O efeito das capacidades logísticas na construção de resiliência da cadeia de
suprimentos
1. INTRODUÇÃO
A resiliência da cadeia de suprimentos pode ser caracterizada como a habilidade
de uma empresa para sobreviver, adaptar-se e crescer em face de mudanças
turbulentas (Pettit,_2008), ou seja, a capacidade de recuperação do status quo
original, a partir do término de um abalo ambiental (Vilchek,_1998).
Marcos_e_Macaulay_(2008) justificam a importância da resiliência nas
organizações, lembrando que o ambiente de negócios está cada vez mais
interconectado, imprevisível e volátil. Além disso, as consequências de eventos
externos às organizações tornam-se cada vez mais impactantes, fazendo com que
empresas menos ágeis em adaptar-se às situações adversas a que suas cadeias de
suprimentos estão sujeitas corram sérios riscos de perder espaço no mercado.
Também preocupados com a velocidade com que ocorrem mudanças ambientais, Hamel
e_Välikangas_(2003, p. 52) observam que "o mundo torna-se turbulento mais
rápido do que as empresas se tornam resilientes", existindo um "gap de
resiliência".
Christopher_e_Peck_(2004) afirmam que as cadeias de suprimentos atuais
tornaram-se mais vulneráveis em função da globalização e da aplicação cada vez
mais frequente da produção enxuta. Essa nova realidade aumenta o risco de
ruptura na cadeia de suprimentos. Segundo esses autores, o desafio atual
consiste em gerenciar e mitigar tais riscos, de forma a criar cadeias de
suprimentos mais resilientes. Em reforço a essa linha de argumentação, Pettit_
(2008) afirma que os ambientes de negócio estão mudando continuamente e essas
mudanças criam riscos, cujo gerenciamento requer resiliência. O autor defende a
necessidade da utilização de definições normatizadas, de variáveis e de
ferramentas de mensuração adequadas para obter melhoria efetiva da resiliência
da cadeia de suprimentos.
A pesquisa relatada neste artigo teve como objetivo principal compreender a
forma como as capacidades logísticas referentes ao gerenciamento de riscos, ao
foco no cliente e ao compartilhamento de informações se relacionam com a
resiliência da cadeia de suprimentos, a variabilidade dos processos da cadeia
de suprimentos e a vantagem competitiva, conforme percebidas pelos envolvidos
com esses processos. Mais especificamente, procurou-se avaliar, a partir da
percepção de gerentes e diretores industriais: o impacto causado pela adoção de
ações orientadas para gerenciamento de risco, pela capacidade de foco no
cliente e pela capacidade de compartilhamento de informações na formação da
resiliência da cadeia de suprimentos; o impacto que o aumento da resiliência da
cadeia de suprimentos provoca na vantagem competitiva percebida e na
variabilidade dos processos logísticos; e o relacionamento entre a
variabilidade dos processos logísticos e a vantagem competitiva.
Trata-se de uma replicação no Brasil de pesquisa realizada em empresas norte-
americanas por Ponomarov_e_Holcomb_(2009a), o que permite uma análise
comparativa entre os resultados de ambas as pesquisas.
A partir de uma perspectiva prática, a pesquisa realizada é relevante porque
alerta as empresas sobre os riscos decorrentes da fragilização de cadeias de
suprimentos expostas a ambientes externos mutantes, ao discutir a necessidade
de definição de processos logísticos resilientes. Embora as organizações que
participaram do estudo possam beneficiar-se diretamente das análises
realizadas, outras empresas e cadeias de suprimentos também encontrarão, nos
resultados obtidos e nas recomendações oferecidas na conclusão do trabalho,
material útil para a discussão de coordenação de esforços para gerar um produto
de valor para o consumidor. Por outro lado, a pesquisa traz uma reflexão sobre
a mitigação do risco associado aos participantes da cadeia. A partir de uma
perspectiva teórica, a realização da pesquisa justifica-se pela constatação da
inexistência de artigos científicos que tratem especificamente do tema da
resiliência da cadeia de suprimentos, publicados nos últimos dez anos, nos
periódicos nacionais considerados mais relevantes na divulgação de trabalhos
científicos, tanto na área da Administração (Revista de Administração [RAUSP],
Revista de Administração de Empresas [RAE], Revista de Administração
Contemporânea [RAC], Revista Eletrônica de Administração [REAd], Revista de
Administração Mackenzie [RAM] e Journal of Operations and Supply Chain
Management [JOSCM]) como pela área da Engenharia de Produção (Gestão &
Planejamento [G&P] e Produção).
Nas próximas seções, após esta introdução, é apresentada uma revisão da
literatura sobre resiliência na cadeia de suprimentos para, a seguir,
discutirem-se o conceito e o escopo geral de resiliência e de capacidades
logísticas da cadeia de suprimentos. Abordam-se, ainda, a forma de ligação
entre as capacidades logísticas e a resiliência da cadeia de suprimentos, sendo
apresentadas algumas hipóteses norteadoras do estudo. Depois, apresenta-se a
metodologia utilizada na coleta e na análise dos dados. Na sequência, discutem-
se os achados da pesquisa. Encerra-se o artigo com as conclusões, algumas
recomendações para estudos futuros e considerações finais.
2. ESTUDOS ANTERIORES SOBRE RESILIÊNCIA DA CADEIA DE SUPRIMENTOS
Em um trabalho com o propósito específico de apresentar e conceituar a temática
da resiliência na cadeia de suprimentos, Ponomarov_e_Holcomb_(2009b) declaram
que o conceito de resiliência vem sendo discutido a partir de várias
perspectivas e nos diversos domínios da ciência, e sua utilização mais
frequente ocorre nas áreas da Ecologia, Psicologia, Economia e no Gerenciamento
de Situações de Emergências. Segundo esses autores, na recente disciplina de
gestão de riscos na cadeia de suprimentos (Supply Chain Risk Management), a
abordagem da resiliência ainda é relativamente indefinida. Em resposta a essa
constatação, Ponomarov_e_Holcomb_(2009b)desenvolveram uma definição para
resiliência da cadeia de suprimentos usando as diversas perspectivas
multidisciplinares, a qual vem sendo adotada também, em trabalhos mais
contemporâneos, por outros pesquisadores da área de Gestão de Operações. Para
eles, resiliência da cadeia de suprimentos é
a capacidade adaptativa da cadeia de suprimentos para se preparar
para acontecimentos inesperados, responder a interrupções e
recuperar-se a partir deles, mantendo a continuidade das operações ao
nível de conectividade e controle sobre a estrutura e a função
desejada (Ponomarov_&_Holcomb,_2009b, p. 131).
