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EuPTCVHe0870-90252011000100006

EuPTCVHe0870-90252011000100006

variedadeEu
Country of publicationPT
colégioLife Sciences
Great areaHealth Sciences
ISSN0870-9025
ano2011
Issue0001
Article number00006

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Impacto do cancro do osso e tecidos moles no ajustamento emocional e qualidade de vida

Introdução Desde os últimos 30 anos tem crescido o interesse em avaliar o impacto específico não médico da doença crónica, em geral, e da doença oncológica, em particular 1-3. Este interesse resulta do reconhecimento de que o impacto do cancro não deve ser reduzido aos seus efeitos biofisiológicos mas sim entendido numa vertente mais ampla, olhando para as limitações que a doença poderá impor nas diferentes áreas de vida do indivíduo 4-9. É neste sentido que uma atenção crescente tem vindo a ser dirigida à avaliação de problemas de ajustamento, morbilidade psicossocial e distress psicológico que podem resultar da doença e do seu tratamento 10 e que a QdV começa a ser aceite como uma importante medida em oncologia 11-13.

Os doentes com cancro manifestam normalmente compromissos no funcionamento físico e psicológico e vivenciam perdas e sintomas adversos 14-16. Problemas específicos tais como dor intensa e prolongada, compromissos funcionais e vocacionais, alterações da imagem corporal, dificuldades sexuais e isolamento social são consequências negativas que habitualmente surgem associadas à doença oncológica e seus tratamentos 17-20. O impacto psicossocial do cancro e a sua associação a uma QdV diminuída deve-se portanto às consequências físicas, psicológicas e sociais que resultam do diagnóstico, da própria doença e do seu tratamento, as quais comprometem o ajustamento individual e bem-estar dos doentes 15,16,21,22.

Diversos estudos sobre as implicações do cancro no ajustamento psicossocial utilizam amostras de doentes com patologia oncológica diversificada e em diferentes fases da doença. Algumas investigações têm-se centrado, no entanto, em neoplasias malignas específicas e/ou em períodos particulares da trajectória do cancro, embora muitas vezes evidenciando resultados inconsistentes. Em doenças oncológicas mais raras este tipo de estudos são escassos, assim como aqueles que tenham procurado comparar o distress emocional e QdV em diferentes momentos da experiência da doença.

Após o diagnóstico e antes do início dos tratamentos têm sido encontrados compromissos em diferentes domínios da QdV quer em doentes com cancro da mama quer em amostras que incluem diferentes tipos de cancro 23,24. O distress experienciado no momento do diagnóstico é geralmente agudo e transitório, estimando-se que cerca de 50 % dos doentes exibem sintomas de ansiedade e depressão temporários em resposta à notícia da doença. Em 30 % dos casos identificam-se distúrbios de ajustamento com humor ansioso ou deprimido mas a presença de depressão major e de outra sintomatologia psicopatológica mais grave não é comum nesta fase da doença 25,26. Couzijn e colaboradores 17referem que uma percentagem entre 20 % e 33 % parece ser uma indicação realista da morbilidade psicológica na fase de diagnóstico. Alguns estudos não encontraram diferenças significativas nos níveis de depressão e ansiedade entre doentes oncológicos e controlos saudáveis, pouco tempo após o diagnóstico, embora num número substancial de pacientes se tenham verificado elevados valores de sintomatologia depressiva e ansiosa 27,28. Outros constataram sintomas ansiosos e depressivos moderadamente elevados no momento do diagnóstico 29.

Uma pior QdV global, física e mental, um intenso experienciar de sintomas (e.g.

dor, dispneia, distúrbios do sono, perda de apetite) e compromissos ao nível do trabalho, actividades de lazer e tarefas domésticas têm sido observados em doentes oncológicos a receberem tratamento 30-32. Adicionalmente, estudos recentes em doentes com diferentes tipos de cancro indicam prevalências de distress emocional significativo até cerca de 1/3 e, mais especificamente, incidências de ansiedade que variam entre 17 % e 27,2 % e depressão entre 6 % e 19,6 % 33-35. No estudo de Weidner e colaboradores 32 mulheres com cancro ginecológico a receberem tratamento exibiram maiores níveis de ansiedade e depressão comparativamente a mulheres da população normal. Contudo, também no grupo clínico estes níveis de distress emocional encontravam-se abaixo do ponto de corte para os"caseness".Resultados similares foram encontrados por Thuné- Boyle, Myers e Newman 36 em doentes com vários tipos de neoplasia maligna a receberem quimioterapia.

Em sobreviventes de cancro livres de doença, ou seja, em indivíduos que se encontram na fase após o término dos tratamentos e que não apresentam evidência de neoplasia maligna 37, a maioria das investigações tem revelado uma boa QdV global, não diferindo da percepção de QdV de indivíduos da população geral saudável, ou sendo mesmo melhor. Contudo, limitações físicas e funcionais, condições de saúde comórbidas, preocupações diversas relacionadas com a doença e os seus tratamentos, dificuldades sexuais, dificuldades nas actividades de lazer, domésticas e no trabalho e distress emocional com sintomas depressivos e ansiosos têm sido descritos nesta fase de follow-up 38-40. A maioria dos estudos tem revelado baixos níveis de distress psicológico em sobreviventes pós-tratamento e similares aos manifestados por controlos saudáveis 29,41,42.

