Dimensões da urbanização dispersa e proposta metodológica para estudos
comparativos: uma abordagem socioespacial em aglomerações urbanas brasileiras
Introdução
Dois fatores devem ser considerados no processo de crescimento urbano: o
populacional e o padrão de expansão física das ocupações urbanas. O primeiro
representa um desafio em si mesmo quando exerce um importante peso na expansão
da infra-estrutura urbana. Já o padrão de ocupação pode e deve ser entendido
como um fator essencial para que esse crescimento possa se dar com maior ou
menor custo social, refletindo impactos sobre as formas de reprodução social e
a sustentabilidade ambiental (UNFPA, 2007).
Segundo Angel (2006), há que se distinguir estes dois processos, pois é natural
que o crescimento da população urbana leve a uma expansão das áreas urbanas
para comportar esse contingente populacional dentro das cidades. Mas o que se
desenha enquanto um desafio, no século 21, não é apenas a pressão dos números,
mas como as formas urbanas se moldam e são moldadas pelas tensões entre
crescimento populacional e expansão urbana.
Resumindo, duas aglomerações urbanas podem apresentar taxas de crescimento
populacional semelhantes no mesmo período, mas uma pode configurar uma forma
urbana compacta, verticalizada e monocêntrica e outra poderá conformar o seu
espaço urbano de modo disperso, horizontalizado e policêntrico, cada qual
representando custos sociais e ambientais distintos. Com o surgimento do termo
urban sprawl, primeiramente nos Estados Unidos como uma designação pejorativa
para expressar a expansão descontrolada das aglomerações urbanas em meados da
década de 60, sobretudo pela disseminação do padrão suburbano de urbanização
(KIEFER, 2003), estudos passaram a procurar elementos que permitissem avaliar
em que medida uma forma de ocupação do espaço poderia apresentar impactos
sociais, econômicos e ambientais diferenciados. Embora a conceituação do termo
urban sprawl ainda seja controversa, é grande o número de pesquisas que adotam
distintos aportes metodológicos para apreender os impactos das diferentes
formas de expansão urbana, inclusive em outras partes do mundo.
O objetivo deste trabalho é apresentar, a partir do resgate dessas abordagens
internacionais, um aporte metodológico que permita analisar de modo comparativo
as formas urbanas dentro do contexto das redes urbanas brasileiras sob a
perspectiva das características formais da ocupação urbana. Não se trata de
avaliar, em termos conceituais, se o que se denomina de urban sprawl,1 no caso
norte-americano, pode ser aplicado no Brasil, mas sim trazer para a discussão
sobre população, espaço e ambiente uma abordagem metodológica pouco enfatizada
na literatura brasileira: a dimensão da dialética socioespacial com ênfase nos
impactos do espaço sobre a sociedade.
Segundo Veiga (2000, p. 22), o paradigma da economia política foi a perspectiva
dominante nas análises urbanas brasileiras e latino-americanas das últimas
décadas. Neste contexto, pode-se dizer que os estudos urbanos brasileiros
carecem de novas abordagens metodológicas que permitam avançar sobre questões
contemporâneas. Por essa tradição, esbarram em duas premissas distintas e
simultâneas: uma de ordem teórica; e outra metodológica.
A primeira dimensão, de natureza teórica, diz respeito à preconização da
perspectiva histórica sobre a espacial, em uma dialética socioespacial
incompleta na compreensão da problemática urbana. De certo modo, a conjuntura
social, econômica e ideológica que perpassa as discussões teóricas acerca dos
temas urbanos, na segunda metade do século 20, acaba por consolidar paradigmas
e modelos interpretativos que buscam, acima de tudo, elucidar as origens da
desigualdade e da pobreza urbana no processo de desenvolvimento industrial
tardio latino-americano. Segundo Faria (1991), parece ter havido um lapso de
conceituação mais aprofundado no que se refere aos termos utilizados nas
análises da sociedade urbana; assim, termos como urbano, cidade, espaço e até
região metropolitana, entre outros, assumem sentidos e significados meramente
convencionais sob uma base extensa e plural de temas e perspectivas teóricas.
Segundo Soja (1993), houve uma epistemologia essencialmente histórica que ainda
hoje perpassa a consciência crítica da moderna teoria social. Assim, "o espaço
ainda tende a ser tratado como fixo, morto e não dialético, e o tempo, como
riqueza, a vida, a dialética e o contexto revelador da teorização social
crítica" (SOJA, 1993). Dessa forma, a delimitação conceitual do campo de
atuação das pesquisas urbanas se deu em torno dos impactos decorrentes do
processo de urbanização e do agravamento dos problemas sociais, principalmente
a partir da transferência de população de áreas tipicamente agrárias para as
aglomerações urbanas. Parece ter havido, portanto, uma perspectiva na qual a
associação entre processo de urbanização e a industrialização limitou, em
parte, a compreensão dos aspectos espaciais da urbanização.
Para Vilmar Faria (1991), "a reflexão sobre a sociedade urbana no Brasil se
funde e confunde com a reflexão sobre os processos de mudança social que
caracterizam a constituição de uma sociedade urbano-industrial". Pode-se
considerar, então, que grande parte dos estudos urbanos brasileiros consolidou-
se sob a égide do paradigma da produção social do espaço, em que espaço urbano
é tratado como a expressão material do modo de produção capitalista.
