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EuPTCVHe0870-90252012000200003

EuPTCVHe0870-90252012000200003

variedadeEu
Country of publicationPT
colégioLife Sciences
Great areaHealth Sciences
ISSN0870-9025
ano2012
Issue0002
Article number00003

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Sucesso na manutenção do peso perdido em Portugal e nos Estados Unidos: comparação de 2 Registos Nacionais de Controlo do Peso

Introdução Quando se pensa em tratamento da obesidade, o sentimento que está mais presente é o de pessimismo, visto que a maior dificuldade é a manutenção do peso perdido a longo prazo. As intervenções têm atingido sucesso ao nível da perda do peso, mas o mesmo não sucede ao nível da sua manutenção, surgindo como dado consistente o facto de o peso perdido pela maioria dos pacientes obesos ser geralmente recuperado1. Apesar do limitado número de estudos e de diferentes definições de manutenção do peso adotadas nas metodologias desses estudos, estima-se que cerca de 20% dos participantes em programas de tratamento tem sucesso na manutenção a longo prazo2 e as recomendações para o sucesso da perda do peso a longo prazo apontam para estratégias comportamentais que incluam redução da ingestão calórica e aumento da atividade física3. O estudo de variáveis preditoras da manutenção do peso perdido é importante para compreender a etiologia da obesidade e para melhor definir objetivos e alocar recursos de intervenções. Pode também contribuir para avaliar a prontidão para a perda do peso de uma pessoa e identificar possíveis variáveis associadas à perda do peso4.

Num estudo com cerca de 2000 adultos bem-sucedidos na manutenção do peso perdido, concluiu-se que as estratégias mais eficazes para esse objetivo foram a monitorização do peso corporal, planear as refeições, a contagem de calorias, o registo da gordura ingerida, cozinhar por prazer, a inclusão da atividade física na rotina diária e a realização de treino de força5. Numa revisão alargada, cujo foco incidiu em potenciais fatores comportamentais e psicossociais preditores de manutenção do peso perdido, verificou-se que a perda do peso inicial mais elevada, automonitorização dos comportamentos, estilo de vida ativo, refeições regulares incluindo pequeno-almoço, suporte social e autoeficácia estão associados ao sucesso na manutenção do peso, definida como intencional e mantida pelo menos por 6 meses6. Outros estudos verificaram que, quanto maior a perda do peso inicial, melhor o resultado final do tratamento7 e que estratégias não saudáveis, como saltar refeições e jejum prolongado, mesmo que conjugadas com outras estratégias saudáveis, aumentam a probabilidade de recuperação do peso perdido8.

Um número reduzido de tentativas anteriores de dietas e uma elevada automotivação são preditores de maior sucesso na perda do peso9. O mesmo se verificou num estudo com mulheres portuguesas que também evidenciaram a imagem corporal como preditor de sucesso na perda do peso10. No controlo do peso a longo prazo, fatores motivacionais relacionados com o exercício, especialmente a motivação intrínseca e a autoeficácia, desempenham um papel importante11, assim como uma maior regulação autónoma para permanecer no programa se associa a maiores perdas do peso e a maior adesão ao exercício no longo prazo12. Os resultados do programa Promoção do Exercício e Saúde na Obesidade (PESO)13 mostraram que uma menor alimentação emocional e um padrão de restrição alimentar flexível são fatores críticos para a perda do peso, acentuando igualmente a importância de que para o sucesso a longo a prazo se deva promover a motivação intrínseca e a autoeficácia para o exercício14. Num outro trabalho do mesmo estudo longitudinal, verificou-se que uma maior motivação autónoma e o exercício regular com intensidade moderada ou vigorosa são mediadores da manutenção a longo prazo15.