Em função da recente importância do conceito da resiliência na gestão da cadeia
de suprimentos, o que justifica a necessidade de maiores aprofundamentos sobre
o tema, Wieland_e_Wallenburg_(2013), de maneira similar à utilizada no presente
trabalho, conduziram uma pesquisa envolvendo 270 gestores de empresas da
Alemanha, da Áustria e da Suíça. A pesquisa buscou investigar os efeitos das
competências relacionais (comunicação, cooperação e integração) na formação da
resiliência na cadeia de suprimentos e, por sua vez, a influência disso no
valor da cadeia de suprimentos percebido pelo cliente. Wieland_e_Wallenburg_
(2013) construíram oito hipóteses combinando as três competências com dois
mecanismos de resiliência e estes com o resultado sobre o valor da gestão da
cadeia de suprimentos. Assim, por exemplo, a hipótese H1a é formada pela
expressão: a comunicação exerce um efeito positivo na agilidade; a hipótese H2a
é formada pela expressão: a comunicação exerce um efeito positivo na robustez,
e assim sucessivamente, conforme exposto na Figura_1. Os resultados
apresentados pela pesquisa de Wieland_e_Wallenburg_(2013) confirmaram as
hipóteses H1a, H2a, H1b, H3a e H3b, já as hipóteses H2b, H1c e H2c não puderam
ser confirmadas.
Figura 1 Estrutura das Hipóteses Propostas por Wieland e WallenburgFonte:
Wieland e Wallenburg (2013, p. 304).
Também em outro recente trabalho, Johnson,_Elliott_e_Drake_(2013), em estudo de
caso em uma ferrovia britânica, pesquisaram como três dimensões do capital
social (cognitiva, estrutural e relacional) podem atuar como facilitadores ou
capacitadores de quatro recursos formadores de resiliência na cadeia de
suprimentos (flexibilidade, velocidade, visibilidade e colaboração). Na Figura
2, esboça-se o relacionamento entre as variáveis formadoras de resiliência na
cadeia de suprimentos proposta por esses autores.
[/img/revistas/rausp/v49n4//0080-2107-rausp-49-04-0642-gf02.jpg]
Figura 2 Estrutura do Relacionamento Proposta por Johnson, Elliott e
DrakeFonte: Adaptado de Johnson et al. (2013, p. 325).
Vale ressaltar que Johnson_et_al.(2013) também utilizaram a definição de
resiliência da cadeia de suprimentos proposta por Ponomarov_e_Holcomb_(2009b),
o que evidencia sua adoção e aceitação pela comunidade científica.
Em outro recente trabalho, Golgeci_e_Ponomarov_(2013) investigaram o
relacionamento das variáveis inovatividade da empresa (firm innovativeness),
magnitude da inovação (innovation magnitude), severidade da ruptura (disruption
severity) e resiliência da cadeia de suprimentos. Os relacionamentos foram
estudados em contextos em que ocorreram rupturas na cadeia de suprimentos. O
estudo foi conduzido por meio de um survey encaminhado para gerentes seniores
de logística e supply chain de empresas de manufatura, que resultou em 114
respostas, sendo 21 de empresas europeias e 93 de empresas norte-americanas. Os
autores construíram quatro hipóteses combinando as quatro variáveis. Assim, a
hipótese H1 foi formada pela expressão: o grau de inovação da empresa é
positivamente associado à magnitude da inovação; a hipótese H2 foi representada
pela expressão: a severidade da ruptura é positivamente associada à magnitude
da inovação; a hipótese H3 formou-se pela expressão: o grau de inovação da
empresa é positivamente associado à resiliência da cadeia de suprimentos; e,
finalmente, a hipótese H4 foi formada pela expressão: a magnitude da inovação é
positivamente associada à resiliência da cadeia de suprimentos, conforme
exposto na Figura_3. Os resultados apresentados pela pesquisa de Golgeci_e
Ponomarov_(2013) confirmaram as hipóteses H2, H3 e H4, já a hipótese H1 não
pôde ser confirmada.
[/img/revistas/rausp/v49n4//0080-2107-rausp-49-04-0642-gf03.jpg]
Figura 3 Estrutura das Hipóteses Propostas por Golgeci e PonomarovFonte:
Golgeci e Ponomarov (2013, p. 606).
Em um estudo empírico sobre a resiliência da cadeia de suprimentos em tempos da
crise financeira mundial, Jüttner_e_Maklan_(2011)também afirmam que o conceito
da resiliência da cadeia de suprimentos é novo e seus modelos e justificativas
teóricas ainda se encontram em sua infância. O estudo empírico realizado por
Jüttner_e_Maklan_(2011), que também adotaram a definição de resiliência da
cadeia de suprimentos proposta por Ponomarov_e_Holcomb_(2009b), aconteceu por
meio de entrevistas com 28 gestores de três grandes cadeias de suprimentos
europeias e da análise de documentos secundários. O estudo revelou evidências
empíricas sobre o relacionamento entre a resiliência da cadeia de suprimentos,
o gerenciamento de riscos da cadeia de suprimentos e a vulnerabilidade da
cadeia de suprimentos.
Os exemplos das pesquisas mencionadas demostram que os estudos que abordam o
tema referente à resiliência da cadeia de suprimentos são recentes e vêm sendo
desenvolvidos em âmbito internacional. Já em âmbito nacional, inexistem
pesquisas sobre o assunto, o que aponta um universo a ser explorado sobre um
tema maior representado pela gestão da cadeia de suprimentos.
3. RESILIÊNCIA DA CADEIA DE SUPRIMENTOS: CONCEITO E ESCOPO
Como já mencionado, Ponomarov_e_Holcomb_(2009a)definem a resiliência da cadeia
de suprimentos como a capacidade de a cadeia de suprimentos preparar-se para
eventos inesperados e responder às rupturas por meio da recuperação da
continuidade das operações no nível desejado de conectividade e controle entre
as funções e as estruturas. Christopher_e_Peck_(2004) já consideravam a
resiliência da cadeia de suprimentos como a habilidade de um sistema retornar a
seu estado original, ou a um estado mais desejado do que o anterior, após
sofrer alguma ruptura. Para eles, essa definição conferia a noção de
flexibilidade ao processo de ajuste, dado que o estado desejado nem sempre
corresponde ao estado original.