Entretanto, Villaça (1999) salienta que, apesar de muito se falar em produção
do espaço, pouco se avançou sobre o consumo, a troca e a circulação desse
"produto" social; e quase nada se disse a respeito dos efeitos do espaço sobre
o social, pois, evidentemente, o espaço nunca adquiriu peso significativo
nestes estudos para que pudesse ser tratado como uma variável relevante e
eventualmente capaz de interferir nos processos sociais. É preciso, portanto,
incorporar a dimensão espacial para a compreensão mais ampla da sociedade.
Assim, se o espaço é produzido socialmente, enquanto soma dos valores e signos
da sociedade moderna, entendê-lo como parte das relações dialéticas espaço-
sociedade só será possível se compreendermos as mudanças dos valores e re-
significações que a sociedade contemporânea atravessa. Ou seja, muito mais do
que entender as transformações da economia para entender as novas formas de
organização do território, pode-se buscar identificar, nas formas espaciais,
indicadores para compreender como mudam as formas de consumir a cidade, pois há
um "deslocamento" das relações sociais de contextos locais de interação e uma
conseqüente reestruturação dela através de extensões indefinidas de tempo-
espaço (GIDDENS, 1991).
Para se aproximar de uma abordagem que traga novos elementos teóricos e
metodológicos, o artigo está dividido em duas partes. A primeira coloca em
discussão os aspectos metodológicos que podem ser considerados na construção de
um indicador sintético para mensurar, de forma comparativa, as configurações
formais das aglomerações urbanas brasileiras. Esta abordagem se deu,
principalmente, com base na revisão da literatura internacional acerca do
estudo do urban sprawl ' característica marcante da urbanização norte-americana
', que, metodologicamente, pode ser importante para a compreensão da
urbanização brasileira a partir de uma análise comparativa, privilegiando o
espaço como categoria analítica. Posteriormente, são apresentados os principais
resultados, validando o indicador em termos de seu potencial analítico e sua
capacidade de relacionar indicadores socioespaciais e os impactos do espaço na
dimensão social.
Dimensões formais da expansão urbana
Entre 1970 e 1990, a população da região de Los Angeles cresceu em torno de
45%, mas, no mesmo período, sua área urbana ocupada aumentou em 300% (MEADOWS,
1999); ou seja, houve uma redução significativa na densidade urbana dessa
região, sobretudo pelo avanço das regiões periféricas em detrimento da
importância desempenhada pelo centro urbano consolidado. Mesmo em cidades
européias, tradicionalmente associadas a desenho urbano compacto (RICHARDSON;
CHANG-HEE, 2004), há sinais de que a urbanização dispersa se encontra cada vez
mais presente.
O crescimento das áreas urbanas segundo o padrão de expansão periférica não é
novidade; mas, o que parece ser novo são as formas espaciais que as ocupações
urbanas passam a assumir, principalmente a partir do final do século 20.
Segundo Richardson e Chang-hee (2004, p. 1), parece haver uma convergência nos
padrões de assentamento urbano encontrados nos Estados Unidos e na Europa
Ocidental. Mas isso ocorre também em países em desenvolvimento? Em caso
positivo, quais seriam as dimensões que evidenciam os padrões de ocupação na
urbanização e, em termos práticos, como poderíamos medir as dimensões da forma
urbana de modo comparativo no caso das aglomerações urbanas brasileiras?
A literatura internacional que estuda a dispersão urbana (ou urban sprawl)
identifica alguns elementos constitutivos das áreas urbanas enquanto dimensões
formais empiricamente observáveis nas regiões metropolitanas para dimensionar
em que medida o processo pode ser percebido ao longo do país. A Figura_1
ilustra esquematicamente como a distribuição espacial da população no espaço
intra-urbano pode assumir distintas expressões, apesar de apresentarem uma
mesma densidade populacional.
Os modelos 1 e 2 apresentam uma distribuição espacial tipicamente monocêntrica,
mas com diferentes distribuições espaciais, sendo a primeira mais compacta do
que a segunda. O modelo 3 é claramente mais fragmentado e, assim como o 2,
poderia ser classificado como mais disperso do que o modelo 1. Os modelos 4, 5
e 6 parecem conter mais similaridades; entretanto, o modelo 4 possui uma
continuidade da ocupação mais pronunciada do que os modelos 5 e 6.
Se esses modelos representassem áreas ou aglomerações urbanas, o que poderia
ser dito a respeito? As pessoas que vivem em duas áreas distintas, como, por
exemplo, nas aglomerações 1 e 5, teriam atividades cotidianas similares? A
hipótese é de que o espaço urbano ' socialmente construído e reflexo de
diversos interesses e ações sociais ' reflete impactos diferenciados na vida
urbana, de acordo com as suas características formais. Em relação aos impactos
ambientais, as características da forma de expansão urbana parecem ser mais
evidentes, dado que, intuitivamente, o diagrama 3 (mais disperso) pode
apresentar menos áreas verdes contínuas,2 maior demanda por transporte
automotivo, entre outras.
