Razões da intolerância na Europa integrada
INTRODUÇÃO
Uma das consequências da União Europeia (UE) e sua complexa euroburocracia foi
a internalização de relações entre países, anteriormente manejadas segundo
dinâmicas internacionais diplomáticas. Assim, iniciativas de cooperação ou
conflitos antes resolvidos no âmbito dasrelaçõesexterioresdos
Estadoseuropeussão hoje negociados no Conselho de Ministros ou no Parlamento
Europeu. As instituições regionais são novos atores também da política nacional
dos países europeus envolvidos no processo de integração europeia. No âmbito de
um processo político complexo, como é o caso europeu contemporâneo,
consequências da política regional refletem na preferência do eleitor em
eleições nacionais. Por conseguinte, o perfil ideológico dos partidos políticos
e seu posicionamento diante de temas da política regional são levados em conta
não apenas nas eleições europeias mas também nas eleições nacionais na Europa.
A percepção de um deslocamento de instâncias negociadoras e decisórias na
dinâmica política europeia produz consequências no cálculo das preferências
eleitorais por partidos políticos em todos os âmbitos de competição eleitoral.
Diante disso, eleições locais e nacionais também devem ser objeto de observação
no que diz respeito ao sucesso de agendas partidárias claramente favoráveis ou
desfavoráveis ao processo de integração política. A hipótese desenvolvida neste
artigo é que a nova extrema-direita europeia se sustenta fortemente da oposição
ao processo de integração e ao aprofundamento das políticas e das regras que
incluem cidadãos de diversas nacionalidades europeias em uma só categoria de
cidadania europeia. Sendo assim, a variação da performancedos partidos
políticos que se opõem radicalmente à UE deve ser compreendida no contexto do
desenvolvimento da integração regional, levando-se em consideração aspectos que
influenciam o comportamento dos eleitores não apenasemvirtude dos benefícios
econômicos percebidos pela integração.
É de conhecimento do eleitor europeu que a atuação de seus chefes e ministros
de Estados não se restringe mais à política doméstica, bem como sua autonomia
para implementação de políticas não é mais absoluta, mas restringida por
políticas europeias comuns e interesses regionais. Isso porque as instituições
regionais europeias são novos atores também da política nacional dos países
europeus envolvidos no processo de integração. Da mesma forma, os partidos
políticos se tornaram atores de representação de interesses de grupos que se
identificam mais ou menos com o projeto de integração e todas as suas
consequências. De fato, o perfil ideológico dos partidos políticos e seu
posicionamento diante de temas regionais são levados em conta não apenas nas
eleições europeias mas também nas nacionais.
A integração europeia é um tema obrigatório nas agendas dos partidos políticos
europeus e nas plataformas eleitorais nos pleitos de todos os níveis na região:
locais, nacionais e europeu. Inúmeras pesquisas vêm investigando o
posicionamento dos partidos políticos no que diz respeito à integração, mas
pouca atenção tem sido dada a eventuais inter-relações entre o posicionamento
dos partidos políticos em relação à integração e sua performanceem eleições
locais e nacionais. Agendas intolerantes e xenófobas de muitos partidos são
incompatíveis com a agenda europeia regionalista. No entanto, em meio a
variações não sistemáticas de preferências dos eleitores entre partidos de
direita, centro-direita, centro e centro-esquerda, vimos uma renovação da velha
extrema-direita no seio do desenvolvimento da integração, que vem apresentando
um tímido mas contínuo aumento de suporte por parte dos eleitores europeus.
Este artigo procura mapear o aumento dos votos em partidos de ideologia
extremista de direita nos países europeus ocidentais individualmente e em toda
a região. Primeiramente, o mapeamento do real crescimento de votos em partidos
de extrema-direita na região ocidental em geral nos mostra um crescente, lento
e seguro aumento de suporte a agendas intolerantes e incompatíveis com a
integração europeia. Além disso, a análise por país permite visualizar em que
países a tradição de suporte a essas agendas é mais ou menos forte. Nesse
contexto, é preciso deixar clara a distinção entre os partidos da nova extrema-
direita (PEDs) e aqueles identificados com a tradicional extrema-direita. Os
últimos fortemente relacionados ao fascismo; os primeiros, representantes de
uma nova clivagem política - fruto da "sociedade pós-industrial" (Betz, 1994;
Ignazi, 2003). A literatura sobre o tema é rica em comparações de
performancesde partidos de extrema-direita entre países específicos, entre
partidos específicos ou em eleições específicas europeias ou nacionais (Ignazi,
2003; Kitschelt, 1995; Taggart, 1998; Veugelers e Magnan, 2005; Veugelers e
Chiarini, 2002). No entanto, não existe uma análise mais abrangente ou dados
publicados sobre o suporte eleitoral dado em todos os PEDs de todos os países
ocidentais ao longo de toda a existência daqueles partidos. Com o objetivo de
suprir essa lacuna, foram reunidosparaestapesquisadados de todosospaíses-
membros ocidentais da União Europeia (UE15) dos últimos 28 anos1,com um mínimo
de cinco eleições parlamentares por país, e testadas variáveis econômicas,
sociais e de representação na busca de uma contribuição para a reflexão sobre
fatores regionais determinantes do suporte à intolerância2.
Alguns achados indicam que, ao contrário do que uma análise baseada nos
programas políticos e nos discursosde líderes de extrema-direita poderia
sugerir, a presença de imigrantes, o nível de violência ou o grau de
desenvolvimento econômico não são os melhores indicadores para compreendermos o
aumento da preferência de eleitores europeus ocidentais por partidos que
defendem agendas de reformas não inclusivas, não pluralistas e eurocéticas. As
sociedades que vêm suportando os PEDs se consideram mais informadas a respeito
da UE, sendo assim mais conscientes das consequências da integração para a
política doméstica. Além disso, vêm apresentando um bom desempenho econômico e
nível de distribuição de renda; e os índices de violência nessas sociedades têm
reduzido mais significativamente do que naquelas que não suportam PEDs.