Christopher_e_Peck_(2004) alertam para a distinção entre os termos resiliência
e robustez que, em outras circunstâncias, poderiam até ser utilizados como
sinônimos, mas que, no contexto da cadeia de suprimentos, adquirem conotações
diferentes. O termo robustezestá associado à força física ou à resistência
estrutural. Um processo robusto pode ser desejável, porém, por si só, pode não
assegurar que a cadeia de suprimentos tenha a resiliência necessária para
enfrentar mudanças inesperadas.
Um estudo apresentado por Starr,_Newfrock_e_Delurey_(2003) define resiliência
como a habilidade e a capacidade de suportar descontinuidades da rede e
adaptar-se ao novo risco do ambiente. Os autores afirmam que uma organização,
para ser resiliente, precisa: alinhar efetivamente sua estratégia, operações,
sistemas de gerenciamento, estrutura de governança e capacidades (capabilities)
de decisão/suporte; e estabelecer transparência entre os membros da rede.
A falta de resiliência torna a organização vulnerável, expondo-a a sérios
distúrbios, quando riscos internos e/ou externos à cadeia de suprimentos se
concretizam (Christopher_&_Peck,_2004). Para Kleindorfer_e_Saad_(2005),
existem duas grandes categorias de riscos que podem afetar o desempenho e o
gerenciamento da cadeia de suprimentos: riscos provenientes de problemas na
coordenação entre abastecimento e demanda; e riscos provenientes de rupturas
das atividades normais (desastres naturais, greves, crise econômica, atos de
sabotagem ou até ações terroristas).
Christopher_(2003) sugere que, para elevar a resiliência da cadeia, é
necessário entender suas diversas formas de vulnerabilidade e os riscos a que
está sujeita. O autor propõe quatro diferentes níveis de análise de riscos da
cadeia de suprimentos: processo/fluxo de valor; ativos e infraestrutura;
organização interna e redes intraorganizacionais; e ambiente de negócios.
Para enfatizar a necessidade de melhoria da resiliência da cadeia de
suprimentos contra riscos em nível de ativos e infraestrutura, Ratick,_Meacham
e_Aoyama_(2008) estudam a forma como o uso de estoques backup em instalações
adicionais pode ser adotado em resposta aos potenciais efeitos dos vários
riscos naturais para proporcionar uma efetiva forma de reduzir a
vulnerabilidade e alcançar a resiliência da cadeia de suprimentos e outras
funções logísticas. No estudo, demonstrou-se que as empresas consideram que os
custos adicionais acabam sendo compensadores nos casos em que existe certa
probabilidade de riscos cuja ocorrência possa representar um longo tempo de
ruptura.
Hamel_e_Välikangas_(2003) também discutem a melhoria da resiliência para
proteção contra os riscos provenientes do ambiente de negócios, alertando para
o fato de que as empresas se equivocam quando investem demais em o que é e de
menos em o que poderia ser. Segundo eles, as empresas acabam por sobrecarregar
seus investimentos apenas na manutenção do status quo. Isso acontece de várias
maneiras: quando investem em marketing direcionado aos consumidores existentes
em detrimento dos novos; quando direcionam grandes investimentos à melhoria dos
produtos já existentes, relegando a um segundo plano investimentos em projetos
novos e mais ousados; ou desperdiçando recursos nos canais de distribuição
existentes, desprezando possibilidades decorrentes das novas tecnologias de
informação (TI), por exemplo.
4. CAPACIDADES LOGÍSTICAS: CONCEITO E ESCOPO
Nas últimas décadas, muitos produtos tornaram-se commodities, ou seja,
indistinguíveis e facilmente copiáveis, reduzindo as margens de lucro a eles
associadas. Os serviços de transporte e distribuição passaram a ser utilizados
como parte importante da estratégia de obtenção de vantagem competitiva, nesses
casos. As empresas buscaram aprimorar suas capacidades logísticas como meio de
criar algum nível de diferenciação para suas ofertas (Stalk,_Evans_&
Shulman,_1992 ; Daugherty,_Stank_&_Ellinger,_1998). Segundo Esper,_Fugate_e
Davis-Sramek_(2007), mais recentemente, essa estratégia também passou a ser
copiada e imitada. Com isso, a vantagem competitiva anteriormente obtida a
partir dos serviços logísticos também deixou de representar um fator de
diferenciação. Por isso, esses autores propõem que as empresas precisam, agora,
explorar a "capacidade de aprendizado logístico" como forma de diferenciar-se.
Consideram, ainda, que a evolução dinâmica criada por tal capacidade permitirá
à empresa sustentar sua competitividade ao longo do tempo.
Adotando essa linha de raciocínio, Pettit_(2008)desenvolve e apresenta um
procedimento para gerenciar a melhoria da cadeia de suprimentos por meio de uma
ferramenta para mensurar e gerenciar sua resiliência (Supply Chain Resilience
Assessment and Management – SCRAMTM). De acordo com ele, a resiliência da
cadeia de suprimentos pode ser calculada por meio de duas dimensões:
vulnerabilidadese capacidades (capabilities). Daugherty,_Haozhe,_Mattioda_e
Grawe_(2009) definem capacidades como sendo aquilo que as empresas fazem
efetivamente com seus ativos, como elas realmente os utilizam, considerando que
precisam transformar seus ativos em algo que lhes assegure espaço no mercado.
Já para Pettit_(2008), capacidades são atributos que habilitam uma empresa a
antecipar e superar rupturas na cadeia de suprimentos.
Aparentemente, ainda não existe consenso na academia quanto à enumeração e à
classificação dessas capacidades logísticas, as quais poderiam levar as
empresas e suas cadeias a obterem maior destaque no mercado. Daugherty_et_al._
(1998), referindo-se a uma pesquisa realizada em 1995 pela Michigan State
University, falavam em 17 capacidades logísticas universais. Mais recentemente,
Esper_et_al._(2007) sumarizaram as capacidades logísticas apresentadas por
vários pesquisadores da área, classificando-as em cinco classes de capacidade:
capacidade de foco no cliente; capacidade de gerenciamento; capacidade de
integração; capacidade de medição; e capacidade de foco no compartilhamento de
informações. Acrescentam, contudo, conforme mencionado anteriormente, a
necessidade do desenvolvimento de uma sexta capacidade: a capacidade de
aprendizagem logística, como forma de sustentar ao longo do tempo qualquer
vantagem competitiva obtida. Pettit_(2008), no SCRAM, considera que há 14
capacidades distintas, além de sete tipos de vulnerabilidade.