Para o desenvolvimento de intervenções de tratamento mais eficazes, assume extrema importância perceber os fatores que influenciam e tornam possível o controlo do peso no longo prazo. O National Weight Control Registry (NWCR) estudou indivíduos americanos com sucesso na manutenção do peso perdido e descreveu as características de mais de 6000 participantes. Nesta investigação retrospetiva, indivíduos que perderam intencionalmente pelo menos 13,6kg (30 libras) do seu peso corporal e mantiveram o peso perdido pelo menos por um ano, são considerados como tendo sucesso na manutenção do peso perdido. No grupo inicial, com uma média de idades de 47 anos, sendo 80% mulheres, a média de peso perdido reportada foi de 30kg e a duração média de peso mantido foi de 5,5 anos16. A adoção da atividade física revelou-se uma estratégia essencial para os participantes deste estudo17. O nível médio de atividade física realizado por estas pessoas pode ser considerado elevado18,19,20, situando-se acima das recomendações para o controlo do peso, que apontam para uma duração de 150 a 250min semanais de atividade física moderada para prevenir voltar a ganhar o peso, produzindo moderadas perdas do peso21. A realização de mais de 250min semanais de atividade física moderada está associada a reduções do peso clinicamente significativas, especialmente se conjugada com moderada, mas não severa, restrição calórica21. Outras estratégias, como a frequente automonitorização22, limitar o número de horas por dia a ver televisão23, o consumo de uma dieta pobre em gorduras17, tomar pequeno-almoço diariamente24, manter um padrão alimentar consistente, sem alterações nas férias ou fins de semana25 e adotar níveis de desinibição alimentar reduzidos2 podem ajudar no sucesso da manutenção do peso.

O RNCP é o primeiro estudo em Portugal que caracteriza as pessoas com sucesso na manutenção do peso perdido. Integrado neste projeto, o objetivo do presente trabalho é analisar os programas e métodos de perda do peso adotados, assim como as estratégias de manutenção do peso perdido que atualmente estes indivíduos utilizam e comparar estes dados com os reportados pelos participantes americanos do NWCR. As características demográficas dos participantes portugueses encontram-se descritas em trabalho anterior26.

Complementarmente, os participantes no RNCP foram analisados quanto às suas características comportamentais, como a atividade física formal e informal, e relativamente a algumas variáveis nutricionais selecionadas.

A metodologia seguida no RNCP26 baseou-se na que foi implementada no NWCR16, tendo o recrutamento sido realizado através da publicidade local e nacional, com recurso à imprensa escrita, rádio e televisão, e apenas no caso do registo português com o recurso a um website desenvolvido para o efeito. Em ambos os registos os participantes assinaram um acordo e consentimento informado, tendo autorreportado o seu peso, altura e perda do peso. Os critérios de inclusão no NWCR incluíam a perda do pelo menos 13,6kg (30 lbs) enquanto que no RNCP o valor de perda mínimo para entrada no estudo foi de 5kg. Outra diferença metodológica verifica-se no facto de os participantes do NWCR preencherem questionários de follow-up anualmente e, no caso do RNCP, a avaliação inicial foi repetida na íntegra um ano após a entrada no estudo.

Métodos Amostra De acordo com os critérios de inclusão neste estudo, os participantes do RNCP têm mais de 18 anos, nos últimos 15 anos perderam pelo menos 5kg intencionalmente e mantiveram o peso perdido pelo menos por um ano, considerando-se manutenção do peso perdido uma variação inferior a 3% do novo peso corporal. Indivíduos cuja redução do peso inicial induza a obtenção de um índice de massa corporal inferior a 18,5kg/m2 não foram incluídos no RNCP por se considerarem valores potencialmente prejudiciais para a saúde. Os 198 indivíduos, 59% mulheres, que constituíram a amostra do presente trabalho, apresentaram uma idade média de 40 anos, com um peso médio de 73,8kg correspondente a um índice de massa corporal de 26,0kg/m2, tendo registado uma perda do peso média de 17,4kg e um tempo médio de manutenção do peso perdido de 29 meses. Destes 198 participantes que iniciaram o processo de avaliação, uma subamostra de 139 indivíduos completou a avaliação inicial, realizando um conjunto de testes de laboratório, incluindo a caracterização da atividade física e da alimentação, informação que se expressa na Tabela_1. Para todas as restantes análises, utilizou-se a amostra completa (n=198). Não se registaram diferenças estatisticamente significativas entre esta subamostra e a totalidade dos participantes nas principais variáveis do estudo, especificamente no peso atual (p=0,148), na perda do peso (p=0,602) e no tempo de manutenção do peso perdido (p=0,620).