Grande parte dos doentes parece exibir portanto um padrão de humor normal, estando bem ajustados 43.

Alguns estudos que compararam o ajustamento emocional em diferentes fases da trajectória do cancro, incluindo longitudinais, revelam que o distress psicológico é mais elevado no momento de diagnóstico e tratamento comparativamente ao período pós-tratamentos 28,29,44-46.

Doentes diagnosticados com sarcoma, uma neoplasia maligna primária relativamente rara que se desenvolve no osso e tecidos moles conjuntivos, são um grupo bastante incapacitado e vulnerável ao desenvolvimento de dificuldades psicossociais 47. Para além dos riscos que normalmente estão associados a este tipo de cancro (restrição permanente na mobilidade, funcionamento físico reduzido, perda de um membro, desfiguramento físico), são também frequentes alguns efeitos adversos que incluem dor crónica e intensa, fracturas dos ossos, défices neurológicos e actividade física reduzida, que acarretam um compromisso global na QdV dos doentes 48-51.

O diagnóstico de sarcoma requer muitas vezes regimes de tratamento intensivos que implicam longos períodos de internamento, elevadas doses de quimioterapia e cirurgias extensas que podem resultar em perda temporária de mobilidade, amputação de um membro e necessidade de programas de reabilitação complexos 52- 54. Com efeito, os doentes podem viver com sequelas físicas e compromissos funcionais significativos, resultando num distress emocional e social persistente 52,54,55.

Apesar de serem reconhecidas as consequências negativas do cancro do osso e tecidos moles, a literatura acerca do ajustamento psicossocial e QdV destes doentes é escassa e foca-se essencialmente nas sequelas físicas e funcionais que resultam da doença e dos seus tratamentos. Para além do mais, a grande maioria dos estudos tem sido conduzida em sobreviventes livres de doença, pelo que pouco se conhece acerca da adaptação de doentes que se encontram noutras fases da doença (e.g.: no momento do diagnóstico ou durante os tratamentos).

Grande parte das investigações na fase pós-tratamentos revela uma boa QdV geral em sobreviventes de sarcoma, embora possam existir compromissos no domínio físico 56-59. Resultados funcionais positivos, bom funcionamento social e emocional e mesmo um bom funcionamento físico foram também encontrados por alguns estudos em doentes no período de follow-up, se bem que estes manifestassem alguns problemas de mobilidade e dificuldades a nível laboral 47,60.

Aksnes e colaboradores 52, numa amostra de sobreviventes de tumores ósseos das extremidades, não verificaram diferenças no distress emocional em relação a indivíduos da população geral e Felder-Puig e colaboradores 47 constataram que aproximadamente 80 % dos sobreviventes de sarcoma revelavam apenas problemas psicossociais menores e não significativos. Resultados em certa medida contraditórios são revelados por duas pesquisas que evidenciam prevalências elevadas de distress emocional crónico nestes sobreviventes (cerca de 77 %), sugerindo um elevado risco para o desenvolvimento de consequências psicológicas adversas e persistentes 61,62.

Como anteriormente mencionado, a literatura que procure avaliar e comparar o ajustamento emocional e QdV de doentes que se encontram em diferentes fases da experiência do cancro continua a ser escassa, assim como os estudos em doentes com neoplasias malignas mais raras que, não obstante, têm importantes implicações para o seu bem-estar. Existe portanto a necessidade de se desenvolverem estudos em tipos de cancro com menor incidência, como seja o cancro do osso e tecidos moles, de modo a se poder conhecer e compreender as suas consequências emocionais e nas diferentes áreas de vida do doente.

O presente trabalho teve como principais objectivos i) avaliar a prevalência e níveis de ansiedade e depressão em doentes com sarcomas na fase de diagnóstico, tratamento e follow-up; ii) examinar a sua QdV nas três fases da doença e iii) comparar o distress emocional e QdV nos três momentos da trajectória do cancro do osso e tecidos moles.

Com base na revisão da literatura efectuada noutros tipos de cancro e na experiência clínica, foram colocadas algumas hipóteses relativas aos objectivos deste trabalho. Nas três fases da doença esperava-se encontrar uma maior prevalência de indivíduos com sintomas esperados, normais e não significativos de distress emocional (ansiedade e depressão). Esperava-se também observar uma incidência significativa de ansiedade e depressão clínicas nas diferentes fases e superior à observada em indivíduos da população geral, sobretudo no momento do diagnóstico e durante os tratamentos. Doentes na fase de diagnóstico e a receberem tratamento eram esperados apresentarem maiores níveis de ansiedade e depressão comparativamente a indivíduos da população geral. No momento do diagnóstico hipotetizamos encontrar os maiores níveis de distress emocional, seguindo-se a fase de tratamento e de follow-up.