Claro que não é possível resumir a complexidade da urbanização em modelos
esquemáticos simplificados e classificá-los a partir dessa categorização, mas é
inquestionável que as aglomerações urbanas brasileiras assumem formas espaciais
muito distintas. Em termos da percepção da pessoa que viaja de uma cidade para
outra, não é raro ela dimensionar a cidade de destino em relação à de origem,
classificando-a em termos de distâncias percorridas de um ponto a outro de
atividade, de organização dos espaços, de congestionamentos, de dificuldades de
acesso, entre outros.
Neste sentido, o objetivo desta seção é propor medidas que permitam classificar
as aglomerações urbanas brasileiras em termos do que se poderia entender como
dispersão urbana. Para tanto, estas dimensões foram aplicadas para 37
aglomerações urbanas,3 para construir um ranking da dispersão urbana.
Cabe esclarecer que, ao usar o termo "aglomeração urbana", não se está fazendo
referência à figura institucional prevista constitucionalmente. Consideraram-
se, para a delimitação destas unidades de análise, os critérios propostos pela
pesquisa Características e tendências da rede urbana no Brasil (IPEA/IBGE/
UNICAMP, 2000), na qual foram avaliadas as características de integração
regional e dinâmica econômica, entre outras, para propor um conjunto de 49
aglomerados urbanos, entre os quais foram selecionados 37 onde, a partir das
informações de mobilidade pendular do Censo Demográficos 2000, identificaram-se
critérios mínimos de movimentos pendulares internos à própria aglomeração.4
Algumas das dimensões puderam ser observadas recorrentemente na literatura e se
concentram, sobretudo, segundo as seguintes características: densidade,
fragmentação, orientação e centralidade. Cada uma destas dimensões será
explorada individualmente nos itens seguintes, justificando suas
potencialidades na mensuração da forma urbana e sua aplicabilidade a partir dos
dados disponíveis em âmbito nacional.
Densidade populacional urbana
Entre os fatores que evidenciam a mudança no padrão de ocupação urbana, está o
fato de que, recentemente, há um descompasso entre o crescimento da população
urbana e a expansão das áreas urbanas. Segundo pesquisa publicada pelo Sierra
Club (2003), o ritmo de crescimento das áreas urbanas, nos Estados Unidos,
excede em pelo menos duas vezes aquele verificado para a população.
Neste aspecto, uma das formas de se mensurar este descompasso em áreas
metropolitanas distintas seria a análise das densidades populacionais; assim, a
densidade aparece como um dos indicadores mais usados para quantificar a
dispersão urbana (GALSTER et al., 2001). Entretanto, o uso da densidade média
considera todo o espaço da aglomeração urbana, inclusive o não dedicado a
ocupações urbanas, levando a uma distorção do fenômeno.
Se forem utilizadas as áreas totais dos diagramas 1 e 2 da Figura_2 para
calcular a densidade, o resultado seria a mesma densidade média, pois para
ambas o volume hipotético da população é de 312 unidades distribuídas em uma
mesma área. Entretanto, se considerada a área efetivamente urbanizada (as áreas
em cinza do diagrama), a densidade populacional no diagrama 1 seria muito maior
do que no 2, embora o volume populacional continue sendo o mesmo. Neste
sentido, o cálculo da densidade populacional urbana é mais relevante para
quantificar a dispersão urbana.
Do ponto de vista prático, a mensuração da área considerada urbana é um desafio
em si mesmo. Com a relativa popularização das imagens de satélite nos estudos
urbanos, vários trabalhos passaram a utilizar técnicas de sensoriamento remoto,
de modo a estimar a área urbanizada em diversas localidades. Particularmente
para o estudo dos processos de expansão urbana, essa prática tem sido
recorrente.
Os trabalhos de Galster et al. (2001), Batty, Xie e Sun (1999), Chin (2002),
Torrens e Alberti (2000), Cutsinger et al. (2005), Roca, Burns e Carreras
(2004), Angel Sheppard e Civco (2005), entre outros, utilizam imagens de
satélite para avaliar a expansão urbana em diversas partes do mundo. Angel,
Sheppard e Civco (2005) apresentam um dos mais abrangentes estudos considerando
um conjunto de aproximadamente quatro mil cidades com população superior a 100
mil habitantes ao redor do globo. Segundo este trabalho, as densidades das
cidades de países em desenvolvimento tendem a ser maiores do que nos países
desenvolvidos, mas, em ambos os grupos, a tendência ao longo do tempo tem sido
de redução.
O Global Rural-Urban Mapping Project (GRUMP), desenvolvido no âmbito do Center
for International Earth Science Information Network (CIESIN), Columbia
University, utiliza imagens de satélite e a leitura dos dados dos pontos de luz
emitidos pelas aglomerações urbanas para realizar uma estimativa das áreas
urbanizadas. Entretanto, o uso sistemático desses instrumentos ainda possui
algumas limitações operacionais, tais como o elevado custo para aquisição das
imagens e posterior processamento e análise, sobretudo quando se consideram
recortes espaciais mais detalhados e não usuais, como é o caso do estudo de
aglomerações urbanas que não fazem parte de regiões metropolitanas
institucionalizadas, ou ainda quando o objetivo é realizar uma investigação que
inclua um conjunto maior de áreas de estudo.
