Nota bibliográfica
Nota bibliográfica
Manuel Delgadoa
aIASIST, Lisboa, Portugal. mdelgado@iasist.com
Morais, L. Liderança e estratégia: casos de inovação nas organizações de saúde.
Lisboa: Escolar Editora; 2012.
As organizações de saúde são estruturas muito complexas e com grande dinamismo,
aonde, à volatilidade do conhecimento e das tecnologias, se associam as
alterações no próprio padrão epidemiológico da procura.
As questões relacionadas com a liderança, a estratégia e a inovação assumem,
neste contexto de atuação, particular relevância. E os modelos de gestão, em
que essas questões se enquadram, são decisivos para a sua eficácia.
O livro, que agora comentamos, trata justamente deste conjunto de questões,
tentando descortinar, através da análise de novos modelos de gestão aplicados à
realidade hospitalar, como evoluíram as dimensões da liderança, da estratégia e
da inovação.
Parece evidente, no setor público, a evolução para modelos de gestão mais
próximos da Nova Gestão Pública, em que a incorporação de metodologias
importadas da gestão privada reforça o foco nos resultados, em detrimento dos
aspetos procedimentais ou burocráticos.
Na área da saúde e, em particular nos hospitais, não temos um modelo consensual
para a liderança (um médico ou um gestor? um órgão colegial ou um órgão
individual?) como bem assinala o autor, após a sua investigação. Mas convirá
também esclarecer qual o tipo de liderança a que nos referimos: a estratégica,
mais próxima da gestão de topo, ou a intermédia, mais próxima da liderança
técnica e em que predomina a figura do médico?
O autor reflete bem sobre este tema, traçando, como corolário, as 2 linhas de
autoridade, por vezes conflituantes e que são muito visíveis nos hospitais: a
hierarquia administrativa ou gestionária que representa o poder formal; e a
hierarquia técnica, muito centrada na componente médica e que, muitas vezes,
assume um poder (informal) de decisão muito superior à sua posição hierárquica.
Diz o autor, e muito bem, que a inovação (outro dos temas abordados) deve ser
fundamentada em critérios objetivos que articulem custos e benefícios, riscos e
utilidade. Todos sabemos que esta é uma das caraterísticas mais impressivas dos
modos de produção clínicos, em que as tecnologias estão cada vez mais
intensamente presentes no diagnóstico, na terapêutica e na reabilitação. A sua
prévia avaliação e a definição rigorosa das formas de utilização são elementos
da maior importância para que as tecnologias sejam um benefício efetivo para os
doentes e não apenas um encargo crescente para os serviços, que passam a
adquiri-las sem critério e a utilizá-las indiscriminadamente.
Mas há outros tipos de inovação em que, ao invés, o autor descortina pouca
atenção das administrações e dos serviços e pouco investimento: a inovação
organizacional.
Esta é manifestamente escassa e provoca muitas vezes a rejeição dos
profissionais: modelos compreensivos/integrados de tratamento dos doentes,
novas modalidades ambulatórias e de apoio domiciliário, registos em formato
eletrónico, uniformização dos processos clínicos, modelos de atendimento para
hora certa, integração com os cuidados primários, etc.
Hoje, aborda-se a gestão como se fosse um compromisso: entre a disponibilização
de recursos finitos e a aposta em resultados cada vez mais exigentes. Esse
compromisso, no setor da saúde, exige lideranças partilhadas e não antagónicas.
E em que os modelos da «nova organização» (os Centros da Responsabilidade e a
Governação Clínica) pretendem espelhar justamente essa partilha de
responsabilidades.
Em síntese, trata-se de um trabalho, no essencial conseguido: a relevância e a
oportunidade do tema são inquestionáveis, as escolhas do autor para o seu
trabalho de campo são manifestamente acertadas e a metodologia seguida
irrepreensível.
As conclusões do autor revelam algum pessimismo: novos modelos de gestão e
poucos resultados. De facto, nas últimas décadas várias foram as experiências
inovadoras de gestão no modelo hospitalar público. E parece hoje evidente que
nenhuma delas trouxe vantagens indiscutíveis e sustentáveis face ao passado. O
que falta fazer?
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