Efeito de diferentes misturas de substratos orgânicos na biomassa e no óleo
essencial de Thymus zygis
Efeito de diferentes misturas de substratos orgânicos na biomassa e no óleo
essencial de Thymus zygis
INTRODUÇÃO
O género Thymus é um género bastante complexo, tanto química como
morfologicamente. A variabilidade química dos seus óleos essenciais pode ser
determinada geneticamente, e estará relacionada com a diversidade das condições
ambientais (humidade, amplitude térmica e tipo de solo), idade e
desenvolvimento da biomassa, variação sazonal e práticas agronómicas em geral
(Morales, 2002; Sáez e Stahl-Biskup, 2002; Horwath et al., 2008).
Tal como no género Thymus, a variabilidade química também é encontrada nos
óleos da espécie Thymus zygis predominando o timol, carvacrol e p-cimeno (Sáez,
1995; Figueiredo et al., 2008; Pérez-Sánchez et al., 2008).
Os óleos essenciais destas plantas possuem elevada importância uma vez que têm
sido utilizados na alimentação, cosmética, perfumaria e indústria farmacêutica
(Moldão-Martins et al., 1999). Alguns autores consideram que T. zygis
representa a planta com mais valor no género Thymus sendo a elevada
concentração em timol particularmente interessante (Pérez-Sánchez et al.,
2008).
Boas práticas de cultivo de Thymus zygis são necessárias para a obtenção de
teores suficientes de biomassa e produção de óleos essenciais com rendimento e
composição química adequados (Letchamo e Gosselin, 1995; Jeliazkova et al.,
1999). O efeito de diferentes níveis de água de rega nos teores de biomassa e
óleos essenciais de Thymus já foi estudado por vários autores (Sotomayor et
al., 2004; Jordán et al., 2009). Um dos aspectos mais importantes encontra-se
relacionado com o substrato utilizado para o crescimento.
O termo substrato aplica-se a qualquer material sólido, natural, de síntese ou
residual, mineral ou orgânico, que colocado num contentor, estreme ou em
mistura, permite o desenvolvimento do sistema radicular, desempenhando um papel
de suporte da planta (Abad et al., 2004). Sempre que se pretenda utilizar
substratos em estufa constituídos por determinados materiais é importante a
avaliação das suas propriedades físicas (relacionadas com a retenção de água e
o arejamento), químicas (relacionadas com a nutrição vegetal) e biológicas
(relacionadas com a decomposição, fauna microbiana e estabilização dos
materiais envolvidos) (Ribeiro et al., 2001). Abad et al. (2004) definiram os
valores óptimos de densidade real e espaço poroso total para substratos como
inferiores a 0,4 g cm-3 e superiores a 85% em volume, respectivamente, e
valores de pH compreendidos entre 5,2 e 6,3.
O vermicomposto é um produto que resulta da degradação mesofílica de materiais
orgânicos por meio da interacção entre minhocas e microrganismos (Gopal et al.,
2009).
Dada a importância do óleo do tipo timol em Thymus zygis, pretendeu-se com o
presente trabalho, avaliar o efeito de diferentes misturas de dois substratos
orgânicos (substrato comercial e vermicomposto) e respectivas propriedades
físicas no rendimento, na composição química dos óleos essenciais e na biomassa
daquela espécie.
MATERIAL E MÉTODOS
O ensaio decorreu entre Fevereiro e Maio de 2009 no Horto do Campus de Gambelas
na Universidade do Algarve.
Utilizaram-se 5 substratos resultantes da mistura, em diferentes proporções, de
um vermicomposto produzido na Futuramb a partir da vermicompostagem da fracção
orgânica dos resíduos sólidos urbanos, com um substrato orgânico comercial à
base de turfa Gramoflor® adquirido na empresa Messinagro.