Outra questão que permeia a utilização das imagens de satélite refere-se aos
problemas de classificação das imagens, pois, tratando-se de um processo
automatizado, demanda a realização de estudos empíricos para confirmar a
classificação das imagens. Como se sabe, o conceito de "urbano" não é
totalmente consensual e depende, em certo grau, de uma classificação
subjetiva.5 A utilização das imagens de satélite não elimina esta
subjetividade, pois, apesar de sua evidência empírica, ainda se trata de um
processo de classificação que depende da qualidade e resolução da imagem e do
grau de detalhamento que ela consegue captar.
Neste sentido, a informação contida nos Censos Demográficos, embora possua suas
limitações em termos da classificação do que é rural ou urbano, apresenta
algumas vantagens, tais como uniformidade, acessibilidade e abrangência da
informação. Ou seja, é possível obter com facilidade os dados de forma
homogênea para todo o país.
Garcia e Matos (2005) utilizaram, em pesquisa recente, informações
disponibilizadas na forma de Malha Digital de Setores Censitários Rurais e
destacam a subutilização dessa base de dados. Esta informação está disponível
na Internet, no sítio eletrônico do Instituto Brasileiro de Geografia e
Estatística (IBGE),6 sem custo, e inclui a classificação dos setores
censitários urbanos e rurais para todos os municípios do país.
Como forma de oferecer maior detalhamento às categorias rural e urbano, o Censo
Demográfico ainda subdivide as áreas urbanas e rurais em oito subcategorias,
sendo três delas relativas ao urbano e outras cinco referentes ao rural.7 Para
fins analíticos, utilizamos esta classificação, considerando as quatro
primeiras subcategorias como representativas das áreas urbanas, pois, apesar da
categoria quatro ser classificada como rural, está relacionada ao processo de
expansão urbana sobre áreas classificadas oficialmente como rurais.
O total das áreas urbanas no Brasil, segundo esse critério, é de cerca de 95
mil quilômetros quadrados, o que representa apenas 1,12% do território
brasileiro que comportava cerca de 140 milhões de pessoas, em 2000, ou seja,
81,8% do total da população. A partir desses dados, é possível verificar com
maiores detalhes a informação de densidade populacional, que, em termos da área
total, é de cerca de 20 habitantes por quilômetro quadrado, mas que, se
considerada apenas a densidade relativa à população que vive em áreas urbanas,
passa a ser de 1.453 mil habitantes por quilômetro quadrado.
As 37 aglomerações urbanas representam cerca de um terço do total da área
urbana brasileira (30,5 mil quilômetros quadrados) e abrigam 71,6 milhões de
pessoas. Assim, a densidade populacional urbana nessas aglomerações é, em
média, de 2.353 habitantes por quilômetro quadrado. A área urbana (AU) de
Maringá é a que possui a maior densidade, com cerca de 8,3 mil hab./km2, e a de
Cabo Frio detém a menor, com 591 hab./km2. Assim, sob uma análise comparativa
das aglomerações urbanas, existem situações muito distintas em termos da
densidade urbana. A AU de São Paulo, apesar de possuir a segunda maior extensão
urbana (4,2% do total brasileiro), registra uma das densidades populacionais
urbanas mais altas (4,3 mil hab./km2).
Mas, embora as densidades sejam importantes para identificar o padrão de
expansão urbana e, conseqüentemente, a dispersão urbana, a densidade de
domicílios remete mais diretamente à medida da distribuição da população dentro
do espaço de uma aglomeração urbana. O total de domicílios nas aglomerações é
de cerca de 20 milhões, o que corresponde a uma densidade de 660 domicílios por
quilômetro quadrado.
A Tabela_1 apresenta as densidades populacionais e domiciliares nas áreas
urbanas para as aglomerações selecionadas e permite verificar as distintas
condições em termos da densidade urbana. Com base nestas informações, observa-
se que a AU de Blumenau é a que possui um grau de dispersão urbana mais
evidente, pois a distribuição dos domicílios urbanos se dá sob uma densidade de
218 domicílios por quilômetro quadrado, a mais baixa entre as trinta e sete
aglomerações. A AU de Maringá detém a maior densidade de domicílios urbanos e,
a partir desse critério, poderia ser classificada como a aglomeração urbana
mais compacta.
Fragmentação
Entretanto, a densidade urbana não é necessariamente um indicador que garante a
existência de uma urbanização mais dispersa nas aglomerações, sendo que o
padrão de ocupação do espaço urbano dentro da aglomeração também contribui para
que a urbanização seja mais ou menos dispersa. Isso pode ocorrer em casos como
o ilustrado pela Figura_3, em que as duas áreas urbanas hipotéticas possuem a
mesma densidade urbana, embora apresentem padrões de distribuição da área
urbana muito distintos.
No diagrama 1, tem-se uma forma de ocupação monocêntrica, enquanto no 2 existem
diversos núcleos separados espacialmente. É o caso do que a literatura sobre o
urban sprawl aponta como leapfrog development, ou urbanização em saltos, que se
caracteriza pela fragmentação dos espaços urbanos e está associada à separação
física dos núcleos de desenvolvimento urbano.
