a possibilidade de modelar construtos
reflexivos e formativos de forma mais simples (Chin, 2010; Urbach &
Ahlemann, 2010; Vinzi, Trinchera & Amato, 2010). Por outro lado, ainda não
estão disponíveis no PLS índices de qualidade de ajuste similares aos que são
usualmente adotados em SEM (por exemplo, GFI, AGFI, RMSEA etc.), ou mesmo
testes estatísticos de comparação de modelos. Em função disso, a qualidade de
um modelo em PLS é geralmente avaliada de acordo com sua capacidade preditiva,
conforme demonstrado pelos valores de R2 gerados para as variáveis latentes
endógenas (Urbach & Ahlemann, 2010).
Como alguns estudos têm indicado que fatores demográficos podem influenciar a
intenção de adoção de sistemas de informação (ver, por exemplo, Venkatesh &
Bala, 2008), foram incluídas no modelo proposto as seguintes variáveis de
controle: gênero, idade, educação e renda. Adicionou-se também, para os mesmos
fins, uma variável dummy que indicava se o respondente já havia ou não
utilizado o sistema de home broker anteriormente. As cinco variáveis de
controle foram conectadas à variável latente mais endógena no modelo, ou seja,
a que correspondia ao construto intenção de uso.
A avaliação da significância estatística dos efeitos previstos num modelo de
PLS é feita por meio de técnicas de reamostragem, tais como bootstrapping e
blindfolding (Chin, 2010; Urbach & Ahlemann, 2010; Hair Jr., Sarstedt,
Pieper & Ringle, 2012). No presente estudo, essa avaliação foi feita por
meio de bootstrapping, com o tamanho das amostras fixado em 152, e o número de
reamostragens, em 1.000. O software utilizado foi o SmartPLS v. 2.0.M3 (Ringle,
Wende & Will, 2005).
5. ANÁLISE DOS DADOS COLETADOS
O modelo de mensuração do estudo foi avaliado por meio de uma análise fatorial
confirmatória (Confirmatory Factor Analysis - CFA), seguindo os prodecimentos
definidos por Wetzels, Odekerken-Schröder e van Oppen (2009). A partir dos
resultados obtidos, verificou-se se as condições especificadas por Chin (2010),
Hair Jr., Anderson, Tatham e Black (2009) e Vinzi et al. (2010) para avaliar se
a consistência interna e a validade convergente e discriminante das escalas
haviam sido atendidas, são elas:
•as cargas das variáveis observadas devem ser altas e significantes;
•a amplitude de variação dessas cargas para uma mesma variável
latente deve ser pequena;
•eventuais cargas cruzadas das variáveis observadas devem ser menores
do que as cargas em suas respectivas variáveis latentes;
•valores de variância média extraída (Average Variance Extracted -
AVE) devem ser iguais ou superiores a 0,50;
•valores de confiabilidade composta (Composite Reliability - CR)
devem ser iguais ou superiores a 0,70;
•a raiz quadrada de AVE para uma variável latente deve ser maior que
suas correlações com as demais variáveis latentes.
Observou-se, então, que era necessário remover alguns itens, de forma que as
cinco condições fossem plenamente atendidas. Uma nova CFA foi realizada,
atestando a validade convergente e discriminante das escalas, ou seja, a
adequação do modelo de mensuração utilizado. Os resultados finais obtidos são
apresentados na Tabela_1.
Comprovada a validade do modelo de mensuração, prosseguiu-se com a avaliação do
modelo estrutural. Na Figura_6, apresentam-se os resultados obtidos. Nela,
observa-se que as proporções de variância explicada para as variáveis
satisfação (R2 = 0,38) e intenção de uso (R2 = 0,42) foram razoáveis, sugerindo
que o modelo proposto tem um poder preditivo moderado. É importante ressaltar,
no entanto, que parte da variação na intenção de uso do sistema de home broker
foi explicada pela variável de controle usuário, que indica se o indivíduo já
utilizou o aplicativo antes de responder a pesquisa. Embora a magnitude do
efeito dessa variável tenha sido consideravelmente menor que o da variável
satisfação, o resultado sugere que investidores que já utilizaram o sistema
tendem a continuar a fazê-lo no futuro. Nenhum dos fatores demográficos
incluídos como variável de controle teve efeito estatisticamente significante
na intenção de uso dos investidores (α= 0,05).