Quanto à QdV, esperava-se que esta se encontrasse diminuída nos domínios físico e psicológico, bem como relativamente ao funcionamento de papéis, cognitivo e social, na fase de diagnóstico e de tratamento. Um maior relato de sintomas e uma pior percepção de QdV são também esperados nestas duas fases. Doentes a receberem tratamento são esperados manifestar uma pior QdV no domínio físico, assim como uma maior experiência de sintomas, comparativamente a doentes no momento do diagnóstico. Em sobreviventes de sarcomas espera-se encontrar uma boa QdV global, embora o domínio físico se encontre comprometido.

Participantes Neste estudo de desenho transversal foi usada uma amostra constituída por um grupo clínico e por um grupo de controlo, num total de 254 sujeitos.

Relativamente aos doentes diagnosticados com sarcoma, 55 estavam na fase de diagnóstico, 55 na fase de tratamento e 74 na fase de follow-up ou sobrevivência livre de doença. O grupo de controlo era composto por 70 indivíduos pertencentes à população geral que não apresentavam história de doença oncológica ou de outra doença crónica.

Na tabela 1 são descritas as características sócio-demográficas da amostra. O teste de χ2 de Pearson revela diferenças significativas entre os grupos em relação ao género.

Tabela_1 - Características sócio-demográficas da amostra

Quanto às características clínicas, nos três grupos de doentes observou-se uma maior prevalência de sarcomas de tecidos moles das extremidades inferiores.

Para os sujeitos na fase de diagnóstico e de tratamento o tempo médio desde o diagnóstico foi de 4,6 meses e 9 meses, respectivamente. A maioria dos doentes no período do diagnóstico encontrava-se internada na altura da avaliação (75,5 %), aguardando o inicio do protocolo terapêutico. Apenas 10 doentes (18,2 %) eram recorrentes/recidivantes. A maior parte dos doentes em tratamento estava também hospitalizada aquando da avaliação (65,5 %), sendo que 76,4 % encontrava-se a receber quimioterapia. Para 41,8 % dos doentes este tinha sido o único tratamento recebido até ao recrutamento e, de entre aqueles que foram submetidos a intervenção cirúrgica (52,6 %), 82,8 % não realizaram cirurgia de amputação. Vinte doentes (36,4 %) encontravam-se em tratamento para uma recidiva da doença. O tempo médio desde o início dos tratamentos até à avaliação foi de 7,3 meses.

De entre os doentes que haviam terminado os tratamentos, 85,2 % tinham realizado cirurgia e destes, 55,5 % foram ainda submetidos a tratamentos complementares de quimioterapia e/ou radioterapia neo-adjuvante ou adjuvante.

Apenas 8,2 % dos doentes na fase de follow-up apresentavam uma amputação e 9 (12,2 %) doentes receberam tratamento para uma recidiva da doença. O tempo médio decorrido entre o término dos tratamentos e a avaliação foi de 54,2 meses.

Material Questionário sócio-demográfico e clínico Para a recolha dos dados sócio-demográficos e clínicos recorreu-se a um questionário de informação pessoal e médica desenvolvido especificamente para este estudo.

Os dados clínicos foram recolhidos por intermédio da informação fornecida pelos participantes e seus médicos e também com recurso à consulta de processos clínicos, nas instituições hospitalares onde este procedimento foi permitido.

Hospital Anxiety and Depression Scale (HADS) A Hospital Anxiety and Depression Scale 63 é uma medida de triagem para a ansiedade e depressão, com utilização em contextos hospitalares. É composta por duas sub-escalas cotadas separadamente: uma que avalia a ansiedade, constituída por 7 itens; outra que avalia a depressão, também com 7 itens. Cada item está formulado para uma escala de resposta de tipo Likert com 4 pontos (0-3).

Segundo o manual da HADS, um valor entre 0 e 7 é "normal", entre 8 e 10 é "ligeiro", entre 11 e 14 é "moderado" e entre 15 e 21 é "severo", quer para a ansiedade, quer para a depressão. Snaith 64 sugere um valor igual ou superior a 11 como sendo indicativo da provável presença de um distúrbio de humor ("caseness") e um valor entre 8 e 10 como sendo apenas sugestivo da presença do respectivo estado.

A versão portuguesa da HADS 65 revelou um coeficientealpha de Cronbach de .82 quer para a escala de ansiedade quer de depressão, na presente amostra.

World Health Organization Quality of Life Assessment (WHOQOL-Bref) O WHOQOL-Bref 66 é uma medida subjectiva e multidimensional destinada à avaliação da QdV de indivíduos saudáveis ou não saudáveis. É composto por 26 itens que representam 24 facetas específicas, avaliadas por uma questão, e uma faceta sobre QdV em geral, avaliada por um item relativo à QdV global e outro sobre a percepção geral da saúde. As 24 facetas específicas organizam-se em 4 domínios: Físico, Psicológico, Relações Sociais e Ambiente. Para cada um dos domínios a pontuação varia entre 0 e 100, sendo que valores mais elevados correspondem a uma melhor percepção de QdV.

Na presente amostra os coeficientes de consistência interna da versão Portuguesa do WHOQOL-Bref 67 variaram entre .61 e .88 para os domínios considerados individualmente. Para a faceta geral encontrou-se um valor de consistência interna de .70.

European Organization for Research and Treatment of Cancer Quality of Life Questionnaire Core-30, version 3.0 (EORTC QLQ C-30, v.3.0).