Os 5 substratos em estudo corresponderam às seguintes proporções (v/v) de
vermicomposto (V) e substrato comercial (O): V100 (100%V); VO75-25 (75%V+25%O);
VO50-50 (50%V+50%); VO 25-75 (25%V+75%V) e O100 (100%O).
Sementes de Thymus zygis foram germinadas em placas de alvéolos, e após 10
semanas de crescimento procedeu-se ao seu transplante para vasos de 2 L de
volume. Cada vaso foi regado manualmente e não foi aplicada adubação mineral.
Os vasos foram colocados em bancada elevada num desenho experimental
completamente casualisado, num total de 50 vasos com 10 repetições por
modalidade.
Em cada modalidade determinaram-se os seguintes parâmetros: pH (H2O),
condutividade eléctrica (CE), água facilmente assimilável (AFA), água de
reserva (AR), água dificilmente utilizável (ADU), espaço poroso total (EPT),
densidade real (dr) e a % de matéria seca (Martinez, 1992). Setenta dias depois
do transplante determinou-se a biomassa da parte aérea de todas as plantas
individualmente e isolaram-se os óleos essenciais por hidrodestilação num
aparelho tipo-Clevanger (Anónimo, 1995) e por cromatografia gás-líquido (Bentes
et al., 2009).
Para os vários parâmetros estudados a comparação entre modalidades foi avaliada
com base numa análise de variância simples. A comparação das médias foi
efectuada pelo teste de Duncan para um nível de significância de 95%. Toda a
análise estatística foi efectuada com o programa SPSS v. 16.0.
RESULTADOS
A produção de biomassa da parte aérea da planta segundo as diferentes
percentagens de vermicomposto encontra-se descrita na Figura 1 pela equação
polinomial de 2.º grau y = 0,0007x2 ' 0,15x + 8,61; R2 = 0,432. De acordo com a
Figura 1, verifica-se que quanto maior a percentagem de vermicomposto nas
modalidades, menor o valor em biomassa da parte aérea.
Figura_1 - Relação entre a percentagem de vermicomposto e o peso da parte
aérea. *** Significativo para p<0,001.
A modalidade V100 apresentou o valor mais elevado de pH e de densidade real,
tendo apresentado inversamente o menor valor de espaço poroso total.
Contrariamente, em O100 registou-se o valor mais baixo de pH e de densidade
real e o mais elevado de espaço poroso total. Os valores em matéria seca foram
mais elevados em V100 e mais baixos em O100. Quanto mais elevados os valores de
densidade real menores os valores de biomassa apresentados (Quadro 1).
Quadro 1 ' Valores médios das propriedades químicas e físicas para cada
modalidade. Em cada linha, médias com a mesma letra não apresentam diferenças
significativas a p< 0,05.
A dependência da produção de biomassa em relação à densidade real encontra-se
definida pela equação polinomial de 2.º grau y = 0,977x2 ' 15,53x + 30,96; R2 =
0,896 (Figura 2). Esta equação e de acordo com o Quadro 1, permite concluir que
quanto mais vermicomposto estiver presente na mistura, maior é a densidade
real.
Figura 2 ' Correlação entre os valores de densidade real e de biomassa no
conjunto das modalidades.
Os teores mais elevados dos monoterpenos oxigenados foram devidos à percentagem
mais elevada de timol, enquanto que os teores mais elevados dos monoterpenos
não oxigenados se encontraram associados à percentagem particularmente mais
elevada de p-cimeno, precursor do timol (Figura 3).
Figura 3 ' Concentração (% m/v) de monoterpenos oxigenados e não oxigenados nas
diferentes modalidades (VO 75-25: 75% vermicomposto + 25% turfa); VO 50-50: 50%
vermicomposto + 50% turfa; VO 25-75: 25% vermicomposto + 75% turfa e O 100:
100% turfa).