Zhao,_Dröge_e_Stank_(2001) pesquisaram a influência de dois tipos de
capacidades no desempenho da empresa: a capacidade de foco no cliente
(customer-capability) e a capacidade de foco no compartilhamento de informações
(information-capability). Segundo eles, a capacidade de foco no cliente
significaria maior habilidade em entender e satisfazer consumidores enquanto a
capacidade de foco no compartilhamento de informações combinaria os
investimentos em TI à habilidade da empresa utilizar eficazmente os recursos
tecnológicos para melhorar essa competência. Em outras palavras, a simples
realização de investimentos em ativos de TI não é, na visão de Zhao_et_al._
(2001), suficiente para garantir a capacidade de foco no compartilhamento de
informações. O resultado da pesquisa por eles realizada demonstrou que as
empresas devem utilizar sua capacidade de foco no compartilhamento de
informações para suportar e facilitar o foco no cliente, de modo a obterem
melhor desempenho no mercado.
Ravichandran_e_Lertwongsatien_(2005) proporcionam evidências empíricas de que a
capacidade de foco no compartilhamento de informações é significativa e
positivamente relacionada ao desempenho da empresa. Esses autores alertam que o
desempenho das empresas pode ser explicado pela forma como, efetivamente,
utilizam a tecnologia da informação para suportar e melhorar essa competência
(compartilhamento de informações), em contraste com o proposto em muitos
estudos anteriores, que assumiam implicitamente que o investimento em ativos de
TI, por si só, provocava efeitos diretos no desempenho da empresa.
Assim como Zhao_et_al._(2001), que abordam a construção da resiliência da
cadeia de suprimentos a partir das capacidades logísticas, Ponomarov_e_Holcomb_
(2009a) procuram compreender a influência da capacidade de foco no cliente e da
capacidade de foco no compartilhamento de informações sobre a resiliência da
cadeia de suprimentos. Para esses autores o termo capacidades reflete o papel
principal de adaptar, integrar e configurar os recursos, as habilidades
organizacionais e as competências funcionais ao gerenciamento estratégico, para
responder aos desafios do ambiente externo.
5. RELACIONANDO CAPACIDADES LOGÍSTICAS E RESILIÊNCIA DA CADEIA DE SUPRIMENTOS
A revisão da literatura apresenta diferentes perspectivas a respeito de
resiliência e gerenciamento de riscos na cadeia de suprimentos. Tomando-se por
empréstimo as discussões realizadas em outras áreas do conhecimento, é possível
reajustá-las e compor a estrutura conceitual (framework) necessária para o
estudo do fenômeno da resiliência da cadeia de suprimentos.
De acordo com Ponomarov_e_Holcomb_(2009a), o estudo da resiliência sob a
perspectiva logística precisa ainda ser mais bem explorado. Contudo, os
diversos achados relatados na literatura a partir das diferentes perspectivas
de estudo da resiliência, do gerenciamento de riscos da cadeia de suprimentos e
das capacidades logísticas que uma empresa pode cultivar possibilitaram a
proposição de algumas hipóteses sobre o relacionamento entre algumas variáveis
e justificaram a formulação do modelo conceitual proposto por Ponomarov_e
Holcomb_(2009a), que é testado neste estudo. É possível levantar as seguintes
hipóteses a respeito da contribuição desses fatores para a melhoria na
resiliência da cadeia de suprimentos, replicando-se o estudo de Ponomarov_e
Holcomb_(2009a):
* H1 — A capacidade de foco no cliente tem impacto positivo na resiliência
da cadeia de suprimentos.
* H2 — A capacidade de foco no compartilhamento de informações tem impacto
positivo na resiliência da cadeia de suprimentos.
Como discutido nas seções anteriores, para elevar a resiliência da cadeia de
suprimentos é necessário entender suas diversas formas de vulnerabilidade e os
riscos a que está sujeita. Riscos provenientes de problemas na coordenação
entre abastecimento e demanda podem afetar o desempenho da cadeia de
suprimentos (Christopher,_2003; Kleindorfer_&_Saad,_2005). Em função disso,
foi possível para Ponomarov_e_Holcomb_(2009a) levantarem uma terceira hipótese,
que também será verificada neste estudo:
* H3 — A orientação para gerenciamento de riscos tem impacto positivo na
resiliência da cadeia de suprimentos.
Apesar de o principal foco desta pesquisa, assim como da que a inspirou, ser o
estudo do efeito das capacidades logísticas na construção da resiliência na
cadeia de suprimentos, os produtos da resiliência da cadeia de suprimentos
também foram analisados, procurando-se testar as seguintes hipóteses de
pesquisa de Ponomarov_e_Holcomb_(2009a), no contexto das empresas brasileiras:
* H4 — A melhoria da resiliência da cadeia de suprimentos melhora a
vantagem competitiva percebida.
* H5 — A melhoria da resiliência da cadeia de suprimentos diminui a
variabilidade do processo logístico da cadeia de suprimentos.
* H6 — A variabilidade do processo logístico da cadeia de suprimentos e a
vantagem competitiva percebida são inversamente proporcionais.
Na Figura_4, ilustram-se graficamente as hipóteses enunciadas por Ponomarov_e
Holcomb_(2009a) que, conforme será discutido na seção sobre os procedimentos
metodológicos do presente estudo, se procura validar a partir de dados
coletados no Brasil.
[/img/revistas/rausp/v49n4//0080-2107-rausp-49-04-0642-gf04.jpg]
Figura 4 Antecedentes e Consequentes da Resiliência da Cadeia de
SuprimentosFonte: Ponomarov e Holcomb (2009a, p. 14).
6. PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS
A coleta de dados foi realizada por meio de um questionário estruturado com 46
afirmações para as quais se procurou determinar o nível de concordância dos
respondentes, que utilizaram uma escala Likert de sete pontos para expressar
suas opiniões. No questionário, replicou-se o adotado por Ponomarov_e_Holcomb_
(2009a).