O EORTC QLQ C-30 68é um questionário de auto-relato que reflecte a multidimensionalidade do construto de QdV, sendo considerado apropriado para ser usado com doentes oncológicos desde o momento do diagnóstico até à sobrevivência de longo prazo. Os seus 30 itens dividem-se por 5 escalas funcionais (funcionamento físico; funcionamento de papeis; funcionamento emocional; funcionamento cognitivo e funcionamento social); 1 escala de estado de saúde/QdV global; 3 escalas de sintomas (fadiga, náuseas e vómitos e dor) e 6 itens isolados/únicos que se destinam a avaliar sintomas adicionais normalmente relatados por doentes com cancro (dispneia; insónia; perda de apetite; obstipação e diarreia) e a percepção do impacto financeiro da doença e seus tratamentos. Todos os itens são cotados numa escala de tipo Likert de 4 pontos, excepto os dois itens que compõem a escala de estado de saúde/ QdV global, os quais são cotados usando uma escala analógica linear de 7 pontos.

A pontuação para todas as escalas, incluindo as de um único item, varia entre 0 e 100. Um valor mais elevado para as escalas funcionais e para a escala de estado de saúde/QdV global representa um melhor/mais saudável nível de funcionamento ou QdV. Uma pontuação superior nas escalas de sintomas ou de um único item representa um maior nível de sintomatologia ou problemas.

A versão Portuguesa do QLQ C-30 69 evidenciou coeficientesalphade Cronbach entre .60 e .92 para as escalas multi-item.

Procedimento Doentes recentemente diagnosticados com sarcoma, que estavam a realizar tratamento ou que se encontravam em consultas de seguimento no IPO de Coimbra, IPO do Porto e Serviço de Ortopedia B - Unidade de Tumores do Aparelho Locomotor - dos HUC, foram recrutados para participar no presente estudo. Como critérios de inclusão para a constituição do grupo correspondente à fase de diagnóstico considerou-se: i) ter recebido o diagnóstico de tumor maligno primário do osso ou tecidos moles, independentemente da sua localização e ii) ainda não ter iniciado qualquer tratamento. Para o grupo de doentes na fase de tratamento foram tidos com critérios de inclusão: i) início dos tratamentos pelo menos 1 mês, independentemente do tipo de tratamento e ii) estar a receber tratamento para um diagnóstico de sarcoma. Relativamente à fase de follow-up considerou-se como critérios de inclusão neste grupo: i) ter recebido tratamento para um diagnóstico de sarcoma; ii) ter realizado pelo menos uma consulta de seguimento e iii) inexistência de evidência de doença nos últimos exames de controlo efectuados. Foram excluídos os doentes com antecedentes oncológicos de outro tipo de cancro, com doença em estadio avançado, com menos de 18 anos e que não apresentassem condições físicas e mentais para poderem responder ao protocolo de avaliação.

Após aprovação do estudo pelos Conselhos de Administração e Comissões de Ética das instituições hospitalares mencionadas, deu-se início ao procedimento de recolha da amostra. Os doentes na fase de diagnóstico foram abordados depois de receberem a notícia da doença. Este contacto foi efectuado em contexto de ambulatório, após a consulta de transmissão do diagnóstico, e também no internamento enquanto os doentes aguardavam o início dos tratamentos. Dos 63 indivíduos abordados, 2 recusaram participar no estudo e 6 não entregaram o protocolo de avaliação. Para 1 doente a aplicação do protocolo de avaliação foi administrada pelo entrevistador, em virtude de a sua condição de saúde não permitir a leitura e resposta ao questionário, e para 2 doentes essa aplicação foi assistida pelo entrevistador, por dificuldade do participante em entender o significado de algumas questões. Os doentes a realizar tratamento foram avaliados quando estavam internados, durante o ambulatório ou no período entre dois ciclos de quimioterapia. Oito não devolveram os questionários e 2 recusaram a participação no estudo. Para 3 dos doentes em tratamento, o protocolo de avaliação foi administrado pelo investigador, na medida em que não apresentavam condições de ler e responder aos questionários, em virtude da sua condição de saúde, particularmente dificuldades de mobilidade. Para 4 doentes, a administração foi assistida pelo investigador uma vez que apresentaram dificuldade em compreender algumas questões. Os sobreviventes livres de doença, que haviam terminado os tratamentos, foram contactados pelo investigador aquando da consulta de seguimento. Oitenta e quatro doentes foram abordados mas 10 não devolveram os respectivos questionários. Para todos os participantes na fase de follow-up a aplicação do protocolo de avaliação foi auto-administrada.

Todos os sujeitos foram informados acerca dos objectivos do estudo e aqueles que aceitaram participar assinaram o respectivo consentimento informado.

Simultaneamente ao recrutamento do grupo clínico, procedeu-se também à recolha dos dados de indivíduos da população geral. Estes não deveriam apresentar história de doença oncológica ou outra doença crónica, tendo sido excluídos aqueles que não responderam negativamente às seguintes quatro questões: i) Está actualmente doente?; ii) Tem alguma doença crónica?; iii) Toma alguma medicação de forma regular? e iv) Consultou um médico ou profissional de saúde no último mês?.