EUROCÉTICOS E EURO-OTIMISTAS
Alguns estudiosos têm focado suas recentes pesquisas nas transformações do
sistema partidário europeu e, especificamente, no posicionamento dos partidos
políticos em relação ao processo de integração regional que se desenvolve há
mais de meio século na Europa (Marks, Wilson e Ray, 2002; Marks et alii, 2006;
Taggart, 1998). De Master e Roy (2000), entre outros, analisaram fatores
culturais que influenciam o suporte à integração, bem como as mudanças de
atitude diante de estrangeiros e imigrantes. No entanto, não é correto deduzir
que uma maior população de imigrantes explicaria um maior suporte a agendas
políticas xenófobas ou vice-versa3.
A maior resistência à integração social tem sido claramente identificada na
emergência de um novo populismo de extrema-direita que começa a ganhar vigor no
começo da década de 1980. Fortes opositores ao processo de integração são,
atualmente, os simpatizantes da "nova extrema-direita" e regularmente votam em
PEDs. A novidade do radicalismo de direita está ancorada, essencialmente,
segundo Betz (1994), na transformação do capitalismo industrial no capitalismo
pós-industrial. Transformações econômicas e sociais estruturais teriam gerado o
aparecimento ou o recrudescimento de reivindicações identitárias e culturais.
Consequentemente, o problema da identidade coletiva vem ganhando novas
dimensões e contornos em debates contemporâneos sobre reivindicações e
lealdades políticas.
Diferentes explicações buscam desenhar as condições e as motivações que levaram
a retórica autoritária de extrema-direita a sofrer as profundas transformações
que marcam as diferenças entre a tradicional extrema-direita, marcada sobretudo
pelo fascismo (1945-1980), como já mencionado, e a nova extrema-direita,
marcada pelo suporte a atitudes xenófobas e pela defesa de políticas anti-
imigratórias desde a década de 1980 (Ignazi, 1996; 2003; Kitschelt, 1988; 1994;
1995; Mudde, 1996; 2007; Taggart, 1998; Veugelers e Chiarini, 2002; Veugelers e
Magnan, 2005). Claramente, eventos como a integração europeia, bem como a
globalização, concorrem para o desenvolvimento de demandas de políticas
públicas de caráter não econômico. Foi fortalecida a onda de politização de
novos temas, como imigração e identidade, ao mesmo tempo que a defesa de
valores e crenças, e a preocupação com temas como cultura, soberania e
segurança entraram fortemente nas agendas políticas do fim do século XX. Ignazi
(1996; 2003) e Kitschelt (1995), ao apresentarem suas teoriassobre a emergência
da nova extrema-direita, associaram-na à grande mudança no espectro da política
em certos países europeus. Em outras palavras, os PEDs são identificados como
um by-productdas sociedades pós-industriais e classificados como "partidos
antissistêmicos" (Kitschelt, 1995; Ignazi, 1996; 2003; Poguntke e Scarrow,
1996).
PARTIDOS ANTISSISTÊMICOS
Marks, Wilson e Ray (2002) classificaram os partidos políticos europeus
contemporâneos segundo as clivagens sociais dos grupos de interesse que
suportam famílias ideológicas partidárias. Além disso, os autores apontaram o
posicionamento dos partidos em virtude do suporte ou da resistência à
integração europeia em duas dimensões: política e econômica.
O Quadro_1 é esclarecedor quanto ao fato de que a absoluta resistência à
integração europeia em relação a seus aspectos políticos e sociais é exclusiva
dos PEDs. Estes são preferidos por eleitores que desacreditam cada vez mais o
sistema representativo, o sistema partidário e as instituições democráticas.
Curiosamente, ocorrem, no mesmo período, o alavancamento da integração
políticadaUE(especificamente desde o Ato Único Europeu discutido e assinado na
década de 1980), que se sustenta na derrubada de fronteiras políticas,
econômicas e sociais entre os países-membros, e a consolidação de uma nova
ideologia política crítica da representação. Esta última sustentada em
estruturas representativas aceitas pelas regras constitucionais vigentes. O
novo populismo é suportado por opositores do sistema representativo democrático
que articulam suas estratégias, desde seu fortalecimento, como participantes do
próprio sistema. Em outras palavras, esse novo populismo defende a queda de
direitos pluralistas sem violência revolucionária ou golpista, mas desde dentro
do processo político de construção de preferências.
CRESCIMENTO DA EXTREMA-DIREITA NA REGIÃO
Muitos estudiosos da extrema-direita realizam importantes estudos de política
comparada considerando grupos de países ou comparando a atuação de partidos
políticos de extrema-direita em diversos países. Como o objetivo neste artigo é
identificar o real aumento de suporte aos PEDs, além de colaborar para uma
melhor compreensão sobre os fatores motivadores desse suporte, primeiramente
foram organizados os dados relativos a todas as eleições parlamentares, desde o
início da década de 1980 até 2008, para que seja possível verificar o aumento
de votos dados a PEDs, desde o surgimento dos mesmos, em toda a região e também
por país.