Para assegurar a equivalência conceitual e a validade das escalas, foi
utilizada a técnica back translation, que implica traduzir para o novo idioma
(português) e depois traduzir novamente para o idioma original (inglês), de
modo a garantir que as questões resultantes continuem apresentando o sentido
original, conforme sugerido por Riordan_e_Vandenberg_(1994).
Para assegurar que os respondentes tivessem bom conhecimento dos assuntos
abordados no questionário, ligados a práticas de manufatura e relacionamento
com fornecedores e clientes, entre outros, priorizou-se a participação de
gerentes ou diretores industriais de logística, de qualidade ou de compras, que
faziam parte de um cadastro de empresas interessadas nas pesquisas ou
treinamentos desenvolvidos por um grupo de pesquisa de gestão de operações do
qual fazem parte os autores deste trabalho.
As empresas objeto desta pesquisa são brasileiras ou têm planta industrial no
Brasil e quase todas atuam como fornecedoras das montadoras de veículos
automotores instaladas no país. Tal amostra justificou-se, principalmente, pela
viabilidade da coleta de dados, considerando a facilidade de realização do
survey, que foi conduzido pelos próprios autores do trabalho.
O questionário foi enviado para cerca de 700 profissionais qualificados no
início de fevereiro de 2010, via e-mail, contendo um link para o survey
hospedado no site Survey Monkey. A aplicação do survey resultou na obtenção de
62 questionários preenchidos.
Os dados obtidos na pesquisa foram analisados estatisticamente com o auxílio do
Software SPSS.
Inicialmente se procedeu a uma análise descritiva de cada uma das 46 variáveis
por meio da Análise Exploratória de Dados (AED), que consiste, basicamente, em
explorar os dados por meio de técnicas gráficas, como recomendado por Dancey_e
Reidy_(2006).
As seis dimensões esperadas foram obtidas por meio da adoção da análise
fatorial, utilizando-se componentes principais como método de extração.
Avaliou-se a adequação fatorial por meio dos testes Kaiser-Meyer-Olkin (KMO) e
de esfericidade de Bartlett. Isso proporcionou evidência de consistência
interna dos construtos, embora tenham sido necessários alguns refinamentos,
como descrito a seguir.
Com os fatores confirmados, os dados foram submetidos novamente a uma análise
fatorial, complementada por rotação varimax, objetivando melhorar a
interpretação das cargas fatoriais (Hair,_Anderson,_Tatham_&_Black,_2005 ;
Dancey_&_Reidy,_2006). O processo resultou na exclusão de 13 variáveis com
cargas fatoriais menores do que 0,4. Nenhuma delas apresentou valor negativo de
carga fatorial que exigisse sua inversão. Avaliou-se a confiabilidade dos
fatores então obtidos por meio do teste alfa de Cronbach. O valor mínimo de
confiabilidade considerado aceitável foi α = 0,5, adotando-se a recomendação de
outros autores que realizaram pesquisas de caráter exploratório (Nunnally,
1967; Glaser-Segura_&_Anghel,_2003).
O passo seguinte consistiu em obter as médias das notas das perguntas
relacionadas a cada um dos seis construtos resultantes da análise fatorial.
A segunda parte do tratamento e da análise dos dados visou compreender a
existência de relacionamento entre os construtos, procurando verificar a
veracidade das hipóteses apresentadas na seção anterior.
As possibilidades de resposta ao questionário de pesquisa não representavam uma
escala intervalar, mas ordinal, já que não há meios de garantir que a distância
entre "discordo totalmente", "discordo", "discordo ligeiramente", "não tenho
opinião formada", "concordo ligeiramente", "concordo" e "concordo totalmente"
seja a mesma na percepção dos respondentes. Contudo, optou-se por tratá-la como
uma escala intervalar, para realizar procedimentos estatísticos. Apesar da
flexibilização que impõe ao rigor do método, essa abordagem tem sido utilizada
em estudos que se baseiam em questionários com escala Likert por facilitar a
análise. Aamplitude das escalas variou de 1 ("discordo totalmente") até 7
("concordo totalmente").
7. RESULTADOS OBTIDOS
Serão, primeiramente, apresentados e discutidos os construtos identificados a
partir da análise fatorial exploratória, para depois apresentar e discutir os
resultados da análise de regressão utilizada para os testes das hipóteses.
7.1. Análise dos fatores das hipóteses
A análise dos histogramas de frequências e diagramas caixa e bigodes (box
plots) gerados não provocou a exclusão de nenhuma variável do conjunto.
Na Tabela_1, expõem-se os resultados da análise fatorial exploratória para os
seis construtos avaliados. O teste de esfericidade de Bartlett mostrou-se
significativo (p-value < 0,001) e o teste de Kaiser-Meyer-Olkin (KMO) também
foi adequado (KMO > 0,7) em todos os casos. Tais resultados possibilitam o uso
da análise fatorial como técnica de exploração para o estudo pretendido.
Tabela 1 Resultados da Análise Fatorial
Variável KMO Sig. Média % de Alfa de
ExplicaçãoCronbach
Orientação para gerenciamento de 0,824 < 0,0001 5,07 60,42 0,852
riscos
Resiliência da cadeia de 0,863 < 0,0001 5,18 76,74 0,938
suprimentos
Capacidade de foco no cliente 0,860 < 0,0001 5,13 66,03 0,898
Capacidade de compartilhamento de 0,859 < 0,0001 5,15 69,90 0,926
informações
Variabilidade dos processos da 0,760 < 0,0001 2,70 60,51 0,780
cadeia de suprimentos
Vantagem competitiva percebida 0,688 < 0,0001 5,55 61,65 0,785
Convém ressaltar que, das 46 variáveis originalmente sugeridas, descartaram-se
13 por apresentarem cargas fatoriais inferiores a 0,4 ou contribuírem
negativamente para a confiabilidade do fator a que ficaram relacionadas,
restando somente 33. A variância explicada pelos diversos fatores ficou entre
60,42% e 76,74%. Na Tabela_2, mostram-se detalhadamente a estrutura fatorial e
as cargas fatoriais obtidas. Adicionalmente, apresentam-se a variância
explicada e acumulada dos fatores e o índice de consistência interna, obtido a
partir do alfa de Cronbach. Em síntese, a análise permitiu o uso dos seis
fatores para o teste de hipóteses pretendido. No entanto, antes de explorar
essas relações, são descritas, na sequência as seis dimensões geradas
(fatores).