Essa urbanização em saltos pode ser entendida como parte de um processo de
desconexão dos espaços de vida cotidianos dentro das aglomerações, claramente
associado às mudanças nos deslocamentos espaciais da população, uma vez que a
continuidade da mancha urbana não é mais necessária para que os contextos
urbanos sejam integrados. Essa forma de desenvolvimento urbano é, depois da
densidade urbana, o fator mais característico da dispersão urbana, pois
adiciona uma evidência espacial ao padrão de distribuição da população dentro
dos contextos urbanos.
Em termos operacionais, a fragmentação dos espaços urbanos pode ser apreendida
de distintas formas e, como pode ser observado de modo intuitivo pela Figura_3,
a distância que os espaços urbanizados possuem entre si caracteriza a maior ou
menor dispersão de uma região. Ou seja, se duas regiões possuem uma mesma
população distribuída em uma área urbana equivalente, elas terão densidades
urbanas próximas, mas uma pode assumir uma forma compacta em círculos
concêntricos, enquanto outra pode ter uma forma policêntrica, com ramos urbanos
indo para distintas direções.
Essa é uma importante dimensão da expansão urbana, pois a urbanização em saltos
pode comprometer usos agrícolas das áreas periféricas, ou ainda demandar a
expansão da rede de infra-estrutura de serviços ' como abastecimento de água e
esgoto ' para além do minimamente necessário (ANGEL; SHEPPARD; CIVCO, 2005).
A questão ambiental surge aqui como um importante condicionante para esta
dimensão da dispersão urbana, pois tanto suas causas como seus efeitos estão
relacionados. Por um lado, tem-se a crescente demanda por uma vivência
cotidiana próxima aos artefatos ambientais,8 mas, por outro, à medida que a
urbanização avança em direção a eles, compromete-se a capacidade de ofertar
tais amenidades. Assim, a tendência é de se criarem espaços urbanos cada vez
mais desconectados uns dos outros, sendo que os espaços não-urbanizados que se
colocam entre eles tornam-se pouco utilizados em termos ambientais, agrícolas
ou mesmo de atividades urbanas.
Para medir essa dimensão da urbanização, utilizou-se o Índice de Vizinhança
Próxima,9 a partir do software ArcGis (versão 9.0). Para calcular essa medida
de dispersão, primeiramente foram agrupados os setores censitários urbanos
conurbados de uma aglomeração urbana, para se criar um único polígono para cada
área urbanizada, evidenciando as áreas urbanas sem fronteiras adjacentes. A
Figura_4 ilustra o procedimento realizado.
Assim, cada conjunto de setores censitários urbanos de uma aglomeração foi
agregado como um único polígono, mesmo quando sua área era dividida por limites
municipais. Como pode ser observado na Figura_5, após o cálculo dos pontos
centrais de cada um destes polígonos (centróides), calculou-se a distância
entre cada um dos centróides e o seu vizinho mais próximo (Di).
A razão entre a média dessas distâncias (Di) e a média das distâncias em uma
área hipotética com distribuição aleatória é um indicador que permite medir o
grau de dispersão das áreas urbanizadas em cada uma das aglomerações urbanas.
Esse indicador foi posteriormente ajustado para que seus valores variassem
entre zero e um. Dessa forma, valores próximos de zero representam padrões mais
compactos, enquanto aqueles próximos de um significam padrões mais dispersos. O
mesmo procedimento foi, portanto, realizado para cada uma das 37 aglomerações
urbanas.
Juntamente com essa medida, foi utilizada a razão entre a área não-urbana e a
área urbana de cada uma das aglomerações, como forma de mensurar a existência
de espaços não-urbanizados. Assim, a média aritmética destes dois indicadores
resultou em uma medida sintética (indicador de fragmentação), combinando uma
medida de dispersão e os espaços não-urbanizados para todas as aglomerações
apresentadas na Tabela_2.
No indicador de fragmentação (IF), os valores mais baixos representam padrões
menos fragmentados. As aglomerações com maior fragmentação são as de Brasília,
Caxias do Sul e Maringá, enquanto as que possuem os padrões mais compactos
correspondem a Rio de Janeiro, São Paulo e Aracaju, com destaque para as duas
primeiras, pois, apesar de terem as maiores áreas urbanizadas (as duas
representam cerca de 30% do total das 37 aglomerações urbanas), possuem grandes
extensões de áreas urbanas conurbadas e, proporcionalmente, uma pequena área
não-urbanizada. Ainda vale ressaltar que, neste indicador, a escala territorial
da aglomeração urbana assume papel importante, pois, como o indicador considera
a distância média entre as áreas urbanizadas, regiões onde há mais áreas
classificadas como não-urbanas entre as áreas urbanizadas também serão aquelas
mais dispersas. No caso da AU de São Paulo, por exemplo, a despeito de sua
expressiva extensão territorial, a maior parte dessa área é classificada como
urbana e, portanto, a conurbação é maior.
Orientação/linearidade
A orientação em que se dá a urbanização também assume papel importante no
processo de expansão urbana e no conseqüente menor ou maior grau de dispersão.