Os participantes foram recrutados através do anúncio e divulgação do website do RNCP na imprensa escrita, rádios e televisão, tendo sido explicado detalhadamente o funcionamento do RNCP, na primeira avaliação laboratorial, realizada em Lisboa e no Porto, após o que todos assinaram um consentimento informado. A participação no RNCP implica 2 momentos de avaliação, no momento inicial e após um ano de entrada no estudo. A participação no RNCP está aberta em permanência, ou seja, o número de pessoas que se registam no estudo e que iniciam o processo de avaliação está em permanente evolução. Neste estudo, apenas se reportam os dados obtidos na avaliação inicial, recolhidos no período de 2008 a 2010.

Instrumentos Foram realizadas avaliações laboratoriais que contemplaram o preenchimento de um questionário inicial (características demográficas, história do peso corporal, estratégias de perda e de manutenção do peso), bem como a avaliação da composição corporal (peso, altura e perímetro da cintura), da atividade física (acelerometria e questionários sobre a atividade física do estilo de vida e de lazer), da nutrição e alimentação (frequência alimentar) e de variáveis psicossociais (p. ex. motivação e autoeficácia para a atividade física, autoestima, qualidade de vida, imagem corporal, comportamento alimentar, ansiedade e sintomatologia depressiva). Neste trabalho, iremos reportar as estratégias de perda, as estratégias de manutenção e descrever parte das variáveis avaliadas no laboratório. As secções seguintes descrevem os instrumentos utilizados para avaliar cada um destes grupos de variáveis.

Estratégias de perda do peso Os participantes foram questionados sobre a estratégia de perda do peso que seguiram, devendo indicar se, para reduzir o peso, modificaram apenas a ingestão calórica, apenas a atividade física ou ambos. Foi igualmente solicitado que indicassem qual o tipo, onde e com quem efetuaram atividade física para perder peso, bem como outras estratégias dos hábitos alimentares (p. ex., «reduziu alimentos ricos em gordura?» ou «reduziu a porção de alimentos?») ou outros comportamentos (p. ex., «passou a subir escadas?» ou «passou a pesar-se regularmente?»), respondendo de acordo com uma escala de Likert de 5 pontos (de «1-Nunca» a «5-Sempre»).

Efeito da perda do peso na qualidade de vida e bem-estar As pessoas do RNCP indicaram qual o efeito da perda do peso registada na sua qualidade de vida, no seu bem-estar físico e mental, no seu humor e nas suas interações sociais, segundo uma escala de Likert de 5 pontos (de «1-Piorou muito» a «5-Melhorou muito»).

Estratégias de manutenção do peso Nesta secção, avaliou-se, de acordo com uma escala de Likert de 5 pontos (de «1-Nunca» a «5-Sempre»), o que os participantes fazem atualmente para manter o peso perdido, relativamente aos seus hábitos alimentares (p. ex., «seleciona os alimentos?» ou «contabiliza as calorias?»), a outros comportamentos (p. ex., «pratica atividade física regularmente?» ou «estabelece objetivos concretos?»), ao número de vezes que come por dia ou que se pesa numa balança.

Consistência no plano alimentar Os participantes foram questionados se ao fim de semana e nas férias mantêm um regime alimentar mais ou menos rigoroso do que, respetivamente, durante a semana e durante o ano de trabalho, usando uma escala de Likert de 7 pontos (de «1-Menos rigoroso ao fim de semana/férias» a «7-Mais rigoroso ao fim de semana/ férias»).

Comportamentos sedentários Foi solicitado a todos as pessoas que indicassem o tempo que passam a ver televisão, ao computador ou a uma secretária, num dia de semana e num dia de fim de semana.

Dificuldade em perder ou manter o peso Usando uma escala de Likert de 7 pontos (de «1-Extremamente fácil» a «7- Extremamente difícil»), as pessoas indicaram a sua dificuldade em perder peso e em manter o peso perdido. Foi calculada uma nova variável, subtraindo o valor indicado para a dificuldade na manutenção ao valor da dificuldade de perda do peso. Um valor positivo significa que essa pessoa tem mais dificuldade em perder do que em manter o peso perdido, enquanto um valor negativo indica uma maior dificuldade em manter o peso após a perda.