Os monoterpenos oxigenados predominaram nos óleos extraídos das plantas nas
modalidades O100 e VO25-75, contrariamente ao que se verificou para os
monoterpenos não oxigenados. As plantas que cresceram nas modalidades VO25-75 e
O100, isto é, com ausência ou com reduzidas percentagens de vermicomposto,
apresentaram as percentagens mais elevadas de monoterpenos oxigenados (timol)
e, consequentemente, a menor percentagem de monoterpenos não oxigenados (γ-
terpineno e p-cimeno) (Figura 4). O timol apresentou-se como o principal
componente dos monoterpenos em todas as modalidades tendo a sua concentração
variado entre 40,3 e 65,0 % nas plantas cultivadas em VO50-50 e VO25-75,
respectivamente. Em relação aos percursores do timol (p-cimento e γ-terpineno),
estes foram os restantes componentes em maior concentração nos óleos (12,6 e
18,2%) (Figura 3).
Figura_4 ' Rendimento em óleo essencial das plantas nas diferentes modalidades
(VO 75-25: 75% vermicomposto + 25% turfa); VO 50-50: 50% vermicomposto + 50%
turfa; VO 25-75: 25% vermicomposto + 75% turfa e O 100: 100% turfa).
O rendimento em óleo essencial foi elevado em particular na modalidade VO25-75.
Contudo, o rendimento obtido na modalidade VO 50-50 foi de apenas 0,2%, sendo
metade do obtido nas modalidades VO25-75 e O100 (Figura 4).
Na modalidade V100 todas as plantas secaram, não se determinando por isso nem a
biomassa nem directamente o rendimento em óleos.
DISCUSSÃO
As diferentes proporções de substrato orgânico comercial e vermicomposto
condicionaram a produção de biomassa bem como o rendimento dos óleos essenciais
e o teor dos monoterpenos. Algumas das propriedades físicas (espaço poroso
total e densidade real) e químicas (pH) poderão ter influenciado a produção de
biomassa da cultura e a utilização de vermicomposto influenciou negativamente a
produção da cultura.
Os baixos valores de arejamento, indirectamente relacionado com a densidade
real no substrato vermicomposto quando comparados com os estabelecidos por Abad
et al., (2004) para substratos, poderão ter inibido o crescimento da cultura
nas modalidades V100 e VO75-25 (Figura_1). Comparando-se ainda os valores de
espaço poroso total e pH com os definidos pelo mesmo autor, registam-se valores
inferiores para o espaço poroso total (73,7%) e superiores para o pH (7,2)
ambos na modalidade V100 podendo também estes valores ter contribuído para a
inibição do crescimento.
Em ensaios em tomate, Atiyeh et al., (2001) obtiveram para um vermicomposto
proveniente de estrume suíno (V), valores de pH de 5,68; 5,75; 5,83; 6, e
condutividade eléctrica de 3,2; 2,4; 1,9 e 1,2 dS m-1, em substratos contendo
respectivamente, 100, 50, 25% e 0% V em mistura com um substrato orgânico
comercial. Os mesmos autores obtiveram nas propriedades físicas, valores de
81,0; 85,8; 89,5 e 91,7% para o espaço poroso total e para a densidade real
1,89; 1,92; 1,93 e 1,93 g cm-3, respectivamente. Os mesmos autores concluíram
que o crescimento desta cultura foi favorecido por misturas de 25 a 50% em V
provavelmente em resultado da melhoria das condições físicas e nutricionais do
substrato. Contudo, as misturas contendo 100% V terão registado baixa
porosidade e arejamento afectando no crescimento do sistema radicular,
reduzindo o crescimento da planta o que vem de encontro ao registado nos
ensaios de Thymus zygis.
Shiralipour et al. (1992) registaram respostas semelhantes em resíduos
orgânicos em vaso, com decréscimo do crescimento das plantas à medida que a
proporção do vermicomposto no recipiente aumentava acima de 50% encontrando-se
estas respostas relacionadas também com a baixa porosidade e arejamento do
substrato.