Algumas aglomerações podem se desenvolver condicionadas por constrangimentos
físicos, como serras, rios, mar ou outras barreiras naturais, além de terem uma
estreita relação com outros elementos, como rodovias, ferrovias, pólos
econômicos regionais, etc.
Sob tais condições, a expansão urbana ocorre de forma diferenciada,
constituindo-se, conseqüentemente, em fator que deve ser levado em conta quando
se analisam as formas de ocupação do espaço. Uma aglomeração urbana que se
desenvolve a partir de círculos concêntricos tem, potencialmente, maior
capacidade de otimizar e distribuir sua infra-estrutura de serviços em
comparação àquela que acompanha o traçado de uma rodovia e, por isso, tende a
se expandir em apenas um sentido.
Assim, é importante diferenciar as aglomerações urbanas em termos da orientação
dessa expansão, ou seja, se a forma é mais circular ou mais elipsoidal.
Apoiando-se novamente nos diagramas de aglomerações hipotéticas, podem ser
observadas duas áreas com a mesma densidade e pouca fragmentação das áreas
urbanas (Figura_6). Entretanto, o padrão de desenvolvimento urbano em linha
tende a caracterizar uma maior dispersão urbana, como pode-se perceber
intuitivamente a partir da observação dos diagramas 1 e 2.
A partir da ferramenta de Distribuição Direcional, disponível no software
ArcGis (versão 9.0), é possível medir se uma distribuição de polígonos segue
uma determinada tendência direcional. Assim, após a identificação dos
centróides dos polígonos dos setores censitários urbanos (agregados como no
item anterior), gera-se um polígono em formato elíptico, em que seus eixos são
obtidos pelo desvio-padrão dos centróides dos polígonos em relação ao eixo de
rotação.
A diferença entre os eixos permite comparar as aglomerações em termos da
orientação do desenvolvimento urbano. Nos diagramas 1 e 2 da Figura_6, a
diferença entre os eixos indica o grau de "achatamento" da elipse. Assim,
quando a diferença entre os eixos está perto de zero, como no diagrama 1, a
tendência é de que a elipse seja mais próxima de um círculo. Em termos da
análise da dispersão, considera-se que formas mais circulares tendem a ser mais
compactas e, portanto, quanto maior for a diferença entre os eixos, mais
dispersa será a aglomeração.
Assim, elaborou-se o indicador de linearidade, que mede o grau em que as áreas
urbanizadas se distribuem e se ajustam a um formato mais circular ou elíptico.
Enfim, como verifica-se na Figura_7, a diferença entre D1 e D2 é maior do que
aquela entre D3 e D4 e, portanto, a tendência de linearidade é maior no
primeiro caso.
Com os dados padronizados, variando de zero a um, aqueles próximos de zero são
os mais circulares, enquanto os que se aproximam de um tendem a apresentar um
padrão de urbanização em linha. Assim, as AU de Guaratinguetá, São Luís e
Maceió são as que possuem as formas mais circulares, enquanto Rio de Janeiro,
Santos e Blumenau têm um padrão mais elíptico. A Tabela_3 sintetiza as
informações obtidas por esse procedimento e apresenta o indicador de
linearidade ajustado.
Centralidade
Apesar de todas as dimensões consideradas aqui, é importante lembrar que, se
não houver integração entre as áreas urbanizadas, pouco importa a forma que
elas assumem, pois uma área muito dispersa em termos espaciais, mas onde o
fluxo de movimentos pendulares10 é muito reduzido, na prática, pode ser
considerada menos dispersa do que outra área um pouco menos fragmentada, porém
com integração mais intensa destas áreas.
Neste sentido, adicionou-se o grau de dispersão, através de um indicador dos
movimentos pendulares, para mensurar a dimensão da integração das aglomerações
urbanas. Assim, foi utilizada uma composição de dois indicadores de integração:
a proporção de movimentos pendulares internos à aglomeração urbana com destino
não polarizado na sede; e a proporção de movimentos pendulares pelo total da
população. O primeiro refere-se ao padrão e direção dos movimentos, sendo que
aquelas aglomerações urbanas que possuem movimentos pendulares menos
polarizados pela sede foram consideradas as que possuem um modelo de
urbanização mais disperso. No segundo caso, a proporção de movimentos
pendulares pelo total da população serve como parâmetro de padronização, uma
vez que a importância dos movimentos com direção à sede dependerá da relevância
que eles possuem no contexto do total da aglomeração urbana.
O procedimento foi realizado para cada uma das 37 aglomerações e considerou,
portanto, as proporções de movimentos pendulares com destino à sede
(considerando-se os menores valores aqueles mais representativos da dispersão
urbana), ponderando-se pela intensidade do total de movimentos pendulares em
relação à população total. Assim, com os valores padronizados, produziu-se uma
escala de 0 a 1, em que os valores mais próximos de zero correspondem à maior
dispersão urbana.
A ponderação com base na proporção dos movimentos pendulares pela população
total da aglomeração urbana foi importante para relativizar as situações em que
os movimentos em direção à sede eram muito representativos, embora sua
importância fosse pequena em relação ao total da população da aglomeração.