Quatro das hipóteses propostas no estudo obtiveram suporte empírico. Conforme
previsto em H1, a satifação do investidor com o sistema de home broker parece
ser um forte preditor de sua intenção de utilizar o sistema no futuro (β=0,40;
p<0,001). Essa satisfação, por sua vez, tende a ser influenciada pela percepção
do indivíduo acerca da utilidade (β=0,22; p<0,05), da facilidade de uso
(β=0,14; p<0,05) e da compatibilidade do sistema com suas experiências, valores
e necessidades (β=0,33; p<0,05). Esses três resultados proveem suporte para as
hipóteses H4, H5, e H8.
6. DISCUSSÃO DOS RESULTADOS
Nos resultados obtidos, sugere-se que, conforme previsto no modelo TAM, a
utilidade do sistema de home broker, conforme percebida pelo investidor, tem um
efeito positivo em sua satisfação com o sistema. O construto utilidade
percebida já é bastante conhecido e explorado na literatura acadêmica, sendo
frequentemente apontado, em estudos apoiados no TAM, como um antecedente da
atitude e da intenção de uso de um sistema de informação. Em particular, esse
resultado é compatível com os achados de Roca et al. (2009), que verificaram
ser a utilidade percebida um antecedente à adoção de sistemas de on-line
trading.
Da mesma forma, a facilidade de uso percebida parece ter uma influência
positiva na satisfação do investidor com o sistema de home broker. No entanto,
seu efeito foi consideravelmente mais fraco do que os demais estatisticamente
significantes. Isso pode estar associado ao fato de que o ambiente Web para on-
line trading é geralmente bastante amigável e de fácil utilização (Roca et al.,
2009). Além disso, Pikkarainen, Pikkarainen, Karjaluoto e Pahnila (2004) e
Cheng, Lam e Yeung (2006), ao estudarem sistemas de on-line trading, perceberam
que os usuários estão mais preocupados com o desempenho de seus processos de
compra e venda de ações na Web, do que com as possíveis dificuldades para
aprender a usar o sistema de on-line trading. Ademais, é importante ressaltar
que Venkatesh, Morris, Davis e Davis (2003) argumentam que a facilidade de uso
percebida tende a ser mais relevante nos primeiros estágios de aprendizagem do
uso de sistemas de informação, tornando-se menos importante ao longo do tempo.
Na amostra analisada no presente estudo, cerca de 80% dos participantes já
haviam utilizado o sistema de home broker da corretora, provavelmente já tendo
um tempo de experiência razoável como seus usuários.
A análise realizada também gerou suporte para a hipótese de que a
compatibilidade influencia positivamente a satisfação do investidor com o
sistema de home broker. Esse resultado é corroborado por Carter e Belanger
(2005), que encontraram compatibilidade como o fator mais importante na adoção
de sistemas de governo eletrônico.
Segundo Rogers (2003), a compatibilidade é o grau pelo qual uma inovação é
percebida como sendo compatível com valores existentes, experiências passadas e
as necessidades de seus potenciais usuários. É um erro considerar que os
potenciais usuários são lousas brancas, isto é, que estão dispostos a aceitar
qualquer tipo de inovação. Na realidade, quanto mais uma inovação for
compatível com experiências anteriores dos adotantes, menor será seu grau de
incerteza em relação a sua adoção, e, por conseguinte, maior sua tendência a
adotá-la.
Ainda de acordo com Rogers (2003), uma adoção deve ser compatível com valores e
crenças socioculturais, com ideias introduzidas previamente ou com necessidades
de inovação por parte do cliente. Nesse último caso, as pessoas responsáveis
pela difusão (agentes de mudança) devem procurar determinar as necessidades dos
clientes, para, em seguida, saber como recomendar-lhes as inovações. Vale
lembrar que nem sempre os potenciais usuários perceberão suas reais
necessidades (por exemplo, telefonia celular, MP3, tablets etc.).
Assim, em um ambiente virtual, a negociação de ações deve ser compatível com o
processo já utilizado pelos usuários no mundo real, porque tal processo possui
um modus operandi bastante específico, com o qual os investidores do mercado
acionário já se acostumaram. Deve-se notar, ainda, que a própria Internet vem
definindo alguns padrões, e pode ser interessante considerá-los no
desenvolvimento de sistemas de home broker.
Há, no entanto, fatores que se mostraram sem significância estatística no
modelo (α=0,05), os quais merecem ser analisados. A seguir, discutem-se as
hipóteses relativas a antecedentes da satisfação do usuário que não obtiveram
suporte empírico.