O Gráfico_1 apresenta a soma do percentual de votos atribuídos a partidos de
extrema-direita nos países da UE15 e tem o objetivo apenas de propiciar uma
visualização sobre a variação do suporte eleitoral recebido pelos PEDs em
eleições nacionais na Europa ocidental4.A conclusão é que há um crescimento de
votos atribuídos a PEDs, com picos de aumento de suporte e períodos de
estabilidade. O que mais interessa aos argumentos deste artigo não é o efetivo
sucesso eleitoral, no que diz respeito à aquisição de cadeiras nos Parlamentos
nacionais, pois os sistemas eleitorais são distintos, com regras específicas em
cada um dos países estudados e, em sua maioria, não garantem a possibilidade de
pequenos partidos políticos alcançarem votos suficientes para o sucesso
eleitoral em Parlamentos nacionais. O objetivo principal é comprovar que a
preferência por PEDs está aumentando gradativamente ao longo dos anos
investigados. Naturalmente, esse aumento não é distribuído igualmente, pois, em
alguns países, os PEDs nem sequer recebem mais do que 0,01% de votos, logo nem
são computados nessa apuração. Por essa razão, mais adiante será necessário
distinguir os países que apresentam suporte eleitoral a seus PEDs daqueles que
não apresentam. Verificando-se os dados agregados em toda a região no Gráfico
1, vimos que os votos em PEDs cresceram de 1,36% para 6,98% quando consideramos
a UE15 e todo o período de existência da "nova extrema-direita", qual seja,
desde a década de 1980. Apesar de os primeiros PEDs, com as características
explicadas acima, terem começado a aparecer no início da década de 1980, só
apresentaram resultados eleitorais mais evidentes em 1986 (1,84%) e mais
significativos a partir de 1995 (4,68%). Nesse período, os PEDs se organizaram
melhor e se consolidaram ao longo da década de 1990. O Gráfico_1 ilustra que,
após 1995, ocorreu certa estabilização no suporte eleitoral a PEDs em torno de
5%, e desde 2004 um novo crescimento parece despontar.
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Quando os países são analisados individualmente, como pode ser visto nos
gráficos anteriores, que apresentam o suporte dado aos PEDs por Estado-membro5,
torna-se possível concluir que, de fato, esse crescimento é uma realidade na
quase totalidade dos integrantes da UE15. Luxemburgo apresentou uma pequena
queda de 1% e, na França, desde o susto das eleições de 2002 com a vitória de
Le Pen no primeiro turno da disputa para presidência, a Frente Nacional entrou
em uma fase de dificuldades. Uma pergunta ainda não respondida pela literatura
sobre conjunturas eleitorais que compara performancede partidos políticos na
Europa:quaissão os motivadores comuns regionais de eleitores que apoiam agendas
políticas xenófobas e de resistência à integração política europeia? Sendo o
fenômeno do crescimento da extrema-direita comprovadamente regional,
consequentemente, os incentivos ao suporte a PEDs não devem ser avaliados com
base apenas em conjunturas nacionais. No entanto, ainda resta definir quais
variáveis devem ser consideradas entre as atitudes ou percepções, dados ou
índices, para uma melhor compreensão da preferência pela defesa da identidade
nacional e cultural a qualquer preço. Este artigo não pretende esgotar esse
debate, mas sim contribuir com a proposição de variáveis normalmente
desconsideradas, como as de representação nas instituições europeias.
CONDIÇÕES E MOTIVAÇÕES
Os integrantes da UE15 são países de tradições semelhantes e, em função da
influência histórica ocidental, possuem instituições nacionais também
semelhantes, portanto possuem princípios de organização constitucional e
respeito a instituições internacionais comparáveis. O que falta saber é o que
há em comum entre as preferências de eleitores, ainda minoritários, por
partidos políticos que representam plataformas xenófobas incompatíveis com
normas constitucionais e internacionais de respeito às diferenças, à liberdade
e aos direitos sociais. Tudo em nome da defesa da soberania e da identidade.
O ano de 2004 foi de muita transparência para os debates a respeito do Tratado
da Constituição, de seu conteúdo e da importância em ser aprovado em 2005.
Coincidentemente, 2004 e 2005 foram anos em que sete dos países da UE15 tiveram
eleições gerais. Desde 2004, no entanto, como se pode verificar no Gráfico_1, é
possível identificar um novo fôlego no suporte do eleitor a PEDs - os
principais partidos políticos que explicitamente se opuseram ao Tratado da
Constituição. O ano de 2005 foi escolhido então para testarmos variáveis que
servirão para a verificação de razões diferentes que teriam levado sociedades
envolvidas no processo de integração a ter preferências eleitorais diversas.
Os programas xenófobos dos PEDs se utilizam frequentemente de argumentos em
defesa da intolerância, associando a presença crescente da população de
imigrantes como elemento determinante de outcomes: aumento da violência,
aumento do desemprego, baixo desempenho econômico, entre outros.
Diferentemente, a teoria normativa que vem explicando as condições sociais e
históricas do aparecimento de uma nova clivagem política, fruto da sociedade
pós-industrial, releva o tema da identidade coletiva nos estudos sobre as
famílias ideológicas do sistema partidário europeu (Ignazi, 1996; 2003;
Kitschelt, 1995).
Quando realizamos estudos comparados isolados entre alguns países da região,
verificamos que o que explica algumas causas nacionais para o suporte a PEDs
não é capaz de explicar outros casos. Luxemburgo e Bélgica, por exemplo,
beneficiaram-se enormemente da integração em termos econômicos; e ainda se
tornaram países-chave para a euroburocracia. No entanto, apresentam uma alta
média de suporte, por parte de seus eleitores, aos PEDs. Baixíssimos índices de
desigualdade de distribuição de renda e aumento de emprego são realidades
nacionais, em ambos os casos, que não ajudam a compreender as razões da
intolerância nesses países. Ao contrário, a Alemanha vem sofrendo consequências
de sua integração nacional e regional ao longo dos últimos anos, com altos
índices de desemprego e de imigração, por exemplo. Contudo, a população votante
na Alemanha apresenta um baixíssimo suporte a PEDs. Esses foram alguns exemplos
que buscam justificar a necessidade da investigação sobre causas comuns
regionais que contribuem para a compreensão do aumento de votos em PEDs na
Europa ocidental.