Tabela 2 Composição dos Fatores
Variável Carga
Fatorial
Fator 1 - Orientação para gerenciamento de riscos. Alfa de Cronbach = 0,852
P1.1 Nossa empresa atribui alta prioridade à gestão de riscos. 0,679
P1.2 Estamos trabalhando em colaboração com nossos clientes e fornecedores para ter 0,786
uma cadeia de suprimentos transparente e ampla troca de informações.
P1.3 Nossa empresa elabora planos de continuidade do negócio ou planos de contingência 0,826
levando em consideração os principais riscos da cadeia de suprimentos.
P1.4 Monitoramos os nossos fornecedores constantemente com respeito a possíveis riscos 0,828
à cadeia de suprimentos.
P1.5 Em nossa empresa, há um funcionário ou uma equipe dedicada à gestão de riscos n 0,799
cadeia de suprimentos.
P1.6 Se possível, fazemos seguros contra riscos relacionados à cadeia de suprimentos. 0,735
Fator 2 - Resiliência da cadeia de suprimentos. Alfa de Cronbach = 0,938
P2.1 Nossa cadeia de suprimentos é capaz de responder adequadamente a interrupções 0,872
inesperadas, recuperando rapidamente o fluxo da produção.
Nossa cadeia de suprimentos consegue retornar rapidamente ao estado original ou
P2.2 mover-se para um novo estado mais desejável após confrontar-se com uma 0,911
interrupção.
P2.3 Nossa cadeia de suprimentos está bem preparada para tratar dos impactos 0,858
financeiros de interrupções na cadeia.
P2.4 Nossa cadeia de suprimentos consegue manter um nível desejado de conectividade 0,880
entre os seus membros em situações de interrupção na cadeia.
P2.5 Nossa cadeia de suprimentos consegue manter um nível desejado de controle em 0,906
situações de interrupção na cadeia.
P2.6 Nossa cadeia de suprimentos consegue compreender e desenvolver conhecimento útil 0,826
a partir de interrupções e eventos inesperados na cadeia.
Fator 3 - Capacidade de foco no cliente. Alfa de Cronbach = 0,898
P3.2 Nossa empresa emprega um processo formal de visualização da logística visando 0,783
identificar os requisitos logísticos dos clientes e dos consumidores.
Nossa empresa busca ativamente desenvolver relacionamentos comerciais e rotinas
P3.3 planejados para proporcionar o envolvimento do cliente, muito mais do que simples 0,788
transações comerciais.
P3.6 Nossa empresa designou clientes a pontos de estocagem primários e secundários 0,770
para reduzir o impacto de eventuais desabastecimentos.
P3.7 Nossa empresa é capaz de tratar uma ampla gama de pedidos especiais de clientes 0,819
especiais a partir de soluções pré-planejadas.
P3.10 Nossa empresa desenvolveu conexões com clientes que permitem substanciais ajustes 0,831
de última hora na programação da produção sem perda da eficiência de produção.
Nossa empresa desenvolveu procedimentos para facilitar o postponement (adiamento)
P3.11 da produção, embalagem, rotulagem ou montagem até que as necessidades do cliente 0,880
estejam mais bem definidas.
Fator 4 - Capacidade de compartilhamento de informações. Alfa de Cronbach = 0,926
P3.16 Os sistemas de informações logísticas na nossa empresa estão sendo ampliados pa 0,778
incluir mais aplicações integradas.
P3.17 Os sistemas de informações logísticas de nossa empresa trabalham com dados em 0,886
tempo real.
P3.18 As bases de dados do planejamento e das operações logísticas são integradas ent 0,825
os diversos aplicativos dentro de nossa empresa.
P3.19 As informações disponíveis em nossa empresa são precisas, oportunas e formatada 0,828
de modo a facilitar seu uso.
P3.20 Nossa empresa investe em tecnologias projetadas para facilitar a troca de dados 0,823
entre organizações.
P3.21 Nossa empresa é capaz de compartilhar adequadamente tanto informações 0,874
padronizadas como informações customizadas, internamente.
P3.22 Nossa empresa é capaz de compartilhar adequadamente tanto informações 0,834
padronizadas como informações customizadas, com fornecedores e/ou clientes.
Fator 5 - Variabilidade do processo da cadeia de suprimentos. Alfa de Cronbach = 0,780
P4.1 Tempo necessário para chegar um pedido nosso de um fornecedor-chave. 0,788
P4.2 Tempo necessário para fazermos o pedido de um cliente-chave chegar até ele. 0,768
P4.3 Lead-time de produção (com programação fixa). 0,800
P4.4 Taxa de produção diária. 0,760
Fator 6 - Vantagem competitiva percebida. Alfa de Cronbach = 0,785
P5.2 Atendimento a pedidos especiais de um cliente. 0,750
P5.3 Atendimento consistente das datas de entrega. 0,842
P5.4 Provisão das quantidades desejadas consistentemente. 0,854
P5.5 Flexibilidade na introdução de novos produtos. 0,683
O quociente entre o número de observações (62) e o número de variáveis (33)
ficou bem abaixo do recomendado nos manuais tradicionais de análise
multivariada, que prescrevem uma taxa de pelo menos 5:1 (Gorsuch,_1974; Hair_et
al.,_2005). Contudo, MacCallum,_Widaman,_Zhang_e_Hong_(1999, p. 85) lembram que
"muitas referências importantes sobre análise fatorial não fazem nenhuma
recomendação explícita sobre o tamanho da amostra". Além disso, consideram
essas recomendações menos importantes, no caso de se obterem "fatores fortes e
claramente definidos" (MacCallum_et_al.,_1999, p. 86). Guadagnoli e Velicer
(1988, apud Floyd_&_Widaman,_1995, p. 290) já contestavam a recomendação
prescritiva de um tamanho mínimo de amostra, em termos absolutos ou em relação
ao número de variáveis incluídas no estudo, afirmando não haver base teórica ou
empírica para tal. Para esses autores, "cargas fatoriais da ordem de 0,8
proporcionam soluções de análise fatorial bastante estáveis entre amostras
distintas, mesmo quando o número de observações é menor do que 50". Assim,
considerando-se que os fatores obtidos no presente estudo ficaram compostos por
variáveis que, em sua expressiva maioria, apresentam carga fatorial elevada
(acima de 0,8), conforme evidenciado na Tabela_2, decidiu-se ignorar a
controversa recomendação de razão superior a 5 entre o número de observações
(participantes) e o número de variáveis pesquisadas.
