Avaliação de ciclo de vida da maçã de refugo
Introdução
O sector da fruticultura em Portugal tem verificado um forte crescimento a
nível de produção e exportação. Ao nível da exportação as "frutas; cascas
de citrinos; melões" (mais 3,1%, ou seja, mais de 10 milhões de euros)
passaram para a 3ª posição como principal grupo de produtos exportado em 2013.
Os principais países de destino foram Espanha (33,1%), França (18,2%), Países
Baixos (10,0%) e Brasil (8,6%) (INE, 2013). Relativamente à produção observada
em 2013, em Portugal as árvores de fruto representam a maior fonte de produção
de frutas (96,3%, em 2013), sendo que a categoria dos principais frutos frescos
corresponde à produção mais intensiva (59,7%), onde a maçã se destaca com uma
representatividade de 52,5% (INE, 2013).
A maçã é a espécie com maior peso na produção de frutos, representando 30,2% do
volume total de frutas produzidas em Portugal, no ano de 2013. Nesse mesmo ano,
a produção rondou as 287,3 mil toneladas, o que correspondeu a um aumento de
30,1% face ao ano anterior e de 16,7% face à média do último quinquénio,
posicionando este ano como o melhor da última década (INE, 2013). Embora o ano
de 2013 tenha apresentado ótimos resultados graças às condições de temperaturas
amenas que se fizeram sentir na floração/vingamento dos frutos, esta forte
dependência de fatores climáticos causa frequentemente reduções significativas
a nível da produção. Por exemplo, no ano de 2012 verificou-se uma redução de
10,7% da produção a nível nacional face a 2011, devido a problemas de
polinização e vingamento provocados pelas baixas temperaturas ocorridas na fase
de floração dos pomares de pomóideas, que conduziram a um menor número de
frutos e a calibres irregulares (INE, 2012).
Aliado aos fatores climáticos necessários para um bom rendimento, outro fator
que leva à diminuição da rentabilidade frutícola é a existência de vários
critérios de padronização, classificação e apresentação para o consumo de fruta
fresca. A padronização vigente leva a um aumento do número de frutas
descartadas devido ao calibre reduzido, manchas e deformações, entre outros
defeitos. Esta fruta não conforme é assim considerada o refugo da produção
frutícola, ou seja, o subproduto. No Brasil, por exemplo, entre 2003 e 2004
aproximadamente 200 mil toneladas de maçãs foram descartadas, decorrente do
rigoroso processo de seleção e classificação comercial utilizada para
satisfazer as exigências do consumidor (Martello et al., 2010).
As maçãs de refugo não atingem os critérios mínimos necessários para serem
comercializadas no estado fresco nos mercados e grandes superfícies, de acordo
com Regulamento (CE) n.º1619/2001 da Comissão de 6 de Agosto, que estabelece a
norma de comercialização aplicável às maçãs e peras. Porém, a venda de maçã de
refugo com calibre reduzido pode ser efetuada em embalagens conjuntamente com
maçãs que satisfaçam os requisitos de calibre. No entanto, os frutos de refugo
que não alcancem o calibre mínimo previsto nunca podem ultrapassar 10% em
número ou em peso, e apenas podem apresentar uma variação máxima de 5 mm aquém
desse calibre (Regulamento (CE) n.º1619/2001). Outro tipo de defeitos como
ataques graves do encortiçado ou vidrado; lesões ligeiras ou fendas não
cicatrizadas; vestígios muito ligeiros de podridão e a presença de parasitas
vivos no fruto e/ou alterações da polpa devidas aos parasitas são admitidas, no
âmbito da tolerância da categoria II, no máximo de 2%, em número ou em peso
(Regulamento (CE) n.º1619/2001).
Apesar da não conformidade deste subproduto frutícola com as disposições
relativas à qualidade e calibre, estas frutas apresentam características
favoráveis em termos de composição química, aroma e sabor, que a tornam numa
ótima matéria - prima para a indústria de processamento alimentar.
O escoamento de refugos provenientes das produções frutícolas para a indústria
de processamento agroalimentar apresenta-se como uma alternativa vantajosa na
redução da carga do refugo, permitindo por outro lado responder à constante
procura por frutas e seus derivados, em consequência do aumento de consciência
dos consumidores para a saúde e da busca crescente por alimentos naturais e
saudáveis (Chong et al., 2013).