Ao considerarmos as tradições de suportee não suportea PED sem países
ocidentais europeus, percebemos que o desempenho econômico não é um bom
indicador para a explicação da ausência de suporte a PEDs. Casos contrastantes
como Irlanda e Portugal - países sem nenhuma tradição de suporte a PEDs -
apresentaram crescimento econômico completamente diverso em 2007 (Irlanda com o
mais alto índice de crescimento, 5%, e Portugal com o mais baixo, 1,8%).
A Tabela_1 demonstra a média de votos atribuídos a PEDs por país ao longo dos
28 anos pesquisados6. Como pode ser visto nos Gráficos_12 e 14 e na Tabela_1,
tanto na Irlanda quanto em Portugal, PEDs não vêm conseguindo se organizar e/ou
receber suporte eleitoral de expressão. No caso de Portugal, temos observado o
Partido Nacional Renovador (PNR) buscar sustentação eleitoral sem sucesso,
provavelmente por representar uma tradicional extrema-direita, sem a renovação
representada pela nova clivagem política que apoia o novo radicalismo de
direita. A Tabela_1 demonstra todas as médias dos percentuais de votos
atribuídos à totalidade de PEDs em cada Estado-membro da UE15 no período de
emergência e de consolidação dos PEDs até as últimas eleições nacionais (2008).
Como se observa, apesar de não serem países que possuam tradicionalmente fortes
PEDs, Reino Unido, Alemanha, Finlândia e Grécia eventualmente veem uma minoria
bastante pequena de seus eleitores votando em agendas extremistas.
Contrariamente, Luxemburgo, Bélgica e Dinamarca, por exemplo, já vêm se
alinhando aos países de tradição de suporte a PEDs, como a Áustria. Espanha é
um dos países europeus ocidentais com mais forte tradição de organização de
grupos xenófobos em networks, no entanto, a organização partidária de extrema-
direita espanhola ainda é fraca.
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Enfim, Espanha, Irlanda e Portugal não apresentam absolutamente condições para
o aparecimento de PEDs fortes, pois a média de votos atribuídos a PEDs nesses
três países, desde a década de 1980, é "0" (ver Tabela_1). O que explicaria a
diferença de motivações ou receios entre as sociedades que não absorveram o
euroceticismo em nenhum grau?
Com a finalidade de desvelar condições sociais e institucionais que poderiam
influenciar a preferência eleitoral pelos PEDs, foram selecionadas algumas
variáveis para correlação com o suporte aos PEDs. A finalidade é contribuir
para uma mais afinada compreensão sobre a relação de indicadores de desempenho
econômico, aumento de criminalidade, capacidade de representação e atitudes
sobre a UE e suas reformas, com a eventual existência de suporte aos PEDs.
Consideramos que o exercício de reflexão e pesquisa a respeito dos caminhos até
então percorridos pelo euroceticismo na Europa é fundamental para a compreensão
da atual crise da UE, em que reformas institucionais dependem do convencimento
das sociedades de que a integração interessa a todos e reformas regionais já
implementadas buscam legitimação social.
HIPÓTESE E VARIÁVEIS
A agenda de integração social e política da UE só é combatida fortemente pelos
PEDs (ver Tabela_1), e as plataformas eleitorais nacionais desses partidos vêm
refletindo uma constante e clara atitude intolerante quanto às consequências da
integração política. Por ser o aumento de votos em PEDs um fenômeno regional,
fatores isolados nacionais ou conjunturais que consideram eleições isoladas não
são suficientes para uma explicação que abranja o significado do crescimento da
extrema-direita em toda a região ocidental europeia.
Treze variáveis foram selecionadas para serem aplicadas a um teste de médias
entre grupos de países cujos eleitores apresentam tradição de suporte a PEDs e
países em que os eleitores não apresentam essa tradição. O objetivo na seleção
das variáveis foi reunir aspectos sociais, econômicos e de representação, bem
como acolher variáveis de percepção regularmente usadas na literatura sobre
euroceticismo que possam colaborar para o teste da hipótese de que o
crescimento da extrema-direita não está associado a benefícios econômicos e
materiais trazidos pela UE, tampouco pode ser compreendido em estudos
comparados de casos isolados. Em outras palavras, o suporte a PEDs na Europa
não se explica por motivos econômicos nem puramente nacionais; e, por isso, as
escolhas eleitorais em eleições nacionais em toda a região ao longo das etapas
de consolidação do processo de integração revelam motivações para a atitude
eurocética do eleitor europeu.
Alguns dos fatores mais comuns de observação e de pesquisas de opinião pública
europeia sobre euroceticismo são as atitudes de falta de confiança na UE e em
suas instituições e, mais recentemente, a atitude a favorou contrao Tratado da
Constituição Europeia, que, após as rejeições da França e da Holanda, ocorridas
em 2005, falhou em seu projeto de aprovação. Julgamos, por conseguinte, o nível
de informação sobre as instituições europeias importante para que consideremos
a eventual conscientização sobre o papel das instituições europeias e as
mudanças ocorridas nos órgãos políticos nacionais por via da integração
política e suas reformas. Um bom exemplo da valorização do papel da informação
na mensuração do euroceticismo já foi identificado pelos analistas das
pesquisas do Eurobarometer 65(2006) a respeito do suporte ao Tratado da
Constituição Europeia. Segundo o Eurobarometer 65(2006), a falta de suporte ao
Tratado da Constituição pode ser atribuída à falta de informação. A variável
informação sobre as instituições europeiassignifica "o quanto as sociedades
nacionais se consideram bem informadas a respeito do processo de integração e
do papel das instituições europeias". É importante mencionar, no entanto, que
essa variável de percepção não deve traduzir a efetiva consciência sobre as
consequências da existência de instituições europeias, mas informar o padrão de
satisfação a respeito do conhecimento sobre a UE7.