O primeiro fator, denominado orientação para gerenciamento de riscos, é
composto de seis itens que traduzem convicções relacionadas a tal aspecto. Esse
fator apresentou um índice de consistência interna, alfa de Cronbach, igual a
0,852, e incluiu variáveis com carga fatorial variando entre 0,679 e 0,828. A
média das respostas para as variáveis associadas a esse fator foi 5,07,
equivalente a "concordo ligeiramente".
O segundo fator, denominado resiliência da cadeia de suprimentos, é composto de
seis itens. Esse fator apresentou um índice de consistência interna, alfa de
Cronbach, igual a 0,938, e cargas fatoriais variando entre 0,826 e 0,911. A
média das respostas para as variáveis associadas ao fator foi de 5,18, também
equivalente a "concordo ligeiramente".
O terceiro fator, denominado capacidade de foco no cliente, é composto de seis
itens restantes de um conjunto original de 11 itens, dos quais cinco foram
descartados pelas razões já expostas. Os itens que carregam nesse fator
envolvem convicções relacionadas a ações que denotam preocupação com o cliente.
Esse fator apresentou um índice de consistência interna, alfa de Cronbach,
igual a 0,898 e cargas fatoriais variando entre 0,770 e 0,880. A média das
respostas para as variáveis associadas a este fator foi 5,13, mais uma vez
equivalente a "concordo ligeiramente".
O quarto fator, denominado capacidade de compartilhamento de informações, é
composto de sete itens restantes de um conjunto original de 13 itens. Os demais
foram descartados pelas razões já expostas. Tais itens envolvem questões
relacionadas a ações que denotam foco de atenção no compartilhamento de
informações. Esse fator apresentou um índice de consistência interna, alfa de
Cronbach, igual a 0,926 e cargas fatoriais variando entre 0,778 e 0,874. A
média das respostas para as variáveis associadas a esse fator foi 5,15, também
equivalente a "concordo ligeiramente".
O quinto fator, denominado variabilidade do processo da cadeia de suprimentos,
é composto de quatro itens. Esse fator apresentou um índice de consistência
interna, alfa de Cronbach, igual a 0,780 e cargas fatoriais variando entre
0,760 e 0,800 para as variáveis que o compõem. A média das respostas foi de
2,07, mostrando uma tendência de "discordância" com as afirmações sobre a
existência de variabilidade dos processos logísticos na empresa.
O sexto e último fator, denominado vantagem competitiva percebida, é composto
de quatro itens restantes de um conjunto original de seis itens. Esse fator
apresentou um índice de consistência interna, alfa de Cronbach, igual a 0,785 e
variáveis componentes com carga fatorial variando entre 0,683 e 0,854. A média
das respostas para as variáveis associadas a esse fator foi 5,55, mostrando uma
tendência de percepção de melhor desempenho da empresa dos respondentes quando
comparada à concorrência (média entre "concordo ligeiramente" e "concordo").
7.2. Verificação das hipóteses
Os fatores levantados pelo survey e depurados pela análise fatorial
exploratória foram então submetidos a uma análise de regressão. Na Tabela_3,
sumarizam-se os resultados para cada uma das seis hipóteses anteriormente
propostas.
Tabela 3 Hipóteses e Resultados
Hipótese Descrição Coeficientes Resultados
de Regressão
A capacidade de foco no cliente tem impacto positivo na resiliência da cadeia β = 0,645
H1 de suprimentos. α = 1,997 Relação positiva confirmada.
p = < 0,0001
A capacidade de foco no compartilhamento de informações tem impacto positivo β = 0,609
H2 na resiliência da cadeia de suprimentos. α = 2,218 Relação positiva confirmada.
p = < 0,0001
A orientação para gerenciamento de riscos tem impacto positivo na resiliênciβ = 0,617
H3 da cadeia de suprimentos. α = 2,204 Relação positiva confirmada.
p = < 0,0001
A melhoria da resiliência da cadeia de suprimentos melhora a vantagem β = 0,232 Relação positiva detectada, mas não confirmada
H4 competitiva percebida. α = 4,587 estatisticamente.
p = 0,112
A melhoria da resiliência da cadeia de suprimentos diminui a variabilidade do β = - 0,111 Relação negativa detectada, mas não confirmada
H5 processo logístico. α = 3,353 estatisticamente.
p = 0,433
A variabilidade do processo logístico e a vantagem competitiva percebida são β = - 0,203 Relação negativa detectada, mas não confirmada
H6 inversamente proporcionais. α = 5,941 estatisticamente.
p = 0,433
O teste das hipóteses H1 a H6 foi estabelecido pela análise dos coeficientes do
conjunto de equações [1] do modelo da regressão linear.
[/img/revistas/rausp/v49n4//0080-2107-rausp-49-04-0642-e01.jpg]
No conjunto de equações [1], RCS corresponde ao fator resiliência da cadeia de
suprimentos e é representado pelas médias das respostas obtidas na escala de
itens P2.n (ver a Tabela_2); CFC corresponde ao fator capacidade de foco no
cliente e é representado pelas médias das respostas obtidas na escala de itens
de P3.n (ver a Tabela_2); CFI corresponde ao fator capacidade de foco no
compartilhamento de informações e é representado pelas médias das respostas
obtidas na escala de itens de P3.n (ver a Tabela_2); OGR corresponde ao fator
orientação para gerenciamento de riscos e é representado pelas médias das
respostas obtidas na escala de itens de P1.n (ver a Tabela_2); VCP corresponde
ao fator vantagem competitiva percebida e é representado pelas médias das
respostas obtidas na escala de itens de P5.n (ver a Tabela_2); VPCS corresponde
ao fator variabilidade dos processos da cadeia de suprimentos e é representado
pelas médias das respostas obtidas na escala de itens de P4.n (ver a Tabela_2);
o índice α é a constante da equação (coeficiente linear); o índice β determina
a inclinação da reta de regressão (coeficiente angular); e o símbolo є
corresponde ao erro residual.