O sector agroalimentar é uma das áreas prioritárias contidas nas políticas
europeias de produção e consumo sustentáveis (Comissão Europeia, 2008). De
acordo com o regulamento europeu para a eficiência dos recursos (Comissão
Europeia, 2011), as metas mais importantes definidas para a agricultura no
futuro próximo consistem na redução de 50% na produção de resíduos, na
preservação da biodiversidade e dos ecossistemas, na redução do uso do solo, na
melhoria da qualidade do solo e em uma maior independência dos combustíveis
fósseis. A desidratação representa uma opção sustentável de conservação e
aproveitamento do refugo das produções frutícolas, consistindo adicionalmente
numa excelente alternativa para evitar as possíveis perdas que ocorrem no
transporte da fruta para as superfícies comerciais (Barrett et al., 2011).
O processo de desidratação consiste essencialmente na redução do teor de água
para um nível, em que a deterioração microbiana e a deterioração por reações
químicas e enzimáticas são minimizadas (Mrad et al., 2012). Isto é traduzido
num aumento do tempo de vida útil da fruta, além da substancial redução de
volume, facilitando o transporte e armazenamento (Vega-Gálvez et al., 2012).
Considerando os diferentes derivados alimentares atualmente aceites pela
sociedade como sumos, purés, conservas de fruta, compotas, a fruta desidratada
tem sido alvo de elevado interesse e aceitação por parte do consumidor
(Mégias-Pérez et al., 2014). A fruta desidratada pode ser considerada
como um alimento de conveniência e de considerável valor nutricional, indo de
encontro à maior procura de produtos saudáveis pelo mercado atual.
Presentemente, existe um crescente interesse em alimentos que contenham
compostos com efeitos benéficos para o bem-estar e saúde (Corey et al., 2013),
e que paralelamente sejam de fácil preparação e/ou prontos-a-consumir
(Oikonomopoulou e Krokida, 2013).
Em comparação com as frutas frescas, as frutas desidratadas apresentam
vantagens nutricionais, em termos de energia total, densidade de nutrientes,
teor em fibra e atividade antioxidante. A diferença existente resulta de um
aumento da concentração dos diferentes compostos, devida à perda de volume
(Bennett et al., 2011).
As técnicas de desidratação ocupam hoje em dia um lugar de relevo na indústria
agroalimentar em todo o mundo (Mégias-Pérez et al., 2014). Nos últimos
anos, a presença de frutas desidratadas no mercado tem aumentado
consideravelmente (Vega - Gálvez et al., 2012). Todavia, este crescimento
tem-se verificado não só para atender à procurados consumidores diretos, mas
também para responder às necessidades da indústria de processamento alimentar
para a formulação de novos produtos agroalimentares como snacks, cereais de
pequeno-almoço, entre outros, que incluem a fruta desidratada como ingrediente
(Vega-Gálvez et al., 2012). Em termos económicos, em 2006 a produção de
frutas desidratadas na União Europeia totalizou 1.700 milhões de euros,
correspondentes a 428 mil toneladas, verificando-se que o seu consumo foi
avaliado em 2300 milhões euros e 871 mil toneladas (Mégias-Pérez et al.,
2014). Pelos vários motivos indicados a desidratação tem sido considerada uma
alternativa de valor acrescentado para o aproveitamento da fruta de refugo, e
uma forte aposta no mercado português.