Duas variáveis de representação institucional foram selecionadas para oteste:
opeso dos votos no Conselhoeonúmero de assentos no Parlamento Europeu. Esses
dados estão organizados em função do percentual de peso que cada país possui em
cada instituição europeia, levando-se em consideração o total de votos e de
assentos de todos os países-membros da UE. A verificação da capacidade de
representação dos países nas instituições europeias pode ser um importante
indício de quanto o Estado-membro exerce influência no processo decisório
europeu. É esperado que as sociedades que vêm dando suporte aos partidos que
resistem à integração possuam menor representação nas instituições europeias,
reforçando-se assim a insatisfação quanto à capacidade de interferência no
processo decisório europeu e consequente redução de instrumentos de defesa da
soberania e da cultura nacionais.
As variáveis econômicas de desempregoe desigualdade de distribuição de
incomesforam construídas a partir de dados do Eurostat Yearbook(2005) e
contribuem para a configuração das condições de desempenho econômico que afetam
diretamente a percepção do eleitor, sobretudo em virtude da existência de
estrangeiros e imigrantes que disputam espaços de trabalho e outros ambientes
de convívio social.
As variáveis sobre violência - dez crimes comuns 2004-2005, ou seja, 2005 em
relação ao ano imediatamente anterior, dez crimes comuns nos últimos cinco
anos, roubo 2004-2005, roubo nos últimos cinco anose, finalmente, crimesdeódio-
são relevantes para verificar se há alguma relação entre a preferência pelas
agendas intolerantes em relação a imigrantes e a estrangeiros e o aumento da
violência. A decisão pela inclusão dessas variáveis de risco social e de
vitimização foi uma consequência da observação dos programas dos PEDs, que
frequentemente apelam para a associação entre o aumento da violência e a
justificativa da atitude intolerante no que se refere aos imigrantes e
estrangeiros. É importante destacar que a violência diminuiu na região da UE15
em geral, e os dez crimes mais comuns ou frequentes nos países europeus
apresentam uma significativa redução de incidência nos últimos anos na maioria
dos países pesquisados.
Os dados utilizados para a mensuração das variáveis sobre violência foram
fornecidos pela European Crime and Safety Survey(EU ICS), publicada como EU
Research Report- ICS em 2005 (Van Dijk et alii, 2005). Essa extensa
surveybuscou produzir estimativas de vitimização para serem usadas em
perspectiva comparada, envolvendo os países da UE15 e mais três dos novos
países do Leste Europeu (Polônia, Estônia e Hungria). Os dez crimes mais
frequentes em cada país foram pesquisados conjuntamente, e foi considerada na
surveya incidência de uma ou mais vitimização nos últimos cinco anos (antes de
2005) e entre os anos de 2005 e 2004, excluindo-se o crime de roubo, que teve
um tratamento separado. Especificamente, a inclusão dos crimes de ódio como
variável explanatória teve o objetivo de incluir os crimes considerados
majoritariamente contra imigrantes e outras minorias, logo, fundamental para os
argumentos deste artigo.
A variável população imigrantefoi considerada importante para a identificação
da presença de uma significativa população imigrante em relação à alta média
existente na UE15. Foram considerados os percentuais da população imigrante por
país usando-se dos dados publicados pelo Europåisches Migrationszentrum(EMZ)8.
O objetivo da utilização dessa variável é identificar a eventual presença de
imigrantes, acima da média ou não, em países onde o programa de PEDs é mais
convincente.
Consideramos que os dados pesquisados sobre o suporte a PEDs, desde seu
surgimento na década de 1980, associados às variáveis sobre representação,
desempenho econômico, vitimização e população imigrante, são fundamentais para
uma contribuição ao debate sobre as razões ainda pouco conhecidas que têm
levado os eleitores a se voltarem cada vez mais, ainda que minoritariamente,
para plataformas políticas xenófobas. Sabendo-se que a atitude extremista de
direita também reflete a resistência à integração europeia, a crítica populista
à falta de legitimidade do processo de integração se reforça e lentamente vem
aumentando.
Como se pode observar no Gráfico_17, o nível de confiança nas instituições
europeias vem diminuindo. A Irlanda, por exemplo, um dos países que apresentava
menos resistência à Constituição Europeia, ao lado de Portugal e Espanha em
2000 (Eurobarometer 53, 2000), recentemente rejeitou o Tratado de Lisboa, que
nada mais é do que uma versão resumida e enxuta do Tratado da Constituição.
MEDINDO EFEITOS
Dividindo os países da UE15 em dois grupos, foi aplicado um teste estatístico
simples, de médias, com o objetivo de verificar que variáveis produziriam
impacto sobre a performancedos PEDs. Foram selecionados dados de 2005 para as
variáveis do teste, por ser considerado um ano importante para o crescimento
geral do suporte a PEDs, como pode ser conferido no Gráfico_1. Assim, o grupo A
está constituído dos países em que as sociedades nacionais não vêm apresentando
suporte eleitoral a PEDs desde 1980. Em outras palavras, países em que a média
de votos atribuídos à extrema-direita é "0" (ver Tabela_1). O grupo B está
constituído dos países em que as sociedades apresentam, mais ou menos
intensamente, suporte eleitoral a PEDs. Testando-se as diferenças de médias
encontradas em cada grupo de países, espera-se que fatores relacionados a
desempenho econômico de fato não sejam fundamentais para explicar a diferença
de suporte dado pelas sociedades nacionais dos países do grupo A quando
comparados aos países do grupo B.