Composição corporal Todos os participantes foram pesados vestindo roupas leves e descalços, numa balança (Seca, Hamburg, Germany), com aproximação ao valor de 0,01kg. Foi medida a altura com aproximação aos 0,1cm com um estadiómetro (Seca, Hamburg, Germany) e foi medido o perímetro da cintura de acordo com procedimentos padronizados27. Adotou-se o perímetro da cintura acima das cristas ilíacas, pois é aquele que está mais relacionado com a percentagem de gordura corporal28.

Atividade física A atividade física foi avaliada através do Physical Activity Questionnaire29, questionário validado para avaliar a atividade física formal e informal30 e constituído por 3 componentes relativos a uma semana típica anterior: escadas subidas, distância percorrida a caminhar e atividades desportivas formais. Os participantes reportaram a média do número de degraus subidos diariamente, de quantos quilómetros diários percorreram caminhando e listaram as atividades desportivas em que participaram na semana anterior, indicando a frequência e a duração de cada uma dessas atividades. Utilizando a codificação deste questionário29, foi estimado o dispêndio energético semanal de cada uma das 3 componentes e o dispêndio energético total semanal. Uma limitação deste questionário é não utilizar nenhum fator de correção para o género ou peso corporal, assumindo uma pessoa de 68kg no cálculo do dispêndio energético19.

Nutrição e alimentação Foi utilizado um Questionário de Frequência Alimentar validado para a população portuguesa31, retrospetivo de autopreenchimento e que expressa a frequência com que cada alimento ou grupo de alimentos é ingerido e a quantidade aproximada da porção ingerida. Este instrumento é um indicador padronizado da frequência de consumo alimentar, o que permite entender a relação entre a composição da dieta do indivíduo e a saúde. Para determinar a frequência de ingestão de alimentos, os participantes indicaram uma resposta em 9 opções possíveis: «consumo nulo do alimento», «1 a 3 vezes por mês», «1 vez por semana'», «2 a 4 vezes por semana», «5 a 6 vezes por semana», «1 vez por dia», «2 a 3 vezes por dia», «4 a 5 vezes por dia» ou «mais de 6 vezes por dia». Para conhecer a quantidade de cada alimento ingerido, os indivíduos indicaram se a sua porção foi menor, igual ou maior do que a porção média indicada. Este instrumento de avaliação foi desenvolvido pelo Serviço de Higiene e Epidemiologia da Faculdade de Medicina da Universidade do Porto e foi validado pela Faculdade de Ciências da Nutrição e Alimentação da Universidade do Porto31.

Análise estatística As análises foram efetuadas usando o Statistical Package for the Social Sciences (SPSS), versão 19, e as técnicas estatísticas utilizadas foram medidas de tendência central, análise da variância e teste t-student de amostras independentes para comparação entre géneros. Foi igualmente usado o teste qui- quadrado para comparação de variáveis categóricas. Para todos os testes foi definido o erro tipo I para α=0,05.

Resultados Os participantes no registo português são, em média, mais novos, 40 anos de idade comparados com os 47 anos dos participantes no NWCR16, mais pesados, índice de massa corporal de 26,0kg/m2 comparado com 24,6kg/m2 no NWCR, embora o registo português seja mais equilibrado em termos de distribuição por género, sendo constituído por 59% de mulheres comparado com cerca de 80% da amostra americana. Menos portugueses possuem educação superior, 68% comparado com 82%, verificando-se igualmente um menor número de casados ou a viver em união de facto na amostra do registo português, 54%, do que no registo americano, 64%. A análise detalhada das características demográficas dos participantes portugueses encontra-se num trabalho que descreve a implementação do RNCP26.