A rejeição da hipótese sobre a influência da norma subjetiva na intenção de uso
(H3) é um resultado que também foi encontrado em outros estudos (por exemplo,
Taylor & Todd, 1995; Chau & Hu, 2001; Wu & Chen, 2005). Venkatesh e
Davis (2000) argumentam que a norma subjetiva pode ser um fator extremamente
significante em ambientes em que o uso do sistema é mandatório, o que não
configura o caso em análise. Ademais, sistemas de home broker ainda estão numa
fase inicial de difusão, havendo pouca ou nenhuma pressão dos já adotantes
sobre potenciais usuários, como familiares, amigos, colegas de trabalho (Wu
& Chen, 2005, p. 797). Dessa forma, é perfeitamente razoável que o efeito
da norma subjetiva na intenção de uso de sistemas de home broker não seja
estatisticamente significante.
A explicação em relação ao fraco efeito da facilidade de uso percebida na
satisfação do usuário pode ser, em grande parte, estendida ao resultado obtido
para o construto complexidade. De acordo com a análise realizada, deve-se
rejeitar a hipótese de que a complexidade do sistema de home broker tem um
efeito negativo na satisfação de seus potenciais usuários. Como já mencionado,
a principal preocupação do investidor é que sua ordem de compra e venda seja
tempestiva e corretamente disparada, mais do que se o sistema é complexo ou
não. Por outro lado, Carter e Belanger (2005) sugerem que a escala de
complexidade captura os mesmos efeitos que a de facilidade de uso percebida,
assim eliminaram o fator complexidade em seu trabalho sobre adoção de sistemas
de governo eletrônico. No entanto, a CFA realizada confirmou a validade
divergente e convergente das escalas utilizadas. Assim, é possível também que
os resultados distintos gerados para os construtos facilidade de uso e
compatibilidade se devam a diferenças substanciais de interpretação por parte
dos respondentes dos itens das duas escalas. Novos estudos devem ser
realizados, portanto, para revalidar as escalas traduzidas para o português.
A hipótese H9, que relaciona a vantagem relativa com a satisfação de uso,
também não obteve suporte empírico. O construto vantagem relativa é definido
como o grau pelo qual uma inovação é percebida como sendo melhor do que a ideia
que a antecedeu (Rogers, 2003). Neste trabalho, a maioria dos respondentes, por
seu poder aquisitivo e nível educacional, deve ser usuária da Internet e da
Web. Assim, até mesmo por considerarem o meio digital compatível com seu estilo
de vida, é possível que os investidores não considerem a compra e vendas de
ações via Web como um novo benefício, já que usam tecnologias similares para
interagir com amigos e colegas, fazer negócios, etc. Dessa forma, os sistemas
de home broker apenas preencheriam uma expectativa existente (Carter &
Belanger, 2005, p. 19-20).
Finalmente, Roca et al. (2009), analisando sistemas de on-line trading,
enfatizam a importância da confiança no sistema de home broker de per si. Da
mesma forma, Wu e Chen (2005) mostram que a introdução do fator confiança nos
modelos TAM e TPB tradicionais pode aumentar o poder de explicação da adoção do
sistema. Gefen et al. (2003) concluem seu trabalho sobre on-line shopping da
mesma forma, enfatizando, tal qual Konana e Balasubramanian (2005), que, em
situações em que a responsabilidade pela busca de informações e pela própria
transação se desloca do agente intermediário para o próprio usuário, o
construto confiança desempenha um papel altamente relevante na satisfação do
usuário e na consequente adoção do sistema. No entanto, os resultados oriundos
do modelo estrutural adotado neste trabalho não proveram suporte empírico para
a hipótese de que o construto confiança é um antecedente significativo à
satisfação dos usuários de sistemas de home broker (H10). Uma explicação
plausível seria o fato de a amostra adotada ser composta de investidores que
são clientes da corretora em questão há tempos. Explicação corroborada pela
elevada média e baixo desvio padrão associados aos indicadores do construto
confiança. No entanto, estudos futuros devem analisar essa questão em maior
profundidade.