O teste de médias utilizado9 é adequado para responder se as médias dos dois
grupos de países, em virtude das variáveis utilizadas, são estatisticamente
diferentes. Ou seja, se os países com diferentes níveis de suporte eleitoral a
PEDs apresentam resultados efetivamente divergentes em relação às variáveis de
representação, às variáveis econômicas e sociais utilizadas. Quanto às
variáveis mais comumente usadas pela literatura sobre euroceticismo (falta de
confiança na UEe contra a Constituição Europeia), espera-se que o grupo B de
fato apresente menos confiança na UE e seja mais resistente a reformas como a
da Constituição Europeia - o que caracteriza uma eurocética mais geral.
Quanto às variáveis sobre violência, espera-se que a violência tenha diminuído
em menos intensidade ou grau nos países cujos eleitores apresentam algum
suporte a PEDs. Isso porque a preferência pelo voto intolerante tem sido
genericamente associada à percepção de que as sociedades estão em risco e a
criminalidade estaria refletindo a não inclusão do imigrante indesejado pelo
eleitor xenófobo. Outra consequência da fragmentação social e da não integração
do imigrante é a discriminação e mesmo o aumento dos "crimes de ódio", que são
vistos como uma reação exacerbada da intolerância, da rejeição e da
discriminação. Assim, espera-se que haja mais crimes de ódio nos países do
grupo B.
Na sequência lógica do que já se compreende a respeito do comportamento
xenófobo, espera-se que a população imigrante em países em que PEDs recebem
mais apoio seja maior, apesar de Luxemburgo, país de baixa incidência de
suporte a PEDs e também de crimes de ódio, ser o país que abriga uma população
imigrante largamente maior do que a média europeia (cerca de 37% da população
de Luxemburgo é constituída de imigrantes).
É importante salientar que, embora o teste de médias utilizado não constitua um
teste estatístico sofisticado, ele é um exercício matemático e estatístico
útil, capaz de evidenciar argumentos e de complementar a tese sobre as razões
não materiais que explicam a performancede PEDs. Assim, o objetivo da inclusão
de um teste de médias, como o apresentado na Tabela_2, é apenas para que a
análise ganhe um instrumento descritivo útil, capaz de evidenciar, com maior
grau de robustez, as diferenças entre as médias dos grupos dos países
estudados. Por essa razão, a variável dependente do teste é o suporte dos
eleitores, ainda que eventual e minoritário, a PEDs em países europeus
ocidentais. Chamamos de suporte "a atitude de votar em PEDs", independentemente
do efetivo sucesso eleitoral em termos de aquisição de assentos nos Parlamentos
nacionais.
O primeiro resultado do teste de médias realizado que merece destaque é que os
países do grupo B apresentam uma média de atitude contra a Constituição
Europeiaede falta de confiança na UEmaior do que os do grupo A, 49% para 13% e
49% para 0,29%, respectivamente. As duas médias são estatisticamente
diferentes, com nível de confiança máxima. Esses resultados sugerem, como era
esperado, uma forte correlação entre a atitude de desconfiança na UE e a
atitude de não suporte quanto às reformas e ao aprofundamento do processo de
integração política. O Tratado da Constituição Europeia e a decisão pelas
ratificações populares a partir de amplos debates constituíram uma medida de
busca de legitimação ex postdo processo de integração. O próprio apelido de
"Constituição" dado ao Tratado de Roma é o sinal mais evidente da intenção em
se efetivar uma aproximação da integração que vem sendo realizada entre elites
políticas com a participação mais ampla e consciente das sociedades europeias.
Assim, a atitude de não suporte à ratificação desse tratado está fortemente
associada à atitude de desconfiança mais generalizada quanto a UE.
O segundo resultado é o que se refere às variáveis de representação dos países-
membros nas instituições europeias. As diferenças de médias, nesse caso, não
apresentaram relevância estatística, mas, diferentemente das expectativas,
apresentaram resultados positivos. O grupo dos países cujos eleitores mais
tradicionalmente suportam PEDs possuem mais cadeiras no Parlamento Europeu e
mais votos no Conselho, logo, possuem mais instrumentos de interferência nas
decisões sobre as políticas regionais. Como a mudança no número de cadeiras e
de votos no Conselho é muito pouca, e os dados, no caso dessas variáveis,
variam mais raramente do que os demais, um exercício econométrico que
considerasse uma série temporal longa seria mais preciso, o que poderia tornar
os efeitos dessa variável mais esclarecedores.
Um resultado considerado relevante ao suporte dos argumentos deste artigo é o
que se refere à variável informação sobre as instituições europeias. O grupo B
apresenta uma média maior do que o grupo A, 3,9% para 4,39%, respectivamente,
sendo a diferença dessas médias de nível máximo de confiança estatística no
teste, ou seja, a 1%. Esse resultado sugere que as sociedades nacionais dos
países do grupo B são significativamente mais bem informadas sobre a UE do que
as sociedades nacionais dos países do grupo A. De outra forma, as sociedades
nacionais que votam, ainda que eventualmente, em PEDs são mais conscientes a
respeito do papel das instituições europeias ou das consequências da integração
europeia em geral quando comparadas com as sociedades nacionais dos países do
grupo A. Esse resultado é bastante interessante para a sustentação de
argumentos sobre a relação entre a preferência do voto por partidos que se
opõem à UE e a percepção de conhecimento e satisfação quanto à informação sobre
os efeitos e as funções das instituições europeias. Isso sugere que o voto em
PEDs pode significar um voto de resistência consciente à UE, uma vez que esses
são os únicos partidos políticos europeus fortemente contra a integração
política que vêm apresentando crescimento de votos10.