Dessa forma, mesmo nas aglomerações onde a proporção de movimentos em direção à
sede era relativamente baixa (como no caso de Vitória), a ponderação fez com
que o indicador fosse mais significativo do que em outras onde os movimentos em
direção à sede eram mais elevados (como na de Ribeirão Preto), já que neste
último o peso dos movimentos pendulares em relação à população total era muito
menos expressivo.
Resultados: considerações sobre a análise comparativa da forma urbana
O conjunto de dimensões leva em consideração variáveis demográficas e espaciais
para entender a forma urbana e caracterizar a dispersão. Assim, para a
composição do índice de dispersão urbana, foi utilizada uma média aritmética
dos indicadores de cada dimensão, pois não haveria razões para atribuir um peso
maior para algumas das dimensões em termos do que se pode dizer da dispersão
urbana. A Tabela_4 sumariza cada uma das dimensões e apresenta o indicador de
dispersão urbana derivado da combinação das dimensões consideradas.
O resultado da composição destes indicadores deverá oferecer subsídios para
analisar, de forma comparativa, em que medida uma aglomeração urbana pode ser
caracterizada como mais ou menos dispersa, independentemente do tamanho da sua
população. Segundo Lopez e Hynes (2003, p. 331), áreas metropolitanas com
grande volume populacional não deveriam ser classificadas como mais dispersas
simplesmente por abrangerem uma extensão maior do espaço. Assim, mesmo que
determinada região seja 10 ou 20 vezes maior do que outra, ambas podem ter
padrões similares e, por isso, deveriam ter indicadores de dispersão similares.
Enfim, é preciso distinguir grandes extensões urbanas com o grau de dispersão
considerado aqui através das dimensões e da síntese destas dimensões.
A Figura_9 mostra como o indicador construído satisfaz esse pressuposto, pois a
AU de São Paulo ' a despeito de seu volume populacional muito maior ' apresenta
um indicador de dispersão próximo das AUs de Belém, Recife ou ainda de Maringá.
Afinal, a dispersão urbana não diz respeito ao tamanho populacional da
aglomeração, pois, se assim fosse, não haveria parâmetros de comparação entre
situações como São Paulo e as demais aglomerações urbanas.
Pode-se dizer que o indicador de dispersão urbana, embora não tenha esgotado as
dimensões na análise da forma urbana, buscou cobrir as principais dimensões
mencionadas pela literatura internacional referente ao estudo do urban sprawl.
A relativa fragilidade das informações utilizadas, com base principalmente nos
dados censitários, é compensada pela sua abrangência e uniformidade, permitindo
construir um conjunto de indicadores para todas as aglomerações urbanas
brasileiras. É evidente que refinamentos e detalhamentos posteriores, a partir
de estudos de caso específicos, podem trazer elementos empíricos que uma
análise nesta escala não é capaz de dar conta.
O indicador sintético procurou captar as dimensões da dispersão urbana e
permitiu classificar as aglomerações urbanas a partir de um critério geral, sem
levar em conta características particulares de cada aglomeração. O tamanho da
população, ao contrário do que parece, não possui uma correlação positiva com o
grau de dispersão urbana de uma região, de modo que a dispersão urbana não
depende diretamente de um grande volume populacional. O caso da AU de São Paulo
explicita essa condição do indicador, pois é um exemplo de que é possível
mensurar a dispersão urbana sem que a desproporcional extensão urbana ou a
população pesem na análise de forma determinante.
Claro que suas dimensões tornam-se um importante desafio para a gestão de
políticas públicas, mas, em termos do processo de dispersão urbana, existem
aglomerações que merecem especial atenção, pois as tendências do processo de
urbanização recente não favorecem a reprodução do padrão de urbanização
experimentado por São Paulo.
Isso se deve, entre outras coisas, à mudança nos paradigmas de desenvolvimento
social e urbano, que favorecem a desconexão das esferas de ação social,
transformando o espaço intra-urbano em cenário de ações individualizadas, onde
a racionalidade das ações pauta-se pela dimensão do risco social. A
fragmentação dos espaços dentro das aglomerações urbanas torna-se cada vez mais
uma forma de se defender diante dos riscos sociais na vida cotidiana e estaria
refletindo a fragmentação da sociedade contemporânea (BAUMAN, 2007).
Como pode ser visto na Figura_10, as aglomerações urbanas mais dispersas
encontram-se na porção sul-sudeste do país, com exceção do caso da AU de
Brasília. Aquelas localizadas nas Regiões Norte e Nordeste estão todas entre as
mais compactas, com exceção da AU de Fortaleza, que se coloca no grupo
intermediário. Provavelmente isso possa ser explicado por características
regionais de integração econômica, ampliação das tecnologias de transportes, ou
ainda pela maior inserção no processo de globalização. Independentemente da
resposta, parece ser uma evidência importante a ser investigada, após esse
primeiro esforço de análise comparativa.