Análises estatísticas Para o tratamento estatístico e análise dos dados recorreu-se ao programa estatístico SPSS, v.17.0(Statistical Package for the Social Sciences, version 17.0).Utilizaram-se estatísticas descritivas (frequências e médias) para a caracterização demográfica e clínica da amostra e para examinar as prevalências de ansiedade e depressão nos diferentes grupos. Para analisar a homogeneidade entre os grupos em termos das características sócio-demográficas, efectuou-se uma análise univariada da variância(ANOVA), seguida dos testesPost-Hoc de Bonferroni ajustados para p < 0,008 e usou-se o teste de qui-quadrado de Pearson. Este teste foi ainda usado para a comparação dos grupos relativamente às prevalências de ansiedade e depressão. As análises de poder demonstraram que a amostra permitia detectar efeitos médios e grandes (w = 0,25, p < 0,05;poder = 0,79, G*Power) 70. Medidas de efeito (V) são apresentadas para as análises.

Análises multivariadas da covariância(MANCOVAs) foram realizadas para examinar diferenças entre os grupos nos níveis de ansiedade e depressão, assim como na QdV, controlando a influência de eventuais variáveis parasitas (covariáveis).

As análises de poder evidenciaram que a amostra era suficiente para a detecção de efeitos pequenos, quer nas análises multivariadas para a ansiedade e depressão (f 2 = 0,03, p < 0,05;poder = 0,82, G*Power) 70, quer para a QdV (f 2 = 0,09, p < 0,05;poder = 0,84, G*Power) 70. São apresentadas medidas de efeito (ηp 2) para as análises efectuadas.

Para averiguar o efeito univariado da variável independente em cada um dosoutcomese examinar a natureza das diferenças entre os grupos, efectuaram-se seguidamente análises univariadas da covariância(ANCOVAs) e testesPost-Hoc usando o ajustamento de Bonferroni para múltiplas comparações (p < 0,008 e p < 0,02). As análises de poder mostraram que, quer no que respeita à ansiedade e depressão, quer em relação à QdV, a amostra era suficiente para detectar efeitos pequenos (f = 0,22, p < 0,05;poder = 0,82, G*Power) 70. Apresentam-se também as medidas de efeito (ηp 2) para as análises.

Em todas as análises foi considerado um nível de significância abaixo de .05, excepto nos casos em que foi usada a correcção de Bonferroni.

Resultados Prevalência de ansiedade e depressão nas diferentes fases da doença Na tabela 2 encontram-se as prevalências relativas aos diferentes graus de severidade de ansiedade e depressão nas três fases da doença e no grupo de controlo.

Tabela_2 - Prevalências de ansiedade e depressão

Na fase de diagnóstico, tratamento e follow-up a maioria dos doentes manifesta um grau normal ou ligeiro de ansiedade e apenas uma minoria exibe sintomas moderados ou severos. Prevalências similares são encontradas para o grupo de controlo. Considerando o ponto de corte de 11, na escala de ansiedade da HADS, como indicativo da provável presença de um distúrbio do humor 64, constatou-se na fase de diagnóstico uma maior prevalência de casos de ansiedade clínica (29,6 %), seguida pela fase de tratamento (26,4 %) e follow-up (25 %) e pelo grupo de controlo (20 %). O teste de χ2 de Pearson não revelou a existência de diferenças significativas entre os grupos [χ2(9, N = 249) = 9,135;p = 0,425;V = 0,111].

Também nas três fases da doença, constatou-se que a grande parte dos indivíduos apresenta sintomas depressivos normais ou ligeiros e apenas uma pequena percentagem manifesta um grau moderado ou severo de depressão. O mesmo se verifica para o grupo de controlo. Considerando igualmente para a escala de depressão da HADS o ponto de corte de 11, constata-se na fase de tratamento a maior prevalência de casos de depressão clínica (22,6 %), seguida pela fase de diagnóstico (17 %) e pelo grupo de controlo (10,1 %). Na fase de follow-up, 8,3 % dos doentes exibe níveis de depressão clinicamente significativos. Para as prevalências de depressão foram encontradas diferenças significativas entre os grupos [χ2(9, N = 247) = 24.144;p = 0,004;V = 0,181].

Níveis de ansiedade e depressão nas diferentes fases da doença Na análise multivariada da covariância (MANCOVA), a variável género foi introduzida como covariável.

Os testes multivariados revelaram-se significativos para a covariável género [Hotteling's Trace = 0,028; F(2,236) = 3,344;p = 0,037; ηp 2 = 0,028], tendo sido encontradas diferenças com significação estatística nos níveis de ansiedade [F(1,237) = 5,638;p = 0,018; ηp 2 = 0,023] e depressão [F(1,237) = 5,490;p = 0,020; ηp 2 = 0,023]. Especificamente, as mulheres evidenciam maiores níveis de ansiedade e depressão comparativamente aos homens.