Estudos recentes demonstram que a produção e consumo de alimentos correspondem
entre 10 a 30% do impacto ambiental total de um indivíduo (Stoessel et al.,
2012). Para a obtenção de produtos sustentáveis é essencial avaliar o seu
impacto ambiental e a utilização de recursos, considerando todo o seu ciclo de
vida (Manfredi e Vignali, 2014). De tal forma, a Avaliação do Ciclo de Vida
(ACV) é uma ferramenta indispensável para analisar o impacto ambiental de um
produto ao longo do seu ciclo de vida (Roy et al., 2008). A metodologia de ACV
é regulamentada pela ISO14040 - série de padrões internacionais (ISO14040,
2006). Este método tem sido utilizado em muitos estudos para avaliar a
sustentabilidade da produção de alimentos. Efetivamente os produtos
agroalimentares e seus derivados têm sido frequentemente alvos de estudo (Roy
et al., 2009,Nemecek et al., 2007). No entanto os estudos de ACV realizados têm
avaliado sobretudo a fase de cultivo dos produtos vegetais, dado o seu impacto
sobre o meio ambiente, nomeadamente pela utilização de fertilizantes,
pesticidas, água e energia (Goglio et al., 2012, Cellura et al., 2012,
Abeliotis, et al., 2013). Contrariamente, o impacto associado à fase de
processamento tem sido negligenciado. Poucos estudos têm-se focado nesta fase,
a qual varia entre os diversos países dependendo do seu nível de
industrialização (Karakaya e Özilgen, 2011; Salomone e Ioppolo, 2012) e envolve
a utilização de eletricidade, gás natural, diesele o consumo de água. Além do
mais, é importante considerar todas as causas de impactos ambientais de toda a
cadeia de produção e distribuição, tais como o transporte e o ciclo de vida das
embalagens (Manfredi e Vignali, 2014). No entanto, não existem estudos que
avaliem o impacto da alternativa de valorização de processamento do refugo.
Este estudo consiste na primeira análise de impacto ambiental do refugo da
maçã, desde a sua saída do local de produção até à sua colocação no mercado.
Foram propostos dois cenários como destino do refugo de maçã: venda a retalho e
a desidratação. O objetivo desta investigação consiste na aplicação de uma
metodologia de ACV para efetuar uma avaliação comparativa das entradas e saídas
de massa e energia em cada etapa de produção, da maçã de refugo vendida ao
retalho em superfícies comerciais e da maçã de refugo desidratada para obtenção
de snacks.
Materiais e Métodos
Método de Avaliação de Ciclo de Vida
O ACV consiste em quatro fases principais: definição do objetivo e âmbito,
análise do inventário, avaliação de impactos e interpretação (ISO 14044, 2006).
Cada uma dessas fases encontra-se descrita abaixo com referência ao caso de
estudo em questão.
Definição do objetivo e âmbito
O caso de estudo envolve um sistema de escoamento de refugo da produção de maçã
em que são exploradas duas alternativas com o intuito de aumentar a
rentabilidade agrícola. O objetivo proposto foi atingido através da criação de
uma unidade funcional (UF), selecionando as fronteiras do sistema relevantes e
determinando-se os requisitos de dados, conforme apresentados na Figura_1.
Unidade Funcional
De acordo com a norma UNI EN ISO 14040, a unidade funcional (UF) é definida
como a unidade de referência por meio do qual o desempenho de um sistema de
produto é quantificado numa avaliação do ciclo de vida (ISO 14040, 2006). Esta
unidade de referência denomina-se "funcional", uma vez que está
relacionada com a função do sistema, e possibilita comparações entre diferentes
sistemas de produto que executam a mesma função ou produtos semelhantes que
executam diferentes funções (Milà i Canals e Polo, 2003). A função do sistema é
analisar duas opções distintas de aproveitamento do refugo de maçã comparando
fruta fresca e fruta sujeita ao processo de desidratação. Neste contexto para
que seja possível a comparação entre os diferentes cenários, definiu-se como
unidade funcional 1 ha de exploração de maçã.
Assumiu-se que 1 hectare produz em média 35 toneladas de maçã, em que 15% foi
considerado refugo (5,25 toneladas) por apresentar deformações e um calibre
reduzido. Na definição da UF atendeu-se ao facto do refugo de maçã se tratar de
um subproduto agrícola, e do sistema apresentado ter como objetivo a
valorização do refugo e o aumento da rentabilidade do sistema de produção
frutícola. Segundo Milà i Canals et al. (2006), uma UF de base de massa é
adequada quando se analisam estágios agrícolas do ciclo de vida de uma fruta.