No RNCP, as pessoas reportaram uma perda do peso média de 17,4kg e um tempo médio de manutenção do peso perdido de cerca de 2 anos e meio, enquanto no NWCR se observaram valores mais elevados tanto para a perda do peso, 30kg, como para a duração da manutenção, cerca de 5 anos e meio16. Em ambos os registos, verificou-se que a alteração em conjunto dos hábitos de atividade física e de alimentação foi a estratégia de perda do peso usada pela maioria, 82 e 84% respetivamente no RNCP e no NWCR (Figura_1). Os restantes indivíduos portugueses, 18%, indicaram ter alterado apenas a alimentação para perder peso comparado com 10% dos americanos. Nenhum participante do RNCP indicou ter perdido peso unicamente à custa de alterações da atividade física, o que foi reportado por cerca de 1% dos participantes do NWCR16. Nestas variáveis, não se registaram diferenças entre homens e mulheres do RNCP.

Na Figura_2 estão indicadas as estratégias de perda do peso adotadas pelos participantes no RNCP em comparação com as do registo americano. Assim, para perder peso, verificou-se que a maioria dos participantes dos 2 registos passou a selecionar os alimentos, 79 comparado com 88% do NWCR16. A maior parte das pessoas do RNCP, 77%, perderam peso por sua conta e, das restantes que recorreram a um programa de tratamento, apenas 29% perdeu peso em programas de grupo. Não houve diferenças entre homens e mulheres do RNCP.

O efeito que a perda do peso produziu na vida dos participantes do RNCP é semelhante ao que foi reportado pelos indivíduos do registo americano (Tabela 2)16. De assinalar que cerca de metade dos participantes, 46% no RNCP e 55% no NWCR, reportou uma melhoria no rendimento no trabalho. Apesar do efeito positivo que a perda do peso tem em vários domínios da vida dos participantes, alguns reportam que o tempo que passam a pensar em comida (33% no RNCP e 14% no NWCR) e no peso (54% no RNCP e 20% no NWCR) aumentou, representando um efeito negativo da redução do peso. Não se registaram diferenças entre homens e mulheres do RNCP.

Os tipos de atividades físicas realizadas para perder peso estão ilustrados na Figura_3. A marcha é a atividade preferida dos participantes nos 2 registos e, enquanto que, para os portugueses, a corrida é a segunda atividade preferencial, os americanos optam pelo ciclismo17.

Os participantes no RNCP preferem o ar livre para efetuar atividade física (54%) e o ginásio (38%) enquanto que as pessoas do NWCR indicam preferir realizar atividade física indoor (90%) comparado com apenas 13% dos portugueses que indicam esta preferência. Perto de dois terços dos participantes no registo português, 61% das mulheres e 68% dos homens, indicaram preferir praticar atividade física sozinhos, enquanto que, no NWCR, a preferência recai na companhia dos amigos (40 comparado com 13% no RNCP) e de um grupo ou equipa (31 comparado com 18% no RNCP). Entre os portugueses, verificaram-se diferenças significativas entre géneros no que respeita à preferência pela corrida (p<0,001), pelo ciclismo (p=0,006), com mais homens a adotar estas 2 atividades e pelas aulas de grupo (p=0,002), com mais mulheres a preferir este tipo de atividade. Comparativamente com as mulheres, um maior número de homens prefere realizar atividade física no exterior (71%, p=0,002) e indoor (20%, p=0,039).

As estratégias de manutenção do peso perdido utilizadas pelas pessoas nos 2 registos estão descritas na Figura_4. A atividade física regular é adotada como estratégia por mais de dois terços dos indivíduos no RNCP, estratégia seguida por 72% das pessoas do NWCR. Os participantes no registo português reportaram outras estratégias de manutenção do peso, utilizadas pela maioria, em alguns casos diferentes das usadas pelas pessoas do registo americano16, como selecionar conscientemente os alimentos (69%, comparado com 92% no NWCR), reduzir a quantidade de alimentos ricos em gordura (87 comparado com 38%), limitar a quantidade de alimentos ingeridos numa refeição (63 comparado com 49%) e contabilizar as calorias ingeridas (14 comparado com 36% no NWCR).