A diferença de médias da variável econômica desempregonão apresentou relevância
estatística, mas é positiva. O desemprego vem sendo fortemente associado ao
crescimento da extrema-direita em diversos importantes trabalhos; porém, o alto
desemprego, na maioria dos países europeus, não pode ser analisado sem a
consideração da proteção garantida pelo ainda forte Welfare Stateeuropeu.
Assim, consideramos avariável desigualdade de distribuição de
incomespossivelmente mais importante do que desempregonesse teste, que não
considera os "benefícios" percebidos do cidadão desempregado, que variam na
Europa de país para país. Avariável desigualdade de distribuição de
incomesapresentou um resultado negativo, com diferença estatística relevante e
nível de confiança bastante alto, muito próximo a 5%. Os países do grupo B
apresentam uma média de desigualdade de distribuição de renda
significativamente menor do que os do grupo A, de 4,13% para 6,2%. Esse
resultado sugere que as sociedades menos afetadas por fragmentações sociais
provindas da má distribuição de renda têm votado mais em partidos xenófobos na
Europa ocidental. Isso contradiz os argumentos que associam desigualdade social
à atitude intolerante.
Foram testadas variáveis sobre violência tendo-se em conta a genérica
associação que discursos xenófobos costumam fazer em relação ao problema da
violência urbana, e, no teste, encontramos um resultado bastante sugestivo.
Além do fato de que a violência vem diminuindo em toda a região da Europa
ocidental, como já visto anteriormente, no caso dos países do grupo B, os
crimes de roubo diminuíram significativamente no último ano considerado para a
pesquisa do European Crime and Safety Survey(EU ICS 2005). Considerando-se
ainda os índices dos últimos cinco anos precedentes à pesquisa de 2005, a
diferença da diminuição de roubos entre os grupos A e B se torna extremamente
relevante. Ou seja, existe uma maior diminuição dos crimes de roubo nos países
do grupo B com uma diferença estatística significativa máxima no teste (nível
de confiança a 1%). Ou seja, no grupo B, constituído de sociedades que, ainda
que eventual e minoritariamente, suportam PEDs e votam em agendas xenófobas, os
crimes de roubo têm diminuído mais significativamente do que nos países onde
não existe suporte a PEDs. Lembrando que os programas e discursos de líderes de
PEDs associam a desigualdade, o desemprego e a criminalidade à necessidade da
defesa de uma agenda xenófoba. Curioso é que, ainda que sem relevância
estatística, podemos conferir que, ao contrário dos crimes de roubo, no caso
dos crimes de ódio, o resultado é positivo. Isso significa que há mais crimes
de ódio nos países do grupo B do que nos países do grupo A. No entanto, embora
relativamente alta, a diferença entre as médias não chega a ter confiança
estatística, ficando aqui apenas como uma nota de observação que faz sentido
com os argumentos mais gerais deste artigo.
Finalmente, resta observar que os países do grupo B de fato possuem uma
população imigrante consideravelmente maior do que os do grupo A. Ainda que a
diferença das médias não seja estatisticamente significativa, pode ser
considerada alta: 1,45%.
RESULTADOS E CONTRIBUIÇÃO
Os resultados encontrados sugerem,emsuma, que a atitude de suportar PEDs está
mais fortemente relacionada à falta de confiança na UEe, consequentemente, à
rejeição da ideia de uma Constituição europeia, bem como à percepção do eleitor
de que ele é informado a respeitoda UE, do que às frustrações ou à satisfação
quanto aos benefícios econômicos que a integração europeia pode representar.
Isso sugere que a defesa de valores, crenças e identidades se torna
preponderante sobre as vantagens materiais que uma integração econômica é capaz
de gerar.
Algumas diferenças de médias não apresentaram relevância estatística, como foi
o caso das variáveis de representação. Estas especificamente merecem um
tratamento mais acurado, o que provavelmente dependeria de uma investigação
sobre a correlação das variáveis de representação e seus efeitos em uma série
temporal capaz de agregar mais precisamente informação sobre o crescimento de
votos em PEDs e as reformas que sofreram o Conselho de Ministros e o Parlamento
Europeu na necessária redistribuição de cadeiras após cada um dos roundsde
alargamento da UE.
Os resultados encontrados ajudam a compreender países como Grécia e Itália, que
indubitavelmente se beneficiam da integração econômica ao mesmo tempo que suas
sociedades suportam PEDs que se opõem à integração política. Por outro lado,
países como o Reino Unido, que sempre foi marcado por sua posição histórica de
resistência à integração, não possuem uma significativa tradição em suportar
PEDs. Observe-se que o Reino Unido apresenta um índice baixíssimo - o mais
baixo-de percepção social de informação sobre a UE(3,7% da sociedade do Reino
Unido considera saber um pouco sobre a UE) (Eurobarometer 64, 2005), como se a
indiferença às políticas da UE pudessem poupar os cidadãos britânicos das
garras das instituições europeias. Essa conclusão só pode ser fruto da falta de
informação a respeito de quanto as instituições britânicas atualmente já se
encontram entrelaçadas com as europeias e de que a não adoção do euro, por
exemplo, não é salvaguarda para a desobediência, por exemplo, das decisões da
Corte de Justiça Europeia. Aquelas sociedades que mais percebem os efetivos
poderes instituídos na nova instância europeia de competição e barganha
política são as mesmas que têm demonstrado também ressentimento no que tange à
homogeneização cultural e nacional em meio à integração econômica. Isso sugere
que o eleitor que tem mais consciência sobre os poderes das instituições
europeias e suas consequências pode também temê-las. A compreensão sobre o
estabelecimento de uma instância supranacional de decisões políticas que
interferem na autonomia dos poderes Executivo, Legislativo e Judiciário
nacionais não parece gerar comportamentos indiferentes ao processo de
integração social.