Para a variável tipo de grupo foi encontrado também um efeito multivariado significativo [Pillai's Trace = 0,078; F(6,474) = 3,204;p = 0,004; ηp 2 = 0,039]. Nomeadamente, os resultados do quadro 3 demonstram diferenças significativas entre os grupos nos níveis de depressão [F(3,237) = 4,443;p = 0,005; ηp 2 = 0,053] e, particularmente, entre os doentes na fase de tratamento e aqueles que se encontram na fase de folow-up. Estes últimos relatam menores níveis de depressão (tabela 3).

Tabela_3 - Efeito do tipo de grupo nos níveis de ansiedade e depressão (MANCOVA)

Constata-se ainda que as pontuações médias na escala de ansiedade e de depressão da HADS, para os três grupos clínicos e para o grupo de controlo, se encontram abaixo do ponto de corte de 11.

Qualidade de vida nas diferentes fases da doença Em relação à QdV controlou-se igualmente a eventual influência da variável género, na análise do efeito multivariado do tipo de grupo.

Os resultados da comparação entre os grupos nos diferentes domínios e faceta geral do WHOQOL-Bref encontram-se na tabela 4. Relativamente ao género, os testes multivariados revelaram-se estatisticamente significativos [Hotteling's Trace = 0,063; F(5,232) = 2,943;p = 0,013; ηp 2 = 0,060]. Mais especificamente, as mulheres relataram uma pior percepção de QdV nos domínios psicológico [F (1,236) = 12,152;p = 0,001; ηp 2 = 0,049] e ambiente [F(1,236) = 7,273;p = 0,008; ηp 2 = 0,030] comparativamente aos homens.

Tabela_4 - Efeito do tipo de grupo nos diferentes domínios e faceta geral do WHOQOL-Bref (MANCOVA)

Um efeito multivariado com significância estatística foi igualmente encontrado para o tipo de grupo [Pillai's Trace = 0,441;F(15,702) = 8,062;p < 0,001; ηp 2 = 0,147]. A comparação de médias entre os grupos revelou diferenças significativas no domínio físico [F(3,236) = 19,771;p < 0,001; ηp 2 = 0,201] e QdV geral [F(3,236) = 20,112;p < 0,001; ηp 2 = 0,204], tendo os doentes na fase de diagnóstico e tratamento evidenciado piores pontuações comparativamente aos doentes na fase de follow-up e aos controlos saudáveis.

Na tabela 5 apresentam-se os resultados relativos ao efeito da variável tipo de grupo na QdV, controlando a influência do género e considerando as pontuações obtidas no QLQ C-30.

Tabela_5 - Efeito do tipo de grupo nas diferentes escalas do QLQ C-30 (MANCOVA)

A análise multivariada da covariância não revelou um efeito significativo da variável género nas diferentes escalas do instrumento [Hotteling's Trace = 0,127;F(15,143) = 1,211;p = 0,270; ηp 2 = 0,113].

Relativamente ao tipo de grupo encontrou-se um efeito multivariado com significância estatística [Pillai's Trace = 0,564;F(30,288) = 3,766;p < 0, 001; ηp 2 = 0,282]. Mais especificamente, verificaram-se diferenças significativas entre as fases da doença em todas as escalas do instrumento, excepto na escala Dificuldades Financeiras. Os doentes na fase de tratamento relataram piores pontuações de QdV nas cinco escalas funcionais do QLQ C-30, um pior estado de saúde e QdV global e uma maior experiência de fadiga, náuseas e vómitos, dispneia e perda de apetite comparativamente aos doentes na fase de follow-up.

Os doentes na fase de diagnóstico revelaram um pior funcionamento de papéis, um pior funcionamento social e um pior estado de saúde e QdV global, bem como uma maior experiência de dor e diarreia, também em relação aos doentes na fase de follow-up. Na escala de Funcionamento Social os doentes na fase de diagnóstico obtiveram melhores pontuações de QdV comparativamente aos doentes na fase de tratamento.

Embora as análises univariadas tenham evidenciado um efeito significativo do tipo de grupo nas escalas Insónia [F(2,157) = 3,354;p = 0,037; ηp 2 = 0,041] e Obstipação [F(2,157) = 3,480;p = 0,033; ηp 2 = 0,042], os testes post-hoc ajustados parap < 0,02 não revelaram diferenças significativas entre os grupos.

Discussão No presente estudo procurou-se examinar o impacto emocional e na QdV do cancro do osso e tecidos moles. Mais especificamente, foram avaliadas as prevalências e níveis de ansiedade e depressão na fase de diagnóstico, tratamento e follow- up e comparada a QdV entre doentes que se encontravam nestas diferentes fases da trajectória da doença.

Como esperado, os resultados sugerem que, de um modo geral, os doentes com sarcomas nas diferentes fases da doença apresentam níveis de ansiedade e depressão sem relevância clínica. A grande maioria dos doentes parece portanto manifestar sintomas de distress emocional esperados, normais e não significativos, pelo que o impacto emocional do cancro do osso e tecidos moles não deve ser sobrestimado em diferentes momentos da experiência da doença.

Estes dados estão em consonância com o consenso geral de que para a maior parte dos doentes com cancro as respostas emocionais iniciais não evoluem para problemas psicológicos clinicamente significativos, mas são sim reacções comuns, transitórias e adaptativas, que se enquadram num processo normal de ajustamento 71-77.