Apenas 4% dos participantes no NWCR indica que não toma esta refeição, enquanto que 78% toma o pequeno-almoço todos os dias24. Esta estratégia ainda é mais consensual entre os portugueses do RNCP, pois 98% reporta que não salta esta refeição. A automonitorização do peso corporal é outra estratégia identificada como muito importante: cerca de três quartos dos americanos integrantes no NWCR monitorizam o seu peso pelo menos uma vez por semana e muitos deles fazem-no diariamente16, enquanto que cerca de 65% dos participantes no RNCP reportam que utilizam esta estratégia pelo menos uma vez por semana. Não se registaram diferenças entre homens e mulheres do RNCP.

A maioria dos portugueses com sucesso em manter o peso tem um padrão alimentar menos rigoroso ao fim de semana e durante as férias, o que não acontece com a maior parte das pessoas no registo americano (Figura_5), cujo padrão alimentar é mais consistente durante toda a semana e todo o ano25. Outras características do padrão alimentar destas pessoas são a redução do número de vezes que comem fora de casa por semana (2 a 3 vezes, idêntico no NWCR) e efetuarem várias refeições e snacks por dia (5 a 6 vezes, comparado com 4 a 5 vezes no NWCR). No caso do estudo português, as mulheres registam um número superior de refeições ou snacks por dia ao dos homens (p=0,025).

As características da atividade física e da alimentação dos portugueses e americanos de sucesso no controlo do peso perdido estão expressas na Tabela_1.

O dispêndio energético semanal com atividade física dos participantes no RNCP é de 3422kcal, correspondente a cerca de 250min semanais de atividade física moderada ou vigorosa. Embora os resultados do registo português sejam um pouco superiores, são consistentes com o que se observou no registo americano, em que a estratégia fundamental para a manutenção do peso perdido foi a adoção de elevados níveis de atividade física, cerca de 2621kcal despendidas por semana19. A exemplo do que se passa no NWCR, os homens do registo português atingem um dispêndio energético mais elevado do que as mulheres (3812kcal/ semana comparado com 3127kcal/semana, p=0,032), realizando mais atividade física vigorosa (127min/semana comparado com 41min/semana efetuado pelas mulheres, p<0,001).

Os participantes do NWCR indicaram consumir uma dieta alimentar constituída por aproximadamente 29% de energia proveniente de gordura, 19% de proteína e 49% de hidratos de carbono20, semelhante à composição da dieta alimentar das pessoas no RNCP, 32,8% de gordura, 19,2% de proteína e 49,3% de hidratos de carbono. A quantidade total de energia consumida diariamente é bastante superior nas pessoas do RNCP, 2 223kcal, comparada com 1 379kcal ingeridas pelas pessoas do NWCR.

Tal como no registo americano, a maioria dos participantes do RNCP sentiu ser mais fácil manter o peso perdido do que perder peso (Figura_6). Analisando a perceção dos participantes relativa à dificuldade em manter o peso perdido (calculada subtraindo a dificuldade de manter à dificuldade de perder peso), verificou-se que a maioria das pessoas sentiu ser mais fácil manter o peso ou de igual dificuldade a perder peso, enquanto poucas pessoas (14% no RNCP e 25% no NWCR) sentiram que manter o peso é mais difícil. Não se registaram diferenças entre homens e mulheres do RNCP.

Discussão O objetivo principal do RNCP é identificar as características e estratégias de sucesso na manutenção do peso perdido adotadas por portugueses a longo prazo.

Os participantes neste estudo mostram que é possível perder grandes quantidades de peso corporal e não voltar a recuperá-lo, contrariando a ideia comum de que «ninguém tem sucesso na perda do peso a longo prazo». Pelo exemplo, dos participantes no registo americano, à medida que o tempo vai decorrendo, a manutenção do peso perdido torna-se mais fácil, pois, apesar do esforço que é necessário, um período de manutenção entre 2 a 5 anos aumenta consideravelmente a probabilidade de sucesso2,17.