Outro fator que deve ser considerado em futuras pesquisas refere-se à redução
do padrão dicotômico centro-periferia como paradigma explicativo do processo de
urbanização recente, uma vez que os fluxos de movimentos pendulares
caracterizam um mosaico de situações distintas em cada uma das aglomerações
urbanas e, sobretudo, porque a partir desse indicador pode-se perceber que os
movimentos intra-aglomerações urbanas não são, em todos os casos,
predominantemente direcionados para a sede ou núcleo da aglomeração. Ou seja,
existem aglomerações urbanas onde os deslocamentos de trabalho ou estudo se dão
de forma difusa entre seus diversos municípios.
Em relação ao impacto ambiental da dispersão urbana, a literatura aponta para
uma estreita relação entre as áreas urbanas mais dispersas e uma maior
utilização de veículos automotores. Causa e efeito do processo de dispersão
urbana, o uso e a expansão dos transportes automotores, sobretudo de uso
particular, possuem impactos relevantes em termos da qualidade de vida da
população nos principais centros urbanos, tais como congestionamentos,
acidentes, incidência de atropelamentos e óbitos, além da poluição atmosférica
e todas as suas conseqüências.
A partir dos indicadores de dispersão urbana para as aglomerações brasileiras,
encontrou-se uma correlação negativa com a proporção de domicílios com pelo
menos um automóvel de uso particular. Ou seja, quanto menor o ranking da
aglomeração urbana (mais dispersa), maior a proporção de domicílios com pelo
menos um automóvel de uso particular. Esse resultado era esperado, uma vez que
a literatura já apontava para essa tendência, o que, inclusive, parece ser
óbvio. Se uma região possui uma dispersão urbana maior, a necessidade de
deslocamento e meios de transporte também deveria ser maior.
Claro que a variável renda tem um papel importante nessa relação, mas a mesma
correlação negativa é encontrada em todas as classes de rendimentos per capita
domiciliar. Desde para os domicílios com renda per capita inferior a meio
salário mínimo até para aqueles com mais de dois salários mínimos por pessoa, a
correlação se mantém significativa. Como se pode perceber através da Figura_11,
as aglomerações urbanas mais dispersas possuem uma proporção maior de
automóveis de uso particular, independentemente das classes de renda
domiciliar.
Assim, é possível dizer que a medida de dispersão urbana é coerente e análises
podem ser realizadas considerando outras relações. Como já exposto, o estudo
mais detalhado sobre algumas aglomerações urbanas específicas pode trazer mais
subsídios para o aprimoramento do indicador, tanto incluindo novas dimensões
como qualificando melhor o processo. Uma análise comparativa de uma mesma
região em termos temporais pode servir para indicar a intensidade em que o
fenômeno ocorre e quais os impactos causados pela dispersão urbana à medida que
se avança no tempo. Da mesma maneira, uma análise comparativa entre duas
aglomerações permitiria um maior detalhamento dos processos que condicionam as
distinções na forma.
Merece atenção o fato de que, se, por um lado, a análise comparativa com o uso
de indicadores reduz a capacidade de analisar os processos condicionantes da
urbanização contemporânea, por outro, permite identificar áreas prioritárias
para a análise detalhada. Isso porque, segundo a literatura internacional, há
uma associação significativa de efeitos negativos desse modelo de urbanização
mais disperso e fragmentado, que se consolidou a partir da segunda metade do
século 20. Entre os aspectos sociais relacionados à dispersão urbana,
encontram-se a elevação dos custos sociais para a oferta de serviços públicos
(como abastecimento de água, coleta de lixo e tratamento de esgoto) e o
potencial aumento da dependência pelo uso de transportes automotores, pois
ambos estariam condicionados pela maior ou menor dispersão da rede urbana.
Portanto, a urbanização sustentável, relacionada à capacidade de otimizar o uso
e a ocupação dos espaços urbanos, deverá cada vez mais considerar as relações
do espaço vivido na experiência metropolitana e a construção social do espaço.
É preciso entender as relações e dinâmicas internas às aglomerações urbanas,
superando a dicotomia centro-periferia para poder compreender o papel das
aglomerações urbanas contemporâneas e suas formas, dado que serão estes os
potenciais pontos de tensão da urbanização mundial e brasileira nos próximos
anos (UNFPA, 2007, p.76). De certa forma, pode-se pensar que o planejamento e
ordenamento territorial deverão considerar as conseqüências da mudança de um
padrão denso para uma tendência de dispersão urbana. Portanto, incorporar a
dimensão espacial como uma das variáveis explicativas dos processos sociais que
se constituem nessas aglomerações não apenas contribuirá para padrões de
urbanização mais sustentáveis, mas também será fundamental para entender a
sociedade urbana.
Em termos das mudanças ambientais, o processo de implosão-explosão urbana
(LEFEBVRE, 1999) estará relacionado aos novos padrões de vida e às novas formas
de consumo do espaço dentro destas áreas urbanas. Os efeitos serão sentidos em
escalas locais, regionais e até mesmo globais, pois a dispersão urbana
relaciona-se intimamente com as mudanças na vida cotidiana e as representações
do risco social inerentes a essas mudanças. Assim, se a fuga dos riscos dentro
dos contextos urbanos delineará o contorno da urbanização contemporânea e
estará fortemente vinculada ao que desejamos como qualidade de vida urbana,
cabe buscar novo instrumental metodológico para abordar as contradições da
urbanização na sociedade moderna.