Conforme observado na Tabela_3, os resultados indicaram que existe uma relação
positiva e estatisticamente significativa entre capacidade de foco no cliente
(H1) e foco no compartilhamento de informação (H2) com resiliência da cadeia de
suprimentos.
Essa relação de capacidades logísticas com a resiliência da cadeia já havia
sido detectada nos estudos realizados por Zhao_et_al._(2001) e Ponomarov_e
Holcomb_(2009a), de forma integral, e por Esperet_al._(2007), de maneira
parcial.
Os resultados ora obtidos garantem maior robustez aos achados do estudo
realizado por Ponomarov_e_Holcomb_(2009a), porque sugerem que as diferenças
culturais e de outra ordem existentes entre as organizações e cadeias de
suprimentos estudadas nas duas situações (contexto norte-americano e contexto
brasileiro) não são suficientes para ocasionar resultados distintos quanto à
influência das variáveis independentes sobre a dependente.
Nos resultados expostos na Tabela_3, percebe-se também que existe uma relação
positiva e estatisticamente significativa entre orientação para gerenciamento
de riscos e resiliência da cadeia de suprimentos (H3). O trabalho de Ponomarov
e_Holcomb_(2009a) havia, igualmente, confirmado essa hipótese. Mais uma vez, os
resultados ora obtidos colaboram para a confirmação da robustez do modelo
proposto por Ponomarov_e_Holcomb_(2009a), a partir de sua aplicação a um
contexto distinto.
As hipóteses H4, H5 e H6 não puderam ser comprovadas, uma vez que os resultados
das regressões lineares não apresentaram significância estatística, embora os
coeficientes angulares β das equações obtidas tenham apresentado sinal
compatível com o esperado no enunciado das hipóteses. As hipóteses H4 e H5
haviam sido confirmadas por Ponomarov_e_Holcomb_(2009a), de modo que o
resultado ora obtido é distinto daquele obtido para a amostra do Hemisfério
Norte. Por outro lado, a hipótese H6 também não havia sido confirmada no estudo
de Ponomarov_e_Holcomb_(2009a).
8. CONCLUSÕES
No geral, os resultados do survey aplicado a profissionais de logística de
plantas industriais localizadas em território brasileiro ficaram bastante
alinhados aos resultados obtidos pela pesquisa norte-americana. A replicação da
pesquisa obteve resultados similares para quatro das seis hipóteses propostas
por Ponomarov e Holcomb. Confirmou-se o relacionamento positivo da adoção de
ações orientadas para gerenciamento de risco, foco no cliente e
compartilhamento de informações na formação da resiliência da cadeia de
suprimentos e, da mesma forma que no estudo norte-americano, não foi confirmado
o relacionamento entre a variabilidade dos processos logísticos e a vantagem
competitiva percebida. Tais resultados sugerem que as diferenças culturais e de
outra ordem existentes entre as organizações e cadeias de suprimentos estudadas
nas duas situações não são suficientes para ocasionar resultados distintos
quanto à influência das variáveis independentes sobre a dependente.
Por outro lado, a pesquisa apresentou resultado distinto do obtido para as
empresas do hemisfério norte com relação ao impacto que o aumento da
resiliência da cadeia de suprimentos provoca na vantagem competitiva percebida
e na variabilidade dos processos logísticos, para os quais as hipóteses
definidas não puderam ser comprovadas.
Dentre as implicações para a prática gerencial da área destaca-se, portanto, o
fato de se terem identificado fatores que, consistentemente, são percebidos
como impactantes sobre a resiliência da cadeia de suprimentos, evidenciado
tanto no presente estudo quanto naquele que o motivou, realizado em um contexto
culturalmente distinto. Esses fatores podem ser observados por gerentes
encarregados dos processos logísticos, com o intuito de tornar mais flexíveis
suas operações, no sentido de adotar medidas que mitiguem os efeitos nefastos
de rupturas na cadeia de suprimentos sobre o atendimento ao cliente. A
relevância do trabalho para a área acadêmica decorre de resiliência ser uma
temática ainda pouco explorada nos estudos de cadeias de suprimentos, as quais
vêm se tornando cada vez mais complexas. Assim, os resultados ora produzidos
podem motivar outros pesquisadores a avançar nos estudos para uma compreensão
mais apurada do fenômeno e seus desdobramentos sobre o desempenho empresarial.
Apesar dos resultados interessantes obtidos, este estudo apresenta algumas
limitações que reduzem o alcance de suas conclusões. Como em toda pesquisa por
adesão, existe preocupação com a representatividade de uma amostra que não é
formada aleatoriamente. Afinal, os respondentes optaram por participar,
enquanto os não respondentes decidiram por declinar o convite. Por mais que não
tenha sido identificado nenhum possível motivo para um viés de formação de
amostra no presente estudo, já que todos os convidados para participar da
pesquisa são profissionais diretamente envolvidos com o gerenciamento e a
definição de processos logísticos em suas organizações e, portanto, igualmente
interessados na discussão de questões relativas à cadeia de suprimentos, a
extrapolação dos resultados obtidos a partir de uma amostra por adesão para a
população envolve riscos. Outra limitação, ainda, refere-se ao fato de os
respondentes não estarem todos situados no mesmo nível hierárquico dentro de
suas organizações. Embora a maior parte deles tenha função gerencial e,
consequentemente, autonomia para a tomada de decisões, em alguns casos isso se
restringe ao nível tático e não ao estratégico das empresas.
Na continuidade dos trabalhos, pretende-se verificar as capacidades logísticas
cujo desenvolvimento é afetado positivamente pela adoção da Materials
Management Operating Guideline/Logistics Evaluation (MMOG/LE) – que é um
conjunto de recomendações de práticas e procedimentos referentes à gestão de
materiais e logística criado por membros da indústria automobilística, com
possibilidade de utilização nos mais variados ramos industriais. Pretende-se
também verificar em que extensão o aprimoramento dessas capacidades contribui
para aumentar a resiliência da cadeia de suprimentos. Ainda como parte dos
estudos futuros, é intenção explorar o motivo da não confirmação das hipóteses
relativas à relação entre o aumento da resiliência da cadeia de suprimentos e a
vantagem competitiva percebida e a variabilidade dos processos logísticos.
Sistema de Avaliação: Double Blind Review Editor Científico: Nicolau Reinhard