Por comparação com o estudo norte-americano, que conta com cerca de 6000 participantes e de aproximadamente 95 milhões de adultos com obesidade (ou seja, sensivelmente um participante por cada 16 000 pessoas com obesidade), o registo português terá ultrapassado o número de participantes do seu congénere americano, em termos relativos. Assim, em Portugal, estima-se que cerca de 1 000 000 de adultos apresentem obesidade, com base em 14,3% de prevalência32 para uma população total de 10 570 000 e uma percentagem de adultos de 67,3%. A amostra de aproximadamente 200 participantes atuais do RNCP indica que, por cada 5000 adultos com obesidade em Portugal, existe um participante registado neste estudo (16 000 para um no NWCR).

A importância da atividade física no processo de controlo do peso está bem expressa nos resultados reportados pelos participantes do RNCP. A exemplo do que sucede com os participantes americanos, a marcha é a atividade preferida nos participantes do registo português, optando a maioria por conjugar esta atividade com outro tipo de exercício, o que contribui possivelmente para aumentar a motivação e adesão ao exercício pois a variabilidade de mais do que uma atividade pode evitar saturação e desinteresse em relação ao exercício realizado. Apesar de não ser a atividade preferencial, tanto no registo português como americano, existe um número considerável de pessoas que efetua treino com cargas adicionais («treino de força»), o que constitui um sinal da importância que este tipo de treino tem para o controlo do peso, uma vez que, promovendo um aumento da massa muscular, conduz a um aumento do dispêndio energético ao longo do dia33.

Os homens em ambos os registos reportam atividades com intensidades mais vigorosas e maior dispêndio energético com atividade física do que as mulheres, o que pode ser explicado pelo tipo de atividade escolhida, pois, enquanto os homens preferem a corrida e o ciclismo, as mulheres optam pelas aulas de grupo.

Comparando com o NWCR, os resultados indicam que no registo português o volume e dispêndio energético com atividade física são mais elevados do que no registo americano. A maior percentagem de homens que integra o RNCP, cerca do dobro do NWCR, pode ajudar a explicar este resultado, uma vez que atividades mais vigorosas induzem dispêndios mais elevados. O dispêndio energético semanal atinge, em média, um valor superior às orientações para indivíduos com pré- obesidade ou obesidade que recomendam um gasto energético com atividade física de, pelo menos, 2000kcal semanais com o objetivo de manter o peso perdido no longo prazo21. Apesar de a maioria destas pessoas cumprir essa orientação, existe um número considerável de pessoas, uma em cada 4, que controlam o peso gastando pouca energia com atividade física e menos participantes atingem as recomendações publicadas pela International Association for the Study of Obesity em 2003 indicando 60-90min de atividade moderada na maior parte dos dias da semana para prevenir a recuperação do peso perdido34. Esta conclusão comprova os resultados obtidos no NWCR19, sugerindo que fatores individuais como a energia ingerida, quantidade de peso perdido, idade, género ou fatores genéticos possam ter uma influência significativa no volume de atividade física necessária para manter o peso.

Os valores dos macronutrientes reportados no RNCP estão de acordo com as recomendações para adultos do Institute of Medicine, que descrevem uma dieta constituída por 20 a 35% de gordura, 10 a 35% de proteína e 45 a 65% de hidratos de carbono como saudável35. De referir que a comparação do número total de calorias ingeridas, bem como da percentagem de ingestão dos macronutrientes, tem em consideração as diferenças culturais existentes entre as 2 populações, uma vez que os questionários utilizados foram específicos para as respetivas populações, i.e. validados para cada país36,37. No RNCP, a ingestão energética é mais elevada, existindo uma maior limitação dos alimentos ricos em gordura embora com um consumo superior de gordura, provavelmente pelo tipo de alimentação adotado pelos portugueses, que tradicionalmente seguem a dieta mediterrânica, mais rica em gordura. Também neste caso, a diferente constituição das amostras dos 2 registos, com a amostra portuguesa com um maior número de homens (41 comparado com 20% no NWCR) poderá explicar a maior ingestão energética observada. Permitir um padrão mais flexível pode evitar aborrecimentos e desistências em relação ao seu regime alimentar, mas pode, por outro lado, aumentar o risco de exposição a situações de alto risco, criando mais oportunidades de perda do controlo do peso e aumentando a probabilidade de manter o peso perdido em 1,5 vezes2.