Fronteiras do sistema e considerações
Foram modelados dois cenários. O Cenário 1 (C1) é o destino mais comum do
refugo da maçã, embora não acolha toda a produção que apresente defeitos e de
calibre reduzido, sendo esta por vezes doada para instituições de
solidariedade. No C1 considera-se que toda a fruta de refugo (5,25 toneladas)
produzida por 1 hectare de produção de maçã é encaminhada para o mercado
retalhista para venda em sacos de 1 kg de polietileno de alta densidade (PE-
HD), sendo consideradas as fases de armazenamento e embalamento, incluindo
todas as fases de transporte. O Cenário 2 (C2) consiste no encaminhamento da
maçã de refugo para uma unidade de desidratação, em que o principal objetivo
consiste na produção de snacks de maçã desidratada em porções de 35g embaladas
em polipropileno orientado (OPP). Neste cenário são consideradas as fases de
armazenamento, desidratação, embalamento e todas as fases de transporte. A fase
de consumo não é considerada devido à falta de dados e dificuldade em estimar o
comportamento do consumidor (Manfredi e Vignali, 2014). As infraestruturas
(instalações e equipamentos) também não foram tidas em conta. Sendo ainda de
referir que não foram considerados os impactos na fase de produção agrícola,
por se tratar de um sistema em que são avaliados cenários de valorização de
refugo.
Inventário de ciclo de vida
O inventário de ciclo de vida (ICV) quantifica todos os recursos utilizados,
energia empregue e todas as emissões ambientais associados ao sistema avaliado
(ISO 14040, 2006), pelo que são consideradas todas as entradas e saídas
relevantes para os processos que ocorrem durante o ciclo de vida de um produto.
Os dados de processo para as diferentes etapas foram recolhidos através de
dados publicados em revistas e jornais técnico-científicos e outros resultantes
de inventário próprio. No caso da desidratação da maçã, os dados foram obtidos
através do protótipo de desidratação, que utiliza uma fonte de energia de
biomassa com um rendimento de 70%. No Quadro_1 é descrito o inventário de ciclo
de vida do escoamento da maçã de refugo para os dois cenários modelados. As
saídas dos diferentes cenários modelados são de 5,25 toneladas de maçã fresca
em embalagens de 1kg para o C1 e no caso do C2 de 0,898 toneladas de maçã
desidratada em embalagens de snack de 35g.
Método de avaliação do impacto
A fase de avaliação de impacto é baseada nos dados recolhidos no ICV. Tendo em
conta o consumo de energia e de matérias - primas e as emissões para o
ambiente, efetuou-se a avaliação de impacto com o objetivo de avaliar os
potenciais impactos ambientais do sistema analisado (ISO 14040, 2006) devido à
emissão para efluentes, emissões para o ambiente e consumo de recursos. Foram
adotados três métodos de avaliação de impacto: CML 2 Baseline2001, CML 2001,
Cumulative Energy Demand, CED e Eco-indicador 99H. O CML2001é uma metodologia
de ACV desenvolvida pelo Centro de Ciências Ambientais da Universidade de
Leiden, na Holanda. Referente a este método foram consideradas as seguintes
categorias de impacto: Potencial de Aquecimento Global para o horizonte
temporal de 100 anos (Global Warming Potential - GWP100), Potencial de
Oxidação Fotoquímica (Photochemical Oxidation Potential - POP), Potencial
de Destruição da Camada de Ozono (Ozone Depletion Potential - ODP),
Potencial de Acidificação (Acidification Potential - AP), e Potencial de
Eutrofização (Eutrophication Potential - EP). O segundo método utilizado
é o CED (Cumulative Energy Demand - Exigência de energia cumulativa), publicado
pelo Ecoinvente que calcula a energia utilizada por um sistema expresso em MJ
(Manfredi e Vignali, 2014). O Eco-indicador 99H é um método multifásico cuja
abordagem está orientada para o dano, isto é, de acordo com a ISO corresponde
ao ponto final no mecanismo ambiental. Neste método, uma emissão identificada
no ICV é convertida numa contribuição para a categoria de impacto
multiplicando-a por um fator equivalente (Goedkoop e Spriensma, 2000). As
categorias de impacto são agrupadas em três categorias de dano: Saúde Humana
(SH); Qualidade do Ecossistema (QE) e Recursos (R).
Resultados e Discussão
Os perfis ambientais dos diferentes meios de escoamento e valorização de maçãs
de refugo são apresentados nos Quadros_2 e 3 para os diferentes cenários. Os
resultados são apresentados em termos de impacto ambiental para os dois
cenários modelados com o objetivo de compreender melhor os resultados do estudo
de análise de impacto (Figura_2). Estes foram organizados dividindo o sistema
em quatro fases: Transporte (inclui todas as deslocações), Armazenamento,
Desidratação e Embalagem, apresentando-se simultaneamente o valor total de
impacto.