Contudo, observou-se também que uma minoria importante de doentes, nas diferentes fases da doença, manifestou níveis elevados de distress emocional.

Embora as diferenças encontradas não se tenham revelado estatisticamente significativas, principalmente em relação à ansiedade, estas prevalências de distress emocional com relevância clínica foram superiores às observadas nos indivíduos da população geral, sobretudo na fase de diagnóstico e de tratamento. Estes resultados vão de encontro à hipótese inicialmente formulada e são coerentes com as prevalências que têm sido indicadas por diversos estudos em doentes oncológicos e em distintos momentos da trajectória da doença 17,25,33-35,44, sugerindo que o impacto emocional do cancro também não deve ser desvalorizado.

Doentes com sarcoma que se encontram no momento do diagnóstico, a realizarem tratamento e no período pós-tratamento parecem manifestar, de um modo geral, um ajustamento emocional comparável ao de indivíduos saudáveis. Esta constatação não era esperada, particularmente na fase de diagnóstico e tratamento, mas é compreensível atendendo ao facto de que a maioria dos doentes, nas diferentes etapas da doença, revela somente um grau normal ou ligeiro de ansiedade e depressão. Por sua vez, ela vai de encontro ao que é referido por alguns autores, nomeadamente que as implicações psicológicas do cancro parecem ter sido sobrevalorizadas em investigações anteriores 25,77. Alguns estudos têm também encontrado poucas ou nenhumas diferenças entre doentes oncológicos e indivíduos com doenças benignas ou controlos da população geral em relação ao ajustamento psicossocial e em medidas de distress emocional 25,28,78. Os níveis de ansiedade exibidos pelos doentes a realizarem tratamento, muito próximos daqueles que são relatados pelos indivíduos saudáveis, podem dever-se ao facto de esses doentes terem iniciado, em média, os seus tratamentos cerca de 7 meses. Deste modo, a incerteza, o medo e as preocupações que caracterizam o inicio desta fase poderiam não estar tão presentes aquando da avaliação.

Na fase de diagnóstico esperava-se encontrar níveis mais elevados de distress emocional, seguindo-se a fase de tratamento e de follow-up. Relativamente à ansiedade, embora a tendência nos resultados de encontro ao esperado, sugerindo a associação da fase de diagnóstico a uma maior vulnerabilidade para o desenvolvimento de sintomas ansiosos, não foram encontradas diferenças significativas entre os grupos. Por sua vez, os doentes a realizarem tratamento relataram níveis de depressão significativamente superiores aos manifestados pelos doentes na fase de follow-up mas, também, tendencialmente mais elevados que os encontrados em doentes no momento do diagnóstico.

Estes resultados não corroboram por inteiro as hipóteses formuladas e não são totalmente consistentes com as evidências que indicam que o distress emocional é mais intenso no momento do diagnóstico e imediatamente após o início dos tratamentos, tendendo a diminuir com o passar do tempo 17,77. As características particulares do protocolo terapêutico para doentes com sarcomas ajudam, no entanto, a compreender estes dados, assim como a maior incidência de depressão clínica observada nos doentes a realizarem tratamento. Um diagnóstico de sarcoma, particularmente de grau intermédio ou alto grau de malignidade, requer regimes de tratamento intensivos e prolongados que implicam uma longa hospitalização e elevadas doses de quimioterapia e/ou radioterapia 52. Estes tratamentos agressivos conduzem frequentemente a efeitos colaterais adversos que resultam habitualmente num aumento do sofrimento, debilitação, compromissos mentais, incapacidade física e limitações comportamentais. Tais dificuldades levam a uma maior dependência dos cuidadores formais e informais e requerem um ajustamento dos papéis familiares. Por sua vez, os procedimentos cirúrgicos para doentes com sarcomas são muitas vezes extensos e podem implicar mutilações corporais, por exemplo amputação de membros 54. O tratamento dos sarcomas pode ter assim efeitos significativos ao nível da aparência corporal, conduzindo a dificuldades em lidar com uma auto-imagem alterada. As perdas vivenciadas, as alterações nas competências físicas e mentais, as mudanças nos papéis pessoais e sociais, as dificuldades em reintegrar a rotina diária e as alterações na aparência e imagem corporal podem ser então exacerbadas na fase de tratamento, resultando num forte impacto emocional e na manifestação de sintomas depressivos.

Sobreviventes livres de doença, como esperado, exibiram baixos níveis de distress emocional, inferiores aos manifestados por doentes na fase de diagnóstico e de tratamento, e mesmo inferiores aos manifestados por indivíduos da população geral. Hipoteticamente, esta tendência nos resultados em relação à população geral pode estar relacionada com fenómenos de crescimento pós- traumático. De referir, contudo, que a incidência de ansiedade clínica em sobreviventes de sarcomas (24,7 %) alerta para a necessidade da continuidade da prestação de serviços de saúde mental no período após o término dos tratamentos.

De uma forma geral, os resultados encontrados corroboram as hipóteses inicialmente formuladas relativas à QdV. Com efeito, constatou-se uma QdV física diminuída quer nos doentes no momento do diagnóstico quer naqueles a receberem tratamento. Os dados de diversos estudos em doentes com cancro validam estes resultados 24,30,31.