O facto de a maioria das pessoas com sucesso na perda do peso a longo prazo sentirem maior facilidade em manter o peso do que em perder peso pode causar alguma surpresa, dada a noção generalizada de que a fase de manutenção é muito mais difícil do que a fase de perda do peso, aliás comprovada pelo facto de apenas 20% dos participantes em programas de tratamento ter sucesso na manutenção a longo prazo2. Esta maior facilidade na fase de manutenção poderá advir do facto de as pessoas terem internalizado os novos comportamentos que adotaram. Por exemplo, a integração da atividade física na rotina diária torna- se mais fácil com o decorrer do tempo e com a vantagem da melhoria da condição física ser uma motivação acrescida para manter essa regularidade.

Os resultados deste estudo, à semelhança do seu congénere americano17, sugerem que as estratégias de perda e de manutenção são muito diversificadas, indicando que não existe uma única forma ou caminho para alcançar o objetivo de manter o peso perdido. No entanto, é de realçar que a maioria das estratégias adotadas pelos participantes para perder peso se mantêm na fase de manutenção, devendo o aconselhamento dos técnicos de saúde ser orientado para estratégias que possam ser mantidas no longo prazo, contrariando a ideia de que as estratégias usadas nas 2 fases do processo de combate à obesidade devam ser distintas.

A importância da comparação dos 2 registos assenta no facto de se perceber se as conclusões do NWCR podem ser total ou parcialmente aplicáveis à população portuguesa. Os comportamentos e estratégias utilizadas em Portugal para perder e manter o peso apontam globalmente no mesmo sentido que as reportadas pela amostra americana, embora com algumas especificidades devido possivelmente a diferentes normas socioculturais, como à popularidade de dietas específicas ou ao envolvimento potenciador ou constrangedor da prática de atividade física.

Este facto pode explicar, por exemplo, o facto de os participantes portugueses adotarem com mais frequência atividade ao ar livre e as pessoas do NWCR preferirem o indoor, pois o clima mais ameno e a criação de infraestruturas que possibilitem escolhas de prática de atividade física para isso contribuem.

Embora não seja conhecida atualmente a prevalência em Portugal das pessoas com sucesso em manter o peso perdido, este estudo conseguiu por si e, até ao momento, identificar um número considerável deste grupo de pessoas. Outro aspeto positivo é a extensa bateria de avaliação psicossocial e comportamental.

No entanto, a amostra do RNCP é uma amostra selecionada, constituída por pessoas voluntárias que se interessaram em participar, sendo esta uma limitação que este estudo partilha com o seu congénere americano. Para além disso, desconhece-se a representatividade desta amostra face ao universo representado, pelo que os seus resultados e conclusões não podem ser generalizados para todas as pessoas que estão a tentar perder peso ou que o tenham conseguido. Outra limitação reside na diferença no valor de perda do peso a atingir para cumprir o critério de inclusão nos 2 registos e que pode condicionar os resultados encontrados, nomeadamente o facto de o consumo energético médio ser superior no RNCP ao do NWCR. Enquanto no NWCR os participantes necessitaram de uma perda mínima de 13,6kg, no RNCP a perda do peso mínima é de 5kg. Os critérios de inclusão utilizados no registo português seguiram as orientações do NWC, tendo, no entanto, sido ajustados à realidade portuguesa e descritos em pormenor no artigo que se encontra em processo de submissão26, explicando a metodologia de implementação do RNCP.

Apesar de as perdas do peso reportadas pelas pessoas do registo português poderem ser consideradas bastante superiores às perdas do peso registadas pela maioria das pessoas que tentam perder peso (p. ex., no Programa PESO, a média do peso perdido do grupo de intervenção ao fim de 24 meses foi de 5,5% do peso inicial14), é de realçar o valor dos ensinamentos que os indivíduos do RNCP podem proporcionar, exemplificando que é real a possibilidade de perder peso e de o controlar a longo prazo. A implicação mais forte destes resultados poderá ser a de avaliar, em estudos experimentais, se as estratégias e comportamentos demonstrados pelos participantes do RNCP serão eficazes na promoção da manutenção do peso perdido em outros indivíduos que estejam a tentar controlar o seu peso.


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