De entre os cenários modelados, o C1 apresenta os maiores valores de impacto
ambiental das várias categorias analisadas. A única exceção verifica-se para a
categoria QE analisada através do método Eco-indicador 99H. A qualidade do
ecossistema engloba as seguintes categorias de impacto: Mudanças climáticas;
Radiação; Destruição da Camada do Ozono; Ecotoxicidade e Acidificação/
Eutrofização. As categorias de impacto com maior expressão no sistema
analisado, em ordem decrescente, são: CED, GWP 100, R, QE e AP. Os diferentes
cenários foram analisados separadamente para estas categorias de impacto, de
modo a que fosse possível compreender quais as fases que apresentam maior
contribuição em termos de impacto nas categorias selecionadas.
Impacto do escoamento do refugo de maçã para o mercado no estado fresco (C1)
As potenciais contribuições do processo de obtenção de maçã de refugo no estado
fresco em sacos de 1kg, em termos da unidade funcional de 1 hectare de
exploração de maçãs para o CED, GWP 100, R, QE e AP, são representadas para as
diferentes fases do C1 na Figura_3.
Após distribuição dos valores referentes ao impacto total pelas diferentes
fases, é possível observar que o armazenamento é a fase com maior contributo
para as categorias estudadas no C1, contribuindo entre 49 e 72% para todos os
impactos, à exceção da QE em que o contributo é de 34%. A fase de transporte
representa a fase com maior contributo para a QE (61,10%). Relativamente à fase
de embalamento, esta contribui com cerca de 5 a 13% para o impacto das várias
categorias avaliadas.
Impacto do escoamento do refugo de maçã para a obtenção de snacks (C2)
Tal como para o C1, as potenciais contribuições do C2 para a obtenção de maçã
de refugo desidratada em sacos de 35 g, em termos da unidade funcional de 1
hectare de exploração de maçãs encontram-se representadas na Figura_4.
Ao contrário do verificado em C1, as fases com maior contributo para o impacto
são a desidratação (40 - 87%) e o embalamento (48 - 59%). O
embalamento apresenta maior contributo para as categorias de impacto CED e R,
por sua vez, a desidratação apresenta maior impacto para as restantes
categorias. O contributo do transporte varia entre 7 e 12%, e o armazenamento
apresenta um contributo entre 3 e 18%.
Comparação dos diferentes cenários em termos de avaliação dos impactos
Os cenários modelados nesta análise de impacto revelaram-se ótimas alternativas
para o aumento do rendimento frutícola. Contudo, a desidratação permite não só
aumentar o tempo de vida útil da fruta, como permite uma redução de volume
substancial, que facilita o transporte e armazenamento (Vega-Gálvez et al.,
2012), sendo verificada a diminuição dos impactos destas fases no C2 em relação
ao C1. Ao contrário do que acontece em C1, o armazenamento refrigerado das
maçãs de refugo ocorre durante um período de tempo bastante menor. Após
chegarem à unidade de processamento o refugo é apenas armazenado durante o
tempo necessário para ser submetido à desidratação. Este menor tempo traduz-se
numa redução substancial dos impactos do armazenamento, de 49 a 72% (C1) para 3
a 18% (C2).
Relativamente à fase de transporte, os menores impactos no C2 estão
relacionados com o menor número de deslocamentos necessários e com o menor
volume de produto final (0,898 toneladas). Pelo contrário, no C1 o escoamento
total da maçã de refugo implica um maior número de viagens.