Doentes na fase de tratamento relataram igualmente um pior funcionamento emocional e cognitivo comparativamente aos sobreviventes, tal como inicialmente hipotetizado, mas, para os doentes na fase de diagnóstico, as diferenças não se revelaram significativas. Estas duas dimensões funcionais da QdV parecem, portanto, ser mais afectadas durante os tratamentos do que no momento do diagnóstico. No domínio psicológico do WHOQOL-Bref, no entanto, quer os doentes na fase de diagnóstico, quer aqueles a realizarem tratamento, não relataram piores resultados de QdV em relação aos sobreviventes e aos indivíduos saudáveis, o que não vem de encontro ao esperado. A ausência de diferenças significativas nesta dimensão da QdV entre doentes e indivíduos da população geral parece estar, contudo, em consonância com o que é sugerido por alguns autores, nomeadamente que o impacto do cancro no domínio psicológico da QdV é menor do que muitas vezes se pensa 25,77.

Uma QdV diminuída em relação ao funcionamento de papéis e ao funcionamento social foi também observada na fase de diagnóstico e na fase de tratamento.

Estes resultados foram inicialmente previstos e estão de acordo com diversos estudos que demonstram as limitações no desempenho de papéis pessoais e sociais, os compromissos ao nível do trabalho e desempenho das tarefas domésticas e as restrições na participação em actividades sociais e de lazer, impostas pela própria doença e seus tratamentos 24,31,48,54. Por sua vez, é durante o tratamento para o cancro do osso e tecidos moles que parece ocorrer uma maior experiência de sintomas. Atendendo ao protocolo terapêutico para um diagnóstico de sarcoma (principalmente de alto grau de malignidade, como aliás acontece para a maioria dos doentes recrutados), anteriormente descrito, esta constatação era esperada e acabou por ser corroborada pela tendência nos resultados do presente estudo.

Finalmente, confirmando as hipóteses iniciais, doentes na fase de diagnóstico e tratamento relataram uma pior percepção de QdV global comparativamente aos indivíduos no período pós-tratamentos e aos da população geral. Adicionalmente, os sobreviventes de sarcomas manifestaram uma QdV global comparável à dos controlos saudáveis, se bem que a pontuação média inferior no domínio Físico do WHOQOL-Bref sugira a presença de alguns compromissos físicos e funcionais.

Estes resultados são consistentes com a literatura no âmbito da doença oncológica e em sobreviventes de sarcomas 24,30,38,40,56-59.

O presente estudo é um contributo para a compreensão do ajustamento emocional e QdV de doentes diagnosticados com sarcomas, um tipo específico e raro de cancro. Ao procurar examinar o distress emocional e a QdV em diferentes fases da trajectória da doença, este trabalho colmata uma importante lacuna no campo da psico-oncologia, embora com algumas limitações que passam sobretudo pelo tamanho reduzido da amostra, e sua heterogeneidade, nos distintos momentos.

Como anteriormente mencionado, se bem que o impacto emocional do cancro do osso e tecidos moles, nas diferentes fases da doença, não deva ser sobrestimado, ele também não deverá ser menosprezado atendendo ao número considerável de doentes que ainda exibe um distress emocional significativo. Com efeito, as implicações clínicas deste estudo vão no sentido da importância da existência, na prática clínica, de uma triagem para o distress emocional, de modo a que se possam detectar precocemente os doentes em maior risco de desenvolverem um pobre ajustamento à doença e seus tratamentos. Uma atenção especial deverá também ser dirigida à monitorização dos níveis de ansiedade e depressão em diferentes momentos da vivência da doença.

A implementação de intervenções psicossociais em doentes com sarcomas revela-se portanto necessária e particularmente pertinente no momento do diagnóstico, onde parece existir uma maior vulnerabilidade para a manifestação de sintomatologia ansiosa, e durante os tratamentos em virtude do maior risco para o desenvolvimento de sintomas depressivos. A prevalência de distress emocional significativo, e principalmente de ansiedade clínica, que foi encontrada em sobreviventes de sarcomas apela também para a continuidade destas intervenções no período após o término dos tratamentos.

O impacto do cancro do osso e tecidos moles na QdV chama também a atenção para a importância das equipas multidisciplinares em oncologia. Para além dos habituais cuidados médicos e de enfermagem, os doentes com cancro beneficiam ainda de serviços de saúde mental e assistência social, assim como de programas de reabilitação e fisioterapia. Estas intervenções multidisciplinares são fundamentais para a promoção da QdV nos seus diferentes domínios, principalmente em doentes na fase de diagnóstico e a receberem tratamento, onde ela se encontra mais comprometida.

Em estudos futuros será importante examinar os contextos de influência da adaptação de doentes com sarcomas, nas diferentes fases da trajectória da doença, incluindo variáveis demográficas, clínicas e psicossociais.

Investigações longitudinais que avaliem a estabilidade ou mudança na adaptação ao longo do curso da doença e de distintas fases, assim como os seus preditores, são também importantes em doentes diagnosticados com este tipo de cancro.


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