7. CONCLUSÕES
No presente trabalho, o objetivo foi investigar, sob a ótica dos investidores
no mercado acionário, os antecedentes da intenção de uso de sistemas de home
broker. Com base nos resultados obtidos, conclui-se que compatibidade e
utilidade e facilidade de uso são antecedentes da satisfação com o sistema, e
que influenciam positivamente a intenção de adoção do sistema. Ressalta-se que,
como dito anteriormente, a satisfação pode ser encarada como um proxis da
atitude em relação ao uso de sistemas de informação (Mather et al., 2002;
Konana & Balasubramanian, 2005; Wixom & Todd, 2005).
7.1. Implicações acadêmicas
Neste estudo, buscou-se investigar os antecedentes da adoção de uma específica
tecnologia - no caso, sistemas de home broker -, por meio do desenvolvimento e
teste de um modelo estrutural próprio gerado a partir da literatura científica
existente, em linha com as recomendações de Orlikowski e Iacono (2001) e
Benbasat e Barki (2007), que entendem que tecnologias específicas demandam
modelos de adoção específicos. Além disso, no estudo em questão, buscou-se
aproximar duas vertentes teóricas que têm se desenvolvido em separado: adoção
de tecnologia e satisfação do usuário (Mather et al., 2002; Wixom & Todd,
2005).
O uso da satisfação do usuário com o sistema de home broker como um proxis da
atitude do usuário em relação a esse sistema e como antecedente a sua intenção
de uso pode ser considerada uma contribuição acadêmica deste trabalho, já que
raramente essas duas abordagens são combinadas (ver Mather et al., 2002). Os
resultados encontrados mostram que a aplicação conjunta dessas duas vertentes
teóricas pode ser mais adequada do que o uso isolado de cada uma delas. Dessa
forma, neste estudo, aponta-se para a possibilidade e a necesssidade de
desenvolver e testar variações do modelo aqui apresentado, levando-se em
consideração não apenas os ubíquos modelos TAMxx (Benbasat & Barki, 2007),
mas também outras abordagens, como IDT e confiança (Carter & Belanger,
2005) e, principalmente, o construto satisfação do usuário com a tecnologia em
análise.
Conforme argumentam Orlikowski e Iacono (2001), é fundamental que os modelos de
adoção levem em consideração as especificidades das tecnologias investigadas,
seu papel e o contexto em que estão sendo usadas. Ademais, é importante ligar a
satisfação do usuário com a tecnologia em análise e seu uso, naquilo que é,
ainda hoje, considerado um gap conceitual (Wixom & Todd, 2005, p. 89).
Finalmente, como já dito, nesta pesquisa avança-se numa área pouquíssimo
explorada - on-line investing -, que se diferencia de Internet banking por uma
série de razões, anteriormente explicitadas (Bakos et al., 2005; Roca et al.,
2009). Assim, evitou-se neste trabalho mimetizar os modelos adotados para
adoção de sistemas de Internet banking, como se eles fossem capazes de explicar
completamente o processo de compra e venda de ações via Web (Konana &
Balasubramanian, 2005).
7.2. Implicações gerenciais
O trabalho apontou a compatibilidade e a utilidade e facilidade de uso
percebidas como antecedentes à satisfação do usuário com o sistema de home
broker, a qual se configurou em poderoso antecedente a seu uso.
No caso da compatibilidade, pode-se argumentar que sistemas de home broker
congruentes com o modo como os investidores do mercado acionário interagem com
outros sistemas na Web - seja socialmente (redes sociais, e-mails etc.),
economicamente (compra de serviços e produtos via Web) ou profissionalmente
(atividades relacionadas a seu dia a dia no trabalho) - têm maiores chances de
satisfazer o usuário e ser efetivamente usados.
Compatibilidade foi o mais significativo antecedente à satisfação do usuário
com sistemas de home broker. Tal não configura uma surpresa, já que esse
construto tem sido frequentemente encontrado como um antecedente altamente
relevante à atitude/intenção de uso de sistemas em variados contextos,
incluindo-se aí os sistemas de comércio eletrônico (Van Slyke, Bélanger &
Comunale, 2004). Assim, para aumentar a satisfação do usuário com sistemas de
home broker, as corretoras devem fornecer informações e serviços de forma
consistente com as outras formas que o investidor tem de interagir com essas
empresas. Por exemplo, formulários on-line devem ser semelhantes aos formuários
em papel com os quais os investidores em ação já estão acostumados, o mesmo
ocorrendo com o modus operandi para compra/venda de ações por meios
tradicionais ou eletrônicos.