Os dados levantados contribuem para confirmar outros achados da literatura
(Ignazi, 1996; 2003; Mudde, 2007; Kitschelt, 1995; Betz, 1994) segundo a qual a
preferência pela intolerância não está fundamentada na percepção de que
realmente há perdas de natureza material e econômica, por parte das sociedades
europeias, em função da integração regional. O foco de preocupações e
reivindicações da nova clivagem política é a identidade.
Enfim, a capacidade de interferência no processo decisório supranacional e a
consciência dos limites dessa capacidade se tornam importantes variáveis para
uma melhor compreensão do comportamento xenófobo na Europa. Essas conclusões
estão em consonância com a mudança no perfil do eleitor da extrema-direita, que
está se tornando mais jovem e com mais anos de educação, diferentemente do
tradicional perfil associado a clivagens de classe.
CONCLUSÕES
Em 1900, a Europa reunia aproximadamente 20% da população mundial. Hoje sua
população representa 11%, e as previsões são para que, em 2050, represente
apenas 4% da população de todo o planeta. Parece evidente que, nos próximos
anos, a região necessitará passar por uma nova onda migratória, e o Parlamento
Europeu já se manifestou recentemente sobre a necessidade da imigração como um
tópico importante na agenda sobre medidas de sustentação do poderio
europeu11.Ou seja, do ponto de vista demográfico, a imigração é necessária para
a Europa, além de a índole europeia sempre ter sido migratória. Assim como a
migração interna naturalmente sempre foi facilitada pela condição geopolítica
dos pequenos países europeus, ao mesmo tempo a xenofobia e a intolerância
também são ingredientes antigos na região. O que há então de novo em todo o
quadro apresentado neste artigo?
Se há alguma novidade quanto à atitude intolerante ou xenófoba em relação a
situações de intolerância no passado da história europeia, ela está na forma de
organização e de articulação de ideias não democráticas. O voto na nova
extrema-direita vem sendo também largamente interpretado como um voto de
protesto do eleitor que está desacreditado e desconfiado dos políticos locais e
nacionais, e que, naturalmente, não apoiaria a criação de mais instâncias
políticas representativas ou decisórias - como as instituições europeias.
Assim, o inusitado é que o resultado vem sendo o fortalecimento de partidos
políticos que disputam eleições dentro das regras do jogo democrático para
ganhar legitimidade para a defesa da implementação de agendas que visam
restringir o mesmo jogo democrático do qual eles vêm se beneficiando no último
quarto de século.
(Recebido para publicação em setembro de 2008)
(Versão definitiva em janeiro de 2009)
NOTAS
1. Foram pesquisados os sitesoficiais dos Parlamentos nacionais de cada país,
além de outros, como http://www.electionworld.org; http://
www.electoralgeography.com/new/en/elections; http://www.electionresources.org;
http://www.electionguide.org/index.php (acessados em 10/10/2008).
2. Os dados das eleições e os votos recebidos por partido político são
disponibilizados pelos órgãos oficiais de cada Parlamento nacional. Não há uma
fonte única, assim, para este artigo, foram consultados individualmente os
dados por eleição e os votos por partido em cada país.
3. Espanha e França possuem uma população de imigrantes similar (em torno de
5,5%), no entanto, na Espanha não há tradição de suporte a partidos políticos
xenófobos como há na França.
4. Nos anos em que não houve eleição nacional, foram repetidos os percentuais
da última eleição para efeito da contagem ano a ano, considerando-se que as
eleições nacionais nos países pesquisados não são realizadas nos mesmos anos.
Esse foi um artifício encontrado para considerar os intervalos eleitorais
diferenciados, bem como, em alguns casos, os termos dos mandatos.
5. Os gráficos foram construídos a partir dos resultados da pesquisa sobre os
percentuais de votos por eleição nacional em cada país e por partido político
de extrema-direita consultados nos sitesoficiais dos Parlamentos nacionais dos
países estudados e em http://www.electionworld.org (os resultados estão
resumidamente organizados em tabela apresentada no Apêndice).
6. O critério para apuração das médias de votos atribuídos em cada país ao
longo do período pesquisado foi o mesmo usado para o Gráfico_1, qual seja, a
repetição dos percentuais nos anos de intervalo das eleições.
7. Os dados usados para a medição das variáveis contra a Constituição Europeiae
falta de confiançana UEforam retirados do Eurobarometer 63(2005); para
informação sobre as instituições europeias, do Eurobarometer 64(2005).
8. Disponível em http://www.emz-berlin.de (acessado em 8/10/2008).
9. Trata-se de um teste Z cuja fórmula utilizada é a seguinte: Z = (X1 -X2)-(µ1
-µ2) /
σx1- x2.
10. Isso porque os partidos radicais de esquerda, ao contrário dos partidos
radicais de direita, vêm perdendo votos progressivamente na Europa ocidental.
11. Naturalmente, isso não significa que haverá facilitação para o blue-collar
worker,pois interessa a esses países uma imigração regulada, e as mudanças nas
políticas regionais demonstram que a seleção dessa imigração tem sido cada vez
mais acurada.