O maior contributo para os impactos ambientais da fase de embalamento no C2 em
relação ao C1 deve - se ao tipo de filme utilizado nas embalagens. A
utilização do polipropileno orientado na amostra desidratada vai de encontro às
maiores exigências de proteção contra a humidade, oxigénio, perda de cor e de
aromas voláteis. Durante o armazenamento e distribuição a fruta desidratada
está exposta a uma grande variedade de condições ambientais como alta
temperatura, humidade, oxigénio e luz. Estas podem desencadear vários
mecanismos de reação, conduzindo à degradação da fruta e à perda de
antioxidantes alterando de tal forma o produto que este possa ser rejeitado
pelo consumidor ou mesmo tornar-se prejudicial (Henríquez et al., 2013). O
polipropileno orientado apresenta maiores impactos ambientais que o polietileno
de alta densidade em parte devido ao seu maior peso. Uma das estratégias para
minimizar o impacto ambiental da embalagem envolve a redução na quantidade de
material utilizado - embalagem mais fina (Barlow e Morgan, 2013). Outra opção é
a utilização de filmes mais ecológicos, que sejam de materiais de base
biológica, evitando como tal o uso de materiais produzidos a partir de recursos
não renováveis (Macedo et al., 2013). Os filmes NatureFlex® à base de celulose
feita a partir da polpa de madeira renovável constituem uma excelente
alternativa para a redução dos impactos ecológicos, permitindo adicionalmente o
controlo da permeabilidade à humidade necessário em produtos desidratados
(http://www.innoviafilms.com/). A eficiência dos filmes NaturFlex® no
embalamento de produtos secos como a granola apresentou resultados bastantes
satisfatórios em relação ao tempo de prateleira do produto (Macedo et al.,
2013). Como tal, estes filmes surgem como uma opção viável de forma a reduzir
os contributos para os impactos ambientais da fase de embalamento verificada em
C2.
O consumo de eletricidade e gás natural são aspetos importantes a serem
considerados em termos de impactos ambientais. Alguns estudos afirmam que a
eletricidade proveniente de fontes não fósseis, como os sistemas fotovoltaicos,
podem representar uma economia significativa em comparação com os sistemas
tradicionais de produção de energia (Peng et al., 2013). Neste sistema, a
utilização de uma fonte de energia de biomassa com um rendimento de 70% no
protótipo de desidratação permitiu que os impactos ambientais fossem muito
menos pronunciados. Porém, a utilização de um sistema combinado em que se
recorra a sistemas fotovoltaicos e à biomassa poderá ser uma alternativa para
reduzir significativamente os impactos ambientais da desidratação, cujo
contributo é principalmente evidente na categoria QE.
Conclusões
No sentido de avaliar as alternativas de escoamento de maçã de refugo
existentes, foi efetuada uma análise de ciclo de vida considerando dois
cenários: Maçã Fresca (C1) e Maçã Desidratada (C2). Ao aplicar a metodologia de
ACV foram considerados os consumos energéticos e de matérias - primas, as
emissões para o ambiente e o consumo de recursos, de modo a executar uma
avaliação dos potenciais impactos ambientais do sistema analisado. O cenário C2
apresentou um menor contributo para todas as categorias analisadas, a exceção
da categoria QE. Este maior impacto está relacionado essencialmente com a fase
de desidratação que não existe no cenário alternativo. O recurso a painéis
fotovoltaicos poderá ser uma opção para reduzir este impacto.
O cenário C2 revelou ser a melhor opção tendo em conta o menor contributo das
fases de transporte e armazenamento. Em contrapartida, no C1 existe uma maior
necessidade de deslocamentos para que todo o refugo seja escoado, assim como um
maior tempo de armazenamento devido à menor taxa de escoamento do produto
fresco.
O tipo de filme utilizado no embalamento provoca um elevado impacto desta fase
no cenário C2, o que implica processos de otimização de forma a reduzir estes
efeitos. A substituição de materiais produzidos a partir de recursos não
renováveis por matérias de base biológica, como os filmes NatureFlex® poderá
ser uma escolha viável.
Em suma, o cenário da desidratação da maçã de refugo revelou menores impactos
ambientais, apresentando-se como uma excelente alternativa para aumentar a
rentabilidade agrícola da produção frutícola. Adicionalmente, a fruta
desidratada apresenta-se como um produto de valor acrescentado, permitindo o
fornecimento de nutrientes e compostos promotores de saúde. A perecibilidade da
fruta fresca condiciona o tempo de prateleira desta, assim como aumenta as
possíveis perdas ao longo de todo o sistema de escoamento. Deste modo, a fruta
desidratada surge como um produto nutritivo de maior conveniência e
durabilidade. Um estudo económico poderá ser uma mais-valia, de modo a avaliar
a rentabilidade dos dois cenários. Todavia, este estudo representa um ponto de
partida de incentivo a um maior processamento de subprodutos frutícolas por
técnicas de desidratação. Apresentando a desidratação como uma metodologia
sustentável e economicamente viável.