Para Frankenberger e Arshad (1995) os microrganismos não apenas mineralizam
substâncias em nutrientes assimiláveis pela planta, como também sintetizam
metabolitos como reguladores de crescimento. Krishnamoorthy e Vajrabhiah (1986)
e Tomati et al. (1987) observaram que o vermicomposto proveniente do tratamento
de lamas de ETAR possuía elevada concentração em bactérias e hormonas de
crescimento (giberlinas, citocininas e auxinas) o que poderia induzir também
mais crescimento. O efeito da presença de hormonas de crescimento nas culturas
hortícolas, estabelecido por Hopkins (1995), poderá no entanto ter inibido a
produção de biomassa da planta.
Contudo, em plantas aromáticas, Anwuar et al. (2005) apenas obtiveram um
elevado crescimento de biomassa, quando utilizaram combinações de vermicomposto
com fertilizantes inorgânicos. Este facto também poderá ter justificado a pouca
produção de biomassa nas modalidades V100, VO75-25 e VO50-50. Neste aspecto, os
valores em espaço poroso total e densidade real poderão ter originado baixos
valores de disponibilidade hídrica no substrato vermicomposto.
Segundo Sotomayor et al. (2004), menor quantidade de água disponível aumenta o
rendimento em óleo essencial. Este facto parece indicar que a imposição de um
determinado tipo de stress favorece o aumento da concentração em óleos (Figura.
4). Neste trabalho, e apesar de não haver uma tendência muito clara, a inclusão
de mais vermicomposto no substrato diminuiu a biomassa e o rendimento em óleos.
A baixa produção de biomassa em VO75-25 e VO50-50 foi coincidente com a
concentração em p-cimeno mais elevada e de timol mais baixa. De acordo com
Skoula et al., (1999), em estudos realizados em orégãos (Origanum vulgare),
registou-se uma tendência para a produção de carvacrol (um isómero do timol)
principalmente através da produção de novas folhas. Estes dados poderão
explicar, ainda que parcialmente, os resultados que a fraca produção de
biomassa sem formação de novas folhas terá originado na fraca produção de
timol.
Baranauskiene et al. (2003) identificaram a presença no óleo essencial de
Thymus vulgaris de timol (44,1 a 58,1%), p-cimeno (9,1 a 18,5%), γ-terpineno
(6,9 a 18,9%) enquanto que Zambonelli et al. (2004) identificaram timol (22 a
38%), p-cimeno e γ-terpineno. Comparando os resultados obtidos por estes
autores com os estabelecidos em ensaio, o timol apresentou máximo de 65% em
VO25-75 enquanto que os precursores do timol (p-cimeno e γ-terpineno),
apresentaram valores dentro dos intervalos (12,6 e 18,2%) respectivamente.
De acordo com Jordán et al. (2003), a maior presença em timol não foi
verificada para a espécie T. hyemalis. De acordo com Özcan e Chalchat (2004),
esta diferença nos teores de timol podem dever-se a factores genéticos,
ambientais e nutricionais.
CONCLUSÕES
Os dados permitiram concluir que o substrato orgânico comercial permitiu a
obtenção de maiores produções de biomassa na modalidade O100 e rendimento em
óleos na modalidade VO25-75, sendo que, aparentemente a inclusão do
vermicomposto nas modalidades não aumentou a produção de biomassa.
Inclusivamente, os maiores valores de densidade real e menores de espaço poroso
total nas modalidades contendo maior percentagem em vermicomposto poderão ter
influenciado as produções de biomassa e rendimento em óleos.
Apesar de considerado pela maioria dos autores um substrato com potencial em
aumentar a biomassa de culturas hortícolas em produções de vasos em estufa ou
em solo, a utilização de vermicomposto não registou os mesmos efeitos nos
ensaios realizados com T. zygis, fruto possivelmente da menor tolerância desta
cultura às variações das propriedades químicas e físicas dos substratos.