De modo similar, a compatibilidade pode também ser alcançada se o mercado
financeiro decidir padronizar as interfaces de seus websites. Não obstante tal
possibilidade ser improvável no curto prazo, maior demanda dos investidores por
sistemas de home broker pode eventualmente levar a tal padronização. Assim, ao
padronizar-se a interface e a interação do usuário com os sites de corretoras e
bancos, a compatibilidade será aumentada (e por consequência, a satisfação do
usuário e a intenção de uso), à medida que os investidores mudam de um site
para outro (Carter & Belanger, 2005).
Semelhantemente, as percepções de utilidade e facilidade de uso de sistemas de
home broker mostram-se antecedentes importantes à satisfação do usuário com o
sistema. Um sistema de home broker adequado ajuda os investidores a efetuarem
lucrativas transações com ações, de forma rápida, fácil e tempestiva, mitigando
suas dúvidas acerca das decisões tomadas (Roca et al., 2009). Tal se explica,
mais uma vez, pelo específico processo de compra e venda de ações, extremamente
dependente da responsividade do sistema às ordens lançadas (Konana &
Balasubramanian, 2005). Assim, um sistema de home broker que coloque as ordens
dos investidores de forma rápida, simples e precisa aumenta a satisfação do
usuário com ele, levando a um incremento na intenção de uso do sistema pelos
investidores.
Como a satisfação do usuário é um construto importante para o projeto do
sistema em questão (Wixom & Todd, 2005), essas observações podem ser
levadas em consideração pelas empresas quando do projeto e desenvolvimento de
sistemas de home broker.
7.3. Limitações da pesquisa e trabalhos futuros
Algumas limitações devem ser consideradas ao avaliar-se a presente pesquisa.
Uma limitação refere-se aos modelos de aceitação de tecnologia escolhidos e
utilizados no referencial teórico (TAM, TRA, TPB e IDT). Eles não esgotam a
totalidade dos modelos existentes na literatura acadêmica mundial, tendo sido
escolhidos discricionariamente pelos pesquisadores. Assim, podem existir outras
variáveis relevantes que também mereçam ser consideradas e que não foram
levadas em consideração no presente estudo.
Ademais, o construto satisfação do usuário foi medido por meio de uma escala de
0 a 10, deixando margem a tendenciosidades inerentes aos respondentes, quando
de suas respostas. Além disso, não foi adotada uma escala mais elaborada desse
construto, como a desenvolvida por Doll e Torkzadeh (1988), que tratam esse
construto de forma multidimensional. Deve-se destacar que tal opção se deveu ao
fato de essa escala ter sido criticada por Chin e Lee (2000), conforme
explicado anteriormente neste artigo.
Finalmente, a amostra de respondentes usuários de sistemas de home broker,
embora adequada à análise estatística, não foi objeto de uma análise de
proporção vis-à-vis a população de usuários de sistemas de home broker do
Brasil. Infelizmente, não foi possível encontrar um padrão demográfico dessa
população, inviabilizando, portanto, tal análise.
Pode-se citar, por fim, algumas sugestões para pesquisas futuras nessa área de
conhecimento, conforme explicitado a seguir.
A pesquisa foi realizada com investidores usuários ou potenciais usuários de
sistemas de home broker. Um experimento interessante é estudar os investidores
que aplicam na bolsa de valores, mas que optaram por não utilizar sistemas de
home broker, visando identificar os motivos para tal rejeição.
Adicionalmente, o Web survey atingiu um número não muito grande de
respondentes. Assim, uma pesquisa futura realizada com uma escala maior de
respondentes pode confrontar os resultados obtidos no presente estudo. Por
outro lado, outros procedimentos metodológicos baseados em análises
qualitativas, também, poderiam ser utilizados, comparando-se os resultados
obtidos com os aqui apresentados.
Por fim, neste trabalho objetivou-se adentrar uma área pouquísimo estudada no
Brasil, de modo a permitir que, em futuro breve, mais trabalhos corroborem ou
refutem os resultados aqui encontrados, fortalecendo o conhecimento de
acadêmicos e praticantes acerca de sistemas de home broker. Acredita-se que um
passo tenha sido dado no sentido de ligar duas importantes correntes teóricas
relativas ao uso de sistemas de informação. No entanto, foi um simples passo.
Pesquisas adicionais necessitam ser desenvolvidas para refinar as relações
propostas no presente modelo de intenção de uso de sistemas de home broker. ïµ