A Segurança em Unidades de Saúde
COMENTÁRIO
A Segurança em Unidades de Saúde
Manuel Cardoso de Oliveira*
*Escola de Estudos Pós-graduados e de Investigação, Universidade Fernando
Pessoa
Correspondência
Neste início de século o Controlo e a Melhoria da Segurança em Unidades de
Saúde tem vindo a merecer crescente atenção, estando estabelecido que
necessitamos de uma nova organização, bem como lideranças sensíveis à
importância do tema. As numerosas fontes de informação, a taxonomia variável e
a complexidade da Saúde aconselham que os seus profissionais tenham cada vez
mais competências nesta área e assumam iniciativas tendentes à melhoria. À
semelhança do que vai acontecendo em países mais desenvolvidos, a contribuição
de grupos multidisciplinares que dediquem à caracterização e à modernização das
realidades nacionais interesse específico vai contribuir para que doentes e
instituições de Saúde se movimentem mais expeditamente neste campo.
As organizações de Saúde estão, pois, confrontadas com o desafio de educarem um
grande número de profissionais no sector da Segurança e da Qualidade Clínica.
Sabe-se que recentemente a profissão médica ficou pressionada pelo conceito da
Medicina Baseada na Evidência o que, tendo sido um avanço, nem sempre foi
apreciado na sua verdadeira dimensão. Por muito admirável que seja esse
conceito sabe-se que há organizações altamente fiáveis que nunca sentiram a
necessidade de ensaios randomizados e controlados para confirmarem a eficácia
dos seus princípios de Segurança, argumentando que um grande número destes
conceitos são questões de senso comum.
A escassa influência de muitos que se dedicam especialmente à Segurança fez
instalar a crença de que pouco se pode fazer para inverter práticas que colidam
com princípios bem definidos pelos que são nesta área mais competentes.
Reconhece-se que as organizações da Saúde devem ser flexíveis para facilitar a
mudança e que esta, ao ocorrer, cria sempre alguma turbulência. Mas também se
sabe que é muitas vezes em tempos de crise que surgem grandes inovações. A
necessidade de pensar diferente num ambiente tão volátil e complexo como o da
Saúde torna ainda mais importantes todos os esforços que conduzam à criação dos
tais grupos multidisciplinares.
Para que se possa avançar com iniciativas consistentes na área da Segurança
necessitamos de ultrapassar problemas de taxonomia e de colmatar a falta de um
processo sistemático de colheita e análise de dados. Outras grandes questões
passam pela planificação de estratégias de desenvolvimento e de investigação,
além de um domínio perfeito das metodologias usadas. A Segurança dos Doentes
tem a ver primariamente com
o evitar, prevenir e melhorar eventos adversos ou danos que emergem dos
processos dos cuidados. A Segurança tem ainda a ver com a interacção dos
componentes do sistema, sendo mais do que a ausência de eventos adversos ou do
que evitar erros ou ocorrências preveníveis. A Segurança não reside numa
pessoa, num equipamento ou num departamento, antes depende do modo como emerge
das interacções entre os componentes do sistema. Estando relacionada com a
qualidade dos cuidados, os dois conceitos não são sinónimos, considerando-se a
Segurança subsidiária da Qualidade Clínica.
A investigação sobre Segurança deve examinar como é que as mudanças podem
alterar a tolerância aos erros, apoiar a detecção e a recuperação de falhas
incipientes e reconhecer e examinar efeitos laterais não intencionais que criam
novas vias para as falhas. A investigação sobre Segurança pode debruçar-se
sobre falhas sistémicas, fenótipos, como alguns lhe chamam, isto é, as
características superficiais do sistema em oposição aos mecanismos subjacentes,
genótipos, isto é, as características profundamente enraizadas dos sistemas. A
investigação é pois um componente muito importante de uma estratégia mais ampla
para melhorar a Segurança. O contributo de numerosas áreas afins '
Epidemiologia, Bioestatística, Sistemas de Informação, aspectos sociais
diversos, nova Economia da Saúde, Direito da Medicina, Liderança e Gestão,
entre outras ' constitui base fundamental para a abordagem científica de
componentes com uma forte faceta prática.
A Associação Portuguesa Para a Segurança dos Doentes (APASD) nasce desta
evolução convergente com o Imperativo da Qualidade Clínica e áreas afins, e
espera-se que possa dar contributos muito positivos. Englobando profissionais
dos mais variados sectores e sendo uma área da Segurança na Saúde especialmente
vocacionada para a investigação deseja-se que os profissionais desenvolvam
planos de investigação nos seus locais de trabalho, familiarizando-se com as
ferramentas necessárias para uma abordagem científica destes problemas.
Construir uma cultura de segurança é um enorme desafio e, como tal, exige que
se criem estruturas e capacidade organizativa adequadas para o que é necessário
uma grande determinação. Para atingir os resultados desejado sé necessário
assegurar expectativas e comportamentos claros, líderes e colaboradores com os
conhecimentos e as aptidões indispensáveis para essa tarefa e que um sistema de
accountability esteja garantido. Para manter a motivação de todos os membros da
organização exige-se que haja ganhos visíveis e escassez ou nulos danos para os
doentes. Espera-se assim contribuir para que os Hospitais e outras Unidades de
Saúde sejam lugares mais seguros e menos frustrantes para os doentes, lugares
onde se possa trabalhar com mais gosto e eficiência e ainda que os recursos
humanos e materiais neles envolvidos possam ser um investimento com retorno.
Correspondencia:
Prof. Manuel Cardoso de Oliveira
Escola de Estudos Pós-graduados e de Investigação, Universidade Fernando
Pessoa, Praça 9 de Abril, 349, 4249-004 Porto. E-mail: maco0410@gmail.com